Criança Perdida escrita por Lu Rosa


Capítulo 26
Capitulo Vinte e Seis




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Alexia se aproximou da caixa azul. Estendeu a mão para ela, sentindo na ponta de seus dedos a textura da madeira. Aquele pequeno gesto lhe trouxe lágrimas aos olhos e um nó em sua garganta. Ela sentia a nave pulsar sob seus dedos lhe trazendo uma sensação de conforto. O elo que as unia ainda existia e Alexia se sentiu voltando para casa.

Sem que ela pedisse, a porta da nave se abriu, como se lhe desejasse boas vindas. Alexia entrou na nave e constatou que ela permanecia a mesma. As luzes piscavam com se fosse uma forma de comunicação. Alexia foi até o console e o tocou.

— Olá TARDIS. Senti saudades.

— Como entrou aqui? – o Doutor surgiu de um dos corredores. – Foi a Sarah Jane que a trouxe? Mas, por favor, não se assuste. Posso lhe explicar.

— Você não precisa me explicar. – Alexia saiu de perto do console – Eu sei de tudo.

— Foi a Sarah Jane que contou a você? Ela deve confiar bastante em você para falar de mim.

— Não foi a Sarah Jane, Doutor. Eu sempre soube de tudo. Desde o dia do cometa, lembra-se?

O Doutor ficou paralisado por alguns minutos, que Alexia se recriminou por ter se dado a conhecer tão cedo. Talvez ele não estivesse preparado.

— Não pode ser... Você não deveria lembrar-se de nada. Eu entrei em sua mente

— Todo bom soldado deve aprender a controlar a sua mente. Assim ele não sente medo, frio ou fome, Doutor. Você só fechou as portas que eu permiti que fechasse. Eu nunca esqueci você, nem tudo que vivemos juntos.

— Mas a Sarah Jane me disse...

— Ela disse a você a mentira que nós vivemos há quase um ano. Mentir a você foi a pior coisa que ela me disse ter feito. Por isso estou aqui. Ela praticamente me intimou a vir aqui e contar toda a verdade.

— Mas você continuaria mentindo se pudesse?

— É claro. Você quem disse para que eu continuasse a viver. E foi o que eu fiz. Arrumei um emprego, um pretendente...

— Um pretendente? – a caixinha com o anel pareceu queimar no bolso do casaco do Doutor.

— Sim. Charles Peterson. Um professor que dá aulas no mesmo colégio.

— Você se tornou professora? Não acredito!

— É. Dou aulas para o Fundamental. Não é muito complicado. As crianças me acalmam. Você deveria tentar... Dar aulas é muito bom. A energia das crianças é um bálsamo, depois de ser um soldado.

— Talvez eu tente um dia. Mas... Esse pretendente... Ele já, tipo assim, a pediu em casamento? Você tem algum compromisso com ele?

Alexia se sentiu tentada a mentir.

— Não. Ele me pediu, mas eu não aceitei. Disse a ele que era muito cedo para um compromisso mais sério.

Ele não escondeu o alivio. – Que bom...

— Bom?

— É. Ele a conhecia há tão pouco tempo e já vai assim pedindo em casamento. – ele declarou um tanto irritado.

— Ele, pelo menos, me pediu. – a acusação permeava a suas palavras.

O Doutor pesou as palavras antes de retrucar.

— Eu não podia permitir que você estivesse na Guerra do Tempo comigo. Você não sabe como foram os primeiros dias. Antes que as forças de Gallifrey pudessem repelir os ataques.

— Sorus? – Alexia perguntou com voz baixa.

— Foi ferido, mas sobreviveu. Conseguimos salvar muitas pessoas, antes que a minha outra versão chegasse.

— Vocês se encontraram?

— Sim. Uma ou duas vezes durante a Guerra. Foi estranho... E no final, eu encontrei mais outras versões minhas. Do passado e do futuro.

— Do seu futuro? Mas você me disse que era sua última vida.

— Foi o que eu pensei. Mas no pior momento, quando todos nós pensávamos que tudo tinha sido em vão, uma versão minha apareceu do futuro

— E então vocês salvaram o planeta?

— Sim. Todos nós unidos. Depois cada um voltou para a sua própria linha temporal.

— Então meu sofrimento não foi em vão. – ela virou de costas para ele.

— Você sabe que eu não queria que você sofresse. Por isso eu tentei apagar sua mente em relação a mim. Eu voltei disposto a reconquistar você aos poucos. Quero viver o resto da vida com você.

Ela voltou-se para ele com um sorriso maroto nos lábios. Chega de mentiras, a hora da verdade chegara.

— Chegou tarde, Doutor. Já existe uma pessoa que me conquistou.

Ele se aproximou dela.

— Não é verdade.

— Ah, é sim. – ela balançava a cabeça reafirmando sua frase. – E é por isso que eu estou aqui. Quero lhe agradecer por ter me deixado aqui. Se eu tivesse ido com você eu acho que nem teria tido chance de conhecer a pessoa mais importante para mim em todo o Universo.

— Então, mesmo sem ter aceitado o convite de casamento do seu colega professor...

— Charles não tem nada a ver com isso. – ela deu um sorriso – Essa pessoa é tão importante que ela é uma parte de mim.

— Sei... – o Doutor sentou-se em sua poltrona favorita.

— Não. Não fique aí. Porque você vai conhecer essa pessoa. – Alexia pegou em sua mão e tentava lhe puxar.

— Eu não quero conhecer ninguém, Alexia. Eu vim até aqui por que achava que teria alguma chance para nós.

Ela parou no mesmo instante.

— Você quer dizer que...

Ele levantou-se da poltrona e a segurou pelos ombros

— Que eu ainda a amo, Alexia. Agora mais do que nunca. Chega de salvar o Universo, de enfrentar monstros ou tiranos sedentos de poder. O Universo tem que tomar as rédeas da situação, e as civilizações precisam aprender a se defender sozinhas.

— Mas você é um herói, não pode abandonar tudo.

— Antes de ser um herói, eu sou alguém. Alguém que quer amar e ser amado. Alguém que já perdeu muito em toda a sua vida. Alguém que fugiu por toda a sua vida. Mas, em você, eu encontrei o meu refugio. Não preciso mais fugir.

Ela queria muito jogar-se em seus braços depois dessa declaração. Mas havia algo ainda a ser feito.

— Então, mais um motivo para que você conheça essa pessoa tão importante para mim.

— Depois de tudo isso que eu disse a você, você quer que eu conheça alguém que vai tirá-la de mim?

— Ai, meu Deus! Que homem mais dramático! Você pode vir comigo primeiro e depois tirar as suas conclusões. – Alexia começou a puxá-lo em direção à porta.

O Doutor a seguiu imaginando se o seu cruzado de esquerda ainda era tão bom quanto na época da Academia. Por que ele iria precisar.

Alexia e o Doutor entraram na casa de Sarah Jane.

— Sarah? Sarah Jane? – Alexia chamou. – Nós chegamos. – a jovem foi até o pé da escada, enquanto o Doutor sentava-se em uma poltrona.

— Estou aqui em cima. Nós quem, Alexia?

— Eu e o Doutor. Eu o trouxe para conhecer a pessoa mais importante da minha vida, Sarah Jane.

— Você vai apresentá-los? Tem certeza. Pode ser perigoso... – o tom de Sarah Jane parecia ser de troça.

— Sarah Jane, por favor! Quem quer que esteja ai com você pode trazê-lo. Prometo que me vou me comportar com civilidade – o Doutor estava muito irritado com a situação.

Alexia aproximou-se dele com um sorriso malicioso.

— Nossa! Doutor, por que esse ar tão carrancudo? Você sabe que não precisa ficar desse jeito.

— Eu mudei muito, Alexia. Você mais do que ninguém deveria saber que uma guerra muda as pessoas.

Ela riu um pouco.

— Você não mudou com a guerra, Doutor. Você está com ciúmes.

O Doutor revirou os olhos para cima.

— Alexia, nós já estamos descendo...

O Doutor levantou-se da poltrona e foi até a janela. Alexia admirou o porte elegante daquele homem que ela conhecia tão intimamente. Ele olhava para fora, porém sem nada ver. Todos os seus sentidos estavam voltados para os sons atrás de si. Tinha alguma coisa errada... Um par de passos. Passos femininos. Um leve gemido, como um filhote de gato. O Doutor virou-se. Mas invés de duas mulheres e um homem, ele viu as duas mulheres e uma delas carregava um pequeno pacote.

— Doutor, - Alexia tinha um sorriso enorme no rosto – esta é a pessoa mais importante para mim em todo o Universo. Este é Adrian. Nosso filho.

O Doutor olhou para o pacotinho nos braços de Alexia. Um bebê?! E anunciado como seu filho.

— Como? Como isso aconteceu? – ele realmente estava aturdido.

Alexia estreitou os olhos. O Doutor sabia que isso queria dizer problemas.

— Quando você me deixou aqui, eu estava grávida. Adrian foi concebido na noite dos meteoritos, lembra-se?

É claro que ele se lembrava. O Doutor aproximou-se dela e do bebê. O pequeno ser recém acordado olhou para ele com brilhantes olhos azuis. A boquinha abriu-se em um sorriso. O Doutor olhou maravilhado para Alexia. Sorrindo, estendeu o dedo tocando as mãozinhas que se agitavam.

Alexia colocou o bebê nos braços do Doutor, que ficou meio indeciso, com medo de pegar o bebê. Ele parecia tão pequenino, tão indefeso. Mas logo pai e filho pareceram amoldar-se um ao outro, como se não fosse a primeira vez. Ele continuou olhando Adrian, registrando cada detalhe do rosto infantil, as unhas diminutas da pequena mão, a maciez dos cabelos castanhos.

Alexia e Sarah Jane olharam-se com olhos rasos d’agua, emocionadas com a cena. As duas sabiam do que aquele homem era capaz, mas vê-lo tão entregue, tão desarmado...

Sarah Jane saiu discretamente para deixar o casal à vontade. Alexia colocou o bebê no carrinho.

— Durante o tempo em que fiquei desacordada, a Sarah Jane pediu ao seu computador, o Sr. Smith, fazer uma varredura em mim e ele detectou a gravidez. E ele tem cuidado de mim desde então. Eu não podia arriscar que médicos da Terra pudessem descobrir. Adrian nasceu há dois meses

— Oh... Mas há dois meses aconteceu a invasão Dalek.

— É. E eu apertei meus lábios até eles sangrarem para não gritar.

Ele se aproximou dela e lhe tocou os cabelos com carinho. Mais uma vez, fizera alguém sofrer.

— Alexia, eu peço que me perdoe. Eu deveria ter evitado...

— Nem continue! Nós só estamos tendo essa conversa por que Sarah Jane não acha justo que eu esconda isso de você. Mas Adrian é meu. Você pode continuar suas viagens pelo Universo. Nós não precisamos de você. – cada fibra do coração de Alexia sangrou por aquelas palavras.

Sarah Jane, que escutava a conversa sem nenhum arrependimento, bufou de raiva. Aquela cabeça dura estava expulsando o homem que amava de sua vida!

— Se você quer assim Alexia... Eu não posso pedir pra ser diferente. O que eu fiz, eu fiz para garantir a sua segurança, e não me arrependo disso.

— Ok. E eu estou fazendo isso pela minha sanidade. Por que o que você tem a me oferecer, Doutor? Já sei! Todo o Universo. – ela respondeu quando viu abrindo a boca. – Mas eu não quero o Universo. Eu quero uma família. Um homem que me ame, mas que esteja sempre ao meu lado. E não desapareça quando a estrela não sei do quê na galáxia não sei onde correr o risco de explodir, ameaçando o planeta não sei qual. Desculpa. Você queria que eu seguisse a minha vida. Pois bem. É isso que eu vou fazer. Vou aceitar o pedido do Peterson e vou ter a minha família humana afinal.

— Seja feliz então. – ele passou por ela em direção à porta. Alexia permaneceu parada. O Doutor foi até a porta e abriu. Mas na mesma hora ele a fechou com força, caminhou até a Alexia em quatro longos passos e a virou para ele.

— Não! Eu não atravessei galáxias para chegar aqui e ver você com outro homem. – ele a enlaçou e a beijou intensamente.

Ela correspondeu ao beijo como se sua vida dependesse disso. Os dois sentiram como se o próprio tempo parasse e como se todo o Universo cantasse em júbilo ao reencontro.

— Você e eu. TARDIS agora. – ele a puxou pela mão e a levou porta afora.

— Mas Doutor. E o Adrian? Tenho que vê-lo.

— Não se preocupe. Ele está em ótimas mãos, não é Sarah Jane? – a porta se fechou suavemente

Sarah Jane saiu de seu esconderijo e foi até a janela ainda a tempo de ver a nave desmaterializar-se. Ela foi até o carrinho e pegou o bebezinho ali deitado.

— E assim, meu queridinho, agora o Universo vai tremer. – ela olhou para o bebezinho em seus braços.

E não é que o danadinho parecia sorrir.


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