Blood Curse escrita por Soul Kurohime


Capítulo 36
Especial - Quarto Branco - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Sim, parte 2. A parte um foi o especial de Nathaniel!
Gente, beleza, eu demorei. Mas olhem o tamanho do capítulo e me perdoem. Levei muito mais tempo para escrevê-lo do que achei que demoraria. Tive que tirar muuuuuita coisa do que estava previsto para não ficar longo demais. :c
Espero que gostem. :3
Boa leitura! s2
~Soul



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Londres, 1885.

O céu londrino de início de dia estava acinzentado como os outros que haviam passado. O vento gelado que anunciava a chuva era barrado pelos vidros das janelas, causando assovios que ecoavam pela sala de estar. Ainda assim, os tecidos de seda que cobriam a cama de casal do quarto do fim do corredor no segundo andar estavam intactos.

O frio indesejado daquela manhã fazia com que os ossos do homem doessem. Ele andou – enquanto praguejava para as paredes – até a lareira do outro lado da sala e a acendeu: apenas aquele calor acolhedor poderia salvá-lo de uma precoce morte por hipotermia.

Ele se sentou na poltrona em frente à lareira e tomou um gole do chá enquanto folheava o jornal daquele dia. Depois da terceira página, ele já estava adormecendo: havia passado a noite toda em claro, pois a quietude do lugar dava à sua preocupação as mais insanas possibilidades para com o futuro daquela mulher.

O homem despertou com o barulho da porta pesada de madeira sendo arrastada. Ele se levantou – querendo parecer o mais calmo possível -, colocou o jornal com cuidado onde outrora estava sentado e a encarou. Ela, como se nada tivesse acontecido, apenas sorriu para ele.

– Estava... me esperando? – Ela olhou através dele, como se procurasse algo.

– Apenas me levantei mais cedo do que o costume. – Mentiu.

– Sério? – Ela não parecia convencida. – Devo encontrar um trevo de quatro folhas hoje. Eventos bizarros estão acontecendo, ao que me parece.

Ele apenas ignorou, desviando o olhar.

– E você? Vejo que acordou bem cedo também.

– Não estou disposta para joguetes, Castiel. Ambos sabemos que não dormi em casa esta noite.

– Então vá direto ao ponto. Não preciso perguntar para que saiba o que desejo saber, não é mesmo?

– De fato. – Ela se aproximou dele – Estava em um baile, querido. Não sabia que era proibido a mim ir a bailes. Até porque, se não fosse por esses nossos adorados bailes, nunca teríamos nos conhecido.

Ele sentou novamente na poltrona e bebeu mais um gole do chá. O frio estava realmente insuportável naquele dia, e ficava cada minuto mais intenso.

– Da mesma forma que sabe que não é proibida a ir a bailes, sabe que não deve comparecer aos mesmos sem a companhia de seu marido.

– Claro. – Ela sorriu – E também sei que humanos devem ter uma ótima noite de sono todos os dias para não acarretar problemas futuros.

Ele olhou para ela de cima a baixo.

– Isso também se aplica a você. – Então, ele bebeu mais um gole do chá, que desceu doce por sua garganta.

Ela se ajoelhou aos pés dele quando os pingos de chuva começaram a agredir com força a janela de vidro.

– Ora, Castiel! – Sua voz soava triste e incompreendida – Sabe que nos casamos demasiado jovens em comparação aos outros. Deveria entender que, jovem que sou, não estou preparada ainda para as regras impostas pela sociedade a nós, senhoras. Algumas vezes, quando me olho no espelho, ainda me vejo como uma senhorita! Esta aliança de ouro que carrego em minha mão que me desperta de meus devaneios!

Castiel olhou para ela. Ela não estava totalmente errada. Haviam se casado há pouco mais de dois meses, e ambos tinham dezessete anos. Debrah, por sua vez, não havia recebido uma boa educação acerca da sociedade: era órfã, e havia sido criada por uma velha senhora em um orfanato escondido da cidade londrina.

Mas isso não mudava o fato de que, até de longe, ela era linda. Seus cabelos longos e castanhos – com as mexas frontais amarradas em um coque atrás da cabeça – contrasteava perfeitamente com seus olhos azuis. O vestido azul que usava agora, enquanto ajoelhada aos seus pés, era o mesmo que usara quando se conheceram: não permitia mostrar nenhum pedaço de sua pele macia e perfeita, sem nenhuma mancha ou cicatriz. Apenas ele sabia que ela assim era.

Lembrou-se de quando a notícia de seu casamento se espalhou pela cidade: Ele, um herdeiro rico, casando-se com uma mulher que, além da beleza e do vestido deixado para ela por sua mãe, nada o tinha. Todos diziam que ela era apenas uma mulher gananciosa, que estava se casando apenas para usar de Castiel e do dinheiro que possuía, mas apenas ele sabia, ao encarar os olhos azuis de Debrah, que o amor que sentia era recíproco.

– E tem mais... – ela continuou, estranhando o silencio de Castiel – Era um baile apenas para as mulheres.

Ele franziu o cenho.

– Apenas para as mulheres? Como funciona esse baile, se não há homens para acompanha-las nas danças?

Ela levou o dedo indicador direito a boca, como quem pede silêncio.

– É um segredinho nosso. – Ela riu – Assim como a existência do baile. Não saía comentando por aí. Apenas nós, mulheres, temos o direito de saber sobre ele.

Ele olhou para ela por alguns segundos, para logo sorrir.

– Desculpe. Estava preocupado.

– Eu errei em não o avisar. Deveríamos sair escondidas e voltar antes do levantar, mas não consigo esconder nada de você, não é mesmo? Eu que devo me desculpar.

Ela sorriu para ele e se levantou. Desfez o coque, e deixou que os fios castanhos escorressem pela seda do vestido.

– Estou realmente muito cansada. – Ela suspirou. – Vou banhar-me. – Debrah andou para a escada e parou no primeiro degrau para olhar para Castiel. Ele notou, e retribuiu o olhar. Ela levou a mão enluvada para o zíper do vestido, em sua costa. – Realmente tenho problemas com este zíper! Poderia me ajudar com isso?

Castiel ergueu as sobrancelhas e sorriu. Logo, estava dando um último gole em seu chá e levantando-se da poltrona, para a seguir para o último quarto do segundo andar.

*

Dois meses passaram-se, e os bailes de Debrah eram contínuos aos fins de semana. Ela saía onze da noite, e voltava às sete da manhã. Ao menos uma parte de Castiel estava aliviado, pois sabia onde ela estava. Outra parte, no entanto, não conseguia deixar-se de estar aflita: Londres não era exatamente a cidade mais segura.

Era por isso que, ao menos daquela vez, ele estava disposto a impedi-la.

– Venha comigo.

Aquela havia sido sua resposta. Castiel estava completamente surpreso, mas, ao mesmo tempo era, talvez, sua única chance de ver, através de seus próprios olhos, onde sua esposa ia todos os fins de semana. Transparecendo uma relutância forçada – que arrancou leves risadas de Debrah -, ele aceitou.

Eles entraram na carruagem e seguiram pelas ruas escuras e molhadas de Londres até uma construção antiga nos arredores da cidade. Aparentando ser apenas ruínas malcuidadas, Castiel franziu o cenho. Debrah ajeitou o chapéu ao descer – com a ajuda do chofer – da carruagem, e sorriu para Castiel com seus lábios rosados. Ele sorriu torto para ela, e voltou sua atenção novamente àquele prédio que tanto o intrigava.

Debrah tocou Castiel no pulso e, mesmo com o clima chuvoso de Londres, ele parecia quente ao toque dela – com certeza, todas as roupas que ele usava mantinham sua temperatura constante. Ela entrou no prédio e o moreno a seguiu. As ruínas tampouco pareciam diferentes do lado de fora: paredes rachadas, tinta descascada, o chão sem piso molhado pelas goteiras.

De primeiro, poder-se-ia adivinhar que o prédio era, há alguns anos, um hotel. Havia uma bancada na frente de um guarda-chaves, ambos de madeira e detritos pelas más condições do lugar. Na esquerda, havia um corredor – comprido e repleto de portas de madeira – pelo qual seguiram. Debrah entrou em uma das últimas portas, e a fechou quando Castiel passou por ela. Tudo ficou estranhamento escuro e quieto, até Debrah pegar um pequeno lampião de ferro em uma cadeira daquele antigo quarto de hóspedes e o acender.

Ela olhou para ele e sorriu mais uma vez. Ele retribuiu com um meio-sorriso. Debrah virou-se e andou até uma das paredes para passar por uma pequena passagem que ali havia – pequena o suficiente para que ela precisasse se abaixar para passar. Logo, estavam descendo por uma escada íngreme, estreita e escorregadia.

Castiel julgou que, o lugar para onde estavam indo, era o sótão. De repente, com um sopro, Debrah apagou o fogo do lampião. Tudo havia ficado ainda mais escuro e sombrio que antes. Ele desceu os últimos degraus com dificuldade e procurou a parede mais próxima. Castiel encostou-se em algo quadrado e recuou pelo susto, derrubando algumas coisas de vidro que seus braços encontraram.

– Não derrube minhas coisas, querido.

A voz dela soou melodiosa no meio daquela total escuridão. Então, as luzes ligaram, todas ao mesmo tempo. Brancas, atacaram sem pudor as pupilas de Castiel. Ele arregalou os olhos. Não havia nada de baile naquilo.

Diferente de todo o resto do prédio, as paredes daquele lugar eram impecavelmente brancas. Havia algumas prateleiras de madeira escura nas paredes, cheias de vidros com líquidos coloridos. O chão estava coberto de piso branco e, no meio do quarto, havia uma cama cirúrgica, também branca. Ele olhou para o chão, e os vidros que ele havia derrubado estavam estilhaçados no chão. Os líquidos que antes estavam dentro dos mesmos se misturavam e borbulhavam, formando uma coloração roxa.

– Você não acha a cor branca tão... perfeita? – Ela olhou para ele, com os olhos brilhando – Tão pura. Tão especial. Por mim, todas as coisas deveriam ser tingidas de branco.

Ele olhou para ela embasbacado.

– Alguns chamariam de racismo.

– Ora, não. – Ela balançou as mãos negativamente – Não é isso. As coisas, amor. Pessoas não são coisas.

Ele continuava perplexo. Não com a conversa, mas sim com o lugar. A substancia roxa que havia se misturado possuía um cheiro bastante doce. Doce demais. Ele sentiu sua cabeça girar, a força lhe faltar, o mundo virar de cabeça para baixo. Quando suas pernas perderam a força, ele se apoiou na bancada de ferro ao seu lado. Os fios negros balançaram, e sua visão tornou-se tão escura quanto suas madeixas.

*

Ele piscou os olhos pesadamente e sentiu suas pupilas queimarem. Uma enxaqueca forte o atacou, e ele levou as mãos aos cabelos. Sua pele estava extremamente gelada ao seu toque. A luz continuou atacando-o com infinitos volts e ele rolou da cama para o chão. Arrancou-a da tomada e viu-se novamente afogado em uma escuridão infinda.

Engoliu em seco para logo arregalar os olhos. Estava completamente escuro, mas, ainda assim, seus olhos acostumaram-se à escuridão. Castiel conseguia ver nitidamente cada detalhe daquele lugar: o sótão do hotel.

A enxaqueca havia passado, e ele levantou-se do chão. Andou até a pia da bancada de ferro e encheu um copo com água. Sua garganta estava horrivelmente seca, e ele estava com uma sede tremenda. Mas, ao primeiro gole, sua garganta queimou, obrigando-o a cuspir. Ele tentou mais uma, duas, três vezes, mas seu corpo rejeitou cada uma delas.

Então, a luz ligou novamente. Ele, por instinto, olhou, e suas pupilas queimaram, fazendo-o gritar de dor.

– Castiel.

Ele tampou o contorno dos olhos com as mãos e, apertando os olhos, olhou para ela. Debrah, olhando completamente fascinada para ele.

– Não acredito que funcionou. – Afirmou.

– O... o que? O que funcionou? Por que você está gritando?

– Eu não estou gritando, meu amor. Seus ouvidos estão bem... sensíveis. – Ela sorria – Para falar a verdade, mal estou balbuciando estas palavras.

O que está acontecendo? – Ele gritou.

Ela se aproximou dele e o tocou.

– Eu mudei você, Castiel. Mudei para melhor.

Ele olhou confuso para ela, evitando a luz.

– Visão e audição mais aguçadas. Super força. Super velocidade. Imortalidade.

Quem é você? – Ele parecia visivelmente assustado.

– Uma... cientista. – Ela sorriu – Sou uma bruxa sobrevivente de Salem. Sinto muito enganá-lo assim, meu amor, mas, quando o vi, eu soube! – Os olhos dela brilharam – Era por você que eu procurava! Por baixo de toda essa... humanidade – ela gesticulou com as mãos – você era o vampiro perfeito!

– Bruxa? Vampiro? Você é louca! – Ele a empurrou.

Mesmo que ele não tivesse colocado força o suficiente para aquilo – ele nem mesmo a possuía – Debrah voou e atingiu em cheio a parede do outro lado da sala. Castiel olhou para ela e sentiu vontade de correr até a garota que amava. Então, no outro milésimo de segundo, ele já estava em frente a ela. Tonto, ele ajoelhou-se e a segurou pelos ombros.

– Debrah?

Sangue escorria de um pequeno ferimento na cabeça da bruxa. Ele sentiu uma vontade altamente incontrolável de perfurar os vasos sanguíneos dela e beber de seu sangue. Vontade muito maior que a sua repulsa. Ele gritou de dor quando suas presas desceram pela primeira vez e sangue escorreu pelo seu queixo, pingando no vestido marrom que ela usava.

Ele a puxou contra si e, por um instinto puramente animal, perfurou a veia pulsante do pescoço dela. Debrah mexeu os braços procurando libertar-se, mas Castiel a segurou pelos pulsos e a jogou contra parede – deixando-a inconsciente –, e continuou a sugar sua força vital.

Ele levou uma mecha do cabelo dela para atrás da orelha e, ao deslizar suas mãos no torso da garota, sua aliança de ouro ficara presa em uma linha solta do vestido. Ele olhou para aliança, que refletiu a luz da lâmpada que iluminava o quarto e, consequentemente, queimou suas pupilas.

Castiel arquejou e se afastou da garota, usando suas mãos para proteger seus olhos. Ele levantou os olhos para a mulher em sua frente e ficou completamente congelado com o que vira: a garota que amava, desmaiada, com um ferimento profundo no pescoço, feito por ele.

Mas o que ele era agora, era culpa dela. Se ela morresse por suas mãos, nada seria mais justo. Ele provocou com a ideia de matá-la, e ainda mais por saber que havia bebido sangue humano. E que havia gostado.

Não queria vê-la. Amava-a, mas a odiava. Queria matá-la, e começou a odiar a si mesmo por saber que não seria capaz de fazê-lo.

Vampiro. Monstro. Sangue. Repulsa.

Olhando para ela, ele suspirou fundo e seus pulmões queimaram. Ele tossiu. As presas retraíram e ele levou a mão à boca pela dor. Mais sangue dele escorreu, fundindo-se com o dela. Castiel se levantou com um olhar triste sob ela. As luzes falharam, e no outro segundo...

Ele não estava mais lá.


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Notas finais do capítulo

E então, gostaram?
Por favor, me digam suas opiniões. Acho que foi um dos capítulos mais trabalhosos para ser escrito. Mas eu gostei do resultado, espero que vocês também! s2
Obrigada por lerem, Soul ama vocês. s2
Beijinhos,
~Soul.