Ellie Foster

Quando chegou perto do teto da sala de treinos, perdeu o equilíbrio e caiu. Por sorte os colchões que foram colocados no chão amorteceram sua queda. Poucos tributos estavam na parede de escalada, mas alguns não contiveram seus risos. Ellie se levantou, envergonhada, enquanto tentava seguir em frente de cabeça erguida, deixando a parede de escalada e tentando evitar os olhares de tributos indesejáveis. Se fizesse certo, iria errar tudo e assim os Carreiristas não iriam prestar atenção nela, e a levariam como um alvo indefeso. Isso seria uma vantagem.

Chegou na bancada de arco-e-flecha, onde alguns tributos tentavam aprender a manejar o arco, e a Carreirista do Um se exibia com uma mira impecável. Ellie observou o instrutor ensinando como segurar o arco e como prender a flecha na corda e então escolheu um alvo. Se colocou na linha onde marcava que ela teria de ficar e fechou um dos olhos para ter uma visão mais apurada. Encostou a testa na corda, seguindo a direção da flecha e então mirou o centro do alvo, movendo o arco para alguns centímetros mais longe, para errar de qualquer maneira.

Soltou a corda, que ricocheteou em sua mão e estalou na parte de dentro de seu braço, causando uma dor tremenda. Ellie teve certeza de que a flecha errou o alvo, mas não ergueu os olhos para ver onde tinha ido parar, apenas segurou o braço ferido e observou a marca fina e vermelha que a corda tinha causado. Sentiu olhares sobre seus ombros e então se levantou, observando a sala. Ao lado, a Carreirista do Um estava com o arco pronto para atirar, a flecha perfeitamente alinhada e os braços erguidos de maneira que Ellie jamais conseguiria abrir. Seguiu os olhos da garota loura e então engoliu em seco, entendendo o porquê dela não ter atirado ainda. Sua flecha tinha atingido o alvo dela.

Sua flecha, aquela que Ellie tentou errar. Os ombros tremeram. A flecha estava exatamente no centro do alvo. Só que o alvo errado. Dakota abaixo seu arco e então rodou nos calcanhares com leveza, direcionando um olhar frio a Ellie.

– D-Desculpe, eu não queria, não foi minha intenção...

Dakota abriu um sorriso gentil e então voltou a posição de ataque que tinha feito anteriormente, movendo o corpo para o lado de Ellie. A garota sentiu o suor escorrendo por suas costas. É agora, ela vai me matar... Ela vai me matar com uma flecha no meio da testa. Céus! Que hora para morrer, os Jogos nem começaram! Então Dakota soltou a flecha, que passou metros longe de Ellie, fazendo uma curva graciosa no ar, como se tivesse vontade própria e fincado no centro do circulo do alvo de Ellie.

– Agora estamos quites, certo? – a Carreirista disse e logo deixou o arco e flecha para ir treinar com espadas. Ellie sentiu os ombros caindo e então os joelhos falharam.

Que merda foi essa? Quando estava fazendo algo para não chamar a atenção, acabou chamando muita atenção. E agora aquela menina a considerava uma ameaça. Mas não foi de propósito, a flecha acertou o alvo por engano! Mas que engano! Ellie piscou os cílios, sentindo algo se mover dentro de seu peito. Engano. Acaso. Sorte. A flecha teria atingido um tributo se fossem Jogos. Respirou fundo, tentando segurar outra flecha, entre os dedos trêmulos e a colocou no alvo. Fez as mesmas coisas de antes, mas desta vez não tentou errar. Quando soltou a flecha, a corda do arco ricocheteou novamente, mas desta vez Ellie estava preparada e ergueu os braços como a Carreirista tinha feito, e assim a corda passou por baixo do arco que fazia com os próprios braços. A flecha atingiu o alvo.

Piscou, ainda absorvendo. Sua mira era boa. Concluiu que nunca tinha percebido isso.

Sua mira era ótima! Mas que droga! Abriu um sorriso um tanto maior do que o normal e tratou de atirar mais flechas, todas atingiam o centro do alvo, em locais próximos uma das outras. Ellie notou que alguns alvos se moviam e tentou utilizá-los. Não obteve tanto sucesso quanto com os alvos parados, mas notou que melhorava a cada flecha. Por fim, conseguiu se levantar, suando, e feliz de ter encontrado algo que fazia bem.

Ela colocou o arco no apoio de onde tinha tirado e observou os outros tributos tentando atirar. Agora já estava quase no final dos treinos e os tributos mais experientes tinham deixado a sala fazia alguns minutos. Quando seus olhos pararam numa pequena figura de corpo desajeitado e um arco na mão com a metade de seu comprimento, ela teve de segurar um sorriso travesso, observando o erro que a garota cometia. A corda saltou para seu braço e ela exclamou de dor.

Ellie sentiu-se tremendamente perturbada. Não queria ver aquilo, mesmo que fosse um oponente, mesmo que fosse outro tributo que a mataria se pudesse... Era uma garotinha tão indefesa e pequena... Não faria mal nem a um mosquito! Se aproximou, enquanto a menina arrancava mais uma flecha dos apoios de flecha e a prendia na corda do arco, irritada. Ellie concluiu que ela devia ter errado muitas vezes para estar tão brava.

– Espere, você está fazendo errado – falou, enquanto colocava as mãos nos braços da garota e a arrumava na posição certa. – Agora mire e solte.

A menina fez. Sua flecha voou, livre, e fincou alguns centímetros ao lado da cabeça do alvo. Ela soltou um suspiro infeliz, girando nos pés e erguendo os olhos para encará-la. Ellie percebeu o quão pequena ela era. Sua cabeça atingia sua cintura e os óculos de aro vermelho que ostentava na ponta do nariz eram quase do tamanho de seu antebraço.

– Obrigada. – disse.

– Por nada – Ellie respondeu, logo virando suas costas para ir embora.

– Espere. – ouviu a menina dizendo às suas costas. – Vi você atirando com o arco hoje. – pausa – Quer formar aliança comigo?

Ellie se voltou para ela, quase que intrigada e ao mesmo tempo divertida.

– Uma aliança? Sério? Não acho que você vá querer uma aliança com alguém como eu. Sou boa apenas nisso.

– Só preciso de você para isso – a garota a interrompeu com dureza. – Consegue atirar uma flecha a cada trinta milésimos?

– Como? – Ellie piscou, atônita.

– Esqueça – a pequena suspirou – Quer ou não, Ellie Foster?

– Sabe meu nome.

– Sei o nome de todos. – ela disse, meio irritada – É normal decorar rosto, nome e número de distrito assim que os vejo pelas reprises da TV. Você sabe o meu?

– Lamento...

– Não lamente, fico grata por isso. Sarah Ah-Dom, mas pode me chamar apenas de Sarah. Então, Ellie Foster, quer formar Aliança?

– Apenas nós?

– Claro. Com minhas outras... Amigas. – Sarah disse a palavra com certa rigidez, como se tivesse selecionado com cuidado.

– E elas seriam...?

– Eu aposto que você não saberia quem se eu dissesse o nome ou o Distrito – Sarah disse, simples, mas fria. – Arabella Agron, uma manipuladora e namoradeira de mão cheia. Pandora Saritovi, rápida e forte como o som de um trovão. E eu, Sarah Ah-Dom, apenas uma menina com boa memória. E você é Ellie Fostes, mira impecável, ótima em escalada e gosta de meninas.

–C-Como? – Sentiu as bochechas ferverem.

– Nada, nada. – Sarah movimento a mão, deixando o assunto de lado. – Quer ou não, Ellie Foster? É sua última chance.

– Sim. Bem... E as outras? Elas me aceitariam?

Sarah abriu um sorriso, que não foi nem um pouco caloroso.

– Quem decide isso sou eu.