Blood Curse escrita por Soul Kurohime


Capítulo 40
Somos todos cinzas


Notas iniciais do capítulo

Gente.
Metade dos comentários do capítulo anterior foi: quero a Rain com o Castiel.
A outra metade foi: Finalmente Rain e Kentin juntos!
Tia está confusa.
Enfim, gostaria de agradecer à Bells pela recomendação. MUITO OBRIGADA MESMO!! FIQUEI MUITO FELIZ. OBRIGAADA! Capítulo dedicado a você. :3
Gente, é com pesar que digo que a fic está caminhando ao seu finalmente. Quantos capítulos mais irá durar, eu não sei. Mas estamos quase lá. :c
Enfim, enfim.
Boa leitura. s2
~Soul



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A mulher olhou para ele de cima a baixo e levou uma mecha do cabelo para detrás da orelha. Ela abriu a porta e sinalizou com a cabeça para que ele entrasse. Lysandre obedeceu e, evitando olha-la nos olhos, observava sua imagem distorcida no assoalho brilhante.

Ela sentou em um sofá de dois assentos que ficava entre uma mesa de pernas curtas e uma janela que soprava um vento frio vindo da floresta de folhas alaranjadas, e olhou para ele. Ele entendeu o olhar e sentou ao lado dela, desconfortavelmente.

Agora que finalmente estava aqui, ao lado dela, realmente não sabia o que esperar.

Lilith o olhou e desviou o olhar. Foi a vez de Lysandre, pela primeira vez depois de tantos séculos, observá-la. Ela usava uma longa saia branca, que o permitia ver apenas uma bota marrom de cano médio com detalhes mais escuros, além de uma blusa de mangas longas rosa clara, que deixava seus ombros nus à mostra. Sua pele era rosada à luz que vinha da janela.

Ela olhou para ele novamente, mas ele não se permitiu desviar o olhar. Sua boca carnuda, sua pele perfeita sem poros, sem cabelo negro e comprido, os olhos vermelhos tão vívidos que pareciam palpitar. Durante todos os milênios de sua existência, Lysandre nunca encontrou uma mulher que fosse tão linda quanto Lilith. Ela era extremamente linda, extremamente perfeita. E mesmo com os milênios que se passaram, ela parecia ter pouco mais de dezessete anos mundanos.

– A boa educação me obrigada a oferecer-te chá.

Antes que ele pudesse responder, ela já havia se levantado. A bota sem salto marcava o som dos passos dela. Lysandre passou os dedos pela calça preta, ainda mais desconfortável. Realmente, não sabia o que esperar dessa visita. Passou centenas de anos a vigiando – mesmo de longe -, apenas assegurando a si que ela estava bem. Que estava viva. Mas estar assim tão, finalmente, próximo a ela...

Não esperava que ela não tivesse mudado desde o Jardim do Éden. Não esperava que ela pudesse estar ainda mais bonita... essa possibilidade parecia impossível. Esperava que a voz dela ainda soasse melodiosa aos seus ouvidos, embora estivesse. Espera que, mesmo que ela tivesse escolhido Lúcifer a ele, ele ainda a amasse.

Passou séculos acreditando que seu amor por ela ainda existia e que, por isso, não poderia voltar aos céus. Não poderia voltar, não ainda, por ela. Mas estar tão perto dela, algo que ele esperou ansiosamente por milhares de minutos... não estava sendo o que ele esperava. Quando havia deixado de amá-la?

Ele despertou de seu devaneio com o som de uma bandeja de prata sendo deixada, com cuidados ensaiados, na mesa à frente. Lysandre suspirou silenciosamente e tirou um pedaço de papel do bolso.

– Recebi sua carta, embora já esteja obvio. Confesso que não acreditei que fosse sua, de início.

Ela repousou a xícara de porcelana em um pires em cima de sua saia.

– Não esperava que viesse tão rápido. – Ela levou a xícara mais uma vez aos lábios. – Não esperei que viesse, para falar a verdade.

– Não acredito que tenha perdido seu tempo enviando uma carta em que achasse que seria ignorada.

Ela deixou um sorriso escapar-lhe dos lábios.

– Tu me conheces bem, Lysandre. – Ela repousou a xícara e o pires na mesa - Não menti na carta. Temo ser a única que pode ajudar a todos neste momento. Mas não posso agir, preciso de ti.

Lysandre engoliu em seco, imperceptivelmente.

– Estou aqui. Conte-me, por que precisa de mim?

Lilith mordeu o lábio inferior.

– Agi horrivelmente durante anos, séculos. Não me orgulho de minhas ações. Não estava em mim. – Ela balançou a cabeça – Não sei porque fiz tudo o que fiz! Estava cega! Cega de ódio por ter sido expulsa do Éden! Sempre fui um dos melhores anjos, não sei porque fui escolhida para ser esposa de Adão.

– Talvez exatamente por isso.

Ela suspirou.

– Nunca consigo argumentar contigo, não é mesmo? Sempre perco.

Lysandre a tocou no pulso.

– Lilith, por favor, o que está acontecendo?

Ela olhou para ele de soslaio e virou-se para olhar através da janela.

– É.... uma longa história.

– Conte-me.

– Tu conheces meu codinome, acredito. Lilith, a mãe dos demônios. – Ela cerrou os dentes. – Sinto repulsa em pronunciar isso. Dei à luz a todos os demônios primitivos. Estava obcecada por ódio, vingança, e Lúcifer me deu uma maneira de eu me vingar: criar o mal, acabar com a criação que Nosso Pai tanto ama. Me sinto horrível hoje, mas, naquele tempo, eu aceitei, e não importava os métodos que teria que utilizar, eu só queria vingança, nada mais. Fazer com que Adão e Eva fossem expulsos também, não foi o suficiente. Incitar Caim a matar Abel não foi o suficiente. Eu precisava de mais. Então, eu fiz. Eu sabia o quão grotesco nasceriam as criaturas frutos da relação de um anjo com uma humana, mas assim seria... melhor.

– Eles não deveriam nascer natimortos? – Ele indagou, por curiosidade.

– Apenas se for filho de um puro anjo, com uma pura humana. Lúcifer estava ainda mais obcecado por ódio que eu. Havia perdido quase toda a sua Graça, estava tremendamente manchado. A única parte anjo nele era a que o mantinha vivo, até porque, quando sua Graça é toda extraída, um anjo morre definitivamente. Eu havia sido transformada em uma humana. Da mesma forma, ainda possuía um pouco de Graça. No fundo, ambos ainda éramos anjos, embora caídos.

– Ah, entendo. – Ele piscou.

– Continuando... – Ela suspirou e deslizou os dentes uns nos outros, como que escolhesse o que falar – Durante a Primeira Grande Guerra mundana, tivemos nossa Primeira Grande Guerra também, sei que tu sabes. – Ela sorriu – Foi então que eu percebi que tudo estava errado. Que todas as minhas escolhas, até então, foram equivocadas. Mas era tarde demais. O sangue dos nossos irmãos estava derramado em toda parte. Achei que era o fim do mundo. Mas não foi: o Céu venceu. Lúcifer ficou ainda mais irado. Ele queria mais demônios primitivos, eram mais fortes, mais velozes, mais inteligentes, mais cruéis. Mas eu não podia mais ser a ferramenta dele. No fim, a ideia de um exército não passou de uma ideia. – Ela apertou os dedos – Ele queria mais... mais..., demônios primitivos não seriam suficientes.

Lysandre olhou para ela e percebeu que suas mãos tremiam.

– Eu não tive muita escolha. Ele... me ameaçou. Eu aceitei, embora tivesse uma condição.

– Condição?

Lilith assentiu.

– Eu o ajudaria a dar início ao Projeto Anticristo, se, e somente se, ele recuperasse toda a Graça que me foi roubada.

– Projeto... Anticristo? – Sua voz falhou.

– Isso. – Ela assentiu, receosa – Então, marchamos rumo à Segunda Grande Guerra, tanto mundana, quanto espiritual. – Ela mordeu o lábio inferior – Nunca passou pela minha cabeça que Lúcifer conseguiria recupera-la. Estava muito bem guardada, as sete chaves, no Céu. Mas ele usou a guerra para que um espião no Céu trouxesse minha Graça despercebidamente. – A garota mordeu o lábio inferior – Não tinha mais desculpas. Demos início ao Projeto...

Lysandre continuava ouvindo-a atentamente.

– Todo o sangue dos demônios inferiores que restaram foi drenado e consumido por ele. Tu não tens ideia de quão horrível eram os gritos de Lúcifer. O sangue de demônio estava destruindo a sua parte angelical e substituindo-a por excreções demoníacas. Não havia mais nada de anjo nele ao fim do processo. Seu globo ocular e unhas estavam negros e havia escamas sob a pele. Todo o ar adorável que ele tinha havia acabado. Ele estava um demônio perfeito, se eu posso usar esse adjetivo. Então, o segundo passo: dar à luz ao Anticristo.

Lysandre engoliu em seco.

– Ainda assim, eu não podia deixar aquilo acontecer. Não podia permitir que o plano dele se concretizasse, que tirasse mais ainda a vida de nossos irmãos. Então, eu fiz algo que nunca havia passado pela minha cabeça: retornar a ser um anjo, ainda grávida daquela criatura. Usei a minha Graça, e voltei a ser um anjo. Anjos não podem ter filhos quando o outro não é um anjo, então, eu esperava que eu fosse abortá-lo.

– E abortou?

Ela balançou a cabeça.

– Não. Aconteceu algo inesperado. – Ele percebeu que ela continuava tremendo – Dez meses depois, dei à luz a uma criança. Uma menina, na verdade. Ela tinha os olhos azuis de Lúcifer. – Lysandre percebeu a suavidade na voz dela ao falar da menina, e sorriu.

– O que houve de inesperado?

– Não era o Anticristo. Graças a nosso Pai, não era essa criatura abominável. Pela primeira vez, um híbrido de demônio e anjo conseguiu nascer. – Lysandre ergueu as sobrancelhas - Acredite se quiser. Ao nascer, ela possuía escamas em toda a parte esquerda do corpo, e o outro lado brilhava dourado, como quando os anjos nascem. Minutos depois, um atributo anulou o outro, e as escamas caíram e a luz parou de brilhar. Ela parecia simplesmente humana por fora, mas eu conseguia sentir que ela não o era.

Lysandre continuou observando-a fixamente. Maravilhado, confuso, embasbacado. Não sabia exatamente o quê.

– E o que houve com essa criança?

Lilith mordeu o lábio inferior.

– Na época das bruxas de Salem, uma garota, de cabelos castanhos, fez um acordo comigo. Eu daria a ela todo o poder que precisasse para ser uma das mais poderosas bruxas, e ela, em troca, faria tudo o que eu ordenasse. Quando Lúcifer descobriu que seu plano havia falhado, ele ficou demasiadamente furioso. Então, eu fugi com minha filha, e procurei a minha bruxa. Ela bloqueou toda a forma de magia da minha filha, transformando-a em uma pura humana. Eu, ainda caçada por Lúcifer, deixe-a na porta de um casal de humanos que, felizmente, a adotou. Ainda assim, eu sempre a acompanhei de longe.

Bruxa de Salem de cabelos castanhos? Ele havia ouvido muito Castiel falar dela, de como a odiava, de como ele queria matá-la, mas seria possível que fosse Debrah? Lysandre se mexeu desconfortavelmente no sofá.

– No entanto... Debrah havia me advertido que o feitiço não era eterno. Duraria, no máximo, vinte anos. Mas o poder da minha filha é tão, mas tão forte, que mesmo antes dos dezesseis o feitiço se quebrou. Não sei como, mas Lúcifer descobriu onde ela estava. Minha doce Annabeth... Não, seu nome mundano é Rain. Ele fez com que os pais adotivos dela a deixassem em Sweet Amoris para que os poderes dela despertassem. É aqui que você entra, Lysandre. – Ela o olhou fixamente nos olhos – Você não pode permitir que ele chegue perto da minha filha!

Lysandre se levantou.

– Por que você mesmo não o faz?

– Eu não posso! Eu não tenho... o direito... de ser uma mãe para ela. Não quero que ela saiba.

– Ela já sabe. – Lilith arregalou os olhos – Bem, ao mesmo que é adotada. Os pais sumiram.

– E... como ela reagiu?

Ele deixou um sorriso escapar-lhe os lábios.

– Mal, mas ela vai ficar bem. Alguém importante para ela está ajudando-a a superar.

– Alguém importante? – Ela sorriu – É um garoto?

– Sim. – Ele retribuiu o sorriso. Lilith parecia o anjo que tanto amou no Éden agora mais do que nunca. – Sua filha é uma ótima garota, Lilith. Ela está sempre pensando no próximo, e é forte: mesmo com sua vida virando de cabeça para baixo, ela se manteve firme.

Lysandre sorriu às lágrimas que escorreram pelo rosto de Lilith. Ela murmurava algo entre os soluços, e ajoelhou-se no chão, com a cabeça enterrada na saia.

Ainda bem, ela dizia.

Lilith enxugou as lágrimas e levantou em um pulo, olhando para Lysandre.

– Preciso que faça mais uma coisa por mim.

– E o que seria?

– Notei que sua Graça está demasiadamente baixa. O que houve?

– Acho que Rain... a roubou de mim. – Ele sorriu sem graça. O sorriso desapareceu ao rosto ilegível de Lilith. Ela se aproximou dele em um pulo.

– Você precisa matá-la!

O que? – Lysandre se afastou, por impulso.

– Me expressei mal, me desculpe. Na verdade, não, você realmente precisa matá-la.

Lysandre cruzou os braços.

– Aceito explicações.

– Como eu já disse, Anna... digo, Rain, é metade demônio, metade anjo. A parte dela que roubou sua graça foi a demônio, que precisa de graça dos anjos e almas humanas para se fortalecer. – Lysandre arregalou os olhos – Vai chegar uma hora em que as partes entrarão em conflito, elas não foram feitas para conviver. Elas irão brigar pelo corpo da minha menina, e fará com que ela exploda de dentro para fora. Você precisa matar a parte demônio dela, eu te imploro.

Ele recuou.

Como eu posso fazer algo assim?

– Você precisa fazer a parte demônio despertar. Se ela está, como você falou, gentil com o próximo, é a parte anjo que está se sobressaindo. Quando a parte demoníaca despertar, você a mata. Simples. Ela renascerá anjo. Ou Nephilim.

– Nephilins são proibidos. Anjos com metade humana não são aceitos...

– Tenho certeza que uma parte humana não seria tão ruim quanto uma demoníaca.

Lysandre engoliu em seco.

– Você parece muito com ela... – deixou escapar.

Ela abriu a boca para responder, mas a fechou. Lilith suspirou fundo. A ideia de matar sua filha lhe doía mais do que ela achou que fosse doer. Ela continuaria viva, mas, ainda assim, era sua filha.

– Por favor... Lysandre... – sua voz mal soou.

– Eu... não posso...

– É a sua Graça, é isso? Não se preocupe. Desde que lhe enviei aquela carta, estava preparada quanto a isso.

Lysandre abriu a boca para responder, mas não foi rápido o bastante. Lilith avançou, e o beijou. Ela o segurou pela manga do sobretudo, impedindo que ele se afastasse. As veias dela tornaram-se douradas por alguns segundos, mas logo apagaram. Ela caiu ao chão como uma boneca de pano. Foi a vez das veias dele brilharem dourado e então, ouviu-se alto o bater de asas. Sua cabeça fervilhou, sua visão aguçou. Era anjo outra vez. Ele ajoelhou-se ao lado dela.

– O que você fez? – Mas ele já sabia.

– Dei minha Graça para você. – Respondeu ela, com dificuldade.

– Não devia ter feito isso! – A voz dele falhou.

– Sim, eu devia. Já vivi por muito tempo, Lysandre. Fiz coisas terríveis. Pelo menos, no fim, eu deveria fazer algo bom. Eu estou... com medo... Lysandre. Os humanos, quando morrem, vão para o Céu, para serem cuidados por nós, anjos. Mas para onde nós vamos? Nenhum de nossos irmãos jamais voltou quando morreu.

– Nosso Pai vai ser justo com você, Lilith. Ele não vai permitir...

– Ele – ela o interrompeu – já foi bom demais para mim. Ele me permitiu conhecer você, e simplesmente por isso, posso dizer que minha vida valeu a pena.

– Lilith...

– Por favor, Lysandre... – implorou ela, em seu leito de morte, enquanto sentia seus ossos e pele virarem pó – Faça o que te pedi. Mate a parte demônio dela. Mesmo que seja eu... eu a amo.

E então, em seus braços, Lysandre viu a mulher que tanto amou, a mulher que tanto errou, a mulher que tanto se culpou, transformar-se em cinzas.


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Notas finais do capítulo

Lilith não teve muitas aparições, mas é um personagem que me apeguei. Fiquei com o coração muito apertado escrevendo a última parte. :c
TUDO FOI REVELADO!
E agora, o que acham que vai acontecer? hehhehehehehhe
Estou muito animada para a continuação. s2
Espero que não demore para com o próximo. Próxima semana começam as provas finais, sabem como é.
Tia Soul ama vocês, obrigada por lerem.
Beijinhos e até mais. s2
~Soul