My Master Camus escrita por Love


Capítulo 2
Melt the ice #1




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Os dois caminhavam pelo solo encoberto de neve da Sibéria, em direção ao vilarejo recluso localizado próximo ao local em que residiam. Os passos eram dificultados pela camada espessa de gelo, o qual parecia nunca derreter mesmo com o passar dos dias. Camus não fazia muito esforço para trilhar pelo contínuo obstáculo que se estendia sob seus pés. Já estava acostumado aos longos percursos que realizava semanalmente até o povoado para abastecer a modesta cabana onde vivia com seu discípulo, mas Hyoga não demonstrava a mesma facilidade.

Na verdade, era a primeira vez que o menino seguia seu mestre em suas idas ao lugar. Sua movimentação era lenta e sentia os pés afundarem gradativamente, obrigando-o a empenhar-se mais na jornada e tornando sua respiração ofegante. A possibilidade de pedir ajuda passou por sua mente mas logo a dispensou, seu pequeno orgulho de aspirante a cavaleiro superando a necessidade.

O ruivo se distanciava cada vez mais, sem dar-se conta da luta que o menor travava com a neve atrás de si. O loiro continuava tentando alcançá-lo, até que o suporte proveniente de suas pernas vacilaram e ele caiu. O aquariano percebeu que havia algo errado devido ao baixo som emitido e virou-se para observar o garoto, assustando-se ao ver a imagem de Hyoga imóvel e com o rosto no chão. Correu até seu lado e o ajudou a se levantar, também tirando o gelo que havia se acumulado em suas roupas e começado a derreter por conta do calor corporal da criança.

– Está tudo bem? - perguntou enquanto se levantava para encará-lo. Contemplou seu discípulo assentir e passou a mão enluvada pelo rosto, dissipando um suor imaginário. Criticava-se mentalmente por havê-lo deixado para trás sem ao menos questionar sua capacidade física de realizar algo que, para si, era simples.

– Precisa de ajuda?

O menor envergonhou-se e desviou o olhar para os próprios calçados, sem responder. Um cavaleiro de Atena não deveria precisar de ajuda para fazer algo tão simples como andar. Era embaraçoso apresentar fraqueza frente a algo que ele deveria dominar.

Foi rapidamente tirado de seus devaneios deploráveis quando o adulto esticou-lhe o braço para oferecer auxílio.

– Vamos.

O rubor proveniente do frio se intensificou em seu rosto por causa do gesto. Sem pensar duas vezes, enroscou os próprios dedos nos de Camus e ambos passaram a caminhar lado a lado. A velocidade com a que o mais velho se locomovia havia diminuído, mas era recompensador não ter que se preocupar em acabar esquecendo seu aluno para trás. E Hyoga passou o resto do trajeto imaginando como seria segurar a mão de seu mestre sem a divisão das luvas.

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– Posso pegar isso?

O adulto analisou o objeto para o qual seu aprendiz apontava, identificando uma barra de chocolate. Não aprovava muito o consumo deste tipo de alimento - calorias demais, sabor viciante -, mas talvez de vez em quando não fizesse mal. Fez que sim com a cabeça e enxergou Hyoga sorrir ao passo que transferia o pacote da prateleira à veste que carregava animadamente, dando pequenos saltos de felicidade pelo curto percurso. Verificou a lista que trazia consigo à procura de alguma necessidade ausente, constatando que não havia nada faltando. Dirigiu-se ao vendedor para pagar-lhe pelos produtos enquanto o loiro mirava o lado de fora pela grande janela do armazém. Camus precisou chamar a atenção do mais novo para que este o seguisse em direção à saída.

Ao depararem-se novamente com o ambiente frio, o ruivo decidiu ir a caminho de uma pequena livraria que ficava do outro lado, atravessando a horda de crianças que brincavam na praça circular onde, ao redor, encontravam-se as lojas do local. Antes de adentrar o estabelecimento, porem, constatou certa resistência por parte de seu pupilo, cujo olhar alternava-se entre ele e o amontoado de pirralhos que estavam ali perto.

– O que foi? - questionou arqueando uma sobrancelha.

Hyoga sentiu sua garganta fechar-se involuntariamente, no intuito de protegê-lo da iminente resposta que viria caso proferisse o pedido que tanto desejava. Permaneceu em silêncio, o que acendeu uma pequena faísca de irritação no mais velho. Crianças conseguiam ser mais difíceis de suportar que qualquer adversário que já havia enfrentado, principalmente quando tinha de descobrir os enigmas que estas eventualmente lhe apresentavam.

Levou os olhos em direção à algazarra que se instalava próxima aos dois e avistou os pequenos travando uma guerra de bola de neve. Não precisou de muito tempo para compreender o que o menor ao seu lado queria e pôs-se a decidir internamente se iria conceder-lhe sua aprovação. Cavaleiros não tinham tempo para perder em brincadeiras insignificantes, então aquele requerimento a si era esdrúxulo. Não obstante, aquele não era um dia de treinamento e talvez a melhor coisa para se desestressar uma criança fosse um pouco de entretenimento com outras, algo que Camus era incapaz de oferecer a ele.

– Pode ir, quando estiver de saída eu lhe chamarei - comunicou, meneando com a cabeça em direção ao que seu aluno tanto almejava.

O loiro sorriu, agradecendo ao seu mestre rapidamente e correu a caminho da promessa de diversão que parecia lhe seduzir à sua frente.


//

Em meio a inúmeras bolas de neve que pareciam voar de um lado para o outro, Hyoga encontrava-se formando uma pequena barreira na intenção de proteger a si e ao grupo que havia se juntado no jogo. Realizava sua tarefa arduosamente, como se aquilo fosse a coisa mais importante que faria na vida, e não percebeu a aproximação de uma menina da sua idade.

– Olá.

O rapaz assustou-se com a voz fina que surgiu repentinamente ao seu lado e deu um pequeno salto para trás, arregalando os olhos. A desconhecida ofendeu-se com sua reação, achando que o garoto a havia considerado feia e manifestou tal indignação por meio de uma careta irritada.

– O-oi... - cumprimentou-a após algum tempo juntando coragem, percebendo o mau humor da mesma se dissipar rapidamente.

– O que está fazendo? - indagou ela, apontando em direção à construção inacabada de Hyoga.

– Isso era... pra ser um forte.

A dúvida residia clara no rosto da jovem. Era bem expressiva, ele pensou, diferente de si mesmo que encontrava dificuldade para demonstrar suas emoções com qualquer pessoa da mesma forma que ela fazia.

– O que é um forte?

Parou um pouco para pensar em uma maneira de explicar aquilo, levando a mão ao queixo como fazia quando seu mestre lhe explicava algo e ele se empenhava em entender. Era praticamente a primeira vez que entrava em contato com uma criança normal - as do orfanato eram como ele, com inocências manchadas pelo destino - e Hyoga sabia que deveria tratá-la de forma diferente.

– É tipo... um lugar onde várias pessoas se protegem mas atacam ao mesmo tempo.

A menina sorriu em consentimento. Sentiu-se satisfeito e inteligente em conseguir explicar algo a alguém desconhecido e retornou o gesto. A garota perguntou seu nome e lhe informou o dela: Hanna. O loiro só então reparou nas características da mesma: olhos azuis, cabelos dourados, rosto arredondado com uma pele suave e bochechas rosáceas. Era bonita, mas não sentia nada com isso, ao contrário dela que enrubesceu por conta de seu olhar analisador sobre si.

Sentaram-se atrás do monumento incompleto do garoto e conversaram por um tempo sobre nada muito importante. Tiveram de se separar brevemente, pois um homem adulto chamou a menina de uma loja de brinquedos, que destacava-se entre as inúmeras outras ao redor por conta de suas cores chamativas. O pequeno observou a interação dos dois, o moço entregando uma boneca à criança, que em seguida lhe agradeceu com um abraço. Logo depois, este ajeitou o cachecol de Hanna e sussurrou algo em seu ouvido, indo em direção ao bazar adjacente. A menor retornou, exuberante com seu novo presente entre os braços e voltou a sentar-se ao lado de do rapaz.

– Aquele era o meu pai.

Hyoga não pôde conter a pontada de inveja que sentiu em seu peito ao ouvir tal frase. Ignorou à garota que pôs-se a olhar em volta, procurando algo, e se encontrou perdido em perturbações internas.

– Cadê o seu? - perguntou inocentemente.

O menino, abalado com a pergunta, fingiu-se de desentendido.

– O meu o que?

– O seu pai, ué.

Sentiu seu corpo estremecer, e não era por conta do frio. Afundou os dedos na neve abaixo de si e os apertou, procurando amenizar a vergonha que o acometia por não possuir ou jamais ter conhecido tal parente.

– ... Eu não tenho pai.

Hanna curvou uma sobrancelha.

– Então cadê sua mãe?

O jovem engoliu em seco. Aquela garota estava conseguindo fazer com que suas maiores preocupações aflorassem e fizessem com que seu coração batesse mais rápido devido ao desespero crescente.

– Ela morreu - sussurrou tão baixo que sua colega teve de fazer esforço para escutá-lo.

A menina espantou-se com tal afirmação e arregalou seus orbes azulados. Aquilo não fazia sentido para ela pois todos seus amigos tinham pais, e agora aparece essa criança estranha dizendo que não possuía nenhum dos dois.

– Mas então você mora sozinho?

Invocou a imagem de Camus instantaneamente em sua mente e conseguiu se acalmar. Esperou sua respiração esbaforida lentamente voltar ao normal, até que conseguiu responder.

– Não, eu moro com o meu mestre.

E realmente essa noção lhe transmitia segurança mais do que qualquer outra coisa.

– Como assim mestre?

– Alguém que te ensina o que ele sabe e que você precise aprender - replicou, já irritado pela exposição desnecessária de sua vida pessoal.

Hanna não parou por ali, um novo conceito formando-se em sua inocente mente infantil, algo que sentia necessidade de compartilhar com o menino cabisbaixo ao seu lado.

– Seu mestre cuida de você?

– ... Sim.

– Ele te deixa feliz?

Hyoga relembrou as poucas porem preciosas demonstrações de afeto que o aquariano lhe dirigia. Estimava tais atos e lembranças, guardando-os em seu coração junto às memórias de sua mãe como o que tinha de mais precioso, coisas nas quais deveria pensar para dissolver qualquer tipo de tristeza. Lembrou-se das permissões concedidas para comprar chocolate e ir brincar; do calor que suas mãos lhe transferiram quando o ajudaram a andar pela neve naquele dia, ou quando as mesmas afagavam suas mexas loiras sempre que conseguia executar algum golpe com sucesso; de como ele sempre ia ao seu quarto desejar-lhe um breve boa noite. Tudo isso se misturava e produzia no jobem sensações de felicidade em diferentes níveis.

– Sim.

A loira sorriu, chegando a uma conclusão.

– Então ele é seu pai. Pode não ser seu pai de verdade, mas é seu pai de consideração, e isso também é legal! - contestou sorridente, abraçando-se mais à boneca em seus braços.

De fato, uma boa ideia. Estaria mentindo se dissesse que não havia visto Camus dessa forma antes, mas sabia que o mesmo desaprovaria tal consideração para com ele. "Quanto menos laços formados com os outros, melhor" conseguia ouvir a voz do maior retumbando em sua mente, discursando as mesmas palavras de sempre. Mas seu professor não precisava saber como se sentia em relação a ele, assim não o repreenderia. Poderia ser seu pequeno segredo, algo que diria respeito apenas a si mesmo e não afetaria ninguém à sua volta. Um conhecimento criado com base em suas percepções e que não era de todo verdade, mas poderia sê-la na realidade que escolheria.

Sim, era uma ótima ideia, uma que consideraria mais tarde.

– Talvez você esteja certa - disse, seus lábios curvando-se inconscientemente em um sorriso quase imperceptível.

Hanna contentou-se com a conquista em fazer o rapaz sentir-se melhor e começou a rir para si mesma.

– Quer ver uma das coisas que eu aprendi com ele? - Hyoga ofereceu repentinamente. A menina havia se mostrado digna de receber uma demonstração das coisas incríveis que podia produzir, e ele queria dar-lhe uma recompensa por fazê-lo ter uma visão diferente acerca das coisas. - Mas é segredo, então não pode contar pra ninguém.

– Claro.

Os dois se levantaram e foram em direção a um lugar mais reservado porém não muito distante.


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Notas finais do capítulo

acho que esse saiu com menos erros porque dessa vez eu prestei atenção nos sublinhados vermelhos, hue. xau



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