Zorak, Vingança escrita por Semideusa


Capítulo 9
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Porque metade de mim é abrigo, a outra metade é cansaço.
— Oswaldo Montenegro



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Minhas penas estão molhadas, minhas asas e costas cansadas. Estou voando a um bom tempo e sinto frio até os ossos. O beco está logo abaixo. Vai ser mais difícil voltar sem ser vista. Se Amra me vir, ai sim vai ficar desconfiado. Eu não devia ter saído pra início de conversa. Desço em diagonal para o beco e dou uns passos ainda com a energia da descida. Estou cada vez melhor nisso. Retraio minhas asas. Empurro a porta ainda aberta. Ela range. São no mínimo três da manhã e temos que sair as sete. Ando pelo corredor. O silêncio é opressor. Minha porta é quase no final do corredor, a antepenúltima. Chego até ela sem ser pega. Abro a porta. Maby está sentada e levanta o olhar das mãos para mim.

– Onde você esteve?

Sento na beliche e começo a contar tudo para ela, desde conversa entre Amra e Hefrom até a hora em que desci no beco. Estou agora morrendo de sono, Maby tem os olhos vermelhos que, provavelmente eu também tenho. Meus cabelos estão semi secos e os dela muito amassados. Me irrito e enrolo minhas madeixas novamente. Quando termino de dizer tudo, ela tem uma única declaração:

– Você deve estar louca!

– Maby, você não entende! Eu não conseguia aguentar...

– Zora, Zora cala a boca! – ela fala alto e eu silencio – Zora, papai já está perdido, como você acha que eu me sentiria se te pegassem? Aquele monstro continua por ai, fora os outros dikes. Como você acha que eu me sentiria? Se descobrem seu segredo... poderia ser pior que a morte Zora...

Ela começa a chorar, sem escândalo, sem som, apenas lágrimas como sempre fez e vira o rosto. As fadas não choram, não tem lágrimas e Maby não gosta de ser vista chorar.

– Maby, irmã, não chora.

– Não estou chorando!

– Não, você nunca está não é? – falo com zomba, mas ainda confortadoramente – tudo bem Maby, não faço mais, ok?

Ela apenas acena, limpando a bochecha com as costas da mão.

– Agora vamos dormir, que você está com os olhos vermelhos e eu muito cansada. Minhas asas doem. Vamos.

Desço da cama de cima e vou para a minha cama por esta noite. Durmo um sono sem sonhos.

É de manhã. Eu simplesmente desabei noite passada, mas não dormi o suficiente e, por minha culpa, Maby também não. Quando um dos gêmeos, provavelmente Hefrom, o mais esperto, perguntou o que aconteceu, apenas respondemos que estamos preocupadas, o que não deixa de ser verdade. Acordamos as oito, atrasadas na verdade, mas desta vez nos alimentamos. Alimentamos também Fúria e Cavalo e os rapazes alimentaram os cavalos deles. Estamos indo de volta a Cratem, cavalgando devagar para não cansar os cavalos nem a nós mesmos caso haja batalha. Agora, não sei o que vai acontecer. Ah, deuses! O que as nornas[1] tem preparado para mim? Primeiro as asas. Quem tem asas? E, bem disse meu pai: “O mundo gira em harmonia e não há dadva que não venha acompanhada de uma maldição.” Mas por que, eu me pergunto, minha maldição tinha que ser tão grande. Por que Ormire quer justo a mim?

Chegamos na aldeia. As pessoas, normalmente alegres, estão caladas. Elas erguem os olhos e quando nos veem, andam apressadas para sair do caminho, cães assustados. Alguns, a maioria homens, nos dirigem olhares de ódio, mas o que mais me incomoda, são os olhares de piedade. Desço do Fúria, acaricio-lhe o focinho e atrelo a corda a uma barra em frente a livraria da Cile. Os outros me acompanham. Entro na loja.

– Cile!

Quem chama? – ela cantarola como sempre.

– Oi Cil...

– Não! – ela me interrompe - você não deveria ter vindo! Nem você! – aponta para Maby – Nem.... quem são vocês?

É Maby quem responde.

– Estes são os gêmeos Zach e Hefrom e Amra de Starmith. Vieram lutar para...

– Shhhhhhhh.... – ela interrompe mais uma vez – Não podemos conversar aqui. Venham.

Ela nos leva para uma escada que dá para o abrigo que a maioria das casas tem. Acende as lamparinas. Ainda sim tudo está mofado e abafado. Nos sentamos a mesa e Cile dá início.

– As pessoas que as viram agora e as ignoraram, fizeram um favor! Depois que vocês fugiram...

– Nós não fugimos! – Maby interrompe.

– Eu não as culpo. Eu também teria fugido, mas não acredito que teria voltado. Bem, depois que vocês... se foram... Ormire voltou e trazia homens estranhos e alguns dikes com ele. Ofereceu um prêmio pela cabeça de vocês... queria Zora viva, mas não falou nada sobre você. – acenou a cabeça na direção da minha irmã – Ele falou também, que quem as ajudasse, teria um destino pior que a morte... Disse que colocaria homens aqui, e que todos, a partir daquele momento, pertenciam a ele.

– Então, você está se arriscando por elas. Por que?

Pergunta Hefrom, o mais inoportuno. Lanço um olhar feio para ele.

– Porque – diz ela – elas salvaram minha mãe.

– O que eu não entendo, - fala pensativo Amra – é por que ele não escolheu uma princesa para ser “rainha”

Todos o olham confusos então Zach, que anda muito calado complementa.

– O que ele quer dizer, é por que ele não escolheu uma donzela indefesa...

– Mas eu sou uma donzela! – me ofendo.

– Mas não é indefesa.

Todos acenam em concordância.

– Eu vou aceitar como um elogio.

Digo, mas não sei bem ao certo. Os gêmeos levantam e começam a andar de um lado para o outro, já não sei mais quem é quem.

– O ponto é – diz um.

– O que ele quer com você? Por que você e não qualquer outra? – completa o outro.

Todos se entreolham. Nem eu nem ninguém tem resposta para essa pergunta que eu mesma já me fiz várias vezes. Não sei se o plano vai funcionar. Maby foi contra, mas já era de se esperar já que eu sou a isca. Já devem ser nove da manhã.

– Cile, você tem que avisar a alguém que eu e Maby estamos aqui.

– Como assim, Zora? Você acha que mais alguém precisa saber que estão aqui? As pessoas não são de confiança.

– Se tivessem que me denunciar, já o teriam feito. Eu não cheguei escondida. E sim. Eu precisamos, justamente, que Ormire saiba que estou aqui.

– O que? Está maluca? – ela levanta da cadeira e olha para os outros – Vão deixar ela fazer isso?

Eles apenas abaixam a cabeça. Ela continua.

– Eu não acredito... achei que você fosse melhor que isso Maby, deixar sua irmã se sacrificar...

– Não, Cile. – eu a corto no meio da frase – Maby não tem culpa, nem os rapazes. Essa foi uma ideia de todos nós, Maby não concordou com isso, eu me ofereci. Nós temos um plano.

Ela para. Pensa um instante. Nos olha. Faz careta.

– Ok. Eu ajudo.

[1] Deusas nórdicas do destino: Urd, Verdandi e Skuld.


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Notas finais do capítulo

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