O Colar do Parvo escrita por Marko Koell


Capítulo 55
Um amigo retorna




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Acordamos com uma suave camada de orvalho sobre cobertores que, nossos pais, haviam posto em nós durante a noite. Ali sentado, nos vigiando estava Marcelo, fumando um cachimbo e estava muito pensativo. Enquanto os outros acordavam, e após dar um bom dia para o Matheus, eu levantei e fui até ele.

– Bom dia Marcelo. – eu disse ainda esfregando os olhos.

– Bom dia, garoto! Espero que não esteja com dor no corpo. Lá dentro, não foi muito agradável, e acabamos por decidir não acordar vocês, por isso acordaram do lado de fora.

– O que houve? – eu perguntou aflito.

– Kauvirno simplesmente surtou, isso foi o que houve! Nós tivemos uma briga feia, assim que chegamos da caçada, ele queria ir até a mansão para ver como as coisas estavam por lá. Obviamente eu não permitir que ele fizesse isso, pois alguém poderia estar lá, vigiando a chegada de alguém. Não estou sendo parecido com ele, mas isso sim seria muito arriscado.

– E então? O que deu no final da briga?

– Eu levei um soco no estomago e ele esta com os olhos roxos, nada de muito sério.

– Não é o momento para brigas... vocês agiram como crianças...

– Por favor, Kayo, eu não vou receber criticas de um garoto da sua idade, no entanto, eu devo admitir que realmente foi algo muito infantil. – eu deu uma longa tragada no cachimbo e pareceu bastante emotivo.

“Infelizmente Kauvirno é muito pretensioso para admitir certas coisas, muitas vezes devemos ouvi-lo por sua sabedoria, no entanto julga-se astuto o suficiente para não nos ouvir. Um grande homem é Kauvirno, uma pessoa realmente maravilhosa.”

Era realmente uma pergunta que vinha me perturbando há tempos, e nunca a fiz porque não houve oportunidade, esse era o momento.

– Você e Kauvirno são...

– Não! - me interrompeu Marcelo rindo – Não somos amantes, se é o que pensa... porque todos pensam isso? Só porque nos amamos? O amor vai alem da carne, alem da alma, e algo que não se entende, mesmo você sendo um bom conhecedor dele. Temos um amor diferente do seu pelo jovem Matheus, ou pelos seus pais, ou o amor que você sente por seus amigos... é algo mais... como eu posso dizer... algo mais complexo.

Eu tentei naquelas palavras entender o que poderia ser, mas como eu nunca fui muito bom para entender coisas complexas, eu resolvi mudar o assunto. Eu deixei Marcelo ali sentado na grama, fumando seu cachimbo e fui ate Matheus e os outros. Nossos pais e minha tia, Camila e Tereza chegaram com cestas com frutas, comemos e passamos uma manhã agradável.

Logo depois de almoçarmos um coelho assado numa fogueira que montamos rapidamente, eu resolvi treinar um pouco. Eu tinha que criar mais laços com os meus elementais e hoje, por mais que eu tentasse trazê-los, eu não conseguia, nem mesmo com a ajuda do colar, eu conseguia trazer o que eu conseguia com mais facilidade, o meu soldado de fogo.

Obviamente que perguntas me vieram a mente, mas de certa forma eu sabia o porque de não conseguir. Eu estava com medo, e ansioso por noticias de Kauvirno, a preocupação também era algo que estava ajudando muito para criar esse certo conflito.

Nos instantes que se seguiram após, uma fina chuva no final da tarde, estávamos todos conversando sobre o que fazer agora que, não tínhamos aonde ir, e ficar ali no Campo de Hayanna não seria muito seguro, pelo menos não por muito tempo.

Marcelo pediu aos pais de Sara e de Mario que dessem uma volta em torno do campo, para garantir que estava tudo tranqüilo. Enquanto isso, os pais de Eduardo estava sentados, no centro do campo, conversando. Minha tia, meus pais, Camila e Tereza,conversavam num canto da sala aos pé de ouvindo, discutindo sobre o que fazer. Eu, Matheus, e os outros estávamos apenas sentados, calados esperando que alguém tomasse alguma decisão, foi quando Marcelo chegou, e minha falou com ele.

– Marcelo, estamos decidindo o que vamos fazer... para onde ir... mas não temos muitas opções.

– Todas se esgotaram, minha cara, eu também não tenho idéias.

– Gente, impossível Kauvirno ter saído assim, da maneira como saiu, e não ter deixado nada para ser feito... não é o feitio dele... – dizia Adrian.

– Sim, realmente não faz, no entanto ele o fez. – falou Marcelo, sentando na cadeira, desolado.

– Kauvirno não devia ter ido, e se ele encontrar alguma coisa? Como poderá resolver o problema sozinho? – disse minha tia.

– Kau é esperto, e tem uma astucia fora de controle, nunca duvidem de seus feitos... – disse Marcelo.

– Que seja, Marcelo, Kauvirno é o líder dessa ordem que nem mesmo nome tem. Retirou o nome A Limine e se julga incapaz de dar outro nome a nós. A verdade é que nos perdemos em meio a tantos encontros e desencontros, e as grandes desconfianças de Kauvirno. – disse meu pai.

– Acalma-se homem, Kauvirno salvou vidas, mesmo tendo seus defeitos.

– Não me refiro a isso, Marcelo, me refiro a outros fatos decorrentes de sua mania de dizer que tudo seria arriscado, o nosso maior erro foi se esconder, e aceitar a maneira como ele sempre pensou. Nós ficamos dois anos, praticamente escondidos, e enquanto eles se armaram e arrumaram aliados, nós... nós o que conseguimos com tanta espera?

– Não vou julgar a forma como Kauvirno trabalhou durante todos esses anos, em proteção a ordem, e ao Colar do Parvo, e por seqüência, de Kayo, Matheus e sua família, e aos outros que seguiram depois. Kauvirno sabe o que faz, então não vou discutir mais sobre isso.

Eu senti naquele momento que os nervos de todos estavam quase explodindo. Meu pai acabou saindo da sala, onde todos nós estávamos, dizendo precisar tomar um ar fresco, enquanto Marcelo acendeu o cachimbo e começou a tragar, um delicado cheiro de menta subiu no ambiente.

– E o que vamos fazer? Hayanna protege esse campo, mas vai que ela sucumba ao poder de Átimos... – disse Tereza – Não podemos ficar muito tempo aqui.

– Nós podíamos pedir a Gayon para nos levar para algum seguro. – disse Sara.

– Ele não faria isso, não pode se meter nessa guerra. – eu disse.

– Mas eu me lembro que ele havia dito que poderia nos ajudar, de diversas formas.

– Sim, Sara, ele disse. No entanto não sei se esse tipo de ajuda era o que ele mencionou.

– Não custa tentar... – disse Mario.

– Marcelo, não me lembro se meu tio tinha alguma outra casa... algum outro esconderijo.

– Sim, Nathan, existe mais um, mas já esta sendo ocupado.

– Porque quem? – perguntou Eduardo.

– Pelos meus pais. – disse Matheus.

– Não estão propondo irmos todos até lá? – eu perguntei, já demonstrando minha total insatisfação.

– É o único lugar seguro. – disse Marcelo – Pelo menos eu tenho a certeza de que Kauvirno poderá nos encontrar lá.

– O problema não é esse Marcelo, a casa onde meus pais estão é na praia, é uma casa pequena, somos muitos, não vamos caber todos lá.

Eu fiquei pensativo quando Matheus disse isso... era como se ele soubesse de algo que eu não sabia.

Marcelo passou a mão queixo, pensativo.

– Bem, poderemos acertar algumas coisas. Os Soberanus sabem que existem mais na antiga A Limine, no entanto não sabe quem são eles. Talvez eu, acho que seja a hora de Mario, Sara e Eduardo, e seus pais voltarem para Assis.

– Mas queremos lutar. – disse Eduardo.

– Eu sei que todos querem isso, mas a coisa ganhou uma proporção muito grande. Não sou sábio como Kauvirno para saber se é a melhor solução para o problema, no entanto é o que me parece mais sensato. E creio seus pais sabem que isso é o melhor a se fazer.

Marcelo estava estranho desde manhã, quando conversei com ele no centro do campo. Eu não sabia dizer o porque, mais existia algo nele, o que deixava temente a Kauvirno. Todos nós sabíamos que Kauvirno era o mandante da ordem, e que todos ao aceitar estar ali, deveria respeitar e acatar as decisões que Kauvirno desse, mesmo essa, sendo contra a nossa vontade. Sabiamos que Kau tinha determinados dons, muitas vezes não sabíamos exatamente qual, mas mesmo assim, sabíamos que estavam lá, escondidos, ou talvez não tínhamos a capacidade de conseguir ver. Independente de qualquer coisa, sempre acreditávamos nele, e se achássemos que poderíamos fazer algo sem ele, isso acabou por terra nesse momento. Estávamos presos em Hayanna, e a maior preocupação era se ela poderia nos ajudar, nos manter ali, salvos de qualquer ataque.

– Não podemos esquecer que Hayanna, a moça de pedra que aparece no portão do campo, é apenas uma imagem, e pode sim, ser facilmente corrompida. Ela tem as lembranças de Hayanna, a voz, os mesmo pensamentos, no entanto é apenas um feito de magia, nada alem disso. – disse minha tia Carol.

– Sim, e precisamos agir rápidos, pois se eles nos encontrar e estivermos aqui, quem sabe o que Hayanna poderá fazer... armadilhas, truques... tudo seria possível. Nós poderíamos sim, cair em uma emboscada. – comentou Tereza, Camila concordou.

– Bem, eu tive uma idéia, a gente pode levar o pessoal para Assis, em segurança, enquanto isso, eu posso virar Alim novamente, alugar alguma coisa em algum lugar onde moram os não-mágicos, Tereza pode se transformar em águia, poderia viver muito bem nas florestas. Então a casa de praia, ficaria livre para Marcelo, Kayo, os sobrinhos de Kau, Matheus e seus pais. – disse Camila.

– Ótima idéia! – disse minha mãe.

– Espere, tem a casa onde eu conheci vocês, fica na minha cidade... e tem a casa onde os pais de Matheus estavam antes de ir para a praia, podemos ir a algumas dessas casas, não? – eu disse.

– A casa da cidade esta temporariamente ocupada, e quanto a outra casa, bem... seria uma boa idéia, se Kauvirno não a tivesse vendido para esconder algumas pistas de que a casa era de bruxos. – disse Marcelo.

Por mais que eu quisesse não ir, tudo levava até os pais de Matheus. O que estava me angustiando por demais.

– Amor, meus pais estão diferentes, tenha um pouco de paciência, eles não vão tratá-lo da forma lhe trataram da ultima vez. Confie em mim... você sabe o quanto eu te amo, e jamais eu deixaria ninguém fazer nada para te prejudicar. – disse Matheus, me abraçando e depois com um leve beijo no canto da minha boca.

Descemos, eu e Matheus até o centro do campo, onde apreciamos o céu. Começava a escurecer.

– As coisas estão ficando cada vez mais complicadas, e em meio a tudo isso não fazemos idéia de como achar essa tal Espada do Soldado Derrotado. – eu disse.

– Realmente, mas... a Taça do Erudito também foi difícil de ser encontrada e quando menos percebemos ela estava em nossa posse. Nós devemos é nos manter firmados, focados na Espada, assim como estávamos com a Taça. – disse Matheus, agora sentando na grama, eu sentei no seu lado e deitei em suas pernas – Estamos todos ansiosos, nervosos... existe essas brigadas que ate agora não fizeram nada, pessoas morrendo... a mansão de Kau incendiada. Marcelo quase que entregando-se a ilusão que esconder é o melhor a se fazer. Eu sei que Átimos deseja não deseja a Espada da mesma forma como ele deseja você, e isso é algo ruim, mas ele não esta focado na Espada, e nós, estamos focados em apenas nos esconder... é isso que está nos atrapalhando. Que esta nos deixando perturbados sem saber aonde ir e o que fazer.

De certa forma aquilo que Matheus havia dito fazia sentido. Átimos estava focado em mim, e não na espada. Na verdade ele nunca esteve, tendo em vista que a Taça ele já possuía. O que ele sempre quis foi o Colar do Parvo, e alem disso, queria que meu sangue escorresse por suas mãos, por eu ter matado seu primogênito. Talvez se eu não me preocupasse tanto em ter medo, eu pudesse me focar na Espada, e quem sabe até mesmo o Parvo pudesse me ajudar.

Estranhamente, naquele momento lembrei de Júnior, pude sentir seu cheiro passando por mim,. Eu tentei disfarçar, já que Matheus não sabia que eu já havia falado com Júnior algumas vezes. Eu senti uma vontade de gritar seu nome, mas, por Matheus estar do meu lado, eu não consegui.

– Amor, você poderia chamar os meninos pra mim?

– Claro, eu já volto.

Ele levantou, e saiu, enquanto eu sentava.

– Júnior, você está aí? – eu perguntei suavemente, enquanto eu olhava para os lado com o máximo de atenção. Demorou até uma resposta vir, em forma de brisa, que fez meu cabelo, que estava comprido, esvoaçar.

– Olá! – disse ele, sentado ao meu lado, com seus olhos cintilando, e uma expressão suave no rosto.

– Fazia tempo que você não aparecia pra mim... eu já perguntava o porque.

– Existem coisas que eu preciso fazer, nem sempre estou do seu lado, no entanto minha mente sempre está.

– Coisas a fazer?

– Sim... eu ajudo muitas pessoas a não fazer maldade, não com os outros, mas com elas mesmas. Lembra da minha vida? As coisas que eu fazia? Pensava?

– Sim!

– Eu ajudo pessoas como eu fui em vida. Tenho conseguido êxitos, no entanto é eu me pergunto várias vezes como você conseguiu me manter de pé. A cabeça dos jovens são tão imaturas, as vezes até penso em desistir, mas eu não posso. Eu não devo.

– Júnior, tantas coisas que eu queria saber...

– Como o que, por exemplo?

– Como é estar desse lado? Vendo as coisas de um modo diferente.

– Não é diferente do que você vê, no entanto vemos além, e temos tempo para reagir ou agir premeditadamente.

– E você vê algo para o meu futuro?

Júnior deu um leve sorriso, e depois olhou para o céu pensativo.

– O futuro nós mesmo escrevemos, não queria saber como é, pois então perderá o seu tempo hoje. Faça o que tem vontade, pois nem sempre nossas vontades nos levam a cometer erros.

– Kayo? – disse Eduardo atrás de mim. Eu acabei levando um susto e quando dei por mim, Júnior não estava mais ali.

– Oi, Eduardo.

– Matheus disse que precisava falar com a gente. – disse Sara.

Estavam todos ali. Nathan, Adrian, Mario, Sara e Eduardo.

– Diga Kayo, mais alguma idéia mirabolante de fugir deles como fizemos nos últimos anos? – disse Adrian.

– Não, exatamente. Eu acho que vocês devem voltar para Assis...

– Ah, você partilha dessa idéia também! – disse Eduardo desapontado.

– Para eles, eu partilho sim... – eu sorri levemente – Mas aguardem contato, em breve eu chamarei vocês.


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