Não Leia Essa História escrita por Just a Teller


Capítulo 20
Capítulo 20 - Espaço vazio




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Voltei para casa vestindo roupas de menina mais uma vez, minhas pernas doíam por usar uma calça tão apertada, consegui entrar sem ninguém me ver, tomei um banho e me arrumei para a aula, naquele dia Carol não foi, o que confesso, me irritou bastante, porque eu queria resolver aquela história que começamos na noite passada, embora mais estivesse mais tranquilo do que a noite quando estava na TPM, eu ainda estava muito puto com o que ela tinha me dito.

Dhébora foi a aula e passou ela quase toda dormindo, tadinha ficou a noite toda acordada, porque será né?

— Pessoal, hoje teremos um trabalho em dupla, analisaremos algumas personalidades da história, escolham as suas duplas e daqui a pouco eu vou passar o tema para cada um de vocês. — disse a professora de história uma velha que parecia que não fazia sexo fazia bastante tempo, algo como sua vida inteira, visto as roupas que usava e a sua cara sempre fechada.

Eu olhei para os lados, com a Carol não vindo a aula e eu brigado com ela, teria que fazer dupla com alguém diferente, de todas as opções que eu tinha, tenho certeza que vocês imaginam qual foi a escolhida, Dhébora, sim aquela mesmo que dhévora.

— Sem dupla né? — me aproximei dela perguntando.

— Não tenho muitos amigos nessa escola — me respondeu ela Dhébora em tom de suspiro.

— Quer fazer comigo?

— Não vai fazer com a Carol?

— Ela não veio hoje a aula e então, quer?

— Isso não é mais uma tentativa de me conquistar, né?

— É uma tentativa de não entrar em recuperação, Dhébora...

Ela me olhou desconfiada por um instante.

— Você é bonita, você é interessante, mas já está na hora de você entender que depois de um tempo a gente desencana e segue a vida… — Dhébora ficou surpresa ao me ouvir falando aquilo — eu não vou esperar você virar hétero para a gente ter alguma coisa.

Dhébora sorriu meio de canto, parece que ficou um pouco envergonhada.

— Gostei do que você disse, vou anotar no meu caderninho de frases para usar quando necessário.

Vou admitir para vocês, algo que eu acho que vocês já sabem, não era uma decisão tomada, não era algo que eu tinha certeza na minha cabeça, mas naquele momento que eu estava bem zen parecia algo totalmente certo: eu estava desistindo da Dhébora, ou melhor, o Henri estava desistindo da Dhébora, é difícil analisar isso principalmente pelos fatos que virão a seguir que talvez façam vocês confundirem tudo que eu estou falando, mas é exatamente por isso quero deixar claro, eu ainda estava confuso, quer dizer, eu queria muito ficar com a Dhébora e sim, eu posso admitir isso, eu estava apaixonado por ela, felizes? FELIZES?! Espero realmente que sim… mas entrava muitas coisas em questão disso além dessa paixão, uma coisa era eu ficar com ela, fazer sexo com ela e seguir minha vida, outra é se apaixonar e querer ter alguma coisa séria com a Dhébora.

Em primeiro lugar, não existia possibilidade de eu ter nada com ela, ela era lésbica e não importa o que eu fizesse, lésbicas são lésbicas, você pode encher uma pessoa de penas e a colocar em puleiro e nem por isso ela se tornará um periquito. Da mesma forma que se um gay tentasse me converter para a homossexualidade não conseguiria, eu não conseguiria tirar a Dhébora do mundo lésbico, isso não era uma escolha minha, era dela e eu tinha que aceitar isso.

“Mas você pode ficar com ela como Renata, Henrique deixa de ser orgulhoso!” Orgulho? Não, amigos, autopreservação. Em segundo lugar, eu não sei quanto tempo isso vai durar, pode ser que termine hoje, pode ser para sempre, sem contar que relacionamentos são sempre um problema, eu disse sempre.

Vou explicar uma coisa para vocês mulheres e peço que prestem bastante atenção no que eu vou dizer, sabe aquela história de que todo homem é um cafajeste? Bem, isso pode ser verdade e se realmente for, a culpa é muito de vocês. Entendam.

O garoto nasce e começa a se desenvolver sem entender nada sobre amor e mulheres, a única experiência que ele tem são os filmes, os malditos filmes sobre adolescentes e seus amores, nos quais garotos buscam sexo desenfreadamente, entram em várias enrascadas mas no fim aquela garota maravilhosa pela qual ele se apaixonou durante todo o filme termina com ele, isso é muito bonito de se ver na TV, mas o problema é que os jovens garotos crescem com essa ideia então eles pensam que não importa o quão retardado ou feio ele seja, aquela garota linda da escola vai se apaixonar por ele e no final tudo vai acabar bem, o que acontece é que os 15 garotos da sua sala de aula estão apaixonados pela mesma garota que você e no fim ela irá ficar com o garoto malhado que vai trata-la como um lixo e daí todos eles terão seus coraçõezinhos quebrados e isso acontecerá mais algumas vezes até eles entenderem que não adianta, enquanto eles buscarem essa garota perfeita da qual eles poderão passar o resto das suas vidas, eles irão se ferrar. É uma coisa difícil de se aprender, mas quando se aprende, meu amigo, sua vida é bem mais feliz. Eu aprendi.

Relacionamentos amorosos só te fodem, sempre alguém sai machucado no final, só existe uma exceção a essa regra que é a Carol e o namorado dela, eles são a luz no fim do túnel para mim, a minha esperança de que talvez exista a chance de você encontrar alguém que vá ficar com você para sempre, fico feliz que a Carol tenha achado já na primeira vez.

Por isso não quero relacionamentos, alguém sempre sai machucado, alguém sempre se fode e é por isso que os filmes sempre terminam nos começos de relacionamento, porque se eles fossem mais longe, se eles mostrassem cinco anos depois do fim do filme, você veria alguém na merda por causa do namoro e uma garota dando para mais uns quinze caras diferente, é assim que a vida real funciona. É como tem aquela frase, você não acha a sua metade da laranja porque ela está transando com a banana, com o abacate, com o tomate...

Não estou dizendo que não posso acabar ficando com a Dhébora como Renata, provavelmente isso acabaria acontecendo uma hora se continuássemos nos vendo frequentemente, eu tô dizendo que eu queria lutar contra isso, não por causa de orgulho ou qualquer besteira dessas mas porque provavelmente alguém se machucaria.

Fui racional demais para um episódio só? Talvez… mas enfim, como me extendi né? Eu só queria dizer que eu não me importava mais com como seria minha relação com a Dhébora enquanto Henri, preferia até ser amigo dela, ela era uma garota sensacional mas como Renata, eu estava dividido, eu a queria e queria muito, mas ao mesmo tempo sabia que ia acabar me ferrando pois depois da primeira vez que ficássemos juntas, eu não iria querer mais desgrudar dela, ainda mais na “TPM” que eu estava, como Henri eu estava bem de boa, mas quando eu virava Renata, parecia que eu transformava em um monstro maluco querendo sangue, mortes, atenção e carinhos. Me tornava uma daquelas mulheres malucas que eu tinha tanto medo…

A professora se aproximou de mim e da Dhébora para entregar o assunto que seria nosso trabalho.

— Vocês farão dupla?

— Sim, senhor. — respondeu Dhébora.

— Muito bem, o assunto do trabalho de vocês será a vida e morte de Joana D’Arc.

— Interessante — respondeu Dhébora.

— Com certeza… — disse eu imaginando quem era Joana Dark, com esse sobre nome parecia que era alguma cantora grunge dos anos oitenta que seguia o estilo Nirvana de ser, isso me fez até dar uma pequena risada mental.

— Conhece Joana D’Arc, Henri? — me perguntou Dhébora enquanto a professora ia entregar os assuntos dos trabalhos para outras duplas.

— Claro… como não conhecer? Ela foi muito importante… naquelas coisas lá que ela fez…

Dhébora riu.

— Nem imagina quem é, né?

— Eu tenho certeza que é uma mulher, serve?

— Olha, eu não vou fazer esse trabalho sozinha, você vai ter que fazer comigo, ouviu bem?

— Vish, já vi que vou me arrepender de não ter esperado a Carol…

— Nem vem…

— Ok, ok. Faremos juntos.

— Aliás, você conhece uma amiga da Carol, Renata?

— Hm, mais ou menos, conheço por cima, porque?

— Não, nada, não importa.

— Já tá caçando carne nova, Dhébora? — perguntei de forma sondatória, confesso que fiquei um pouco ansioso com a resposta que ela poderia dar.

— Deixa de ser bobo, Henri, não é nada… — ela ficou vermelha de uma forma que nunca tinha visto antes, foi divertido de ver.

— Você ainda tem meu endereço? — perguntou a Dhébora.

— Não — Claro que eu tinha, na verdade, já sabia de cor.

Dhébora escreveu em um pedaço de papel, rasgou com as mãos o pedaço da folha do seu caderno e me entregou

— Sexta de tarde, por volta das quinze, você aparece lá e vamos fazer esse trabalho.

A tarde passou e a noite chegou rapidamente com ela Renata também, como eu estava brigada com a Carol e por indecisão e TPM estava tentando evitar Dhébora, não tinha para onde ir, então apenas ficava andando por aí, acabei decidindo por ir no shopping e obviamente, eu tinha que encontrar gente lá, já estava com os nervos à flor da pele e quem encontrei primeiro foi Carol, ela estava sentada em uma mesa da praça de alimentação, estava sozinha misturando um milk shake de chocolate com o canudinho, parecia bastante concentrada nisso e em nada mais.

— Que bonito… faltando várias aulas hein? — disse me aproximando.

— Por favor, agora não… me deixa sozinha.

— Porque? Não quer ficar perto do seu amigo egocentrista e irritante que só sabe atrapalhar a sua vida?

— Henrique, por favor, agora não.

— Quando você me xingou sem parar você não se importou em saber se agora era uma hora boa pra isso.

Carol apenas ficou de cabeça baixa olhando para o milk shake.

— Não vai responder nada? — confesso que eu não queria uma solução para aquele meu desentendimento com Carol, eu apenas queria brigar, é comum isso na TPM, meninas?

Carol continuou em silêncio.

— Responde, Caroline! Ou eu estou sendo egocentrista de mais por pedir uma resposta?

— Me deixa sozinha, por favor.

— Você não disse que eu nunca estou aqui para você, agora eu estou! Vamos aproveite a companhia do seu amigo que não serve pra nada.

Carol ficou quieta ainda olhando para o milk shake.

— Responde — gritei eu dando um tapa no milk shake o fazendo voar no chão, todo mundo na volta olhou para a gente, Carol levantou o rosto e olhou para mim, estava chorando.

— Se lembra como você ficou quando você decidiu tentar esquecer a Anne — eu levantei o dedo como advertência — para, Henrique! Se lembra como você ficou?

— Porque estamos falando de mim? Vamos falar de você e esquecer o egocentrista aqui.

— Porque você se tornou tão sem coração? — disse ela chorando enquanto olhava para mim. Porque fica fingindo ser uma pessoa que não é? Uma coisa é você ser um idiota com as garotas que você pega e descarta no colégio, outra é você ser assim comigo… eu precisava de você agora, ou melhor, precisava do meu amigo de anos atrás agora, o que era meu amigo de verdade.

Me levantei, eu estava realmente muito irritada.

— Sem coração? Idiota? Quer saber o que aconteceu, Carol? Eu te digo, eu cresci, eu evolui, a vida não é esse playground que você pensa, nem todo mundo nasce com tudo que precisa para ser feliz como você, Caroline. Nem todo mundo nasce rico e não precisa se preocupar em como vai se sustentar no futuro, nem todo mundo tem facilidade em estudar e passar em todas as matérias, nem todo mundo tem alguém a anos ao seu lado e sabe que vai ter essa pessoa para sempre, por isso que é tão ridículo você vir falar da Anne, porque mostra que no final a egocentrista é você, pois você sabe que isso é uma merda para mim e está toda hora voltando nesse assunto, toda hora, você tem a porra da vida perfeita e vem querer ficar falando porcaria para mim!

— Meu namorado… — ela deu uma pequena pausa para uma risada — meu ex-namorado veio ao shopping hoje para terminar comigo… ele acabou de se mudar e quando nós finalmente poderíamos ficar juntos, ele acabou comigo… ele realmente acabou comigo…

Eu fiquei estático por um instante, Carol me olhou nos olhos, eu não sabia como reagir, não sabia o que falar e acabei tomando a decisão mais covarde que poderia tomar, virei as costas e fui embora, sem olhar para trás, sem pensar, apenas sai, fui embora e deixei Carol lá, eu não estava preparado para aquilo, me senti mal pra caralho por ter deixado a minha melhor amiga sozinha naquela situação, fiquei com dor de cabeça, não sei se pela situação ou pela TPM, estava segurando o choro enquanto saía do shopping, quando estava saindo vi a merda que fiz e voltei até a praça de alimentação, mas Carol não estava mais lá, achei que não seria uma boa ideia tentar falar com ela nesse momento, a chance que tive, eu perdi.

Então novamente, decidi sair do shopping, na saída para piorar toda a situação, encontrei Dhébora.

— Oi Re. Que saudade que eu tava de você… — disse ela me abraçando, não correspondi, apenas a deixei me abraçar.

— Eu vou indo, ok? — respondi rispidamente para ela enquanto começava a andar.

— Ei! — ela me segurou pelo braço — Tá tudo bem?

— Eu sou a pior pessoa do mundo e isso é incontestável, eu me tornei algo, eu criei algo que é uma bola de neve sem volta, um monstro, é isso que sou.

— Calma, vem cá… — disse Dhé vindo me abraçar, eu a parei no meio do caminho.

— Para, Dhébora. Você está apaixonada por mim, não está?

— Sim, estou.

— Então para. Essa coisa de se apaixonar não dá certo, ok? Eu quero ficar com você também, mas vai chegar uma hora que uma de nós duas vai se ferrar e sinceramente se for acontecer eu espero que seja você. Não existe se apaixonar e ser feliz, você sempre se fode e eu tô cansada de ver gente se fodendo por causa de amor, ainda mais por minha causa, então vamos parar por aqui, ok? Vamos deixar isso de lado. Vai ser melhor para nós duas…

— Espera. Só me diz uma coisa, eu to confundindo tudo? — me perguntou Dhébora.

— Como assim?

— Eu preciso saber se eu tô… se eu tô sozinha... quero saber se isso tudo é um delírio, uma ilusão, uma história que eu inventei na minha cabeça…

— Olha Dhébora...

— Espera, escuta, você sabe do que eu to falando…

A interrompi.

— Não quero que você se machuque, então é melhor você acreditar que sempre esteve sozinha e eu também.

Não esperei a resposta da Dhébora, fui embora novamente sem olhar para trás, coloquei meus fones e fui ouvindo Blank Space da Taylor Swift em modo repeat durante o resto da noite inteira.


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