Tetris escrita por Stefani Niemczyk


Capítulo 6
Pode ser?




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Fui seguindo as direções que o menino de roxo, ao meu lado, me indicava. Ele estava claramente bravo por ter sido contrariado.

– Ele vai devolver o dinheiro que eu gastei na entrada.

Disse um dos meninos que estavam no banco traseiro.

– Só ficamos uma hora!

– Eu não sei o que deu nele. - Disse o outro. - Ele sempre aguenta muito.

– Afe, eu falei, eu FALEI PRA ELE ir com calma! - Reclamou o loiro. - Puta que pariu, agora a gente vai ter que ficar cuidando dele a madrugada toda!

– Essa minha camisa é nova, me preparei toda pra brilhar na night. - Falou o japonês.

– Eu fiz a barba correndo, quase me cortei. - Falou o de verde.

– E eu?! - O de roxo disse. - Eu fiz a chuca. CHUCA!!!

Ele gritou pela indignação. Ficou um silêncio no carro.

– De.. Desculpa, moço. - O de verde falou, desculpando-se pelo linguajar do amigo.

Eu não sabia o que dizer.

– Ai, foi mal, mas eu me preparei pra trepar hoje e perdi minha chance por causa dele. - Disse o loiro, referindo-se ao desmaiado. - Você sabe que chuca não é algo legal de se fazer.

Silêncio novamente. Olhei para o lado e só então percebi que ele havia falado comigo.

– O quê? - Perguntei, sem pensar.

– Chuca! Ninguém merece! - Respondeu o garoto do meu lado, virando o rosto para a janela ao seu lado.

– Você fala como se não tivesse prática! - Comentou o de verde. Ele e o japonês começaram a rir.

– Mesmo assim, afe! - Reclamou o de roxo, novamente. - Vira ali naquela padaria. Ele está bem ai? - O loiro olhou para trás.

– Acho que sim... Não sei, não está acordado. - Disse o de azul.

– Você acha que ele vai vomitar de novo?

– Sei lá, ele bebeu demais. Acho que não ia vomitar só aquilo.

– QUÊ? - Perguntei, involuntariamente.

O garoto havia vomitado litros e litros na rua e ainda tinha mais?!

– Ele bebeu muito, acho que volta mais. - O japonês explicou.-

– E a gente passou no Habib's antes... O estômago estava cheio.

– Eca, parem de falar isso!!! - Ordenou o loiro. - Relaxa, moço, ele não vai vomitar no seu carro.

– Mas se vomitar, não tem o que fazer. - Disse o de verde, rindo.

– Gente, vamos mudar de assunto? - Sugeriu o de azul. - O moço deve estar com nojo de nós! Só falamos de vômito e chuca! Não quero nem saber o que vem depois!

– Ai, vômito é nojento, mas chuca é necessário! - Falou o de roxo.

Os três riram. O de roxo riu olhando para mim e, ao terminar a gargalhada, soltou um:

– Não é?

Olhei para o lado e ele estava falando comigo.

– É... Não... - Eu não tinha resposta.

– Não?! Não é necessário? - Ele perguntou, surpreso.

– Necessário? - Falei.

– É!

– O quê?

– A chuca!

– A chuca?

– É ué!

– É o quê?!

Eu já não estava entendendo nada.

– A chuca moço. É necessária. - Ele explicou. - Ou você não faz?

– Não... Não sei...

– Como não sabe? - Perguntou o de azul.

– Não sei o que é isso.

– NÃO SABE?! - O loiro surpreendeu-se, olhando para os amigos de trás. - Você é ativo?

– Mas mesmo assim ele saberia. - Explicou o de verde ao colega da frente.

O loiro virou-se para mim e correu o olhar sobre mim, de cima para baixo e, então para cima novamente.

– Moço... - Ele olhou com insegurança para os amigos. - Você é gay, não é?!

– E-Eu...

Engasguei. Aquela pergunta me pegou de surpresa. Como ele sabia que eu era gay? Eu não havia entrado na Tetris, poderia ser apenas um cara passando ali na rua. Eu também não estava com uma aparência que pudesse ser relacionada ao estereótipo de um homem gay.

– Eu sou... Sim... - Respondi, com vergonha por ter sido surpreendido.

– E não sabe o que é chuca? - O loiro questionou. - Você é gouine?

– O quê? - Perguntei.

– Ele também não sabe o que é gouine! - O japonês disse para si mesmo, como se estivesse espantado.

– Moço, você é hétero?

O de roxo perguntou, ironicamente, e os três riram.

– Gente, não zoa o cara, ele vai deixar a gente aqui na rua. - O de verde falou.

– Ah, é brincadeira. - O loiro disse. - Mas é sério? Você não sabe?

– Não... Não sei.

– Moço, como você vai numa balada gay e não sabe essas coisas? - Perguntou o de azul.

– Eu não fui numa balada gay. - Respondi.

– Ué, você não estava saindo da Tetris? - O loiro perguntou.

– Não.

– MANO, FOI MAL!!! - O loiro disse. - A gente estragou sua noite! - Ele virou para trás e explicou. - O cara estava chegando! Ele ainda ia entrar!

– Mas já estava fechado. - O de verde falou.

– Verdade. Mas você não estava indo nem saindo da Tetris? - O de roxo indagou.

– Não, eu não...

Me deu um aperto no coração. Lembrei da minha frustração por ter chegado até ali e não ter tido coragem de entrar porque tive uma crise existencial ao ver os meninos mais novos que eu na fila.

– Ufa, ainda bem! - Exclamou o loiro. - Se bem que você não parece o tipo de cara que gosta dos shows.

– Shows? - Perguntei.

– É, show das drags. Todo sábado tem. Você nunca veio aqui de sábado?

– Não, eu... Na verdade, eu nunca fui na Tetris.

Os três se espantaram:

– NUNCA? - Perguntou o garoto ao meu lado. - Você não curte balada?

– Não muito, na verdade... - Respondi.

– Ah, tá explicado, então, por que não sabe o que é chuca e gouine. - O de roxo falou.

– Mas, mesmo assim, suas amigas não falam disso? - O japonês perguntou.

– Minhas amigas...?

– É, mano, seus amigos gays. - O de verde foi direto. - Eles não fazem chuca, nenhum deles?

Eu tentei falar alguma coisa, mas pareci um gago morrendo afogado. Não soube o que responder. Eu não tinha amigos gays. Nem héteros. Nem de qualquer outro jeito.

– Você não tem amigos gays? - Perguntou o loiro.

– Não... Eu não conheço muitos...

– Então você é mais isoladão? - O de azul perguntou.

Sem que eu tivesse tempo de responder, o de roxo deduziu:

– Se não tem muitos amigos e vem sozinho pra balada... Moço, você é michê?!

– QUÊ? - Me espantei com a pergunta.

– Michê, oras. Vai dizer que não sabe o que é! - Ele respondeu.

– Sim, eu sei... Mas é que eu não sou! Nem venho nessa balada!

– Não vem?

Os três estranharam.

– Moço... Pode falar, nós aqui somos todos gays... - O loiro disse. - Você é assumido?

– Sim, eu sou... Tipo, não saio contando...

– Papai e mamãe sabem? - O de azul perguntou.

– Sabem. - Respondi.

– E os amigos?

– Também, ué. - SE EU TIVESSE ALGUM.

– E você nunca veio aqui?

– Não, nunca...

– Ué, por quê?! Nem pra conhecer? - O loiro perguntou. - Ou você só tem amigo hétero?

Eu travei pra responder, de novo. Não queria falar que não tinha amigo nenhum, mas também não queria mentir.

– Sim, são. - Menti. Não consegui evitar.

– Afe, coitado! - O de roxo disse. - Vem um dia aí! De quinta-feira é o melhor dia porque eles distribuem tinta neon e sempre tem três DJs.

Três? Um não bastava?! Tinta neon? Isso devia ficar visualmente FANTÁSTICO!!!

– Coitado, vai ficar perdido! - O japonês comentou.

– Não vai, não, a gente encontra ele. - O de verde sugeriu. - Pode ser?

Ele havia perguntado para mim?

Chegamos ao apartamento do loiro e parei o carro.

– É aqui. - O de roxo informou.

– Moço? - O de verde. - Pode ser?

– Pode... Não sei... - Eu estava inseguro.

– Já sei, é mais fácil assim: me passa seu número. - O loiro pediu para mim.

– 998764453.

– Beleza. - Ele anotou no celular. - Depois eu vou te colocar no grupo do whats. Quinta-feira a gente vem e você vem com a gente, beleza?

– Tá... - Falei meio tímido, mas não queria parecer tímido e repeti: - Tá!

– Valeu mesmo por trazer a gente!

– Vocês tem certeza de que ele vai ficar bem? - Perguntei enquanto os outros dois tiravam o de vermelho do carro.

– Vai sim, relaxa. - O loiro falou. - Ah, qual seu nome, pra eu salvar aqui?

– Rafael.

– Ok, o meu é Leonardo. Pronto! Até quinta! - Ele falou com um sorriso no rosto dantes de fechar a porta do carro.

Não havia ninguém na rua, então fiquei esperando os três entrarem no prédio para eu sair de lá, só por segurança.

Eu não sabia onde eu estava, exatamente, mas fui seguindo placas e logo consegui chegar em casa.

Me joguei na cama do jeito que havia chegado. Eu não estava com sono - afinal, já havia dormido no carro - mas estava sem saber o que pensar.

Involuntariamente, eu estava com um sorriso no rosto. Me senti um bobo, mas o sentimento de felicidade era maior.

Eles haviam me convidado. CONVIDADO pra ir com eles! Com grupo de whatsapp e tudo mais!

Eu não conhecia os garotos direito, mas o simples fato de tentarem me ajudar no meu "primeiro dia de balada gay" já valia muito. Se me perguntassem, eu diria que aqueles meninos jamais falariam comigo. Quando entraram no carro, achei que seria um percurso silencioso até o apartamento do loirinho. Quero dizer, do Leonardo.

A tela do meu celular acendeu e pude ler a mensagem:

987585742 adicionou você ao grup...

Sim, aquilo estava acontecendo mesmo. Eu não sabia de onde vinha minha alegria. Se era do fato de terem me convidado, do fato de quererem me ajudar ou do fato de que nada disso teria acontecido se eu não tivesse a iniciativa de ir até lá e, quando tive oportunidade, oferecer carona a eles.

Bem, a origem do sentimento não importava. O que eu sabia é que eu estava muito feliz e não queria que aquela sensação passasse. NUNCA MAIS!!!


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Notas finais do capítulo

E ai, fofos?

Digam o que estão achando e o que esperam da fic *u*

Beijinhos!



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