O Cárcere dos Cooper escrita por _TheDarkMoon


Capítulo 2
Parte Dois


Notas iniciais do capítulo

Não vou enrolar muito com esse conto, então em breve a terceira e última parte estará no ar. Espero que desfrutem da leitura.



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Caminhamos pela cidade enquanto eu tentava não parecer aborrecido por estar aborrecido por motivos excêntricos.

– Não fique tão bravo. Ela não é a última moça solteira do mundo. – Holmes parecia ter assumido minha posição em relação às piadas desnecessárias.

– Não estou interessado.

– Mas a rejeição sem motivo aparente lhe incomoda. – ele riu nasalmente e deu leves tapas em minhas costas. – É claro: ou vocês já se conheciam ou ela conhecia alguém.

Franzi as sobrancelhas, ainda mais irritado com o detetive e seus comentários desconexos.

Depois de entrarmos em uma dúzia de estabelecimentos em uma investigação que eu pouco entendia, seja por motivos de falta de percepção, omissão de informação por parte de meu companheiro ou distração.

Quando a tarde chegou e finalmente nos dirigimos, para nossa surpresa, ao chegarmos ao estabelecimento dos Cooper, Mary não estava lá. E sim um homem de cabelos claros, bigode e olhos escuros.

– Boa tarde. De que forma posso ajudá-los?

– Estamos procurando pela se... – comecei, mas Holmes adiantou-se.

– Por uma reforma em um sofá.

– Compreendo. – o homem saiu detrás do balcão e caminhou pela loja com seu terno elegante. – Qual é a data de sua fabricação? – perguntou enquanto destrancava inúmeros armários e gavetas em busca de tecidos, arquivos e fotografias.

– Início do século.

– Não será algo tão dispendioso então. O senhor pode analisar a tabela de orçamento de acordo com o serviço específico que preferir. – ele mostrou um livro de capa de um tom vermelho semelhante ao da saia de Mary.

Analisei a caligrafia fina e inclinada do livro e, pelo visto, Sherlock teve a mesma percepção.

– Imagino que tenha uma letra tão ilegível que teve que contratar uma pessoa para escrevê-lo... Espero que eu não o tenha ofendido. Isso é muito comum, senhor Cooper. O senhor é o dono da loja, não é? – Holmes atuava de forma despreocupada e com o tempo eu passara a compreender suas táticas.

– Sim. E minha letra é muito legível, só não quis passar tanto tempo realizando este trabalho.

– E quem contratou para fazê-lo? Interessa-me, é uma bela caligrafia.

– O senhor acha? Alguns clientes tem dificuldade de lê-la.

– É uma personalidade e tanto a dona desta letra, eu deduzo. – encostou-se ao balcão.

– Não tens ideia. Mary é uma moça um tanto difícil de lidar.

– Mary? É o nome da redatora?

– Oh, não. É apenas minha irmã mais nova.

– Compreendo. – interferi, finalmente. – De irmãos mais novos eu entendo e não é nada simples.

– É verdade. Estamos tendo bastantes conflitos ultimamente. Diz que se cansou de Londres, que não quer um noivo aqui. – balançou a cabeça negativamente. - Mas não pensem que ela é uma criatura impossível, pois não é. É dócil e muito amável, entretanto...

– À frente de seu tempo. – Sherlock disse e atraiu o olhar insatisfeito do homem. – A estrutura dos seus móveis é à frente do seu tempo. É algo de um valor que irá além.

– Grande visão. Agradeço-a inclusive. – sua expressão se suavizou em um sorriso orgulhoso. – Enfim, prossigamos com o negócio.

– Boa tarde. – uma figura esguia saiu do fundo da loja e dirigiu-se até a porta.

– Mary! – o dono da loja esbravejou.

– Já troquei as vestes assim como você mandou. Que mais quer de mim? Ah, compreendo... Esqueci as algemas no meu quarto. – a moça colocou as mãos na cintura.

Mary diferentemente de poucas horas atrás tinha os cabelos presos com alguns de seus cachos caindo de forma charmosa. Suas sobrancelhas franzidas de chateação e os lábios em leve bico. Estava arrumada em um vestido verde com as bordas de babados e estampado com pequenas flores cor de rosa. Assemelhava-se a uma boneca.

Perguntei-me se ao menos uma vez na vida, Holmes olhara para uma moça de forma a apreciá-la como eu o fazia.

– Esses serviços não lhe levarão a lugar nenhum a não ser o fundo do poço. – o homem socou o balcão.

– Proíbe-me demais. Mas isto eu não irei parar. É inofensivo. – ela bateu o pé e deu língua para o outro, sorrindo para mim e Holmes logo em seguida. – Você deveria ser como esses senhores, George.

– Mary, você tem poucos segundos para voltar para dentro, ou...

– Ou...? Vai me ameaçar em público? – seu sorriso voltou a brincar em sua feição. – Estes são os meus limites. – ela abriu a porta. – Olhe, acabaram de fugir. Melhor eu ir atrás e ajudá-los a se esconder.

George parecia rubro de fúria e por um instante preparei-me para impedi-lo de fazer qualquer atitude inaceitável. Entretanto, ele acalmou-se rapidamente e ajeitando sua gravata, disse:

– Cavalheiros, peço desculpas pela minha irmã e por ter de sair tão deselegantemente. Assim que possível realizarei o serviço a ser solicitado. Com licença.

E nos deixou sozinhos na loja. Holmes olhou-me e como em uma contagem conjunta, simultaneamente saímos atrás deles, buscando compreender a situação e ver até onde esta chegaria.

George Cooper perseguiu-a até um ponto com grande circulação, onde tivemos inclusive dificuldade de compreender a conversa. Ele segurou-a pelo pulso e apontou o indicador para seu rosto. Pude captar apenas alguns fragmentos onde ele lhe chamava de ingrata e indigna e a ameaçava de algo que não pude compreender. Os olhos da moça se encheram de lágrimas e por fim, ela acabou por acompanhá-lo.

– Vamos, Watson. Foi o bastante. – Holmes começou a caminhar no sentido oposto.

– Não captei nada, e, além disso, ele não parecia muito controlado.

– Teme que ele fique a sós com a moça? São irmãos, e ele é o responsável por ela. Não é da conta das pessoas se ele a corrige com pancadas ou não. – caminhou despreocupado.

– Costumava ser da sua conta. Da minha também. Não é adequado. – insisti.

– Não. Não é.

E sem demonstrar mais emoção subiu em uma carruagem e voltamos para Baker Street. Poucos minutos depois, entretanto, Holmes já saía novamente alegando que tinha um caso a solucionar.

Por fim, sem esperança de breve retorno, comecei a refletir o porquê de Holmes ter visto um caso naquela família e acabei adormecendo.

Quando despertei, Holmes não estava e Mrs. Hudson alegara que nem ao menos retornara para o apartamento. Fiz meu desjejum tranquilamente e assim que saí do 221B, um homem muito suado e ofegante pediu minha ajuda com uma paciente.Dirigimo-nos para o centro de Londres para que eu pudesse tratar da paciente. Felizmente, era apenas uma crise de tosses que consegui abrandar em pouco tempo, mas a paciente prolongara minha visita com uma conversa pouco útil. De qualquer forma, sentia-me satisfeito por ainda conseguir lidar com o meu ofício.

A consulta enfim terminou e dei-me conta que era quase o horário de nova refeição. Quando comecei a caminhar em direção à um restaurante, uma figura alta com cabelos desgrenhados, olheiras profundas, mas com olhos azuis muito vivos e ativos me parou.

– Venha, Watson. Temos que fechar um negócio. – Holmes puxou-me pela manga e arrastou-me pelas ruas.

– Espere. Você forjou aquela paciente para que eu estivesse em um lugar propício para que me encontrasse? – parei, incomodado pelo controle que ele insistia em impor sobre minha vida.

– Seu poder de dedução está cada dia melhor, Watson. – deu um breve sorriso.

– Isto é intrusivo!

– Você foi distraído e não foi algo tão ruim, imagino. – voltou a caminhar com as mãos nos bolsos e postura perfeita.

– Uma senhora falando sobre lavar e cozinhar batatas não foi exatamente o que considero divertido.

– Mas uma moça conhecida como Mary Cooper é. – ele abriu a porta da loja.

Ao ver-nos entrando, guardou rapidamente atrás da bancada alguns papéis, assim como o rapaz que escondera um envelope na parte de dentro de seu paletó.

– Espero que goste do serviço, senhor Sagan. – ela sorria lindamente, debruçando-se no balcão de madeira incrivelmente bem trabalhado.

– Nunca me decepcionaria. – ele recolocara o chapéu sob seus cabelos loiros. – Exceto quando me rejeitaste.

– Há males que vem para bem. – ela deu uma leve piscadela e os olhos claros do jovem se iluminaram.

– Até mais ver.

Cumprimentou-nos e saiu da loja. Mary pareceu surpresa ao nos ver, mesmo que já tivesse nos visto entrando na loja.

– Imagino que com o pequeno infortúnio de ontem não puderam terminar o pedido. – seu vestido floral e seus cabelos levemente presos, mas com os cachos caindo-lhe aos ombros tornavam-na ainda mais jovial.

– Sim. Aliás, possui uma bela letra, Mary. – Holmes pôs as mãos no balcão de forma imperativa, o que atraiu o olhar da moça. – Mary... Posso chamá-la assim?

– É meu nome, para isso o tenho. De qualquer maneira, como sabe de minha letra? – ela mexeu em um dos cachos de uma forma que misturava distração e desconforto.

– O livro de orçamentos. – o detetive ergueu uma sobrancelha, começando a se divertir.

– Por que me ignora? – as palavras saltaram de minha garganta e senti-me extremamente estúpido por interromper a investigação com algo tão fútil.

Mas para minha surpresa, meu companheiro não me repreendeu ou mudou de assunto. Mostrava esclarecimento em sua feição, como se soubesse todas as respostas e apenas quisesse ouvir a resposta de seus lábios.

– Não o faço. – ela respondeu, esforçando-se para me encarar.

– Faz sim, senhorita Cooper. – Holmes olhou-a profundamente nos olhos, em desafio. – Por que sentiria repúdio por alguém que nada lhe fez e que se assemelha tanto com seu irmão?

A pergunta em tom de afirmação surpreendeu não só a ela como também a mim. Não havia parado para refletir na semelhança. Talvez porque seja mais difícil ver as semelhanças de outros consigo mesmo ou porque eu estava incrivelmente distraído neste caso.

– Eu não havia reparado. Não havia feito tal comparação. – ela deu de ombros. – De qualquer forma, eu sinto muito se assim o fiz parecer, Doutor Watson. – seu corpo relaxou e pela primeira vez ela abriu seu sorriso estonteante para mim. – Espero que possa compensá-lo por minha indelicadeza.

– Não se incomode. Eu é que peço...

Antes que eu terminasse de me expressar, Holmes derrubara o tinteiro e algumas penas. A moça dera um breve grito assustado com a situação inesperada e retirou todos os papéis de cima do balcão.

– Perdoe-me! – Holmes adiantou-se para o outro lado do balcão e puxou um lenço de dentro do paletó, jogando por cima da superfície molhada com a tinta. – Deixe que eu conserte esta desordem!

Abaixou-se para recolher o que havia caído e reparei que ao fazê-lo os olhos da senhorita Cooper se arregalaram. Ela adiantou-se e puxou o detetive para que ficasse de pé novamente de forma ágil e um tanto cômica.

– Não, não. A responsável por consertos sou eu. – ela nos conduziu até um sofá e abaixada e apoiando na mesinha começou a escrever em uma folha. – Diga como vão querer para que eu mande uma carta para que os funcionários façam o serviço o mais rápido e satisfatoriamente possível.

– Por que não se senta ao nosso lado para escrevê-lo? Seu irmão não gostará de vê-la nesse estado. – Holmes ofereceu a mão para ajudá-la a levantar.

– Felizmente, ele não está aqui. – ela voltara a escrever, mas quando constatou que a mão do detetive continuava estendida para ela, aceitou a ajuda e ergueu-se.

Seus calçados cinza apareciam sob a barra rosa do vestido enquanto caminhava como ninfa. Seus olhos grandes e brilhantes refletiam um misto de emoções que eu não conseguia identificar.

– Espero que esteja se sentindo confortável. – havia uma tensão tão grande entre seus olhares, que eu começava a deduzir que os dois suspeitavam um do outro. Uma incerteza de questões de confiança. – Watson, por que não compra um selo para que a senhorita Cooper possa enviar a carta? – perguntou sem nem ao menos desviar os olhos da moça.

Sem questionar, dirigi-me para o correio, mesmo sabendo que ela poderia colocar o selo quando fosse enviar a carta. Demorei mais do que o tempo estipulado para tarefa tão simples, e três quartos de hora depois, retornando à loja, novamente, Holmes parou-me no caminho.

– Por que demorou tanto?

– Pensei que quisessem conversar. – cruzei os braços, começando a me aborrecer com a inconstância do detetive.

– Não precisava de quase uma hora pra me esclarecer sobre o que eu já sabia. Apenas alguns detalhes a mais, questões a compreender.

– E então? Satisfeito?

– Falta bem pouco.


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Notas finais do capítulo

Que acharam? ;)



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