Tudo que ele não tem escrita por , Lis


Capítulo 23
Vinte e um - Anna


Notas iniciais do capítulo

Hey! ♥
Eu posso encher isso aqui de perdões, mas só vim aqui postar e dar um abraço virtual em cada um de vocês, viu?
E pra todos que fizeram ENEM (ou qualquer outro vestibular de final de ano), independente do resultado, estou MUITO orgulhosa de vocês, certo? ♥ orgulhem-se dos seus resultados, eu sei que você deu duro pra chegar até ali. E como diria Chico Buarque, amanhã há de ser outro dia, não é mesmo?
A vida é uma loucura, tem bloqueio pra lá e estudos pra cá, mas a gente segue tentando terminar isso aqui JUNTOS.
Boa leitura, gente! ♥



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T E N S Ã O

(s.f. condição do que está prestes a arrebentar)

 

Alguma coisa está errada.

Soube disso assim que eu entrei no colégio naquela segunda-feira. O silêncio pacato e a ausência de gente nos corredores, os quais geralmente ficavam lotados de alunos, denunciavam a estranheza da situação. Além disso, as poucas pessoas que eu vi murmuravam entre si, apontando para o caminho que levava ao pátio externo.

Eu realmente estava confiante de que essa semana traria coisas melhores. Que ilusão, Anna! Meus pensamentos se voltam para o dia anterior e a surpresa de Matheus em me levar para a praia. Ele sabia que seria um inferno quando a segunda chegasse, então nos deu um momento de paz e despedida antes que a coisa toda realmente começasse.

Pelo horário, provavelmente Theo já fora notificado da denúncia. Então a tal batalha finalmente começouÓtimo!

— Ei - chamo uma das garotas do primeiro ano que passa por mim - O que está acontecendo?

A menina se vira, o corte curto de seu cabelo ruivo acompanhando o movimento do pescoço. Noto seus olhos arregalados e as bochechas rubras.

— Está tendo briga - responde, antes de correr em direção ao pátio.

No mesmo instante penso em Matheus e sua raiva por Theo. Eu sabia que ele estava revoltado desde a morte de Helena, guardando um provável soco para o babaca assim que ele chegasse de viagem. Balanço a cabeça, sem acreditar que Matheus se levaria por essa estupidez e corro acompanhando a garota ruiva pelo corredor.

Gritos. Palmas. Sussurros de conversas entrecortadas.

Ouço tudo isso antes de adentrar o espaço grande do pátio, onde a grama e as plantas davam um ar bucólico ao local que muitos gostavam de chamar de cantinho da paz estudantil. Uma ironia considerando o estado de guerra que se encontrava ali. Estava lotado: garotos e garotas do ensino médio inteiro resolveram circular o que estava acontecendo no centro do pátio.

Empurro pessoas, xingo algumas e passo por debaixo de braços até encontrar um ponto de visibilidade. O cabelo castanho e os olhos escuros de Theo são as primeiras coisas que vejo. Merda. Outros dois caras estão ao seu lado, provavelmente complementando a sua trupe.

Tento ver quem está do outro lado, mas sou empurrada pro lado e alguém me segura  antes que eu possa socar quem me empurrou. Viro-me para ver de quem é a mão em meu cotovelo e um par de olhos verdes me fitam com repreensão.

— Não precisamos de uma segunda luta, Anna. - Matheus fala e circunda meus ombros com o braço, puxando-me para sua proteção.

— Pensei que você estivesse lá - falo, um pouco culpada por isso e noto seu erguer de sobrancelhas quando ele empurra mais duas pessoas pro canto e tenta nos arrastar pra mais perto do centro.

— Eu realmente preferiria já estar lá - responde - Só soube da luta agora, acabei de chegar.

Franzo a testa para sua resposta e observo o oponente de Theo cair no chão com um baque. O corpo musculoso do maior atleta da equipe de futebol masculina: GustavoMeus olhos se arregalam para o sangue que Gus cospe no chão antes de se levantar novamente. Alguns caras do time de futebol lutam ao seu lado, mas claramente eles não eram os vencedores ali.

Mas o quê...?

Quando ficamos ainda mais próximos do centro da luta e consigo ver claramente uns seis corpos socando um ao outro, Matheus me faz parar apertando meu ombro e me virando pra si. Noto a raiva emanando dos olhos verdes, mesmo ele tentando se conter.

— Eu vou entrar - ele avisa, olhando rapidamente pra Gustavo e voltando o olhar de volta pra mim - Isso já durou tempo demais, então logo o diretor vai aparecer. Porém, por precaução, tenta ligar pra Leah, ela é a melhor em acalmar o Gus quando ele fica assim.

Balanço a cabeça levemente, não querendo que ele entre naquela chuva de socos, mas Matheus apenas coloca o celular nas minhas mãos e eu o seguro pelo braço antes que ele se afaste.

— Não faça nenhuma merda - falo com seriedade e ele sorri rapidamente pra mim.

— Não precisa ficar preocupada, Branca. Eu vou voltar pra você.

Idiota.

A palavra paira em meus pensamentos, mas eu apenas vejo ele se distanciar de mim e olhar com ferocidade para o murro que Theo acerta em Gustavo. Com a aproximação consigo pegar uma parte da conversa:

— Gustavo, Gustavo... Sabemos que você vai perder essa. Você não merece ficar recebendo soco por causa de uma puta do Matt. - Theo fala, rindo ao balançar o punho que usou pra bater em Gus - Você sabe que a vadia não vai ficar com você no final.

Ergo as sobrancelhas para o teor da conversa e Gustavo se levanta novamente, o rosto enraivecido completamente vermelho. Eu, que só tinha conhecido o garoto certinho, apaixonado pela prima do amigo e fã de Sherlock, me surpreendo com a sua mudança. Ele não iria parar tão cedo.

— Ficou putinho? - Theo provoca, preparando-se pra acertá-lo mais uma vez - Ah, não. É uma boa estratégia, você até pode pedir pra ela beijar seus machucados, sabe? Talv...

Suas próximas palavras são interrompidas pelo punho de Matheus em seu rosto. No mesmo momento, Theo xinga e se afasta com a mão no nariz que sangra, provavelmente quebrado. A expressão de brincadeira em seu rosto se perdeu para dar lugar a fúria repentina quando Matheus se coloca na frente de Gustavo.

— Era só quem faltava - o escroto fala com desdém - De novo tentando dar um de herói por seus amiguinhos, Matt? Superman está ultrapassado— Theo me vê na multidão e ri ironicamente - E essa Lois Lane não vale nada.

O próximo golpe vem exatamente quando Theo esperava e o garoto apenas desvia do murro de Matheus, moldando o próprio punho pra acertar na barriga do meu parceiro de dança. Vejo Matheus arfar e Theo se desviar de novo quando Gus tenta acertá-lo, derrubando Gustavo e continuando a esmurrá-lo no chão.

Matheus entra em cena, pegando Theo por trás e voltando a utilizar os punhos. Mas Theo é bom. Muito bom.

— Eu posso ficar fazendo isso o resto do dia - ele fala, o sorriso mostrando os dentes vermelhos de sangue - Mas como eu já falei, essa luta não vale tudo isso. Vocês têm que aprender a não comprar briga por boceta, meus amigos. Existem muitas por aí, mais de uma pra qualquer um.

Como é que é?

Desbloqueio a tela do celular de Matheus e procuro o nome de Leah entre os contatos.

— Filho da puta! - Gustavo urra de novo antes de entrar na briga novamente e tentar socar Theo. Observo Matheus, que antes estava tentando conter um a fúria de Gus e agora está totalmente envolvido na briga, ainda mais quando Gustavo complementa a fala: - Ele estava falando de Leah, Matt.

Droga.

Encontro o nome da prima de Matheus e coloco o número pra chamar. No terceiro toque, a voz feminina reconhecível fala:

— O que houve, Matt?

— É a Anna - respondo, acompanhando com o olhar os corpos que travavam uma verdadeira guerra - Tem como você passar aqui no colégio, Leah?

Mais garotos entram na luta e eu ouço gritos enquanto me afasto o suficiente para conseguir ouvir Leah direito.

— O que o Matt fez dessa vez, Clara?

Quase sorrio porque, na realidade, ele não foi o que entrou na confusão dessa vez. Não no começo, pelo menos.

— Na verdade, estou te chamando mais pelo Gustavo - falo, ouvindo o murmurinho e o começo do dispersar dos alunos. Provavelmente o diretor estava vindo - Está tendo uma luta aqui no pátio contra o Theo. Gus e Matheus estão nela.

Ouço um xingamento baixo em italiano.

— Chego em dez minutos - ela conclui e desliga a ligação.

Menos de dez minutos depois, Leandra chega em toda a sua glória: cabelos de um loiro queimado amarrados em um coque alto, olhos demonstrando irritação e a expressão raivosa parecida com a de Matheus (era de família afinal). O batom vermelho desenhado em seus lábios, que se destacava com seu traje preto, fazia ela parecer a cavalaria de um combate. Observa todos os garotos praticamente matando um ao outro no chão e faz uma careta.

— Há quanto tempo eles estão assim?

— Já faz um tempinho - respondo, dando de ombros - A câmera deve estar quebrada porque o diretor ainda não chegou.

Na verdade, outros zeladores da escola também estavam tentando conter a luta, porém era difícil entrar no meio daquele caos sem ser sugado pela chuva de socos junto. Cruzo os braços e olho Matheus dar outro murro em Theo. O caos era tão grande que todos ali estavam batendo no rosto mais próximo.

— Pois é. Leah, por que meninos são tão babacas?

— Também queria saber, minha amiga. - sorri e assente uma vez - Vamos acabar com isso porque já está ficando chato.

Ergo as sobrancelhas, notando seu repuxar de lábios em aborrecimento.

— Você sabe o motivo da briga. - afirmo.

Ela cora um pouco e sorri.

— Theo Gonzalez é um filho da puta. É tudo idiotice e eu não ligo já que eu sei que realmente não aconteceu, mas aqueles meninos ali? Matheus pode ser tudo, mas ainda é um cara ciumento e não suporta quando mexem com algo relacionado a ele, principalmente as mulheres de sua vida. Eu, tia Luíza, nonna, Cat e agora com certeza você.

Franzo a testa.

— Sei que ele é capaz de entrar em uma briga por mim - murmuro - Mas...

— Ele faria muito mais, Anna - ela responde e olha para o moreno de olhos castanhos esmurrando qualquer rosto inimigo que encontrasse - Já Gustavo...

— Ele é louco por você - completo - Tanto que não suporta que nada de mal lhe aconteça. Ele é um cara legal e sei que brigaria para me defender ou defender qualquer outra... Mas você, Leah, aquela expressão de fúria é todinha por você.

— Eu sei.

E então começamos a andar para dentro do caos. No caminho ela vai puxando uns cinco caras com ela e os leva para perto de onde o show está acontecendo.Os meninos parecem hipnotizados por sua beleza.

— Olha aqui vocês, eu vou entrar junto com a Anna Clara lá dentro e preciso que segurem o Theo e os outros caras, ok?

— O Narcoli e o Stahelin vão tentar bater na gente também por apartar a briga - um loirinho fala.

Leandra sorri maquiavélica.

— Ah, eles não vão. Podem acreditar.

Os caras assentem confusos e começam a entrar no meio. Olho pra ela.

— Eu cuido do Matheus.

Leah sorri ainda mais.

— Estou contando com isso, Clara. Gustavo Narcoli é todo meu.

***

Um cara negro com olhos cor de âmbar e sorriso legal me acompanha para aonde está Matheus e Theo. Meu parceiro de dança estava com o nariz pingando sangue, um olho roxo horrível e um corte no canto da boca. Theo estava pior, mas aquilo dava vontade de pegar a cabeça de Matheus e bater contra a parede por se meter naquele negócio.

O carinha ao meu lado me olha sugestivamente. Eu assinto com a cabeça e ele dá um soco na cabeça de Theo ao mesmo tempo em que Matheus ia bater no mesmo lugar. Antes que ocorra besteira, entro na frente  dele  e seguro seus braços o máximo que consigo, enquanto o cara que me acompanhou luta para prender Theo.

— Ah que bonitinho - Theo ainda luta para se soltar - Os dois heróis da pátria. Meu pai falou sobre a abertura do inquérito policial. Uma babaquice de merda que vai ser só perda de tempo. Mas fiquei surpreso que você esteja envolvida, Anninha. Creio que o nosso querido Matt já contou tudo sobre nossa pequena aposta.

Reviro os olhos

— Vem cá, você só abre essa boca pra falar merda?

O sorriso asqueroso se amplia no rosto do canalha. Eu sinto nojo.

— Também posso fazer outras coisas com ela - diz, malicioso - A aposta está acabada e ainda estou disposto a tirar sua delicada pureza, delícia. A não ser que você já tenha aberto as pernas pro Matt.

— Desgraçado - murmuro.

Matheus enrijece sobre meus dedos, os punhos prontos para socar Theo mais uma dezena de vezes.

— Se você ousar encostar na Anna ou falar alguma coisa dela, eu vou...

— Matheus - toco seu rosto e o forço a olhar pra mim - Esse idiota não vale porra nenhuma! Pare com isso!

Seus olhos entram e saem de foco.

— Mas...

— Vamos lá, Matt - o babaca do outro lado provoca - Ceda a sua nova namoradinha. Seja o covarde que você sempre foi, faça ela se apaixonar e quebre o coração dela em milhares de caquinhos que nem você fez com outras mil garotas que você conheceu.

Você não é assim, Matheus.  Nunca foi.

Continuo olhando pra ele. Seu braço passa ao meu redor e sei que ele só vai me reerguer para me por de lado e continuar a luta. A raiva emana de seu ser, uma emoção contida demais desde a morte de Helena. Droga.  Antes que Matheus possa se mover, dou um belo de um tapa em seu rosto, o estralo ecoando ao nosso redor.

E claro, no lado machucado que eu sei que vai doer mais.

Ele arregala os olhos pra mim e eu estou com a mão preparada para bater de novo.

— Olha aqui, seu imbecil, não seja o idiota que você sempre é e pare de cair nas provocações desse cara! Leah agradece a ajuda, mas ficar brincando de MMA com o Theo e garantindo um hematoma a cada soco não ajuda em nada!

Abaixo a mão e esmurro seu peito com a camisa molhada  de suor.

— Você tem o quê na cabeça?! Ainda não acredito que você fez...

E agora é o momento em que ele está me beijando. Porra! Seus lábios se movimentam nos meus rapidamente e ele finaliza com um beijo em meu queixo e uma abraço apertado. Suspiro.

— Você adora me interromper quando estou falando.

Ele ri.

— Tinha me esquecido como você ficava sexy bancando a agressiva.

Ergo as sobrancelhas pra ele.

— Eu particularmente sempre banco a agressiva.

Ele se aproxima do meu ouvido.

— Então consequentemente você é sempre extremamente sexy.

Abro a boca pra falar alguma coisa, quando ele levanta a cabeça para Theo que está sendo segurado pelo carinha moreno e um loiro. Vejo que a luta parou e grande parte do pessoal acabou se dispersando para evitar problemas. Leah está com os braços cruzados, a postura rígida enquanto olha raivosamente para um Gustavo aos trapos.

Vejo Theo empurrar os meninos que estão o segurando e sair apressadamente pela porta, os alunos murmuram coisas sem sentido e eu sei que o diretor aparecerá daqui há alguns minutos.

— Eu estou com uma enorme vontade de esganar vocês dois - Leah fala e olha pra Matheus e Gustavo, finalizando ao me encarar - Porém, como a Anna já deu um tapa bem dado nesse rosto detonado do Matt, posso me contentar com você, Narcoli.

Matheus faz uma careta para a bronca e eu vou para o lado de Gus, observando os danos feios da luta.

— Eu sou um idiota - sussurra ele baixinho para si mesmo.

— Sabe, Gustavo? - murmuro para ele - Esse seria um bom momento para você calar a boca da Leah. Deixe de ser tão lerdo ao menos um pouquinho e pense como ela está puta, pois ficou preocupada com você nessa luta tosca.

Ele ergue as sobrancelhas, desatento as palavras de Leandra direcionadas a ele.

— Acha mesmo?

— Você só vai saber se tentar.

E em um instante Leah está falando do como aquela atitude foi irresponsável, que da vida dela cuida ela e quando ela vai falar 'babaca' mais uma vez entre a segunda e última sílaba, Gus dá um passo a sua frente.

— Ah não, nem pense nisso Gustavo, eu não...

Mas Gus ainda está no modo off para qualquer coisa que ela está falando e seus braços a erguem do chão enquanto ele a beija como se tivesse concretizando o maior sonho da sua vida. E não pensem que o garoto é santo, pois tenho quase certeza que vi língua naquilo ali. Leah, depois de puxar o cabelo do moreno tanto que doeu em mim, retribuiu o beijo, que progressivamente  passou a ser uma cena de agarração. Ahfinalmente!

Olho sorrindo para Matheus e vejo seu rosto embasbacado enquanto observa a cena.

— Eu realmente nunca pensei que veria uma coisa dessas.

Solto uma risada e puxo sua mão em direção a porta.

— Deixe de ser idiota, eles só estão hm... Consumando a tensão amorosa que existia entre eles. Principalmente por parte do Gustavo.

— Estão consumando o amor?

— Estão consumando o amor - finalizo e depois de um tempo caminhando pelo corredor faço uma careta - Ok, que pegação é aquela? Meu nível de glicose está lá encima.

— Aposto que estão trocando declarações.

— Só se for o Gustavo, porque a Leah não é dessas. Aposto que quando terminar ela vai bater nele, falar um bom sermão, antes de beijar de novo.

— Ah, mas o Gus até que está mudando. Tomando atitudes, deixando de ser lerdo...

Ergo as sobrancelhas e ele ri.

— É, talvez não tanto assim - sorri ao passar o braço por sobre meu ombro e me aproximar do seu corpo - Acho que um dia podemos consumar o amor também, Branca. Uma boa pegação, eu dou uma agarrada em sua bunda, te digo aquela declaração romântica tipo Jack para Rose em Titanic.

— Eca - exclamo - Eu te dou outro tapa daqueles se você fizer isso.

— Ah, eu mesmo me bato se fizer uma coisa dessas. Acho melhor assim, o nosso jeito.

—  Regado a murros e socos?

Matheus dá de ombros e sinto seus dedos percorrerem minha cintura enquanto andamos.

— Não tenho culpa das brigas que aconteceram, Branca. Mas tem uma coisa boa: -  declara e ergo as sobrancelhas - Ao menos eu tenho você pra cuidar de mim.

Gargalho quando ele me puxa ainda mais pra perto e encaro os machucados que permeiam seu rosto.

— Vai sonhando, viu? - paramos em frente a porta da enfermaria, próxima da diretoria o suficiente para ouvirmos os sermões do diretor lá de dentro. Toco a lateral do seu rosto que eu bati, olhando com seriedade a vermelhidão existente - Você precisa entrar lá e colocar gelo nisso. Além de ir para a diretoria.

O sorriso em sua boca se contrai, ficando apenas uma linha fina no canto dos lábios.

— Eu sei. Vou encerrar o ano com uma ocorrência - ri com ironia - Para fechar com chave de ouro.

Faço uma careta.

— Pelo menos a última prova que temos vai ser amanhã. Química orgânica na terceira aula - comento e ele faz uma careta que nem a minha -  Você quer que eu ajude em...

— Já estudamos o suficiente.  Vou revisar hoje - Matheus me interrompe e levanta meu queixo - Relaxe. Eu tenho que entrar agora, mas sobre Theo...

— Matheus...

— Escuta, só toma cuidado, ok? - completa  e sinto seus lábios tocarem suavemente minha testa - Gustavo já deve estar vindo. Qualquer coisa te encontro mais tarde na instituição?

— Certo - sussurro, vendo ele me lançar uma piscadela  antes de entrar na enfermaria.

Ao me virar vejo os alunos recomeçarem a rotina normal de aulas. Cada um conversando,  rindo e  entrando em suas salas. O ritmo estudantil gradativamente voltando ao normal. Observo, em especial, as garotas. As típicas líderes de torcida que foram "amigas" de Helena, os grupinhos do pessoal estudioso ou festeiro, além das tímidas demais ou excluídas demais para fazerem amizades.

Qual delas  foi assediada algum dia?Qual  sofreu com o machismo arraigado na nossa sociedade? 

A verdade é que disso ninguém gosta de falar. Ninguém questiona ou debate sobre, nem comenta nos corredores. Apenas se tornou tão comum receber aquela cantada que nos diminui, aquele "fiu fiu" que nao foi pedido,que nos calamos. Nos silenciamos. E, por fim, somos silenciadas.

Lembro-me de Theo na briga, o modo como olhou pra mim e me diminuiu a uma "vagina ambulante" que ele poderia comer. Argh. Olho mais uma vez para as garotas, algumas delas já devem ter sofrido algum tipo de assédio vindo de Theo. Ou coisa ainda pior. Se todas ao menos pudessem denunciar de alguma forma...

Respiro fundo e me aproximo do primeiro grupo mais próximo a mim. Três meninas do segundo ano que estavam encostadas um pouco distantes uma das outras. A primeira, com a timidez aparente no rubor que atingiu suas bochechas, tinha o cabelo castanho curto e a roupa folgada, como se ela quisesse esconder seu corpo gordinho no meio dos panos.  Chamava-se Beatriz.

A que estava do seu lado, com o cabelo claro na raiz e tingido de loiro nas pontas, era Letícia. Os olhos escuros destacados pelo óculos de aro fino me fitaram com curiosidade. E, por fim, a última se apresentou como Clarice. A pele negra e o cabelo crespo tornando-a diferente das demais e tão bonita em sua particularidade quanto. Belezas diferentes, sutis,  mas verdadeiras.

Juntei as três e sorri.

— Geralmente ninguém nota nas garotas mais tímidas,  mas eu sei que geralmente elas são as que mais tem coisas a contar - comento, analisando as expressões curiosas de cada uma - Preciso que me ajudem.


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Notas finais do capítulo

Sabiam que depois desse capítulo faltará 10 capítulos para o famoso FIM? Pelo menos, se a minha escrita seguir a programação normal hahaha
Gente, essa sou eu: Lídia, autora alagoana, problemática em si, atrasada, cheia de bloqueios criativos estranhos e inoportunos e criadora de momentos desses seres que vocês leem. Eu queria ser uma autora certinha do jeito que vocês merecem, mas infelizmente não sou e sinto muito. Mas, independe do tempo, eu sempre volto. Nunca deixarei essa história sem um fim, ainda mais depois de tudo que TQENT passou então, bom, eu estou com dois capítulos prontos e espero voltar logo, mas se as coisas complicarem de novo, podem falar comigo, viu? Mandem MP, também estou no Instagram, Facebook ou Whats (mandem MP pedindo que eu dou). Tô aqui pra conversar, pra cobranças e pra muita troca de amor porque o mundo sempre tá precisando disso ♥
Amo vocês, isso nunca mudará.
Ah, sobre o capítulo... Temos shippers de Gusandra por aí? Sou péssimas inventando esses nomes. Teremos um bônus especial desses dois que está em andamento (topam ler?) hahaha.
Beijão e até,



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