Tudo que ele não tem escrita por , Lis


Capítulo 19
Dezessete - Anna


Notas iniciais do capítulo

Pessoas, eu sinceramente não tenho nem palavras pra descrever o quão INCRÍVEIS vocês foram no capítulo passado. Sério. Dreamy nerd, Gennie e Mdsgeo... Caramba, obrigada. Sei que já agradeci nos comentários de cada uma, mas não consigo parar de dizer isso. Obrigada a todos, na verdade. Por lerem isso aqui e continuarem ♥ obrigada por estarem junto comigo.

Bom, trouxe um capítulo da Anna pra vocês! As coisas ainda estão caminhando em um clima triste, mas gosto demais desse capítulo por causa da cumplicidade entre nossos protagonistas. Afinal, na alegria e na tristeza, certo?
Espero que gostem e boa leitura! ♥



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L  U  T  O

(s.m. sentimento de tristeza e pesar pela morte de alguém)

 

 

"Ela vai ficar bem"

As palavras ainda se repetiam na minha mente enquanto eu andava rapidamente pelos corredores da enfermaria e ia em direção a sala de espera da emergência. Eu absolutamente odiava hospitaisO cheiro de remédio que impregnava o ar fez meu nariz coçar, enquanto eu avançava meu passo e começava a ver as diversas cadeiras posicionadas no local.

No balcão, sons de conversas,  gritos e telefones tocando se misturavam caoticamente. Eu podia notar que não era a única do colégio que estava aqui. Reconheci o diretor, alguns professores e o técnico de natação sentados nas cadeiras enfileiradas. Além de alguns alunos também, porém não um em especial que eu esperava encontrar.

Ele não estava aqui.

— Anna! - uma voz feminina me chamou e eu me virei pra ver Leah me puxar para um abraço inesperado - Onde você estava,  garota? Matheus estava louco com seu sumiço, pensou que Theo poderia ter...

Ela parou de falar rapidamente quando se afastou e notou o sangue que manchava minha camisa. Uma sobrancelha loira se ergueu quando ela me fitou preocupada.

— O que aconteceu?

— Gisele. - respondi e meus olhos também se demoraram na mancha escarlate -  Eu juro que explico tudo quando eu voltar, Leah. Mas realmente preciso encontrar o Matheus.

— Claro - ela sorriu pra mim - Só fico feliz que você esteja bem, depois de tudo que aconteceu hoje... Mas eu não sei onde Matheus está.

Notei que ela também parecia inquieta. Os cachos dourados que estavam em perfeita sincronia quando eu a vi mais cedo, agora estavam bagunçados como se ela tivesse corrido muito para estar ali.

— Tudo bem. - apertei sua mão para passar calmaria e olhei ao redor mais uma vez - Luiza e Gustavo também estão aqui?

Ela assentiu tristemente.

— Todos viemos assim que soubemos o que estava acontecendo. Gustavo está procurando por Matheus junto com tia Luiza, mas esse hospital é gigante então... - ela dá de ombros sem concluir a frase - Ele estava envolvido demais quando tudo aconteceu, então acabou vindo na ambulância junto com Helena. Aliás, Peter passou mal também, logo, todos estão aqui.

Então nós dois andamos de ambulância hoje. Que infeliz coincidência. Pensei sobre Helena, a garota meiga que eu via na escola, a menina angustiada com quem falei em seu apartamento e  em seu provável jeito antes de se cortar. Ah, Lena. Pisquei rapidamente pra afastar qualquer resquício de lágrima e encarei os olhos esverdeados de Leandra, herança da parte italiana da família Stahelin que Matheus também tinha herdado.

— Eu irei encontrá-lo. - afirmei, já começando a caminhar para o local que ele estaria.

Não foi difícil encontrar o jardim dos fundos do hospital. Ele ficava em uma área aberta para qualquer um, porém poucos sabiam a real entrada daquele lugar. A proximidade do jardim com ala da oncologia me fez morder o lábio inferior para afastar as lembranças que aquele hospital me trazia. De todos os hospitais da cidade, logo esse era o que todos nós estávamos.

Sorri involuntariamente ao notar a única pessoa que se encontrava ali. Os ombros largos encostados na parede, os cabelos castanhos bagunçados, os olhos verdes focados em uma flor vermelha em suas mãos. Matheus estava  sentado em um dos bancos de pedra que ficava exatamente abaixo da janela do quarto que era da minha mãe há três anos.

Não era coincidência. No nono ano era ali que ficávamos quase sempre que nos encontrávamos fora da escola, no mesmo banco ao redor de uma mesa circular. A escolha dele só me fez ficar na porta do jardim e respirar fundo enquanto olhava a janela acima da sua cabeça.

Vamos lá, Anna.

Assim que meus pés tocaram o gramado, intantaneamente seus olhos me encararam. As pupilas esverdeadas estavam mais brilhantes, mas notei que nenhuma lágrima havia sido derramada. Ainda.

— Eu deveria ter trazido café. - falo enquanto caminho até ele. Relembrando nosso antigo hábito de tomar café naquele lugar.

Mesmo com a palavra tragédia pairando entre nós, um breve sorriso se abriu em seus lábios.

— Dizem que grandes mentes pensam iguais - ele respondeu, fazendo-me rir ao levantar um copo antitérmico ao seu lado com a mão direita e outro igual com a mão esquerda.

Porém, antes que eu ousasse me sentar,  os copos já estavam posicionados na mesa e ele tinha se levantado para me puxar tão rapidamente pra ele que eu contive um arquejo. Senti seus braços passarem sobre meus ombros e me apertarem no mesmo momento em que respirei fundo na curva do seu pescoço.

— Desculpe, eu estou com suor e sangue em mim - ele sussurrou, seus músculos se retesando enquanto ele tentava se afastar.

Eu ri novamente com a ironia da coincidência e mantive seu braço ao redor da minha cintura.

— Eu também - murmurei de volta, permitindo-me tocar meu lábio contra a pele quente do seu ombro e sentindo o breve tremor que passou pelo corpo dele. - Matheus...

Mas eu não continuei porque senti uma lágrima quente pingar na minha camisa, seguida logo depois de mais outra. Meu riso se perdeu enquanto meus dedos deslizaram pela linha da sua coluna vertical, puxando sua camisa pra frente a fim de que ele ficasse ainda mais perto do meu corpo.

— Eu não consegui chegar a tempo, Branca - sua voz era baixa no meu ouvido e levemente entrecortada - Eu tentei conter o sangue ou fazer alguma coisa,  mas...

— Você fez o melhor que podia. - sussurrei.

— Não eu... Merda. Desculpe por estar molhando sua camiseta. - ele fala e depois de alguns minutos sinto novamente sua tentativa de me afastar de si.

Franzo a testa ao ver Matheus se virar de costas e limpar a umidade restante embaixo dos seus olhos. Ah, aquilo não tinha acabado. Não mesmoSeguro firme ambos os seus punhos quando ele olha pra cima e fecha os olhos, em um gesto claro para conter as lágrimas. Abri os punhos fechados e entrelacei vagarosamente minhas mãos a dele, erguendo o queixo para encará-lo do mesmo jeito que ele faria por mim em uma situação semelhante.

— É melhor você parar com essa porra de pedir desculpa. - comuniquei.

Sinto ele trincar o maxilar para conter a tristeza que lentamente quer se transformar em fúria. Aperto mais os meus dedos no dele e quase sorrio com a ironia do que estávamos fazendo. Quem diria que eu estaria consolando Matheus Stahelin depois de tudo que já aconteceu entre nós, hein?

— Abra os olhos - ordeno.

Ele não abre, mas a sobrancelha se ergue com a ousadia. Reviro os olhos com sua teimosia e pego uma de suas mãos para colocar em minha cintura firmemente. Paro por um instante pensando que ele irá se soltar, porém ele apenas acata meu direcionamento e me segura perto de si. Bom.

Agora com um dos braços livres, ponho minha mão direta embaixo do seu queixo e puxo seu rosto pra baixo para que ele me olhe.

— Abra os olhos, Matheus.

Ele não reage e eu grunho de raiva quando ergo minha palma em direção ao seu rosto - já sentindo a ardência do tapa - e sou contida por um movimento rápido da mão que antes estava em minha cintura.

— Por favor. - peço baixinho.

De imediato seus olhos se abrem. Tão verdes que eu me surpreendo por um momento,  notando que  a umidade ainda reluzia ali.

— Não foi sua culpa - afirmo - Sabe disso, não sabe?

Ele não responde. Mesmo  contida, faço força contra sua mão.

— Matheus...

Um sorriso fraco se estende em seu rosto e ele troca o aperto firme em minha mão para segurar minha palma contra sua bochecha áspera de algum resquício de barba que ficou.

— Sempre tão agressiva. - provoca.

— Idiota. - falo ríspida e me surpreendo com sua risada quando ele me puxa novamente para dentro de seus braços em um movimento rápido.

Suspiro baixinho por sua atitude e seguro seus braços que me circundam, olhando-o atentamente quando faço isso.

— Você sabe que não foi sua culpa - repito - Não é, Matheus?

Sua testa enconsta na minha, um gesto íntimo ao ponto de me fazer ruborizar com a aproximação repentina. Mas eu não me mexo.

— Sei, Anna. Eu sei.

Assinto involuntariamente.

— Bom.

Com seus olhos tão próximos consigo ver suas emoções mais de perto, um luxo que ele me permitiu fazer ao se aproximar tanto de mim. Seco uma última lágrima restante na sua bochecha e ele sorri pra mim quando aproveita o momento para beijar meus dedos úmidos.

— Realmente bom - concorda e ri baixinho pra mim - Você realmente iria tentar bater em um cara chorando, Branca? Uou, isso é que é maldade.

Arregalo os olhos, ofendida.

— Você estava sendo teimoso como uma mula e eu sou a maldosa aqui?!

Seu sorriso se amplia.

— Hoje soubemos que suas habilidades de psicologia são agressivas demais para a sociedade.

— Na verdade, minhas habilidades de psicologia são agressivas demais especialmente com você. - concluo, rindo da sua brusca mudança de assunto e me afastando para enfim sentar no banco de pedra.

Ele me segue e passa um copo antitérmico pra mim, tomando um gole do seu café logo depois.

— Fico feliz de ser assim tão especial. - responde, o sorriso de canto desaparecendo aos poucos enquanto ele me olha detalhadamente, focalizando o sangue em minha camiseta e franzindo a testa. Retribuo o olhar quando vejo as manchas rubras no seu jeans.

— O que aconteceu? Você...

— Não estou machucada - interrompo quando seu dedo pressiona a mancha  - O sangue é da Gisele.

— Gisele? A nossa Gisele? - sua sobrancelha se ergue com a surpresa. Assinto, tomando um gole do meu café.

— Lembra que estavam me chamando lá fora? Era a Gisele. Ela... - me interrompo e franzo a testa - Eu não sei realmente o que aconteceu, mas ela estava completamente machucada. Fratura, cortes, murros... Ela foi espancada por alguém e estava encolhida no chão perto do muro do colégio.

— Puta merda. - ele sussurra.

— Alguém fez muito mal a ela, Matheus - digo séria - Não sei quem foi, mas ela estava chorando tanto e com tanta dor que... Enfim, ela está passando por cirurgia agora e o médico disse que vai ficar bem. Mas, eu já chamei o pessoal da Terra da Sobriedade.

Meus pensamentos voam com meu constante debate do que pode ter acontecido com Gisele. Seu choro enquanto eu a acolhia delicadamente em meus braços naquela calçada fria ainda ficariam comigo por muito tempo. Nunca vi alguém tão assustada.

— Iremos descobrir então - ele conclui.

— Sim, iremos - concordo, colocando mais uma coisa na nossa lista de mistérios. Mais um. Com um suspiro pesaroso, pego sua mão e me preparo para levantar - Bom, mas podemos esperar na sala de espera, então? Assim saberemos quando Gisele sair da cirurgia e quando surgir algo sobre Helena...

Noto que toquei em algum ponto quando seus olhos se fecham brevemente e ele segura com mais firmeza minha mão.

— Branca, infelizmente... - sua voz é um murmúrio rouco - Não irá surgir mais nada sobre Helena.

— Como assim? - minha pergunta sai involuntariamente e eu balanço a cabeça quando compreendo a informação.

Penso em suas lágrimas alguns minutos antes e encaro o olhar esverdeado sincero e triste que ele me dá. Ao mesmo tempo em que tudo isso acontece mordo o lábio para não gritar pelo quanto eu fui tola ali com ele. Eu realmente pensei... Pensei que ela...

— Os cortes, particularmente um mais profundo que ela deu, atingiram a veia femoral, responsável por levar o sangue da perna ao coração. A hemorragia foi quase instantânea. Segundo o socorrista que atendeu ela, é praticamente uma morte fatal, já que o óbito pode ocorrer em até 20 minutos após o corte.

— Ela sabia o que estava fazendo - sussurrei, ainda atônita pela notícia e chocada com a inteligência e tristeza de Helena para tentar aquilo.

— Ela morreu antes de chegar no hospital. Quando eu cheguei no local e estanquei o ferimento... Bem, provavelmente ela já estava perto. Perto demais.

— Mesmo assim não foi culpa sua - ressaltei por vias das dúvidas.

Ele sorriu tristemente e estendeu a mão para secar alguma coisa em meu rosto.  Olho surpresa para a lágrima em seu dedo, uma das diversas que inesperadamente decidiram sair dos meus olhos.

— Eu sei, Branca. Não foi realmente culpa de ninguém específico, na verdade. O suicídio, quero dizer. - ele responde e me puxa  para mais perto quando um soluço baixo faz eu morder o lábio com força para conter as lágrimas traiçoeiras, coisa que eu tenho feito há três anos desde a morte da minha mãe  - Acho que foi uma sucessão de acontecimentos que fizeram Helena tomar essa decisão. Só queria... Bem, queria ter estado com ela para mostrar que aquela não era à única solução que ela tinha. Queria ter acolhido Helena.

— Mas eu estive com ela - murmurei, as lembranças daquela tarde no apartamento ficando ainda mais nítidas - Nós conversamos, eu notei alguns cortes no braço dela, mas não pensei que...

— É a minha vez de dizer que não foi culpa sua? - Matheus sussurra enquanto tenta inutilmente secar as lágrimas que saem de mim - Porque não foi, saiba disso. Helena deveria ter sido acolhida há muito tempo. E não só pela gente, mas  pelas pessoas que ao invés de ajudá-la, preferiram ignorá-la e até mesmo julgá-la. Se for para culpar alguma coisa, seria a nossa sociedade doente. Mas sinceramente? Culpar ou não algo, não fará diferença nenhuma agora.

Concordo e respiro fundo na tentativa de me recompor. Afinal, Gisele ainda estava ali e ela também precisava de apoio.  A verdade é que todos nós precisamos de um apoio de vez em quando,  negando isso ou não.

— Faremos justiça por ela - continuo e encaro seus olhos esverdeados, estes que expressam a mesma ferocidade da minha expressão. - Ela merece isso. Ela merece... Merecia as melhores coisas desse mundo. E o que pudermos fazer...

— Faremos. O que pudermos fazer, ela terá com toda a certeza. Independente do que aconteceu.

***

— Uau, você está uma gata nesse vestido preto! - as palavras vem de Ibi assim que eu me sento na cadeira da minha escrivaninha.


— Esse não foi bem meu objetivo - respondo, sorrindo para ele, mesmo sendo um sorriso sem graça.

Eu tinha acabado de voltar do velório de Helena. Algo que não é digno de detalhes tamanha a hipocrisia que reinava naquele lugar. Considerando que praticamente todos do colégio resolveram aparecer, eu me contive para não pular encima de alguns  que a julgaram tanto em vida e resolveram derramar uma explosão de lágrimas na sua sepultura. Dora e Marina estavam chorando tanto que uma delas passou mal, ficando sem respirar por um momento.

Cristo!

Além disso, foi um evento feito pra ser discreto. Mesmo com a quantidade de pessoas presentes, Ofélia e José Sanchez não queria atrair muitos olhares para a forma da morte da filha. Durante todo o momento fúnebre observei o casal de pais completamente sérios e frios ao lado de um Peter com rosto inchado e aparência desleixada. O contraste era tão grande que, por um momento, senti pena do irmão de Helena, mesmo sabendo da conversa entre ele e Matheus momentos antes do acontecido.

A melhor coisa, ao menos, era que Theo estava viajando, então ele não teve a oportunidade de chorar lágrimas de crocodilo sobre o caixão da menina. Porque, caramba, se ele realmente ousasse aparecer por lá... Eu sinceramente não sei o que seria dele.

— Desculpe, girl. Eu sei que o momento é triste, mas é que eu queria ver você sorrindo um pouco - Ibi diz com um sorriso triste pra mim - Aliás, sinto muito pela Helena. Sei que faz um tempo que não conversamos, mas pelo que eu estou vendo... Ela era muito importante pra você.

— Depois do que houve,  ela deveria se tornar muito importante para todos nós - digo com um dar de ombros - Mas não se preocupe, com tanta coisa acontecendo nenhum de nós  anda com  tempo para atualizações... A Helena é... era uma pessoa incrível.

Ele assente e foca o olhar em mim mais profundamente.

— Você parece bem. - constata - Desconsiderando tudo isso.

— Eu estou bem - ri de seu tom desconfiado - Eu não parecia bem antes?

— Não é isso, é que você... Hm, parece mais corada. Como se tivesse feito sexo alguns minutos antes de falar comigo.

Arregalo os olhos. Se eu estava corada antes, agora eu parecia um tomate maduro. Maldito Ibi!

— Eu não fiz sexo antes de falar com você!

Ele ergue as sobrancelhas.

— Irá fazer então? - pergunta.

— Não!

— Você está negando tão rápido, querida. O que foi então? Eu te interrompi no meio de uma preliminar? Talvez de algum boque...

— Ibi! - ralhei - Eu estava em um velório, meu Deus do céu!

— Desculpa, desculpa - ele fala rindo - Eu sei que a situação é triste, mas não consigo não notar que tem algo estranho em você.

— Você falando assim parece que eu estou grávida - falo com ironia, rindo de seus olhos arregalados - E eu não estou! Só pra deixar claro.

Ele coloca a mão no queixo e me analisa. Os cachinhos do seu cabelo se bagunçando enquanto ele se inclina.

— Certeza que não tem a ver com sexo?

— O que não tem a ver com sexo? - a nova voz no quarto fala e eu imediatamente fecho os olhos.

Ah, não, pai. Você tinha que inventar de aparecer agora.

— Thiago! - Ibi exclama animado - Que saudade de você, meu velho!

Ibi e meu pai eram quase como pai e filho também. Os olhos do meu progenitor se arregalam quando ele reconhece o cara do outro lado da tela, um sorriso enorme emoldurando seu rosto.

— Ibi, meu caro! Saudade de você nos jantares daqui de casa.

Ibi ri, sabendo tão bem quanto eu o quão deliciosa era a comida do meu pai nesses jantes e não sentindo nenhuma falta.

— Ah, com certeza também sinto falta, camarada! - o sorriso de Ibi é extenso.

"Mentiroso!" o acuso por mensagem labial, notando seu sorriso se estender ainda mais. Meu pai olha pra mim e depois pra Ibi.

— Mas e então? O que vocês estavam falando mesmo sobre sexo? - questiona com seu sorrisinho malicioso. Antes que eu possa falar, ele acaba comigo ao complementar: - Você e Matheus finalmente tiveram sua primeira vez, Clara?

O "O QUÊ?!" de Ibi é tão alto que eu me surpreendo por não ficar surda. Lá se vai a normalidade...

— Não - respondo a pergunta - Essa conversa,  minha aparência ou qualquer outra coisa que vocês estão pensando sobre mim... Não tem absolutamente nada a ver com sexo! - e depois de pensar,  complemento: - E nem com Matheus!

Meu pai faz uma careta, Ibi ainda me encara em uma mistura de excitação contida com interesse exacerbado.

— Pai, posso continuar minha conversa agora? - pergunto.

Noto que ele ainda está com o terno negro que usou para me acompanhar no velório, uma pontada passa por mim ao notar que é o mesmo que ele usou na despedida da minha mãe.

— Já estamos na fase de você me dispensar das suas conversas comprometedoras, Clara? - questionou ofendido.

Sorri, segurando sua mão.

— Não haverá nada comprometedor que você perderá, juro.

Sua sobrancelha se arqueia em desconfiança, mas ele assente ao ver o meu sorriso e sai do quarto, logo após se despedir devidamente de Ibi.

— Anna Clara Bennet, não me diga que você e o Stahelin estão namorando e você nem ao menos...

— Não estamos namorando - interrompo o começo do monólogo  de Ibi - Pelo menos... Não tem nada definido.

O complemento da minha fala é o que faz ele surtar e logo depois disso passamos a próxima hora discutindo cada característica interessantemente erótica de Matheus que com certeza me fará ruborizar assim que eu o vir novamente.

Resignada com os tópicos malucos que converso com Ibi, deixo o notebook encima da cama enquanto troco o vestido preto rendado. Um dos únicos que tenho dessa cor que são apropriados para um cemitério. Após vestir uma camisa de  um pijama velho acompanhada de um short folgado, ajeito-me entre os travesseiros até encontrar uma posição ideal.

Amanhã seria o dia em que eu e Matheus iríamos ao hospital visitar Gisele, já que ela já havia saído da cirurgia e, segundo doutor Lucas que agora acompanhava o caso, progredia gradativamente em sua melhora. Com sorte, uma parte do mistério sobre ela se revelaria.

Encaro com outros pensamentos o wallpaper de Grey's Anatomy na tela inicial do notebook e franzo a testa ao notar o ícone de e-mail piscando no canto do desktop. O nome no remetente me faz arregalar os olhos e me sentar imediatamente.

lenasanchez@email.com

Meu Deus.

Aperto rapidamente na mensagem e começo a ler.

 


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Notas finais do capítulo

Pra tirar uma dúvida que pode vim a aparecer: o e-mail foi enviado só alguns minutos antes da Helena começar a se cortar, enquanto Matheus estava perto de começar a competir e Anna estava ocupada procurando e cuidando da Gisele, então não havia a possibilidade de eles lerem o e-mail antes e impedir de alguma forma o que aconteceu. Acho bom deixar claro isso aqui porque pelo que vocês estão vendo, o efeito do relato da Helena começará no próximo capítulo e teremos muitas coisas desenvolvidas a partir dele.

Como eu tento sempre, voltaremos a intercalar comédia, romance e drama (além de tretas) nos capítulos hahaha muita coisa ainda acontecerá e eu tô arquitetando tudo pra todos os detalhes ficarem arrumadinhos e sem pontas soltas. Mais uma vez digo que críticas construtivas são MARAVILHOSAS e eu as aceito de bom grado, assim como sugestões do que vocês querem ver acontecendo (acho legal saber o que vocês imaginam para ou surpreender ou não decepcionar totalmente as expectativas).

Espero que tenham gostado e vou tentar voltar logo ♥

Beijão e até,



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