Guardian Angel escrita por Juliano Adams


Capítulo 9
Ressaca


Notas iniciais do capítulo

Capítulo no ponto de vista da narração. E introduzindo um novo personagem: Yara. Espero que gostem.



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A cabeça doía, os músculos estavam moles. Leonardo não deu dois passos e caiu na cama novamente. Segurou as mãos com a cabeça e sussurrou para si mesmo:

–Merda. – Bem, era mais ou menos isso que acontecia com todo mundo que esvaziava uma garrafa de vodka, e não era exatamente uma sensação nova para Leonardo, na verdade, a única coisa nova era o que ele havia feito na noite passada, noite que agora ele tentava lembrar: um par de seios veio a sua mente, seguido de um tomara que caia e duas pernas formosas (que até agora chamamos de Larissa) a visão mudou para uma serie de luzes coloridas, e então surgiu uma boca fina, envolta de barba, um corpo rijo de músculos e um brilho suado. A visão tremeu, mas Leo lembrava-se bem da sensação que teve; embora hesitante, precisava admitir: aquilo o excitara como um louco.

Leonardo se levanta trêmulo e a primeira coisa que faz é se despir. Queria deixar a pele respirar, o que é compreensível, visto que o quarto cheirava a álcool, bem como o suor que se desprendia de sua pele. Leo vaga nu até o banheiro e liga a ducha fria, deixa a água verter e senta-se no chão de mármore enquanto a água lava o álcool embora. Infelizmente para Leo, a água não levava pensamentos. Veste um shorts e desce as escadas, pisando devagar nos degraus, não queria acordar ninguém.

–Tá tudo bem filho? – Tarde demais, Leo não sabia, mas mães tem um rastreador de filhos acoplado ao cérebro, conhecido como “sexto sentido”.

–Tranquilo mãe. – Leo boceja e murmura entre os lábios com uma voz sonolenta, que soa mais como “tranqul mai”

–Ih, to vendo que a noite foi boa... Vou fazer um leitinho quente pra ti. – Nesse ponto temos que concordar que a mãe de Leonardo é uma pessoa extremamente fofa, se dependesse de mim, Leo já teria levado uns cascudos. Contudo, talvez a mãe tivesse razão, um copo de leite morno é uma boa maneira de organizar os pensamentos, e foi ali, sentado no balcão ainda com um bigodinho branco formado pela nata do leite que Leonardo deu-se conta de três coisas:

Havia gostado do beijo de Patrick; não apenas pelo beijo em si, mas pela pessoa que Patrick era. Tratando-se de Patrick, tão quieto e fechado, um beijo era muito mais que um beijo, era uma permissão, um sinal que ele deixava Leonardo ser alguém na vida dele. Queria beijar Patrick novamente, experimentar mais uma vez aquela sensação. Gostava do jeito que Patrick sorria, do jeito que Patrick falava, do jeito que Patrick pensava. Gostava do jeito que Patrick

O beijo de Alex o excitava, nem sequer havia falado com ele por mais de cinco minutos, ainda assim, agarrá-lo, virá-lo de costas para a parede, deixá-lo imobilizado e então roubar-lhe um beijo havia deixado Leonardo com calor dentro do peito. Submeter um homem a um beijo era uma sensação de poder, e Leo gostava de poder.

Larissa era sensual. Sua maneira de agir, a forma como gostava de ostentar o que tinha era provocativa. Suas formas eram perfeitas, harmônicas, Leo se apaixonara por aquelas formas, e principalmente por seu jeito malicioso, Leo gostava de ter Larissa para si.

Leo percebeu que pôr os pensamentos em ordem era complicado. Gostava dos três então? Podia-se gostar de três pessoas? Talvez não pelos mesmos motivos, pensou. Mas Leonardo gostava dos três por motivos diferentes. O Jeito único de Patrick; a sensação que conseguia ao agarrar Alex, a sensualidade provocante de Larissa.

Leo não sabia direito o que fazer com tanta informação (na verdade informação não era lá seu forte: na terceira série apresentava dificuldades ao decorar a tabuada do sete, no terceiro ano apresentava dificuldades ao diferenciar amor e desejo). Evidentemente, Leonardo precisava de ajuda, tanto no amor como em matemática.



Patrick acordou disposto (talvez essa seja a frase mais estranha dessa história) Lembrou-se daquele beijo: não do primeiro beijo com Jorge, mas sim do último, com Leonardo. Lembrou-se daquela sensação, dos lábios macios de Leo se encontrando com os seus: finos e indecisos. Lembrou-se do calor que sentira. Olhou em volta: havia um pouco de quarto em sua bagunça. Talvez fosse melhor colocar as coisas em ordem: Começou recolhendo as folhas sujas e amassadas sobre a cômoda, e seguiu com os copos vazios que se espalhavam pelo quarto. Descobriu atrás da cama uma folha de calendário amassada, um exemplar de “As flores do mal” e uma simpática lagartixa, que, devido ao livro, batizou de “Charles”. Tirou o pó da estatueta de Vênus, havia esquecido que era branca e não cinza. Embora motivado a arrumar as coisas, Patrick resistiu a abrir as janelas. Não estava preparado. Desceu as escadas carregando sacos cheios da sujeira que havia recolhido, e colocou-os na lixeira.

Não posso afirmar ao certo como Patrick deve ter se sentido ante aquela visão, mas deve no mínimo ter ficado um pouco surpreso:

–Olá, boa tarde. – Patrick não estava muito acostumado a pessoas o cumprimentando (talvez porque ele também não as cumprimentava) Então ficou sem saber o que dizer por alguns segundos. A moça que o cumprimentara resolveu o ajudar:

–Você é Patrick não é?

–Ahhhn... É. Boa tarde, sou eu sim. – Patrick limpou as mãos na calça, e estendeu para a desconhecida. Quase 1,80, blusa e saia de renda branca, pele dourada, olhos pretos e cabelos perfeitamente lisos. Com certeza ele se lembrou de algum filme de velho oeste.

–Prazer, Yara.

–Posso ajudar? – Ele parecia hesitante, mas tudo bem, se alguma índia desconhecida aparecesse na sua casa te chamando pelo nome, acredito que qualquer um ficaria.

–Na verdade sim. Sou uma grande amiga de Leonardo e vim visitar ele. Mas ele não tava em casa eu acho. Tudo bem se eu ficar aqui até ele voltar?

–Claro, pode sim. – Patrick soou o mais gentil possível. Mas estava cheio de dúvidas. – Pode subir, disse ele apontando a escada.

–Obrigada. – A índia o abraçou. Patrick achou esquisito, mas de alguma maneira gostou daquele abraço, era reconfortante.

–Wow, seu quarto é lindo. – Disse, admirando os desenhos que estavam expostos na parede.

–Deu sorte. – Ele respondeu. – Cinco minutos atrás tava mais parecido com Hiroshima pós-bombardeio, ou algo do gênero.

–Sei bem como é. E esse aqui, qual o nome dele? - A lagartixa havia subido pelo pé de Yara, e ela a pegou na mão.

–Ah, é o Charles, encontrei ele hoje debaixo da cama lendo Baudelaire. Quer algo para beber? Vinho? Virtude? Poesia? – Ele ofereceu, rindo.

–Acho que aceito um suco. – Yara riu e devolveu a lagartixa para o chão. E resolveu abrir as janelas.

–Quer dizer que Leonardo anda divulgando informações a meu respeito. – Disse Patrick enquanto retornava com um copo de suco. Patrick não se espantou ao ver as janelas abertas, talvez a luz não fosse de todo má.

–Ah, ele disse que tinha um amigo morando perto, e mandou uma foto sua e tal. Aí eu tive sorte de te ver na rua quando tava passando por aqui.

Foto? Que foto? Felizmente Patrick não perguntou, ia ser difícil arranjar uma desculpa sem parecer estranho. Visto que Patrick não tinha redes sociais, como Leonardo arranjaria uma foto dele?

–Ah sim. – Patrick limitou-se a responder. Mas estava meio desconfiado. - Vocês se conhecem faz muito?

–Ih, desde criança. Uma peste aquele menino, só sabia ficar de birra. Uma vez eu tava comendo chocolate e ele começou a chorar por que não quis dar pra ele. Meu chocolate, acredita? Mas é um amor, fazer o que.

Patrick riu. Deve ter imaginado Leonardo pequeno. Imaginou uma criança fofa com molinhas loiras na cabeça que brincava com os animais e contava piadas. A descrição de Yara era mais precisa: uma criança fofa, com molinhas loiras na cabeça, que brincava com animais, contava piadas e não podia aceitar um não como resposta.

–Gente, você curte Mawaca? – Yara exclamou, pegando um CD que estava em cima da cômoda, antes coberto pela poeira.

–Sim, música folk é legal.

–Eu amo isso. Tem coisas aqui que são inspiradas no povo da minha avó, os Kayapó do Xingu. Você tem bom gosto Patrick.

–A maioria das pessoas não acha. – ele respondeu

– Meu querido, se dependesse da opinião da maioria das pessoas eu moraria em cima de uma árvore e não saberia a diferença entre “mim” e “eu”.

Patrick riu dessa vez.

–Se dependesse da opinião da maioria das pessoas eu seria hétero. - Ele disse, Yara riu dessa vez.

–É, não é uma coisa para se importar, a maioria das pessoas. – Yara respondeu. – Agora eu preciso ir viu, se aquele menino não acordar eu acordo ele na marra. Mas dá uma chance pro Leo viu? Ele tem bom coração, pena que às vezes pensa com a barriga. Até mais viu, a gente se fala.

Patrick deve ter ficado imaginando o que “dar uma chance” queria dizer exatamente. Mas no fundo ele sabia. Talvez Yara tivesse razão, ele pensou, enquanto ela descia as escadas. Descia rápido demais. Alguns segundos e já havia saído da casa. Patrick achou tudo aquilo muito estranho, qual o sentido daquela visita? Leonardo teria mandado Yara investigá-lo? Ela não parecia uma espiã. Pelo contrário, Yara parecia alguém legal.

Garrafas vazias e pontas de cigarro se espalhavam pelo chão. Alguns cacos de vidro e dezenas de pedaços de copos de plástico jaziam a cada metro, aquele sim era o cenário de uma Hiroshima pós-bombardeio. Apenas um barulho rompia a tranqüilidade do que parecia ser um cemitério de copos vazios: o murmuro de Larissa.

Digamos que ela estava experimentando uma sensação parecida a de Leo, a mesma sensação experimentada por todos aqueles que esvaziam uma garrafa de vodka: ressaca.

–Ai. – Murmurava ela constantemente com um saco de gelo sobre a cabeça, enquanto se apoiava numa mesa perto da piscina.

–É você a Larissa? – Uma figura alta vestida de branco perguntava.

–Ai, fala baixo. Minha cabeça ta explodindo. – Queixou-se ela. - E aliás, como você conseguiu entrar, posso saber? – Larissa adorava ser grossa com os outros.

–Bem, o portão tava aberto... Eu imaginei que desse pra entrar.

–Aham, aham, fala logo o que foi? Esqueceu alguma coisa ontem?

–É, eu vou ser direta. Esse Leonardo Viera, um alto loiro de olho verde, ele veio nessa festa ontem?

–Veio sim, a gente ficou e tal, por que? – Larissa respondeu sonolenta, enquanto se levantava e esfregava as mãos nas bolsas roxas que tinham se formado sob seus olhos.

–Interessante, porque ele é MEU namorado. – Yara levantou a voz. Larissa fechou o rosto como se assim pudesse evitar o barulho.

–Ai garota, se enxerga, o Leo ta comigo. Quem é você alias? Nunca te vi lá na escola. Vai incomodar outra pessoa que não to boa agora.

–Bem, só to avisando pra ficar longe dele. Meu nome é Yara, prazer. – Yara ia se retirando, com Larissa não valia a pena negociar.

–Yara? Que nome ridículo. Vou deixar bem claro: Você não é ninguém, entendeu? - Larissa respondeu com arrogância. Yara virou os olhos. Não gostava muito de sair de si, mas algumas vezes as pessoas pediam. Foi só o tempo de estender o punho e Larissa já caia dentro da piscina.

–Água é muito bom pra bafo de cachaça. – Yara respondeu enquanto a garota espumava de raiva enquanto se debatia para chegar até a borda. – Larissa já não é um problema. Pensou Yara enquanto rumava para a casa de Leo.


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Notas finais do capítulo

e aí? Gostaram? Não se esqueçam de deixar reviews! até maiss.