Fantasmas escrita por Odette Swan


Capítulo 3
Tropeçando Nos Próprios Pés


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Quero agradecer à quem está acompanhando e quem favoritou a história, e aos comentários.
Espero que gostem, até chorei escrevendo esse capítulo :'(

Boa leitura!



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Às vezes as marcas que deixamos para traz, acabam criando outras, que nos perseguirão sem pestanejar. Às vezes quando deixamos algo, achando que podemos recomeçar, sem que os fantasmas voltem, estamos redondamente enganados. O que foi abandonado, de alguma forma ainda está lá, não vai simplesmente desaparecer como se nunca tivesse existido. Aquilo que abandonamos para partir em busca de novas perspectivas, pode voltar, mesmo que você não queira, sempre vai voltar, nos momentos em que menos esperar.

Enquanto voltava de táxi para casa, Jonathan Morinson ainda tentava absorver o que tinha acontecido com Harriet. Enquanto dava o depoimento à polícia, sua mente indagava-se, o modo como a encontrou, o simples fato de não poder mais ter as longas e agradáveis conversas, de não poder mais ser seu ombro amigo quando precisasse. Harriet e Jonathan eram amigos há muito tempo, ele já até havia lhe dado algumas de suas aulas de jazz, a qual Harriet chamava de instigante.

No dia do enterro, o sofrimento de Jonathan foi maior ainda, era o último adeus que daria a Harriet. Algumas coisas são difíceis de dizer ou de aceitar, mas as pessoas não partem sem deixar suas marcas, marcas essas que irão fazer com que se lembrem do seu ser da melhor forma possível.

Passaram-se três dias, Jonathan e sua amiga Margaret, uma professora de música, foram a um café perto de onde trabalhavam, eles precisavam esfriar a cabeça um pouco.

–Você está bem? Digo, em relação aos últimos dias.- Perguntou Margaret, e Jonathan, que estava cabisbaixo segurando seu capuchino, ergueu o olhar para respondê-la.

–Mais ou menos.- Suspirou.- Ainda é difícil acreditar que Harriet se foi assim.- Lamentou.

–É eu sei.- Murmurou.

–É melhor mudarmos de assunto.

–É.- Houve silêncio por alguns segundos.- Então...ouvi dizer que sua irmã está na cidade.

–Não quero falar sobre isso.- Falou desviando o olhar.

–Pensei que já tivessem se acertado.

–Não exatamente.

–Vocês se desentenderam de novo?- Ele deu um longo suspiro jogando a cabeça para traz, depois voltando a encarar Maragaret.

–Não temos nos falado bem, principalmente depois do que aconteceu há alguns meses.

–Como você está em relação a isso?

–Estou tentando conviver com o que aconteceu...mas, é tão difícil. É como se tudo fosse culpa minha.

–Jonathan.- O repreendeu.- Você não tem culpa de nada.- Segurou sua mão com delicadeza.- O que aconteceu foi porque tinha que acontecer, não tinha nada que você pudesse fazer.

–Foi culpa minha Margaret.- Se lamentou.- Quando mais precisavam de mim, onde eu estava? Aqui, longe deles. Eu os abandonei, e veja o que aconteceu.

–Você não vai poder se martirizar pelo resto da vida.- Conselhos? Que interessante.- Me desculpe, eu tenho que ir agora, estou atrasada.- Disse olhando em seu relógio.- Um velho amigo me pediu para tocar pra ele, faço isso toda semana.

–Ah, tudo bem.

–E Jonathan.- Falou enquanto se levantava.- Acho que realmente deveria se acertar com Joanne, ela só tem você.- Disse e foi embora. Jonathan foi logo em seguida.

Chegando em casa se jogou no sofá, queria descansar um pouco, a noite ainda iria para a academia ensaiar um pouco. Ele adorava passar todo o tempo que fosse fazendo aquilo que amava, mas como tudo tem um preço, no final de cada dia não podia deixar de pensar nos sacrifícios que teve que fazer para chegar aonde chegou.

Ligou a TV e fechou os olhos, as palavras de Margaret vinham em mente o fazendo repensar tudo o que tinha acontecido nos últimos anos. É claro que não era a primeira vez que seus fantasmas o visitavam, mas talvez agora, suas assombrações e a conversa com Margaret o estavam fazendo pensar mais.

"Dez anos antes

Mas nem pensar que você vai para Nova Iorque!- Dizia a mulher nervosa.

–O quê?! Você enlouqueceu? É uma grande oportunidade, deveria ter orgulho de mim.

–O que está acontecendo aqui?- Perguntou o homem entrando na sala.

–Richard diga ao seu filho que ele não pode ir morar em Nova Iorque.

–Como?

–Pai, eu recebi uma carta de uma das melhores faculdades de dança do país me oferecendo uma bolsa, e as aulas começam no próximo semestre, se eu não me apresentar perco minha vaga.

–Jonathan, você não pode tomar esse tipo de decisão assim, e, além disso, precisamos de você aqui.- Disse o pai.

–Fora que não temos dinheiro para essa viajem.

–Eu posso pagar a viajem com minhas economias, e vocês não precisam de mim aqui. E eu já tenho dezoito anos, sei tomar minhas próprias decisões.

–Você não vai.

–Não pode me impedir.- Disse isso e saiu, se trancando em seu quarto. Alguns minutos depois alguém bate na porta e entra.

–Jonathan?

–Saia daqui Joanne.

–Eu só quero conversar.- Ele a encarava com raiva.

–Veio me dar mais sermão?

–Não.- Respondeu se sentando na cama ao seu lado.- Não acha que já tivemos muita briga nos últimos anos?

–Diga isso a eles.

–Jonathan, nós precisamos de você, o pai precisa de você para ajudá-lo no trabalho, sabe que ele não está bem.

–E o meu futuro?

–Você já faz um bom curso de dança, e pode arrumar uma faculdade mais perto de casa.

–Joanne você não entende? Oportunidades como essa não aparecem duas vezes.

–Jonathan.- Suplicou.

–Já chega. Não quero mais falar sobre isso com você.- Se levantou indo até a porta, a abrindo.- Agora saia daqui.

–Você não sabe como magoa sua família.- Disse saindo.

Duas semanas se passaram, Jonathan estava decidido, nada o pararia. Mesmo com as súplicas de sua irmã e os protestos de seus pais, ele partiu sem olhar pra trás."

Já eram seis e meia, Jonathan havia acabado de chegar à academia. Ele ensaiou durante duas horas e depois parou para descansar. Sentado no chão com o celular em mãos, seus olhos se fixavam no nome de sua irmã que via na tela. Deveria ligar? Suas duras palavras ainda o machucavam, o machucavam ainda mais por serem a verdade, e distância de tantos anos não ajudava em nada.

"Oito anos antes

–Alô?

–Jonathan.

–O que você quer agora Joanne? Não estou afim de discutir hoje...espera, você está chorando?

–Jonathan é o pai.- Dizia ainda chorando.

–O que aconteceu?...Joanne?

–Ele morreu.

–O quê?

–Jonathan eu não quero atrapalhar a sua vida, mas precisamos de você aqui, o mais rápido possível.

–Ta, tudo bem, eu vou pegar o primeiro vôo.

–Jonathan foi para sua cidade natal o mais rápido que pôde. Durante o enterro ele estava estático, não derramou uma lágrima sequer durante o dia todo, sua mãe o encarava com desgosto, Joanne também não estava muito contente com o irmão. Depois do enterro todos foram para casa.

–Mãe?- Chamou-a se sentando ao seu lado no sofá.

–Por que não estava aqui quando precisamos de você?

–Você sabe que eu tenho muitos compromissos, não posso largá-los desse jeito.

–Ele era seu pai! Mesmo que você não estivesse aqui para apoiá-lo quando foi diagnosticado com câncer, tudo o que ele queria era ver o rosto do filho uma última vez. Mas você deu mais importância a outras coisas antes de sua família.

–Mãe...

–Saia daqui, preciso descansar.- Jonathan se levantou cabisbaixo e foi até a cozinha, onde estava Joanne sentada a mesa, ele sentou-se ao seu lado.

–Tem idéia de como foi difícil nos últimos dias? Tem idéia de como foi difícil pra ele saber que poderia partir antes de ver você?- O encarou com raiva.

–Não pensei que isso poderia acontecer.

–Você nunca pensa em nada. Sua família precisava de você.

–Joanne...me perdoa.

–Não posso.- Disse se levantando."

Sua consciência pesava mais do que tudo, ele encostou a cabeça na parede e algumas lágrimas começaram a escorrer. Como ele pôde abandonar sua família? Como pôde ficar longe quando deveria estar perto?

"Alguns meses antes

–Mas que droga Jonathan! Tudo o que estamos pedindo é que venha passar o Natal com sua família!

–Joanne, eu já disse que não posso.

–Ótimo, abandone sua família, afinal é isso o que você faz de melhor, e é apenas isso que tem feito nos últimos anos.

–Mas que dro...- Respirou fundo.- Vou ver o que posso fazer.

–Ótimo, se você não vier, não será surpresa nenhuma.

–Joanne...

–Cansei dessa conversa, te vejo no final de semana, TALVEZ.- Desligou o telefone sem dizer mais nada.

...

–Oi.- Disse escorado na porta.

–Achei que não viria.

–Eu disse que ia ver. Onde está a mãe?- Perguntou já entrando.

–Na cozinha.

–Mãe?- Chamou entrando na cozinha.

–Jonathan.- Falou indo abraçá-lo.- Que bom que veio. Quer comer alguma coisa?- Perguntou se afastando.

–Não estou com fome agora.- Ela assentiu.

–Pode por suas coisas no seu antigo quarto.- Ele assentiu e subiu. Terminou de arrumar suas coisas e voltou para a sala.

O final de semana foi mais tranqüilo que o esperado, o Natal com a família reunida foi agradável, mas o bom clima logo sumiria no dia seguinte.

–Tem mesmo que ir embora amanhã?- Perguntou a mãe.

–Sim.- Respondeu simplesmente.

–Poderia ficar até o Ano Novo.

–Mãe eu já disse que não posso. Com licença, tenho que chegar uns emails.- Disse e saiu para seu quarto.

–Eu vou falar com ele.- Disse Joanne segurando a mão da mãe e em seguida indo atrás de Jonathan.

–Jonathan.

–Não estou a fim de ouvir sermão Joanne.- Respondeu com os olhos fixos no laptop.

–Não vim te dar sermão.- Falou ríspida fechando o laptop de Jonathan.- A sua família sente falta de você. Faz muito tempo que não passa uns dias com a gente. A mãe precisa de você, de nós, é só o que ela tem.

–Joanne...

–Não Jonathan! Estou cansada de ouvir sempre a mesma história, você pode muito bem adiar seus compromissos por uns dias para ficar com sua família! Mas você não liga pra nada.

–Você não pode me dizer o que fazer da minha vida! Essa casa sempre foi um inferno, não tinha um dia em que não houvesse discussão!

–Como se você não soubesse o porquê.

–Falou a "Santa".

–Eu sei que já errei, mas eu sempre fiz por onde ter o carinho dos nossos pais, você só liga pra si mesmo. O pai morreu triste por sua causa!- Um silêncio desagradável tomou conta do lugar por alguns segundos.

–Nunca mais diga isso.

–Você sabe que é verdade. Você nunca está quando precisamos de você. A única coisa que ele queria era te ver nos últimos dias de vida, mas você preferiu ficar na sua droga de trabalho!

–Já chega! Vou embora daqui agora.- Sem pensar duas vezes, Jonathan jogou suas coisas de qualquer jeito na mala e desceu as escadas.

–Jonathan volte aqui!- Joanne segurou seu braço com toda força que pôde assim que chegaram na sala.

–Me larga!

–O que está acontecendo?- Perguntou a mãe aflita.- Jonathan, filho.- Chamou segurando seu rosto.

–Me deixem em paz.- Disse se soltando.

–Jonathan.

–Deixe ele ir. Ele não se importa com ninguém.- Falou com os olhos lacrimejados.

–Eu não me importo com ninguém? Vocês nunca ligaram para nada do que eu faço!

–Você é um egoísta que não merece a família que tem!

–Eu te odeio Joanne!- Algumas lágrimas escorreram pelo rosto de Joanne.

–Parem de brigar!- Suplicou a mãe.

–Ótimo. Vá embora daqui, não precisamos de alguém como você.- Respondeu com desgosto. Jonathan começou a caminhar em direção a porta.

–Filho.

–Não mãe.- Disse Joanne a segurando tentando acalmá-la.- Mãe?- A mulher colocou a mão no peito e começou a fraquejar, até que desmaiou.

–Mãe?!- Chamou desesperado indo em sua direção.

–Mãe acorda.- Pedia Joanne chorando. Os dois a chamavam em vão.

...

As lágrimas que estavam presas desde o enterro do pai, vieram com tudo no enterro da mãe, a dor e a culpa o tomaram por completo. Durante o velório não trocou uma palavra sequer com ninguém, depois de algumas pessoas irem embora, estavam apenas ele, Joanne, dois tios e uma tia. Apesar do peso que carregava, sabia o que tinha que fazer, mesmo que não desse certo.

–Joanne.- Disse se aproximando da moça sentada no sofá, que se levantou assim que o viu. O olhar de raiva de Joanne compenetrou a alma de Jonathan, seguido por um forte tapa no rosto, mais algumas lágrimas escorreram pelo rosto dele.

–Foi sua culpa. Sua culpa!

–Joanne...

–Eu não quero ouvir nada do que tem a dizer.

–Joanne por favor, me perdoa.

–Não! Eu nunca vou te perdoar, por nada do que você fez nos últimos anos!

–O que está acontecendo?

–Nada tio.- Disse enxugando algumas lágrimas.- É só que Jonathan já estava de saída.

–Joanne, vamos conversar.- Implorou.

–Não tenho nada para conversar com você.

–Ei, vocês são irmãos, não podem ficar assim, precisam um do outro.

–Ele não é meu irmão.- Respondeu fria. Aquilo atingiu Jonathan como um golpe, o golpe mais forte que poderia ser dado em alguém, pior que um soco no estômago ou um golpe de espada."

Jonathan estava encolhido na parede enquanto chorava desamparado. De repente sentiu uma mão tocar seu ombro e viu alguém se agachar a sua frente, ele ergueu o rosto e mal pôde acreditar no que viu. A moça sorria para ele enquanto enxugava suas lágrimas.

–Sentiu minha falta?

–Você não imagina como.- A abraçou forte.- O que está fazendo aqui?

–Eu encontrei com sua amiga Margaret, ela me disse que você não estava nada bem, não podia te deixar assim.

–Pensei que me odiasse.

–Acho que já está na hora de acabarmos com isso, antes que seja tarde.

–Joanne, me perdoa?- Implorou com a voz embargada. Ela apenas assentiu sorrindo e o abraçou novamente, dessa vez mais forte e com algumas lágrimas escorrendo, assim como ele.

–Eu te amo Jonathan.- Declarou baixo fechando os olhos.

–Também te amo Joanne.

Talvez não seja tarde para nos redimirmos, talvez não seja tarde para expulsar os fantasmas que te trazem agonia dia após dia, só depende de nós, antes que seja tarde. Pois quando for tarde demais, os fantasmas que te assombram, virão te buscar, e a dor agonizante do passado voltará com tudo, o fazendo sofrer como nunca sofreu antes, e você passará a eternidade com os fantasmas gritando incansavelmente em seus ouvidos.


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Notas finais do capítulo

Até o/



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