Tríplice escrita por Catiele Oliveira


Capítulo 3
O camponês




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Capítulo 3

Agnes

À volta para casa fora animada, as mulheres compartilhavam sacolas e mostraram suas novas aquisições, praticamente eufóricas. Todas, menos Agnes, que deixava suas irmãs olharem livremente seus sapatos e o pequeno colar de esmeraldas, combinando com um anel. Mary automaticamente ficou de olho, porém gabou-se de suas safiras vermelhas, que combinariam com seu vestido. Agnes não ligou, não era invejosa. Nem vaidosa. Nem ligava pelo fato das irmãs terem mais sapatos, vestidos, bolsas, joias que ela. Na verdade, tudo que ela sonhara era fugir dali. Ir para uma vila onde ninguém a conhecesse.

Ela viu os homens na lavoura de trigo e ficou atenta aos rostos, procurando por alguém, mas não encontrou os cabelos dourados como os seus. Deixou-se vencida então, recostando-se no acolchoado da carruagem. Quando os cavalos pararam e o cocheiro a ajudaram descer, ela ainda olhou em volta, esperançosa. Mas fingiu apenas fitar o horizonte quando Mary questionou o motivo de sua distração.

— Venha logo, hoje é o seu dia de me ajudar com a mesa — Ela bufou, porém obedeceu à madrasta.

Era por volta do horário de almoço. Todas entraram em casa eufórica, as meninas gritavam pelo pai, não apareceu ninguém. Mary jogou-se em uma poltrona, tirando os sapatos que apertavam seus pés. Outras subiam as escadas, Agnes apenas deu sua bolsa para Anna, que subia animadamente, falando com Natalie sobre Dolores.

Agnes caminhou para a cozinha, sentindo o cheiro inebriante de legumes sendo cozido, cordeiro assando e batatas grelhadas. Algumas das empregadas preparam algum tipo de salada, quando a cumprimentara com sorrisos. Agnes acionou a alavanca para ter um pouco de água no lavatório da cozinha, e lavou suas mãos, em seguida a levou para o rosto, se refrescando.

— Está muito quente hoje — Disse como quem não queria nada para uma das cozinheiras — Você viu meu pai, Joanne?

— Não, menina. Ele saiu depois de você e disse para não espera-lo para o almoço — Ela assentiu, observando a mulher a mexer os vegetais — Como estava Londres?

— Cheia como sempre — Disse — E... Tobias?

A velha senhora encarou Agnes, ponderando o olhar para as duas ajudantes na cozinha. As duas compartilhavam um segredo, a mulher experiente não gostava disso, mas Agnes a fez jurar com seu próprio sangue que jamais abriria a boca contra ela.

— No celeiro. Por que, pretende montar hoje? — O olhar da mulher era inquisidor. Agnes assentiu.

— Eu pretendo — Concordou.

— Certo... E aquele rapaz, o de ontem? Natalie está noiva? — Essa pergunta fora feita em voz baixa, Agnes pensou antes de responder. Se não confiasse em Joanne, jamais teria assuntos tão pessoais com a empregada.

— Praticamente. Mas acredito que o pedido oficial virá no baile real. Por enquanto, ele está apenas cortejando-a.

Como, Agnes ainda não sabia. Imaginava que só veria duque Howard novamente no dia do baile, um homem não se deslocaria de tão longe só para agradar uma mulher. Principalmente homens ocupados como ele, que Agnes acreditava que nem tinha um coração. Deveria ser como os reis, já que trabalhava tão perto. Tinha pena da irmã. Mas mais pena tinha de si mesma.

Ela sorriu para Joanne antes de deixar a cozinha pela porta dos fundos. Ela olhou para os lados a procura de alguém, quando não encontrou, correu para os fundos, para uma das entradas laterais do celeiro. Ali estava a sua sorte, ali estava o segredo da sua vida. Compartilhado com duas pessoas. Não sabia ao certo o que aconteceria se fosse descoberta, provavelmente estaria morta e condenada. A decepção do pai. A tristeza das irmãs. O deboche da madrasta... Mas nada daquilo lhe fazia retroceder. Era ali que seu coração estava. Por mais difícil que fosse mentir para as irmãs, sabia que se fosse entre Anna e Natalie, ambas saberiam isso, eram mais amigas e unidas, Agnes sempre se sentia um pouco de lado. Talvez por ser diferente das duas. Mas, ainda assim, não justificava o motivo do segredo. Talvez fosse só medo.

Seu coração disparou quando ela virou para a cela das vacas. Os cabelos dourados caído até o ombro foi à primeira coisa que viu. Deixou que seu sorriso crescesse. Ela o amava. Aquilo era amor. Não conseguia pensar em um só momento que seu coração não esteve batendo tão forte quanto agora. Tobias era o homem com quem ela queria se casar, não qualquer nobre que o pai a obrigasse. Era ele que ela amava. Mas aquele amor era proibido. E perigoso.

— Você! — Ele exclamou assim que a viu chegar, sorrindo largamente. Parando de adornar a vaca e se levantando, correndo para ela e a rodando em seus braços. Beijando-a com força — Eu senti sua falta. Foi à cidade?

Agnes assentiu, beijando-o novamente. Ela também havia sentido a falta dele. Fazia quase dois dias que não o vira e estava quase em desespero.

— Por que não veio ontem? — Ela questionou. Tobias beijou seu nariz a colocando no chão.

— Minha irmã está doente... — Ele disse — Eu sinto muito, querida...

— Tudo bem. Ela está melhor agora? — Estava verdadeiramente preocupada, Tobias assentiu, sorrindo para tranquiliza-la.

— Eu fiquei sabendo sobre o duque... — Todos já sabiam? Ela perguntou a si mesma, vendo como os boatos corriam rápidos.

— Natalie vai casar — Tobias virou-se de costas para Agnes, que tocou as costas largas do rapaz, que continha um choro — Eu sei. Eu sei — Ela murmurou para ele — Mary tem feito o inferno na cabeça do meu pai. Logo ele obrigará a mim. Eu sou a filha do meio.

Sim. Depois que Natalie estivesse casada, logo seria a vez de Agnes, só assim Anna poderia se casar. Mas Tobias não concordava com isso. Ele se virou para Agnes novamente, e segurou seus olhos, com os olhos marejados.

— Nós precisamos fazer algo — Ele grunhiu com a voz embargada — Eu não posso perder você. Eu te amo, Agnes! — Exclamou.

Eles se abraçaram e Agnes chorou tentando encontrar alguma solução.

— Meu pai nunca aceitaria... — Soluçou ela — Ele seria capaz de me mandar para um convento.

— Eu roubaria você de lá... — Eles riram com o pensamento longínquo. Agnes o soltou, acariciando o rosto do homem que amava.

— Eu amo você — Ela disse — Mais que tudo.

— Então vamos fugir — O silêncio imperou sobre eles. Agnes piscou três vezes, tentando imaginar-se fugindo. O pai gastaria todo o dinheiro do mundo atrás dela, e quando a achasse, mataria. E o mataria também. Mas a ideia de fugir e viver com Tobias era muito tentadora.

— Você está se esquecendo da sua família...

Ele abaixou a cabeça. Ela aceitaria qualquer proposta, mas ele nunca poderia propor. Tobias era o quinto filho de seis. Com o pai morto, coube a ele como o homem mais velho, ajudar a prover o alimento da família. Ele não podia fugir deixando a mãe já com idade avançada, e as irmãs, por conta própria. Sabendo que elas não conseguiriam sobreviver só. E logo seriam vendidas para o reino, escravas sexuais do rei.

Fugir não era uma hipótese cogitada. E Agnes não sabia o que podia ser então. Voltou a abraçar Tobias, e tentar não imaginar um mundo onde tivesse que viver sem ele. Não poderia. Não queria. Não seria capaz. Talvez até tentasse ceifar a própria vida. Só de fechar os olhos e imaginar deitando-se com outro homem lhe dava dores fortes de cabeça.

No almoço, ela permaneceu em silêncio. As irmãs ainda estavam eufóricas com o vestido e as joias, até incluíam Mary em seus assuntos, enquanto ela revirava sua comida no prato, sem nenhum apetite. Seria até um pecado desperdiçar comida do modo que estava fazendo, com tantas pessoas famintas no condado. Isso lhe lembrava de novamente Tobias, e das vezes em que ela deixava de comer, para dar sua refeição a ele. Depois de ter sigo pega no flagra por Joanne, dando comida e alguns beijos em Tobias, ficou mais fácil. A cozinheira ao invés de jogar as sobras no lixo, as separava para o rapaz.

— Pensando em que, Agnes? — Mary a questionou, quando supervisionavam as cozinheiras retiraram uma mancha de vinho na nova toalha de mesa que Anna bordou — Está calada. Não começou a me atormentar com o piano. Devo supor que está adoecendo?

— Não precisa ficar preocupada, madrasta. Estou ótima — Respondeu insegura, tentando disfarçar — Foi só o calor da cidade.

— Quando eu vivia na cidade, aquele calor não incomodava. Mas depois dessa vida no campo, não aguento mais de três horas seguidas naquele lugar — Comentou Mary, mas consigo mesma do que com Agnes.

— Então não sente falta da vida aristocrata?

Mary riu de Agnes, limitou-se a responder. Jamais daria aquele gosto para Agnes, à verdade era que ela não suportava a vida no campo. Mas ficaria ali, porque todos os vestidos valiam a pena. E porque na cidade, bom, ela não teria tido um casamento vantajoso assim. De acordo com sua fama de mulher fácil e sem honra. Agnes franziu o cenho de nojo, mediu a madrasta e não se despediu quando deixou a sala de jantar.


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