Blood Curse escrita por Soul Kurohime


Capítulo 8
Sensatez


Notas iniciais do capítulo

Sensatez e paciência são palavras de muito significado e de pouca aplicabilidade.
— Kléber Novartes
Capítulo dedicado à Adrienne Moreau!



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Aquelas palavras de uma língua desconhecida se conectavam e dançavam juntas na melodia. A canção era... Inebriante. Ele estava de olhos fechados, mergulhando em seu próprio mundo e em suas notas.

Rain abriu a porta silenciosamente e o ficou observando cantarolar com tanta intensidade as exóticas palavras ritmicamente. Ela estava completamente fascinada, e parecia que nada iria lhe tirar daquele transe. Havia apenas ela. E ele. E a música.

A menina, no entanto, despertou de seu devaneio quando o garoto parou de cantar e abriu os olhos heterocromáticos lentamente para olhá-la. Quando ele a havia notado? Rain engoliu em seco e ele ergueu uma sobrancelha. Ela molhou os lábios e abriu e fechou a boca uma vez em uma tentativa falha de falar, mas não sabia o que exatamente diria para ele. O garoto simplesmente franziu o cenho. Seus movimentos eram únicos, calmos, calculados.

– Sinto muito, a porta estava aberta e... – ela suspirou – Bem, eu realmente não tinha a intensão de entrar e atrapalhar você, sinto muito mesmo.

– Não tem problema. – respondeu, com uma voz calma e suave. – Castiel deve tê-la deixado aberta quando saiu.

– Castiel? Você é amigo daquele garoto? – a garota não conseguiu esconder a insatisfação na voz.

– Sim. – ele franziu novamente o cenho – Por que isso te incomoda?

– Digamos que... Nós começamos com o pé esquerdo. E continuamos com o pé esquerdo em todas as situações. – ela suspirou – Não nos damos muito bem. – e fez uma careta.

Ele girou levemente a cabeça, com uma expressão divertida no rosto.

– Você é a garota recém-chegada, estou certo? A que ele mordeu...

– Acho que todo mundo já sabe disso.

– Sim, sabemos. – e sorriu. – Sou Lysandre. Encantado.

– Rain! ...Erh... Encantada... – corou – Então... Por que você já está deitado uma hora dessas? – Um olhar de hesitação passou pelo rosto do garoto. Ela bateu com a mão na testa – Espera, não responde. Você está na ala dos vampiros... Desculpe, ainda estou me acostumando com essas coisas de vocês não poderem andar à luz do sol e todo o resto.

– Para falar a verdade, eu posso sim sair ao Sol. Mas isso não vem ao caso... Você vai ficar na porta por muito tempo?

– Ah! ...Não. – ela se aproximou do garoto.

O quarto era parcialmente igual ao dela. Uma cortina amarela solta que balançava com o soprar dos ventos vindos da janela aberta fazia a diferença.

– O que a fez vir aqui?

– Sua música. Eu a escutei quando estava descendo as escadas para a ala de baixo... Sonhei com ela.

– Um pesadelo então?

– Não! Ela é maravilhosa! A coisa mais bonita que ouvi desde que cheguei nessa escola horrível.

– Ela não é horrível. – disse, calmo como sempre – Só precisa conhece-la. Vai precisar muito desta escola daqui para a frente.

– Eu sei... – murmurou – Vem cá, o que você quis dizer quando afirmou que podia andar no sol? Achei que vampiros não –

– Você está na ala dos feiticeiros, mas nem por isso é uma feiticeira. É apenas compatível com eles. Da mesma forma acontece comigo.

– Não é um vampiro? Então, o que você é?

– Creio que apenas nós dois sejamos diferentes nesta escola.

– Nós dois? Você sabe o que eu sou?

– Para falar a verdade, não. Em todos os meus anos de vida, nunca vi uma aura como a sua, um cheiro como o seu. Não me admira que Castiel tenha mordido você. Ele é meio impulsivo, não pensa nos riscos.

– Riscos?

– Você realmente desconhece a tudo. – ele sorriu – Vampiros não costumar consumir sangue de outros seres do submundo, pois sempre que eles o fazem, acarreta um efeito colateral. Se você for mesmo uma feiticeira, Castiel neste momento é uma bomba ambulante prestes a explodir a qualquer momento.

– E você não está preocupado? – a voz da garota soou aflita.

– Sim, estou. Mas conhecer você me alivia um pouco, confesso.

– Por que isso?

– Você não possui nenhum traço que a caracterize como uma feiticeira. É perfeitamente humana por fora.

– Sim... Nathaniel comentou mesmo isso comigo. Percebi os olhos de Rosalya.

– É um bom exemplo. – ele sorriu.

– Então, você não sabe o que sou, mas sabe que sou diferente. Diferente como?

– Não posso afirmar com certeza que você é diferente. Pode pertencer a qualquer uma das classes, desde que tenha sofrido uma mutação.

– Mutação?

– Exato. Elas não ocorrem desde as Guerras Demoníacas mas, supondo que algum tipo de vírus novo tenha se espalhado, é provável que tenha havido uma mutação. E se for o caso, você não é a única no mundo que está passando por isso agora.

– Isso, que você diz... Descobrir todo esse mundo? Antes disso tudo acontecer, eu nunca imaginei que seria algo mais do que uma simples mundana. Meu maior objetivo era a faculdade e meus maiores desafios eram engolir as garotas sem cérebro da minha antiga escola. E não importa o que aconteça, sinto que nunca vou me encaixar no mundo de vocês. – ela se deixou cair em uma cadeira de madeira ao lado da cama do garoto.

– Rain... Esse mundo não é nosso. Ele agora é seu também. Você faz parte dele tanto quanto qualquer outra pessoa que o conheça, embora tenha pouco conhecimento, mas é tudo questão de tempo. Todos nós vemos e sentimos um enorme poder vindo de você, - prosseguiu – que cresce a cada minuto mais.

– Como Castiel me confundiu com uma mundana comum, então? – interrompeu.

– Como eu disse, está crescendo... Se formando... Ou se descobrindo. Você com certeza não emitia poder algum quando chegou aqui, daí o mal-entendido. Olhe para quem você era dias atrás, para você agora, e tente se imaginar daqui a algum tempo. Quem você realmente é? Este poder desconhecido faz parte de você, da sua essência, de quem você é de verdade. Quanto mais rápido você se aceitar e se amar por quem é, mais rápido se descobrirá.

– Está dizendo que o que eu vivia antes era um sonho, e o agora é a realidade? – ela pulou da cadeira em um salto.

– Correto. E já está na hora de acordar. – ele sorriu.

Rain ficou de costas para ele e levou as mãos ao alto. Ficou analisando suas unhas e dedos com os olhos azuis, tentando ver mais além de pele, osso e unhas sem esmalte bem feitas. Queria poder ver o poder que Lysandre disse que todos sentiam dela, mas talvez não fosse algo visível, não é mesmo? Pensou, pensou, pensou, pensou mil coisas e, finalmente, depois de longos minutos, virou-se novamente para ele.

– Obrigada, Lysandre! – disse, com um largo sorriso no rosto.

Ele assentiu com a cabeça. Rain achava que o garoto tinha sua faixa etária, o que realmente aparentava ter, mas seus olhos relatavam uma longa vida de dor e sofrimento. A heterocromia era viciante, desconcertante, mas era muito mais que apenas cor. Era sabedoria, inteligência, sensatez.

– Decidiu me dizer sua raça? – indagou.

Os olhos do garoto arregalaram-se levemente.

– Você não vai me fazer desistir de saber apenas mudando de assunto. – continuou.

– Você realmente é uma garota curiosa. – sorriu novamente.

– E você, super misterioso. Então, qual é?

Ele suspirou enquanto sorria.

– Certo, irei lhe dizer. Eu sou –

– Você costuma invadir quartos de cavalheiros no meio da noite, pequena Rain? Se soubesse disso, teria pedido e insistido a nossa querida diretora para que você ficasse em nossa ala.

Rain não o tinha ouvido entrar, mas ele estava ali, com o braço por cima de seu ombro, deixando seu peso cair levemente em cima do corpo da garota.

– Ela não teria lhe dado ouvidos, Castiel. Principalmente depois do que você fez à Rain. – disse Lysandre calmamente, parecendo completamente nada surpreso de o ver ali.

– O que é isso, um complô? Você está do lado dela agora, Lysandre? Você acabou de conhecer a novata e já a deixou mudar sua forma de ver o mundo? – disse, com ironia.

– Não estou do lado de ninguém. – o garoto de cabelos brancos ergueu uma sobrancelha.

– Rain... – Castiel abaixou-se e passou a sussurrar no ouvido da garota – Você estava se escondendo aqui? Estava tentando furar nosso compromisso?

Ela o empurrou com todas as suas forças, e ele foi com dificuldade para trás.

– Nada de nosso compromisso! Você que me obrigou!

– E eu passei no seu quarto e você não estava. O que está fazendo aqui mesmo?

– Conversando com Lysandre! – ela apontou para ele - Não posso?

– E quanto as regras de dormitório? – ele molhou os lábios.

– ...Esqueci.

Castiel desatou em uma gargalhada rápida, e logo suas feições tornaram-se sérias de novo.

– Rain... Eu senti seu coração acelerar quando estava me apoiando em você? – indagou, com verdadeira intensidade, sorrindo maliciosamente.

Ela corou fervorosamente.

– Mas é lógico! Eu estou viva, sabia?!

– Anham. – ironizou – Claro. Eu só fiz uma pergunta, por que está tão corada, Rain?

– ...Ah. I- Isso é porque... Tem sangue correndo pelas minhas veias! Lógico que sou corada!

– Ah, eu sei bem disso. – ele molhou os lábios.

– Nem venha! – ela deu um passo para trás, institivamente, colocando as mãos para frente como se Castiel estivesse mirando-a com uma arma de fogo.

Lysandre ria castamente ao fundo, observando os dois. Risada essa que se transformou em uma tosse leve, que ia torna-se cada vez mais forte, interrompendo os dois.

– Onde está? – gritou Castiel, com aflição.

– Não precisa. – respondeu ele, entre tosses.

– Me diga onde está! – gritou mais alto.

Sua tosse foi piorando cada vez mais com o passar dos segundos, e Rain percebeu que, nas últimas, sangue acompanhavam-nas. A coberta branca passava a obter uma coloração cada vez mais escarlate com a expiração brusca e barulhenta involuntária vinda do garoto. Ele, com dificuldades, apontou para um pequeno pote de vidro marrom em cima da mesa de madeira.

Castiel virou-se em uma velocidade surpreendente e, no outro segundo, ele já puxava Rain pelo pulso para fora do quarto. Ele, antes de fechar a porta, virou-se para ela uma última vez.

– Me espere aqui. – sibilou, com uma autoridade incontestável.

– Você... Você não prefere que eu vá chamar alguém? – Rain estava verdadeiramente aflita.

– Não.

– Mas... Mas ele está tossindo sangue!

– Eu sei. Me espere aqui. Consegue fazer isso?

E ele trancou a porta rapidamente, fazendo os fios da franja da garota balançarem. As tosses, agora abafadas, apenas aumentavam. Rain encostou-se na parede atrás de si e deslizou para o chão.

Tampou os ouvidos com as mãos, abaixou a cabeça entre as pernas, fechou os olhos e mergulhou em seus devaneios, lembrando de uma cena qualquer da sua vida antes de parar ali. A garota tentava, pela última vez, fugir daquele mundo o qual sabia que também pertencia...

Quando menos percebeu, a porta à sua frente se abriu em um silêncio tenebroso. As tosses haviam cessado, ainda bem! O garoto de cabelos vermelhos garantiu que a porta estava fechada dessa vez, e virou-se para a garota sentada no chão à sua frente. Ele esticou a mão direita em sua direção.

– Vamos?

Rain a apertou. Ele sorriu.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por lerem! Reviews?
Beijos e até o próximo...
~Soul