Sob os Olhos do Napoleão escrita por Ana Barbieri


Capítulo 6
Capítulo 6




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Capítulo 6

Naquela mesma tarde, nós dissemos adeus à família Finn. Holmes ficou bastante aborrecido com a partida de seu novo amigo e descontou toda a frustração por perdê-lo em mim. Confesso que não havia muito que fazer nas minhas condições, menos ainda porque aquele era o campo e não a cidade. Mas jamais poderão dizer que os Holmes não são bons em se adaptar às situações mais adversas... à nossa maneira, claro. E depois daquelas duas semanas, eu jamais tornaria a chamar Holmes de frio. Lembro-me de ter aberto mão de uma lua de mel em nome de seu trabalho e estava mais do que claro que chegara a hora de receber pelo meu sacrifício...

Voltamos a Baker Street no tempo combinado. Eu suspeito que houveram dúvidas, se sobreviveríamos ou não, mas, como a nossa senhoria tão continuamente insistia em constatar: “se esses dois não conseguem resolver, ninguém vai.” E de fato, ela não parecia surpresa ao nos receber naquela tarde de terça-feira.

─ Bem vindos de volta. – exclamou ao abrir a porta para que entrássemos com a bagagem. Duas semanas, mas pela força do abraço de minha amiga parecia que tínhamos permanecido fora de casa por pelo menos um ano. – Se divertiram?

─ Eu jamais admitiria isso a respeito de qualquer período passado no campo, senhora Hudson. – comentou Sherlock, sendo repreendido ferozmente com o olhar pela nossa senhoria. – Mas, é claro, não poderia esperar por companhia melhor. – acrescentou ele me abraçando pela cintura, provavelmente pensando que a censura partira do princípio de que eu ficaria ofendida ao pensar que o tempo passado em minha companhia não fora bom o bastante.

─ O ar do campo certamente lhe fez muito bem, Holmes. Já está até conseguindo mentir sem tanto sarcasmo. – provoquei-o tomando o caminho para o andar de cima, deixando as malas para trás.

O tempo passado na Rose Crown fora suficiente para que eu perdesse o costume de sentir o cheiro de tabaco, impregnado no apartamento. Removendo as luvas, caminhei até a janela para sentir os outros cheiros com que estava familiarizada. Depois de tanto sentir o perfume da lavanda, da terra e o característico cheiro de carvalhos envelhecidos, era de se esperar que o odor das ruas de Londres fosse me chocar. Pelo contrário, estava me sentindo em casa.

─ Será que a senhora poderia me ajudar com a bagagem? – indagou Holmes, empurrando a porta do apartamento com os pés. Eu ri, indo em seu auxílio para pegar as minhas malas.

─ Nada como um último mimo. – comentei colocando-as sobre a cama.

─ Deixei você mal acostumada nessa viagem. – observou ele voltando para a sala. Não era uma característica nossa ter pressa em desfazer as malas.

─ Não sei do que você está falando. – disse na defensiva, seguindo-o. – Afinal, carregar a bagagem não parece um exercício tão ousado quanto me carregar para a cama. – comentei com visível malícia, o que deixou Holmes desconcertado por um momento.

─ Não seja perversa, Anne. Não combina com você. – ralhou, me fazendo sorrir ainda mais.

─ Está querendo apagar as lembranças das últimas semanas, mon détective pompeux? – provoquei cruzando as pernas na minha poltrona, ainda maliciosa.

─ O fato de dividirmos a cama torna essa uma tarefa quase impossível, minha cara. – respondeu ele abrindo um sorriso singelo.

─ Não seja perverso, Sherlock. Não combina com você. – retruquei com ironia.

A senhora Hudson já havia preparado o almoço, esperando que chegássemos àquela hora. O apetite de Sherlock voltara revigorado da viagem, o que surpreendeu nossa senhoria. Quanto a mim, eu jamais mencionaria, mas o desejo mais estranho me acometera numa determinada manhã da segunda semana em Surrey. Holmes e eu estávamos tomando café do lado de fora e de repente, depois de encarar um montinho de terra por alguns minutos, eu me abaixei para pegar um punhado com as mãos e comer. Apesar de ter sido a maior vergonha que já passei na minha vida, confesso que para meu marido e para os outros que assistiam deva ter sido uma cena mais do que cômica. Sherlock fez questão de me importunar com perguntas a respeito pelo resto do dia.

─ Acho que farei uma visita de cortesia a Mycroft. – disse ele pouco depois de acabar de comer. – Agradecer por ter nos propiciado momentos tão memoráveis.

─ Excelente ideia. – concordei jogando o guardanapo sobre a mesa. – Eu vou com você.

─ Tenho certeza de que meu irmão ficaria encantado em vê-la, Anne. Contudo, deve se lembrar de que no Clube Diógenes...

─ Ah, por favor! Eu sei que eles não aceitam mulheres, mas em todo caso eu não estou indo para me tornar um membro. – disse com um pouco de irritação.

─ Mycroft poderia facilmente ser convencido disso, querida. Mas os outros membros são mais insistentes no que concerne a proteção de sua privacidade. – insistiu Holmes, sorrindo.

─ Pois muito bem, então vá sozinho ao clube “homens sendo homens” e diga a Mycroft que também agradeço. E convide-o para jantar! Desde que recebi a notícia não vi mais do que a caligrafia dele. – ralhei cruzando os braços.

─ Transmitirei sua mensagem, minha cara. Embora talvez não consiga transmitir com a sua energia. – brincou Holmes, se levantando para buscar o chapéu no quarto. – Estarei de volta antes que perceba, senhora Holmes. – despediu-se com um aceno de cabeça.

─ Até logo. – despedi-me, sorrindo para a senhora Hudson que vinha na direção do quarto. – Ele está em um de seus bons humores. – observei depois de ouvir a porta da frente bater.

─ Vai querer minha ajuda para organizar as roupas fora da mala, querida? – perguntou minha amiga, retirando os pratos na bandeja.

─ Não, obrigada, senhora Hudson. Acho que farei isso mais tarde. – respondi tornando a me sentar na minha poltrona, alcançando o volume com o gato preto de Edgar Allan Poe, pondo-me a ler de onde havia parado.

Mal havia terminado a primeira página, quando ouvi vozes vindas do corredor. A senhora Hudson parecia estar conversando com um homem.

─ Sinto muito, senhor, mas o senhor Holmes não está. – disse ela ao estranho. Ainda assim, os passos insistiam em vir até a porta. Nosso convidado não parecia disposto a ir embora enquanto não falasse com meu marido.

─ Tudo bem, senhora Hudson, eu assumo daqui. – disse abrindo a porta, encarando o visitante.

Esse, de certa forma, me lembrava Holmes. Ambos se vestiam com distinta elegância e possuíam o semblante inteligente, mas as semelhanças acabavam por ali. Aquele homem não tinha os olhos calorosos do meu marido; tudo nele parecia ser mecânico e frio.

─ Boa tarde, senhora Holmes. É um prazer finalmente conhece-la. – cumprimentou o estranho. Seu tom era educado, mas em seus olhos o prazer não parecia dizer respeito a me conhecer, mas como se estivesse prestes a me devorar. Engoli em seco e acenei positivamente.

─ O senhor seria...? – indaguei imediatamente, imaginando que nome alguém poderia ter dado aquela criatura peculiar.

─ Desculpe-me se pareço ansioso, senhora, mas minhas tentativas anteriores de encontra-la e o seu marido foram frustradas. – ele continuou a dizer, entrando no apartamento e se sentando antes mesmo do meu convite. Notei a falta de resposta frente ao pedido de identificação, mas simplesmente supus que preferiria guarda-la para quando Holmes chegasse.

─ Eu peço perdão, se lhe causamos qualquer inconveniente. – falei me sentando de frente para ele. – O meu estado fez com que o senhor Holmes sentisse um súbito desejo de sentir o ar do campo.

─ Oh, sim. A recente notícia sobre a gravidez da senhora Sherlock Holmes de Baker Street alcançou meus ouvidos. Meus parabéns, aliás. – cumprimentou ele, com um aceno de cabeça cortês. – Como disse, já faz algum tempo que venho querendo ter o prazer de conhecê-la. Sou um grande fã do trabalho de seu marido e o seu casamento me deixou bastante surpreso.

─ De fato, pareceu surpreender a cidade toda. – concordei risonha. – É realmente uma pena que Sherlock não esteja aqui...

─ Realmente. – concordou o homem, olhando a hora em seu relógio de bolso. – Ele ficará fora por muito tempo?

─ Acredito que não. – apressei-me em dizer, desejando do fundo do coração que ele entrasse por aquela porta no mesmo instante. – Contudo, qualquer coisa que tiver que dizer a ele, pode dizer a mim. Deve ter ouvido falar que desde que nos casamos, temos resolvido os casos juntos. Meu marido confia em mim incondicionalmente. – falei esperando que isso o fizesse me revelar seu nome.

─ Tenho certeza de que confia. – afirmou ele com um sorrisinho que me perturbou muito. – Porém, nesse caso, prefiro esperar.

─ Muito bem. – cedi irritada. – Enquanto espera, gostaria de beber alguma coisa? – ofereci já me levantando para tocar a sineta pela senhora Hudson, aqueles poucos minutos foram suficientes para me deixar estranhamente cansada com a companhia dele.

─ Um copo d’água é o suficiente. – respondeu ele, enfiando a mão num dos bolsos internos do paletó. Ao me virar, não consegui ver o que ele buscava...

Todavia, antes mesmo que eu pudesse terminar de encher o copo com água, a porta do apartamento se abriu e revelou outro homem também elegantemente vestido, vindo à minha direção empertigado. Sem pensar, joguei a água que já estava servida em seu rosto e corri para a janela, sendo alcançada pelo bruto antes que conseguisse gritar para fora. Ele forçou meus braços para trás, tentando me impedir de lutar para me soltar. O outro, que até então permanecera sentado assistindo à cena, puxou então um frasco de dentro do bolso e molhou o lenço, que provavelmente puxara antes, com seu conteúdo. Forçou-o com força contra o meu nariz... clorofórmio.

─ O que...?! – indaguei já sentindo a visão ficando turva. Meu corpo amoleceu e não conseguia mais puxar meus braços para longe do aperto de meu carcereiro.

─ Não se preocupe, senhora Holmes, vamos dar um pequeno passeio. – disse o homem que me segurava. Foi a última coisa que ouvi antes que a minha visão se escurecesse por completo.


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Notas finais do capítulo

MUAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA! Moriarty, senhoras e senhores! *trovões e raios no fundo*

Agora que as coisas vão começar a ficar emocionantes... Qual será a reação de Holmes? ONDE RAIOS ESTAVA A SENHORA HUDSON QUANDO ISSO ACONTECEU? Para onde Moriarty levará Anne? Tudo isso no próximo capítulo de... A USURPADORA kkkkkkkkkkkkkk, só que não. Desculpe a piada sem graça, mas ficou muito igual a uma chamada de novela mexicana.

Então, agora eu preciso da colaboração de vocês. É claro que não mais teremos somente o ponto de vista da Anne, do contrário, perderíamos o mais legal: a investigação. Então, eu quero saber: invado a mente do Holmes OU escrevo em terceira pessoa como fiz em "Fechadas as Portas Quebradas" e outras one-shots?! Preciso muito saber qual vocês preferem porque até lá eu me recuso em sequer pensar o próximo capítulo.

No mais é isso, espero que vocês tenham gostado, me deixem saber através da caixinha de reviews ali em baixo, bjooooos! E até o próximo!