Desconexão escrita por Jafs


Capítulo 22
Epílogo




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Não. Não combinava.

Um túnel escuro e úmido, parcamente iluminado por lâmpadas fluorescentes. As paredes cinza de concreto estavam acompanhadas de longos tubos de metal. O ar era pesado, quase sufocante.

Não combinava. Não com o visual daquela garota mágica.

Um vestido branco com detalhes azuis, aonde sua grande saia ia até os pés, à moda vitoriana. Seguindo o mesmo estilo de cor, ela usava uma mitra, que repousava sobre seu longo cabelo cor palha. Assim como a sua gema da alma circular prateada em sua gola, seus olhos verde oliva brilhavam, confusos.

Não combinava. Ela sabia disso, mas havia uma dúvida mais pertinente.

Como cheguei aqui?

Oriko Mikuni vasculhou sua memória recente, mas sem encontrar respostas. Para piorar, não havia nenhuma saída aparente, nem sequer um indício de um acesso para o ar livre.

Esse lugar parece subterrâneo.

Não vendo opção, ela decidiu explorar o lugar, seguindo os tubos metálicos.

[Alguém?]

Suas chamadas telepáticas não obtiveram retorno. Se ela estava com as roupas de garota mágica, podia ser uma situação de combate, sua família podia estar correndo perigo. No entanto, ela não conseguia sentir a presença de magia ou de miasma.

Oriko continuou pelo túnel até o seu fim. Contudo, ela não esperava o que encontraria a seguir.

Havia chegado em uma gigantesca galeria. O teto era tão alto que a luz das lâmpadas nas paredes não chegava até lá. Em termos de metros quadrados, Oriko não tinha nenhuma idéia, apenas podia imaginar por qual motivo havia aquele espaço.

Em uma das paredes da galeria estava escrito em letras garrafais, com tinta branca:

MITAKIHARA 02

“Então eu ainda estou na cidade.” Oriko falou consigo mesma.

Nisso, um movimento chama sua atenção. Uma pequena criatura branca passou correndo por ela.

Oriko reconheceu a criatura imediatamente. “Kyuubey!”

Mesmo estando próxima da garota, Kyuubey ignorou completamente o chamado, como se ela não estivesse ali.

Então Oriko sorriu, agora ela sabia o que estava acontecendo.

Menos apreensiva, ela procurou seguir Kyuubey, que estava entrando em outro túnel que havia na galeria.

Não tardou muito para encontrar a desembocadura daquele túnel. Assim como anterior, esse também terminava em uma galeria, mas nessa havia algo a mais...

Oriko ficou boquiaberta.

No centro da galeria havia um grande prisma flutuante em rotação, de cor âmbar e transparente. Dentro dele podia se ver uma garota em pé, que parecia estar dormindo ou inconsciente.

A garota tinha cabelos muito compridos, suas mechas se acomodavam como podiam dentro do prisma. Era difícil discernir as cores, devido a cor do prisma, mas Oriko tinha certeza que os laços que prendiam o cabelo e o vestido eram brancos assim como o dela. Porém o vestido era mais revelador, especialmente nas pernas, onde se podia ver asas nos sapatos.

Ao ver as cinco gemas no peito, Oriko não tinha dúvidas de que se tratava de uma garota mágica.

Existia um prisma bem menor, também de cor âmbar, que orbitava o maior. Parecia ter algo dentro dele, mas Oriko não sabia dizer o que naquela distância que estava.

Acima do grande prisma tinha um globo negro de tamanho similar, que também estava flutuando ou podia estar pendurado pelo teto. De seu topo saíam ramificações metálicas.

Essas ramificações iam se dividindo ao longo do seu trajeto, até o seu destino, o qual deixara Oriko estarrecida.

Dezenas de milhares, talvez centenas, de Kyuubeys estavam recebendo as ramificações em seus orifícios abertos nas costas. Boa parte estava no chão e aquele ‘tapete branco’ se estendia e subia pela parede da galeria.

Os que não estavam conectados ao globo negro, perambulavam próximo ao prisma. Na verdade, naquela hora eles estavam se aglomerando.

Parecem agitados.

Oriko sabia que os Incubators são criaturas que não expressam emoções, porém o comportamento deles em grupo trazia indícios que corroboravam com a sua observação.

Então o prisma menor, que orbitava, começou a brilhar intensamente. Sua cor âmbar ganhou um tom violeta. No entanto, logo o brilho esmaeceu e o prisma ficara negro.

Por fim ele se quebrou.

O que saiu de dentro assustou Oriko. Uma massa disforme negra com tentáculos, que logo ganhou tamanho.

Os Kyuubeys que estavam pertos se dispersaram, mas alguns se tornaram vítimas das poderosas chicoteadas daquela criatura negra. Seus corpos se despedaçaram em uma nuvem de carne moída.

Aquele ser de tentáculos, que continuava a crescer, não aparentava interesse em perseguir os Kyuubeys. Ao invés disso, foi até o prisma onde estava a garota. Seus tentáculos abraçaram o prisma.

Oriko considerou que a criatura estava aplicando uma constrição e suas intenções eram de quebrar o prisma.

Porém o monstro começou a perder parte da sua massa, que estava evaporando na forma de uma essência escura e sendo absorvida por aquele globo negro.

Seria essa uma criatura composta por aflição? Oriko não pôde deixar de notar as semelhanças daquilo com um processo de purificação de uma gema da alma.

Apesar da perda da massa, a criatura voltara a crescer, alimentada pela mesma essência negra, que saía do prisma quebrado. O volume era cada vez maior.

Logo, mesmo tendo uma parte absorvida pelo globo negro, a criatura havia triplicado as suas dimensões. Vários de seus tentáculos agora chicoteavam em todas as direções.

“Ah!” Oriko reagiu diante de um tentáculo que chegou até ela, mas ele a atravessou sem feri-la.

Esqueci que eu não estou aqui.

Outros tentáculos começaram a destruir as ramificações e estraçalhar os Kyuubeys. Muitos deles começaram a fugir.

A criatura negra se espalhava pela galeria. Seus tentáculos abraçavam o prisma onde estava garota com firmeza, o esmagando e rachando.

Isso não é nada bom.

O prisma então quebrou em vários pedaços e a criatura envelopou a garota. Rapidamente o monstro começou a perder volume enquanto entrava dentro dela, até desaparecer completamente.

Apenas a garota restava, caída de joelhos e agonizando no chão da galeria. Agora Oriko sabia que ela tinha cabelos rosa, suas cinco gemas na altura do peito estavam escuras.

Mas não era só as gemas que estavam negras.

Quando a garota abriu os olhos, eles estavam completamente pretos, não era possível discernir a íris da esclera. Em sua feição contorcida e tremida, ela falou. “P-Por quê? P-Por que eu... falhei? Não era... para acontecer assim!”

O coração de Oriko apertou com aquela angústia que estava testemunhando.

A garota ergueu seus braços para o alto, como se ali estivesse algo para ela agarrar. “Todos... desculpem... eu... não consegui salvar... IIIIEEEEEEEAAAARRRRRGGGHHHHHH!” Um grito inumano saiu de sua boca enquanto seu corpo começou a inchar, se deformando e ganhando um aspecto escuro como a criatura que a possuiu.

Aquilo deixou Oriko horrorizada, aquela era uma visão horrível, mesmo para alguém que caçava demônios.

A massa disforme negra tomou conta da galeria, alcançando Oriko. Então a garota mágica se viu em outro lugar, estava em meio ao brilho do cosmos.

No entanto ele estava se apagando.

Oriko viu cada galáxia, cada nebulosa, cada estrela, desaparecer, deixando para trás apenas um fundo escuro e sem vida.

Não! Não pode ser!

Ela tentou gritar essas palavras, mas nenhum som saiu, pois não havia ar, não existia mais isso. Ela tentou piscar os olhos, com o intuito de enxergar uma luz, por menor que fosse, mas ela não sentiu suas pálpebras, não existia mais isso. Ela se abraçou, querendo sentir o calor.

Mas não existia mais Oriko.

Até o conceito de existir estava difícil de compreender, seus pensamentos eram apenas fragmentos. Sua consciência estava desaparecendo, apenas o sentimento de estar condenada a fazer parte do vazio que permanecia.

...Amor...

Outro fragmento, uma voz que parecia ter ressoado dentro de sua mente.

“Amor!”

Estava mais alto, mais claro, até parecia estar ouvindo.

AMORZÃO!

Em uma longa arfada, Oriko se levantou da sua cama. Estava suando frio e tremendo. Seus músculos reclamavam da fadiga.

Ao lado dela estava uma garota usando uma camisola preta, de cabelos roxos curtos e um olhar que parecia gemas de citrino, que dormia junto a ela na cama de casal. Ela expressava preocupação. “Meu amor! Você estava se debatendo toda e começou a gritar. Está tudo bem?”

Oriko respirava fundo, ela viu que não estava mais com as vestes de garota mágica e sim com a sua camisola branca. “Ah... Está tudo bem, Kirika.”

Nisso, as duas ouvem passos de alguém correndo pelo corredor, indo em direção a porta do quarto escuro onde elas estavam.

Quando a porta abriu-se parcialmente, a luz do corredor iluminou o ambiente. Na abertura, apareceu um par de olhos azuis vivos e curiosos, pertencentes a uma pequena e meiga menina de cabelos verdes curtos. Ela não tardou em falar. “Eu ouvi a mama gritar.”

“Yuma, desculpe assustá-la. Foi só um sonho ruim.” Oriko sorriu para Yuma.

“É amorzinho.” Kirika apontou para si mesma. “Papa vai cuidar bem dela. Pode voltar a dormir.”

“Hmmm... Tá bom.” Yuma sorriu. “Vou desejar para mama que ela tenha um bom sonho.”

“Obrigada.” Agradeceu Oriko.

A porta se fechou.

Kirika passava a mão no braço nu da Oriko. “Não foi um sonho ruim, não é?”

Em resposta, Oriko ergueu sua mão esquerda. Logo sua gema da alma prateada apareceu, repousando sobre a palma da mão. O brilho claro iluminava o quarto, revelando o papel de parede rasgado e deteriorado pelo mofo.

Apesar do brilho, era possível enxergar uma nuvem escura flutuando dentro da gema. “Não foi.”

“O que você viu, amor?” Kirika estava curiosa.

“O fim.” Respondeu Oriko.

“Do quê?”

“De tudo.”


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Notas finais do capítulo

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