Guardian Angel escrita por Juliano Adams


Capítulo 10
Preciso de você


Notas iniciais do capítulo

Bem, foi mal por demorar um pouco mais que o previsto, eu tava viajando x.x espero que me perdoem. Esse capítulo é narrado pelo Leo, e mostra o encontro dele com a Yara. Espero que gostem



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–Desculpa, desculpa... – eu disse depois de beijar ele. Tava com medo do que ele ia pensar, mas não achei outro jeito de demonstrar. Queria que ele se sentisse bem, e acho que nenhuma palavra poderia resumir.

Ele me olhou da cabeça aos pés.

–Escuta, A Larissa é pra lá ó. – Ele disse apontando pro corredor. Ele não tava bravo, a voz dele era calma, mas ele corou, era a primeira vez que vi ele corar. Ele saiu rápido, eu nem tive tempo de responder. Fiquei pensando se ele ia contar pra alguém. Aí lembrei que ele não tinha ninguém pra falar.

Droga, essa cena não saía da minha cabeça. Eu nem tinha como ligar pra ele pra perguntar como ele tava se sentindo. E nem se pudesse.... Também não sabia se ele ia atender. Tinha que esperar até passar o porre, depois eu tomava uma decisão.A dor de cabeça passou, mas precisava dormir mais um pouco, ainda tava meio morto.

Subi as escadas trocando os pés, liguei o ar e entrei no quarto tirando a bermuda, ia cair na cama sem nada, mas uma voz me assustou:

–Que saúde hein garoto? – Eu ouvi aquela voz debochada. Caramba, era ela. Primeiro vesti a bermuda de volta, depois fiquei pensando em como ela entrou ali.

–Como é que tu entrou aqui? – Eu disse, achando a primeira camiseta que tava jogada no chão e vestindo. Yara tava sentada na minha cama lendo minhas revistas.

–Yara é uma índia esperta, sempre dá um jeito de contornar seus obstáculos. – Ela adorava falar de si mesma na terceira pessoa, o tempo todo.

–Era pra você estar no Tocantins fazendo tapioca!

–Pois é.... Mandioca tá na entressafra aí Yara resolveu vir pro sul dar uns conselhos pra homem branco. Aliás, Yara descobriu suas aventurazinhas na noite.

–Do que você tá falando?

–Não finge que fica pior pro teu lado. – Ela disse se levantando. – Que história é essa de Larissa? Falei com ela o suficiente pra perceber que essa maranduvá não presta.

–VOCÊ FALOU COM ELA?

–Não só falei, também disse que você tinha namorada e dei um banho na sujeita. Tava cheirando a cauim tadinha.

–QUÊ? – Tá maluca? – Ela não podia estar falando sério.

–Yara pensa no que é melhor pra ti. Aliás, esse Patrick é um fofo. Yara adorou o quarto dele.

–VOCÊ FOI NA CASA DELE?

–Um amor o menino. Sacanagem o que tu tá fazendo.

–Ai Yara, não sei... Eu gosto do Patrick, mas sei lá, eu não sei nem se sou gay... Que droga também. Eu beijei aquele cara, o Alex, e foi bom tipo... Eu senti que eu podia fazer qualquer coisa, mas tu não entende: A Larissa meio que me seduz sabe? É louco, mas eu quase perdi o controle quando tava com ela – Ela escutou tudo com cara de “menino tu é um idiota” que ela adorava fazer.

–Que tal pensar com a cabeça de cima uma vez na vida? Leonardo, essa Larissa só te quer pra mostrar pras amigas, e o que tu sente por ela é puramente físico, tu só quer um decote e duas pernas. E esse outro cara é reflexo disso. Tu quer é ter uma ereção. Cari é foda hein. Yara não entende. Agora o Patrick, tu gosta dele mesmo, como pessoa, o jeito, a voz, tu gosta da alma, não do corpo. Não tem a ver com ser gay ou hétero quando uma alma gosta da outra, corpo é coisa a parte.

Eu odiava quando a Yara vinha com essas explicações, mas ela sempre me fazia pensar. Será que ela tinha razão? Eu não sabia direito o que eu sentia. Mas talvez não importasse tanto se Patrick fosse homem ou mulher mesmo. Eu ia gostar dele do mesmo jeito.

–Mas e ele? Será que ele sente o mesmo? Ele mal deixa eu chegar perto. E vive me dando foras. É como se ele não quisesse saber de mim.

–O namorado dele morreu Leo, como você acha que alguém reagiria? Além disso ele sofre maus tratos dos pais– Yara dizia aquilo como se estivesse brava, como se achasse que eu já devia saber.

–Nossa, deve ser difícil pra ele. – Eu não sabia bem o que dizer, eu sabia que tinha algum motivo para Patrick agir daquele jeito, mas não imaginava tal coisa. Agora parece que eu entendi aquele abraço, queria confortar ele, não queria que ele se sentisse tão mal assim.

–Muito, Leo. E você indo pra festinha com Larissa. – Yara falava num tom de censura.

–Escuta... Eu não tinha como saber... Aliás, pensando bem: como é que você sabe? Ele contou assim do nada?

–Isso não vem ao caso Leo. O que eu quero dizer é que ele é uma pessoa sensível, e pelo jeito que essa Larissa é, ela não perderia tempo pra começar a se vangloriar de você na frente de toda a escola. O que magoaria ele mais ainda. Pensa nas consequências, você não pode dar falsas esperanças a alguém. – Eu odiava o fato que Yara quase sempre estava com a razão. Mas ela estava, eu acho que fui egoísta. Patrick também devia ter os motivos dele pra agir daquela maneira, e agora eu sabia quais eram. E não eram poucos.

–Talvez eu tenha sido um pouco egoísta... – Admiti.

–Um pouco?

–Não força a barra né Yara?

Ela riu

–Então, o que você vai fazer a respeito?

–Eu vou falar com a Larissa, que ela entendeu as coisas errado, que eu também me precipitei, e que não ia dar certo com a gente. E caso o Alex incomode eu falo que vou contar pra todo mundo que peguei ele no banheiro.

–Yara aprova atitude de homem branco. Yara está gostando de ver. – Ela deu uma daquelas gargalhadas. Acho que só ela pra organizar minha cabeça.

–Agora... Tem como índia Yara dar licença? Homem branco precisa tomar banho. – Eu falei rindo, enquanto pegava uma toalha. Tomei um banho bem gelado, precisava tentar aquela tontura do corpo. Tentei me vestir bem, coloquei um all star, uma calça vermelha e uma camisa jeans. Perguntei pra Yara o que ela achava, ela disse que tava legal.

–Vai aonde filho? Tá tão arrumado... Melhorou? – Minha mãe tinha chegado da farmácia, queria ver como ela ia reagir quando soubesse que a Yara tinha chegado sem avisar – Esqueci de te falar. A sua amiga lá do Norte, a Yara, ela ligou ontem dizendo que ia passar aqui em casa pra visitar uns parentes, ela tá no quarto de hóspedes.

–Sim, eu já falei com ela mãe. – Nossa, Yara pensava em tudo. – Já to melhor, eu só vou visitar um amigo.

–Ok. – Vou preparar uns brownies pra quando você chegar. – Também era estranho o fato de minha mãe ser mais legal quando a Yara tava por perto, mas não reclamei.

Cheguei na casa o Patrick depois de pouca caminhada, não conseguia encontrar a campainha de jeito nenhum, então resolvi bater palmas. Um cara gordo e careca de camisa regata meio suja de gordura atendeu:

–Não, não quero conhecer a palavra do Senhor. – Ele disse meio bêbado. – Não gostei do tom dele.

–É, na verdade eu queria falar com Patrick.

O cara me olhou da cabeça aos pés, eu não gostei do jeito que ele me encarava.

–PATRICK! – Ele chamou de má vontade, gritando. – Ele apareceu meio hesitante, lá no fundo do corredor, notei um pouco de medo nos olhos dele. – Tem um cara aqui querendo falar contigo, espero que não seja agiota. Patrick saiu passando por detrás do pai. Que virou as costas e bateu a porta.

–Bem, então você já conheceu meu famoso pai. – Disse ele, se sentando no muro do jardim. Que que houve? Veio se certificar que eu não comi nenhuma maçã envenenada?

Eu amava o sarcasmo dele.

–Bem, se você tivesse comido eu resolvia o problema. – Não consegui deixar essa escapar.

–Prefiro deixar uma macieira crescer no meu estômago.

Ok, eu mereci.

–Bem, eu só vim... Saber... (nunca tinha sido tão difícil falar isso) Você quer sair comigo?

– Defina “sair”. – Ele disse juntando as mãos como se estivesse falando de negócios.

–Eu pensei em irmos no parque, eu não conheço direito a cidade. Você podia me mostrar algumas coisas. – Falei meio tímido, é meio chato ser impulsivo, eu não sabia bem como continuar a conversa.

–Escolheu o pior guia turístico do universo. Mas, tudo bem. Cuidado com as formigas no caminho, elas já demonstraram que não morrem de amores por você. – Eu ri.

Caminhamos até o parque juntos, ele andava rápido, eu tava suando pra acompanhar ele. Ele ficava olhando pra mim com aquele sorriso nos lábios. De alguma forma eu sentia que ele tava se sentindo um pouco melhor, e era tão bom perceber que eu fazia parte disso.

Não era lá o parque mais bonito do mundo, mas dava pra tolerar: tinha algumas árvores, muita grama e capim (mais capim do que grama, e um bocado de folhas secas pelo chão também) um playground pras crianças, que tava bem cuidado até. E alguns canteiros de flores, que enfeitavam um pouco o lugar. Era domingo, então tinha bastante gente caminhando, e a melhor parte, uns vendedores de comida, meu estômago roncou ao ver a velhinha do churros.

–Bem, esse é o parque. – Patrick subiu em cima de um banco e começou a gesticular feito um guia turístico. – Se vocês olharem para a esquerda, vocês verão o parque. Se vocês olharem para a direita, vocês verão o parque. Aproveitem a experiência, não se empurrem, não se acotovelem e não se matem. – Ele desceu num pulo, e foi andando rapidinho feito o Charles Chaplin naqueles filmes preto e branco. Aí ele chegou perto de uma árvore, e começou a gesticular de novo.

–Aqui nós vemos um espécime de... – ele fez semblante de inteligente – hmm, árvore, como vocês podem ver ela é bastante... Vegetal. Apreciem. Alguma pergunta? – Ele atuava bem.

–Quer um algodão doce? – Eu perguntei sorrindo enquanto via o vendedor passar lá no fundo.

–Já descobriu como são feitos?

–Ahhn, não. – Droga, tinha esquecido daquilo.

–O açúcar é derretido e passado por milhares de buraquinhos enquanto a máquina gira, quando ele passa ele forma pequenas linhazinhas, que são enroladas no palito formando o algodão. Mais ou menos uma colher de açúcar forma uma porção de algodão doce. Acho que não precisa de capacete mesmo. – Ele riu. – Mas não to com fome não, então eu passo.

–Olha, é que pra ser bem sincero, eu to morrendo de fome... E não queria comer sozinho. – Eu tava com fome mesmo, tinha tomado só aquele copo de leite, daqui a pouco meu estomago ia grudar nas costas de tão vazio.

Ele levantou os olhos e sorriu:

–Tá bom, senhor esfomeado, teremos um churros. Ele se levantou rápido e correu até a senhora da barraquinha, e eu tive que correr atrás dele, o que era uma cena engraçada. Ele mexia pouco os braços para correr. Eu ficava pensando num pinguim.

–Um alimento de origem ibérica muito popular nos países sul americanos, preparado a base de farinha de trigo e frito em óleo vegetal. Costuma ser temperado com canela e açúcar cristal e pode vir ou não recheado de doce de leite ou chocolate. – Ele disse se sentando antes de dar a primeira mordida. – Meu recorde é comer vinte e três em um dia. – acrescentou depois de mastigar.

Eu comecei a rir. Eu acho que era isso que eu achava legal nele, a forma como ele dizia coisas não usuais o tempo todo. Como se ninguém pudesse ler o que tinha na cabeça dele. Patrick era o oposto do que podia chamar-se “Pessoa previsível”, e eu ficava feliz com isso. Era diferente de tudo que eu já havia convivido.

–Quem é você, um especialista em comida? – Patrick era inteligente.

–Um cara que gosta de açúcar. Vinte e três churros, você devia tentar.

– Interessante... Eu acho que nunca comi mais de três. – Acho que nunca ia ter uma resposta ideal pras coisas que ele falava.

–Aprendendo a viver, parte um: coma o máximo de churros que você puder. Entendido? – Ele fez aquilo soar como uma ordem.

–Sim senhor – eu disse, me levantando pra pegar mais um.

–Mas então, fale mais sobre você. Acho que eu nem te conheço direito. – Eu tentei puxar assunto da forma tradicional. Vamos ver no que ia dar.

–Vamos pensar... Patrick, dezessete anos e meio, grande amante de Oscar Wilde, tem uma lagartixa chamada Charles, gosta de café, açúcar, chocolate e odeia capacetes. Atividades e interesses: cinema, homicídio, suicídio e admiração de insetos enquanto sobem paredes. Tenho medo daqueles bichinhos que se enterram na areia da praia.

–As pulgas da areia? – Eu ri.

–É, pulgas. Se existem pulgas é por que deve existir um bicho muito maior embaixo pra elas morarem. Be careful – Ele disse fazendo um olhar de mistério. - Ok, sua vez.

–Leonardo, dezoito anos, gosto de parques de diversões, música, toco guitarra, gosto de comer coisas das quais eu não sei a procedência – eu ri nessa parte. – E meu objetivo de vida é comer vinte e três churros num dia só.

–Louvável – Ele disse engolindo o último pedaço de churros.

–Mas então... Você conheceu a Yara né? – Eu precisava saber o que ela falou sobre mim.

–Aquela sua amiga? –Ele disse limpando o rosto. – Ela passou lá em casa hoje mais cedo. Sim, nós falamos mal de você o tempo todo.

Eu ainda não sabia se amava ou odiava essa maneira do Patrick de adivinhar o que eu to pensando. Mas ele parecia não falar pra ofender, era só o jeito dele de ser sincero.

–Ah sim, ela mandou avisar que vai cobrar o chocolate que você comeu quando era criança. – Ele disse, rindo. O mais engraçado é que eu não conseguia lembrar de quase nada da minha infância, era como se tudo tivesse começado com a minha adolescência ou por aí. A primeira memória que eu tive de Yara era tentando ficar com ela. Mas eu não lembrava de mais nada. Odiava isso.

–Providenciarei. – Eu falei com um sorriso amarelo. – Mais alguma coisa que eu deva me envergonhar?

–Não, fique tranquilo, ela não me mostrou suas fotos nu. – Ele disse, pegando um refrigerante e bebendo quase tudo num gole. Eu acho que devo ter corado, porque meu rosto tava meio quente.

–Tá, da Yara eu espero tudo. – Era verdade.

–Bem, eu preciso ir. –disse ele se levantando. – Você já conheceu o füher gordo e bêbado que mora lá em casa, uma das vantagens de ser gay é que você não fica assim com 40 anos. – Ele disse com aquele senso de humor de sempre. E se levantou para se despedir.

–Hey, espera. – Disse, pegando pelo braço dele. Na maioria das vezes era fácil falar aquilo, mas com Patrick eu não sabia exatamente o que dizer, então resolvi ser direto. – Quer ir no cinema comigo terça? – Pedir foi como tirar um peso da minha cabeça, e adquirir outro: qual seria a resposta dele?

–Por que não? Combinado. –Ele sorriu, e se virou sem se dar tchau. Eu sentia que ele tava melhor. E isso me fazia feliz, eu me sentia bem por ajudar ele a melhorar. Estar com Patrick era divertido, desde o jeito que ele me olhava até o jeito que ele falava de churros. Era como se a cada minuto eu fosse descobrir uma coisa nova que ele tem pra mostrar. Ele precisava de mim, mas agora senti algo que eu tava custando a perceber: eu também precisava dele. Precisava ficar perto de Patrick.


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Notas finais do capítulo

E aí queridos? Que acharam? Não esqueçam dos reviews. Beijos, até maiss!



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