Meu despertador apitou escandalosamente as 06h00 naquela segunda-feira. Não costumava acordar tão cedo assim, mas acontece que meu chefe faria uma reunião de urgência com os funcionários da empresa e queria todos lá o mais cedo possível. Levantei-me da cama ainda com os olhos colados pelas remelas – nojento né? - não enxergando absolutamente nada. - Aiii merda! - gemi de dor ao pisar em cima da minha bolsa que estava jogada no chão. Ela tinha uma fivela de prata saltada e aquilo enterrou no meu pé, doeu mesmo, mas isto não vem ao caso. Fui direto para o banheiro, era uma manhã fria - novidade, quase não faz frio na Alemanha né? - senti meu corpo arrepiar ao me despir, entrei no chuveiro rapidamente deixando a água extremamente quente correr por mim aquecendo e relaxando. Banho pela manhã é realmente excitante... Ah eu estava com mania de falar que tudo era excitante, devia ser por causa da minha seca de um mês e devido ao fato de eu estar sentindo falta de ter algo de verdade para me excitar, mas isto também não vem ao caso. Troquei-me rapidamente depois do banho, mas mesmo assim consegui sair atrasada do meu apartamento. Para piorar eu ainda peguei um trânsito daqueles que tem pelas manhãs de segunda-feira em Berlim. Aquela cidade às vezes era estressante, ainda mais para uma pobre jornalista como eu. Bem, pobre eu não era, só que corria seriamente o risco de me tornar.

 Cheguei ao prédio da 'TeenZeitung!' (revista para qual eu trabalhava) notando o tulmuto que estava na porta do escritório do nosso chefe, Leon Phillips.

- Caramba, que bagunça é essa? - perguntei para Eddie, o meu inseparável amigo gay.

- Bom dia para você também Mandy. - ele veio em minha direção me dando um beijo no rosto.

- Eddie, por que essa agitação toda na porta da sala do Leon? E o que ele vai falar para a gente nessa maldita reunião de urgência afinal? - joguei a bolsa em minha mesa.

- Mandy se prepara. Vem bomba ai querida. - Eddie disse num tom que me fez tremer na base.

Finalmente nosso chefe saiu da sala dele e conduziu todos os funcionários até a sala de reuniões. Seguimos os passos dele preocupados com a feição visivelmente abatida de Leon. Quando todos adentraram a sala e se acomodaram em suas cadeiras, ele nos disse curto e grosso:

- Estamos à beira da falência.

Maravilha hein. Tudo que eu queria ouvir em plena segunda de manhã, um baque daqueles. Na verdade não foi um baque tão grande assim porque todos nós já sabíamos que a revista não ia bem e que muitos leitores estavam criticando o conteúdo das matérias, mas pelo tom da voz dele o negócio era bem mais sério do que pensávamos.

Todo mundo começou a falar ao mesmo tempo, aquela sala de reuniões virou uma zona. Eu coloquei a mão na boca querendo mostrar a minha surpresa enquanto olhava para Eddie que permanecia com aquela cara de “eu já sabia”.

- CALEM A BOCA AGORA! - Leon levantou-se furioso da cadeira botando ordem no barraco. Confesso que me assustei, todo mundo se assustou. Todos ficaram quietos na mesma hora. - É assim que vamos resolver os nossos problemas? Esses são os funcionários que eu contratei? Parecem gralhas loucas. - ele ainda gritava conosco batendo com raiva as mãos contra a mesa.

- Apenas nos desesperamos com a noticia chefe. - Susan, uma das funcionarias falou baixo escondendo o rosto atrás de uma prancheta. Realmente tinha que ter muita coragem para ousar falar com o chefe quando ele estava nervoso.

- Pois fiquem calmos e vamos conversar civilizadamente. - ele disse com os olhos raivosos voltados a ela.

- Meu Deus eu não mereço isso em plena segunda-feira, ainda mais depois da festa de ontem. Tô numa ressaca daquelas... - eu falava baixo para Eddie.

- Segura o pirulito querida. - ele disse acariciando minhas costas. "Segura o pirulito" é a expressão que o Eddie usava para dizer: "Segura as pontas"

- Nossa revista está perdendo leitores para a concorrência cada vez mais. E sabem por quê? - Leon nos questionou. Claro que nós não precisaríamos responder, todos já sabiam a resposta.

- Eu sei a resposta senhor! - Susan erguia o braço como uma criança do pré chamando atenção do professor. Ela era a funcionária mais tosca que o senhor Phillips havia contratado e ele tinha plena consciência disto.

- Responda senhorita Susan. - Leon girava os olhos demonstrando sua impaciência para com ela.

- Porque eles conseguem entrevistar as celebridades mais notáveis do mundo. - ela respondeu certa de si.

- Sua resposta está certa, tirou 10! – ele abriu um sorriso sínico para ela - Mas eu cheguei à conclusão de que este não é o único motivo para a revista concorrente fazer mais sucesso que a nossa. – emendou.

- E qual é o outro motivo então chefe? - ela perguntou retraída.

 Leon se levantou calmamente da cadeira indo em direção de Susan. Ficou cara a cara com ela e disse:

 - É PORQUE ELES NÃO TÊM FUNCIONÁRIOS TÃO IDIOTAS COMO VOCÊ TRABALHANDO PARA ELES! – ele gritou na cara dela, gritou tanto que chegou a cuspir. Bem típico de chefe impaciente não é mesmo? Parecia que eu conseguia ver em câmera lenta cada gota de saliva que saltava da boca do nosso exaltado patrão. Imaginem a minha cara, melhor que isso, imaginem a cara da pobre Susan.

- Eu só respondi o que o senhor perguntou. – ela disse chorosa enquanto enxugava o rosto. Eu sinceramente não sei como ela ainda tinha coragem de dirigir a palavra a ele. Depois daquilo Leon voltou para sua cadeira ignorando Susan totalmente.

- Bem, voltando ao que interessa. Eu convoquei esta reunião de urgência apenas para deixá-los a par da real situação da TeenZeitung! – ele nos disse mais calmo, tão calmo que chegou a soar triste. – Eu trouxe algumas revistas concorrentes. Quero que vocês analisem e vejam o que cada uma delas tem em comum.

Leon distribuiu para nós revistas da Bravo, Bild, Star e Blitz. Passamos algum tempo vendo o conteúdo, analisando as matérias e tentando achar defeitos. Para mim todas pareciam a mesma. O conteúdo extremamente idêntico ao da outra, nada de novidade, nada de interessante.

- Para mim são todas iguais. – comentei em particular com Eddie. Ele me abriu um sorrisinho de canto como resposta e continuou folheando uma revista da Bild.

- E então, conseguiram ver o que todas estas revistas tem em comum? – Leon voltou-se novamente a nós.

- Para mim são todas iguais, sem novidade alguma. Todas com o mesmo conteúdo. – Fred Levinsky, publicitário responsável pela parte criativa da TeenZeitung! respondeu. Jurava que ele havia lido meus pensamentos.

- Elas realmente são iguais. Todas elas com o Tokio Hotel na capa. – Eddie respondeu sorridente como ele só.  – É isso que faz estas revistas venderem tanto. Os leitores querem apenas o Tokio Hotel. Os queridinhos da Alemanha.

- Exatamente. Nota 10 para você Eddie! – o senhor Phillips até bateu palminhas para ele. – É justamente neste ponto que eu queria chegar, no Tokio Hotel. Não tem nada que venda mais que eles aqui na Alemanha e até mesmo na Europa. Onde tem Tokio Hotel tem dinheiro, tem sucesso, tem fama, tem atenção. Os olhos da mídia estão totalmente voltados a eles e por que nós da TeenZeitung! temos que ser a única revista que não traga nada desta banda no conteúdo? Nem uma matéria, nem ao menos um pôster. Há muito tempo nós não conseguimos uma entrevista com esses garotos.

- Realmente. A última vez que estivemos com eles foi em 2008, se não me engano. – Fred fazia cara de pensativo.

- Sim foi em 2008. Agora, eu tenho uma história para contar a vocês. – Leon andava de um lado pro outro enquanto falava. – Era uma vez um garoto chamado Bill Kaulitz, este garoto era vocalista da banda mais famosa da Europa, justamente o Tokio Hotel. Essa banda foi para a Espanha fazer alguns shows e lá cederam uma entrevista a um famoso jornal espanhol. O jornalista muito intrigado fez a seguinte pergunta a Bill Kaulitz: “ Por que você é tão magro? Por um acaso está doente?” Bill muito educadamente respondeu: “ Não, eu não estou doente, muito pelo contrário, nunca estive melhor.” Não acreditando muito naquilo o jornalista insistiu: “ Não está doente mesmo? Por um acaso não sofre de anorexia?” Bill respondeu sorrindo: “ Não, isto não é verdade. Eu como até demais.” Mas o jornalista não estava satisfeito, ele queria que Bill admitisse algo e novamente insistiu:“ Bill, você está terrivelmente magro e abatido. Se não sofre de anorexia, posso jurar então que está com AIDS, você pode ter contraído este vírus de algum caso homossexual que teve. Já pensou em ir fazer um exame de HIV?” 

- Meu Deus que jornalista mais folgado. – eu interrompi a história que Leon nos contava totalmente chocada. – O que Bill Kaulitz fez depois? – inclinei-me totalmente interessada.

- Sem pensar duas vezes, Bill Kaulitz fechou o punho e meteu um soco no meio da cara do jornalista. Depois ele disse: “Isso é pra te mostrar o quanto eu gosto de homens e que apesar de estar magro, ainda tenho força o suficiente para quebrar a sua cara.” – O senhor Phillips encenou aquela cena muito bem para nós.

- Isso ai, assim que se faz. – eu vibrei. Aquela história estava me empolgando tanto. – E depois chefe, o que aconteceu?

- No final das contas o jornalista folgado simplesmente processou Bill Kaulitz por agressão.

- Mas que filho da...- Eddie colocou as mãos em minha boca evitando que eu terminasse aquela frase um tanto quanto inadequada para a situação. Olhei sem graça para todo mundo e logo em seguida Leon prosseguiu.

- Como eu ia dizendo senhorita Turner...Bill foi processado e por sinal, perdeu o processo. Agora vem o fato mais curioso. O jornalista folgado não quis uma indenização em dinheiro, ele simplesmente quis que Bill Kaulitz fizesse um exame de HIV e divulgasse o documento com o resultado para todo mundo. 

- Ai que humilhação. – Eddie manifestou-se.

- Humilhado, foi justamente assim que o garoto se sentiu. Depois disso Bill Kaulitz decidiu entrar em uma espécie de “greve de entrevistas”. Há cinco meses ele não abre a boca para nenhum jornal e ele pretende continuar calado por mais um ano. Ai que nós entramos meus queridos. – Leon de repente nos lançou um sorriso diferente.

- Onde nós entramos? – Susan perguntava sem entender nada.

- Quero uma entrevista com Bill Kaulitz. – o chefe nos disse com demasiada naturalidade, como se conseguir aquilo fosse a coisa mais fácil do mundo. 

- Mas chefe. O senhor não acabou de nos dizer que ele não está mais cedendo entrevistas? – Fred o questionou.

- Sim, eu disse. – ele respirou fundo olhando para baixo. Seu olhar era tão triste e preocupante que chegava a me cortar o coração. – Saiam todos já daqui! Sumam da minha frente! - Leon nos ordenou delicadamente como ele só. Todos se levantaram de suas cadeiras e se dirigiram até a porta. - Senhorita Turner! - senti as mãos do chefe me segurando pelo braço.

- Sim Senhor Phillips. - eu me virei assustada para encará-lo.

- Você fica!