Tetris escrita por Stefani Niemczyk


Capítulo 7
Antes tarde do que nunca!




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Eu sempre quis amigos. Sempre quis me sentir importante. Sempre quis pessoas falando comigo. Eu só não estava preparado para ter isso o tempo todo!

O grupo do whats não parava no dia seguinte. Os meninos passaram o dia conversando comigo. Perguntando sobre mim, para ser mais exato.

Onde cresci, como era minha família, de que comidas eu gostava, quais meus filmes favoritos, para onde eu gostaria de viajar, um monte de coisas. Eles nem esperavam a resposta de uma pergunta para fazerem outra. Eu respondia e escrevia "e vocês?", mas nenhum deles falava. Apenas mandavam outra pergunta.

A única coisa que me responderam foi em relação ao menino de vermelho. Descobri que o nome dele era Daniel e que ele havia sobrevivido. Só isso. Ele estava no grupo, mas não estava mandando nenhuma pergunta. Disseram que ele estava de ressaca, por isso não estava animado para participar do interrogatório junto com os outros.

Ao longo do dia, fomos conversado mais (eles começaram a responder, então posso chamar de "conversa") e eu fui conhecendo melhor os meninos. Eram bem comuns.

Leonardo. Vinte anos. Trabalhava como atendente de telemarketing. Morava sozinho. Quer fazer faculdade mas não sabe qual curso escolher. Era loiro, com o cabelo curto, magro e um pouco menor que eu. Tinha uma piercing na orelha, era branco e tinha os olhos verdes (só reparei isso na foto do Whatsapp, não consegui perceber isso no escuro, na noite anterior).

Vitor. Vinte e três anos. Segundo ano da faculdade de Biologia. Estudava à noite e fazia estágio numa escola, auxiliando crianças de doze anos no laboratório. Ele era branco e também tinha olhos verdes, mas seu cabelo era castanho. Com um corte também curto que, através das costeletas, se ligava à barba que ele usava. Era o mais alto dos quatro, uns três centímetros maior que eu. Não era tão magro, mas não por ser gordo, e sim por ser um rato de academia. Tinha uma tatuagem no braço que eu não consegui identificar o que era por causa da manga da camisa.

Henrique. Dezenove anos. Primeiro ano de Psicologia. Fazia faculdade no período da manhã e era sustentado pelos pais. Era o japonês da turma, tinha o cabelo preto, lisinho, bem curto, com um topete um pouco maior na frente. Usava óculos com armações bem discretas e lentes retangulares. Era branco, magro e da mesma altura que o Léo.

Daniel. Dezoito anos. Era o mais novo da turma e, de fato, o que tinha mais cara de adolescente. Talvez por ser o mais baixo e usar um cabelo um pouco grande, penteados para o lado (tipo de Justin Bieber no começo da carreira. Não me canso de falar isso). Mas, diferentemente do Justin, o cabelo dele era mais escuro, um castanho quase preto, a mesma cor dos olhos. Era branco e magro, não parecia ter piercings, tatuagens ou qualquer uma dessas intervenções corporais. O mais diferente no visual dele era uma pulseira de bolinhas de madeira que ele usava. As bolinhas eram pretas e em cada uma havia um ideograma japonês. Ou chinês, sei lá. Ele não fazia faculdade nem trabalhava. Não sei o motivo. Quando perguntei, eles fizeram outra pergunta e não responderam. Eu entendi. Ele não estava na conversa, não era legal os outros ficarem falando por ele.

Fomos conversando e nos conhecendo melhor. Encontrei os garotos no Facebook e adicionei todos. Obviamente fui dando aquela stalkeada básica para descobrir mais sobre eles.

O Facebook é uma coisa engraçada. Em um canto está escrito "Amigos (336)". Trezentos e trinta e seis amigos? Trezentos e trinta e seis e, se eu precisasse desabafar com alguém, não me sentiria confortável em fazer isso com nenhum deles. E o motivo era óbvio: nenhum deles era meu amigo.

Muitos ali eram da escola, muitos da faculdade, muitos do trabalho. Eu passava o dia vendo postagens deles sobre aniversários, namoros, viagens, indignações com a vida e revoltas políticas. Mas nenhum deles era meu amigo, ou jamais foi.

Talvez o Zuckeberg devesse considerar mudar o nome dessa palavra "amigos" para algo mais real, como "conhecidos" ou "sei quem é". Amigos mesmo, nõa havia nenhum. Entre todos aqueles trezentos e tantos, nenhum.

Da mesma forma, o Facebook também é uma vitrine de status. As pessoas passam o dia caçando oportunidades de postar algo que terá likes e comentários. Seja um bolo, um Starbucks, um encontro com alguém, uma roupa nova, qualquer coisa. Tudo vira motivo para postar um foto na timeline.

Os meninos, claro, faziam isso, assim como todo mundo. O perfil deles era cheio de "aventuras" que viveram os dias comuns. Livro novo que comprou, situação engraçada que viu na rua, foto na sala de aula zoando o colega que esta a dormindo...

Prestei atenção às datas das fotos. Aqueles garotos já se conheciam há três anos. Ou, pelo menos, postavam fotos há três anos. Nas primeiras fotos o Dani estava com uma cara de bebê, pois estava apenas com quinze anos. O Vitor aparecia sem barba e, ao passar das fotos, a barba ia aparecendo. O Léo já havia usado uns duzentos cortes de cabelo diferentes nesse tempo e o Henrique já havia trocado a armação do óculos mais do que trocava de roupa.

Era muito bonito ver que eles quatro estavam juntos há bastante tempo. Não pareciam ser muito próximos de outras pessoas como eram próximos de si, mas isso não importava. Ao julgar pelas fotos dos quatro nos McDonalds, nas salas de cinema e nos shows, eles não precisavam de mais ninguém. Se fechavam naquela rodinha e o mundo era apenas mais um motivo de piada. Podiam descontar sua raiva, explorar seus medos, desabafar suas inseguranças, falar o que pensam sem serem julgados e rirem sem receio de serem feliz.

Também percebi isso pela maneira como falavam entre si. Era como se fossem irmãos e se conhecessem a vida toda. Não eram diferente dos garotos que eu havia visto na fila da Tetris. Todos tinham sua roda de amigos. Mas era diferente ver isso de perto.

Claro que eu ainda não os conhecia direito. Não fazia nem vinte e quatro horas que eu havia visto os quatro pela primeira vez. Mas através das fotos, das palavras, do modo que agiam, da forma como se preocuparam com o amigo desmaiado, da forma como se propuseram a ir na balada comigo... Isso mostrava que estavam felizes, seguros de si e que, por mais que coisas ruins acontecessem, ainda teriam um ao outro no final do dia.

Normalmente eu ficaria triste, recalcado e com inveja ao ver esse tipo de relação. Porém, pela primeira vez, senti algo completamente diferente. Eu estava feliz. Era um sentimento de gratidão, não sei explicar. Eu estava alegre por saber que os meninos tinham aquela relação tão forte entre si. Eles eram pessoas boas e não mereciam passar pela solidão e insegurança que passei na idade deles (digo isso dos mais novos agora e do Vitor quando era mais novo). Não mereciam e não passariam, já que tinham um ao outro.

Já eu, fiquei sozinho na adolescência, que é considerada um dos períodos mais difíceis da vida. Se isso fosse há alguns dias atrás, eu começaria a entrar numa crise de existência e chorar por não ter tido alguém quando era mais jovem. Mas agora eu via uma nova possibilidade.

A possibilidade de me tornar amigo daqueles garotos. Era a primeira vez que alguém se interessava por mim e se propunha a fazer algo por mim sem que isso lhes recompensasse, de alguma forma. Eu não tive pessoas assim antes, mas podia ter agora. Antes tarde do que nunca, não é?

E, se pensar bem, não era tão tarde. Eu tinha apenas vinte e cinco anos. Eu ainda tinha mais uns setenta anos de vida pela frente (espero, haha!). Havia chance de eu passar a maior parte da minha vida com amigos, sendo feliz, aceito a amado. Eu não estava velho para ser amigo deles. Não estava velho para ir em balada gay. Não estava velho pra namorar.

Não estava velho para ser feliz.

Ao longo da semana, fomos conversando. O Dani começou a participar mais do grupo nos dias seguintes e, aos poucos, percebi que ele era um dos que mais agitava a galera ali. Falava o tempo todo, fazia piadas o tempo todos, mandava fotos de homem pelado o tempo todo.

Eu podia usar o celular no trabalho, mas sempre que ele enviava uma foto eu ficava com medo de abrir e algum colega ali ver uma bunda peluda no meu celular!

Fui conversando com eles até que chegou o grande dia: quinta-feira.

O dia que eu iria numa balada gay pela primeira vez (dessa vez, sem choro e Celine Dion). Mas, mais importante que isso era que eu iria sair pela primeira vez com um pessoal que gostava de mim. Ainda não éramos AMIIIIIGOOOOOSSS, mas eu me sentia bem conversando com eles. Me sentia importante.

Me sentia inserido num grupo. Não só literalmente, como o grupo do whatsapp. Mas num grupo de pessoas que se importavam comigo e gostavam de mim. Do contrário, por que eles teriam me convidado para a Tétris e me adicionado no grupo?

Pela primeira vez, eu iria sair com um grupo. Não sozinho, como estava acostumado a fazer nas raras vezes em que eu saia. Eu estava muito ansioso. Aquela seria, sem dúvidas, uma das melhores noites da minha vida!!!


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Notas finais do capítulo

E ai, estão gostando?

Me digam!!!

Beijo!!!



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