Cinzas escrita por Ludi


Capítulo 23
Romênia


Notas iniciais do capítulo

Enfim chegamos ao ponto onde todxs queriam, eu suponho. Agradeço demais ao apoio da Rose até aqui e torço para que eu possa corresponder às expectativas dela. Seus comentários foram o que me guiaram por todo esse percurso e eu não tenho palavras para expressar o que esse suporte representa.

A partir desse capítulo a história mudará de natureza, no sentido de que teremos que nos aprofundar na relação dos dois e deixar o plot um pouco de lado. Enjoy! =)

Cara, esse capítulo ficou IMEEEENSO - quasse dez mil palavras, para minha surpresa- mas não tive coragem de parti-lo em dois, seria muita maldade =P

Estou morrendo para saber o que vão achar, não se esqueçam de me contar, haha!



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Gina se debruçou sobre os pedidos de ingredientes que ela faria para a próxima semana, com a testa franzida e extremamente concentrada. Nos primeiros dias depois da visita ao Ministro – e a Voldemort – Gina usara o trabalho como sua tradicional válvula de escape, na esperança de que tudo voltaria ao normal em breve. E, realmente, sua esperança não havia sido em vão: tudo tinha voltado a se encaixar no seu devido lugar. Com a ajuda de Dave, a loja progredia e já gerava lucros que a ajudariam na recuperação do seu dinheiro; sua casa estava em ordem – principalmente graças a Della -, James crescia a olhos vistos e alegrava suas noites, sua família estava se saindo bem das investidas do Ministério e, tirando o sono e a vontade de ir ao banheiro a cada vinte minutos, Gina e seu bebê se sentiam muito bem.

Mas, como nada podia ser perfeito, sua mente traiçoeira insistia em invocar a imagem de Draco Malfoy, seguida de uma série de questionamentos.

Em teoria, os dois estavam quites; ela tinha colocado-o numa enrascada (ainda que ele tivesse merecido), mas tinha livrado-o do problema mais depressa do que era esperado. Ainda assim, era com frequência que ela se pegava rabiscando algum pergaminho aleatoriamente, com a cabeça na doninha branquela.

Dois meses se passaram desde o incidente – como ela insistia em chamar seu pequeno escândalo - sem que ele tivesse dado sinal de vida.

Dois meses!, ela bufou, entre irritação e despeito.

Ele nem havia se incomodado de mandar uma coruja! Não que ele tivesse alguma vez se importado em mostrar qualquer sinal de respeito ou consideração com as suas angústias, de qualquer forma. Provavelmente ele sequer sabia das angústias dela, uma vez que, verdade fosse dita, a própria Gina tentava ignorá-las na maior parte do tempo.

Suspirou, resignada, sabendo que o melhor era enfiar a cara no trabalho. Ela anotou mais alguns ingredientes que precisaria na semana seguinte, mas, depois de mais um deslize momentâneo, sua mão já estava desenhando uma outra palavra no papel.

Drac..., ela parou subitamente se dando conta do que estava fazendo e apoiou o rosto na mão.

Eles não deviam mais nada um para o outro, de fato; entretanto, não saber o quanto ele tinha sido prejudicado por aquela história – não saber se ele estava bem – estava incomodando Gina mais do que ela queria admitir.

Soube através de Olívia e d'O Profeta Diário que ele havia sido mandado para os Estados Unidos há dois meses e só tinha voltado para a Europa ocasionalmente, para visitar alguns países da Europa Oriental, mas sempre acabava regressando para a América na sequência. Nunca para a Inglaterra.

Fazia parte da política de Voldemort estender seus domínios para outros países e, para Draco, sair de cena por um tempo era importante.

Ele tinha sido mandado especialmente para negociar com o chefe de Estado bruxo dos Estados Unidos e estava enfrentando resistência ideológica naquele país. E, na cabeça de Gina, isso significava de que não havia perspectivas para sua volta, pelo menos não tão cedo.

Que se dane!, num impulso de rebeldia, ela se levantou bruscamente, juntou todas as suas folhinhas rabiscadas e se recusou a pensar no assunto.

Iria para casa mais cedo, ficaria com o filho e comeria todas as guloseimas que tivesse vontade.

Quando estava terminando de se aprontar para sair, Dave apareceu tímido, como era de costume, para anunciar que a mulher do Ministro estava lá para vê-la. Gina mandou que ela subisse sem demora; ver Olívia sempre era bom para alegrar seu estado de espírito.

Olívia entrou levemente esbaforida e se começou a tagarelar, depois de dar um leve beijo em cada bochecha de Gina.

"Querida, ele logo voltará para Inglaterra!" Ela se sentou numa cadeira com certo estardalhaço. Vendo a expressão interrogativa no rosto da ruiva, ela completou. "Estou falando do seu marido, só para constar. Estou bastante atarefada, mas achei melhor passar aqui para te dar a notícia."

Gina se inquietou.

"Eu agradeço, mas-." Ela tentou dar de ombros como se não se importasse, antes de continuar. "-mas por que você se deslocou até aqui para só para me contar?"

"Não sei ao certo." Olívia respondeu um pouco sarcástica, depois de olhá-la ceticamente. "Desconfio que seja porque estou te visitando há semanas e cada vez mais você parece estar ficando mais amuada. Achei que tivesse algo a ver com a ausência dele." Ela completou maliciosamente e Gina corou.

"Sinto te desapontar, minha amiga, mas estive muito ocupada nas últimas semanas para ter tempo de me preocupar com Draco." Ela tentou responder da forma mais indiferente que pôde.

Olívia olhou fixamente para ela e em seguida para o pergaminho sobre a mesa onde Gina havia começado a rabiscar o nome de Draco. Gina, por sua vez, um pouco mais vermelha, incendiou o papel rapidamente com um toque da varinha.

Olívia não fez a menor questão de esconder o sorriso.

"Claro que sim, minha querida. Só achei importante te dar a notícia." Deu dois tapinhas condescendentes na mão de Gina, como se estivesse se preparando para sair. "De qualquer forma, é melhor se preparar. Ele deve chegar da Romênia amanhã."

"Romênia?" Gina perguntou mordendo o lábio, dividida entre a curiosidade e a vergonha de saber menos do paradeiro de Draco do que Olívia . "Achei que ele estivesse nos Estados Unidos..."

"Estava, até três dias atrás." A mulher do Ministro explicou. "Você-Sabe-Quem convocou alguns dos seus principais comensais para frear os ataques da Resistência na Europa Oriental. Eles elegeram a Romênia como o alvo principal; parece que o país concentra a cabeça do movimento fora da Inglaterra."

Gina a olhou abismada pensando em Carlinhos e Olívia interpretou sua expressão erroneamente.

"Ah sim, admito: Eu escuto atrás das portas e leio alguns dos documentos de Pio que consigo por a mão. Afinal, não posso esperar que ele me conte qualquer coisa, não é?" Ela falou, um pouco corada de vergonha.

A bem da verdade, Gina estava bem distante de estar chocada com a bisbilhotice da amiga: Faria o mesmo se estivesse no lugar dela, com um marido sob a Maldição Imperius. Mas sua mente se concentrava freneticamente em outro problema; então, resolveu verbalizar suas reais dúvidas.

"Tem certeza de que o Ministério vai mesmo atacar a Resistência na Romênia?" Ela perguntou com voz trêmula e empalidecendo visivelmente.

Olívia deu um suspiro triste. "Sim. E eu tenho razões para crer que será algo fulminante. Não como das outras vezes, onde a Resistência acabava sabendo, de um jeito ou de outro. Dessa vez, pouquíssimas pessoas sabem, somente as envolvidas. Será algo bem surpresa."Ela continuou, pensativa. "Além do mais, é um alvo muito fácil; por estarem distantes da Inglaterra, eles se julgam seguros e, liderados por aquele rapaz Weasley, andam espalhando palavras de ordem contra o Regime Inglês."

Carlinhos.

Gina empalideceu ainda mais

Ela não conseguia pensar direito.

Precisava de um jeito de fazer essa informação chegar até os irmãos, mas como? Carlinhos estava muito exposto! O idiota não tomava maiores cuidados em esconder sua localização, julgando a distância da influência de Voldemort como um bom escudo; até mesmo Gina sabia onde começar a procurá-lo.

"Ginevra, você está bem?" Olívia perguntou, colocando a mão no braço de Gina, franzindo a testa preocupada. "Draco não vai se ferir, eles tem tudo para levar a vantagem dessa vez."

Se é que era possível, Gina ficou ainda mais trêmula.

Ela tentou responder o mais calmamente possível, mas só conseguiu manifestar uma voz distante, que não parecia a sua. "Só espero que nada aconteça com as pessoas que são caras para nós."

"Eu também, querida." Elas permaneceram em silêncio uns instantes, antes de Olívia voltar a se arrumar apressada para sair. "Seja qual for a razão, eu não gostei da sua expressão. Em nome de Merlin, não faça nada de que possa se arrepender."

"Não vou fazer." Gina sorriu, gentil. Estava tremendo por dentro. "Nada que me cause arrependimentos, pelo menos."

Olívia a olhou desconfiada mais uns instantes, antes de sorrir convencida e dizer que estava de saída para preparar a casa para a chegada de Pio.

Distraída e com a mente distante, focada em Carlinhos, Gina já começava a verbalizar um 'por quê?', uma vez que o Ministro não repararia em nada que Olívia pudesse fazer para recebê-lo.

Contudo, conseguiu frear a língua a tempo... Certas atitudes baseadas no coração não tinham resposta, nem explicação.

***

Ela andava de um lado para outro na sua sala, como um diabrete enjaulado.

Como chegar até meus irmãos?, ela pensava freneticamente. Se eu nem sei onde achá-los?

Geralmente eram eles que entravam em contato com ela, não o contrário! Tentou o galeão encantado por Hermione, mas não houve resposta no horário combinado.

Eles tinham seus próprios demônios para caçar, ela supôs.

Entretanto o ataque seria possivelmente naquela noite e ela não podia esperar mais…

Talvez pudesse usar uma coruja para eles, mas iria mandá-la exatamente para onde? Aparatação estavam fora de cogitação pela mesma razão e a Rede de Flu era vigiada pelo Ministério.

Merlin, poderia até mesmo mandar Della, mas a elfo conseguiria achar um caminho a tempo ou aquilo seria infrutífero também?

Uma coruja para Carlinhos também não chegaria antes do ataque, com certeza…

Por que Carlinhos é tão teimoso ao ponto de não se esconder adequadamente, ao ponto de não tomar cuidados com a sua segurança?, ela praguejou contra seu irmão mais velho uma e outra vez.

Se encaminhou para a porta repentinamente, convencida a mandar seu patrono, mas se sentou na poltrona mais próxima na sequência, desabando desanimada. Pela mesma razão que não pôde conjurar um patrono em Hogwarts, também não podia fazê-lo agora.

Tinha que admitir que era uma covarde, pelo menos nesse aspecto.

Durante horas que pareceram minutos, ela se esforçou para pensar e as idéias mais bizarras cruzaram a sua mente.

Entretanto, no seu íntimo, ela sabia que só havia uma solução.

A solução contra a qual vinha lutando.

Teria que ir para a Romênia e avisar Carlinhos pessoalmente.

***

Com as conexões certas, arranjar uma chave de portal ilegal que Draco não pudesse rastrear não tinha sido impossível. Extremamente custoso, é verdade, mas não impossível.

Um pouco antes do final da tarde, ela já estava em Bucareste. Tinha ido visitar seu irmão algumas vezes na capital da Romênia, mas fazia tanto tempo que ela mal se lembrava como se locomover no lugar.

Só tinha certeza que tinha sido transportada para um bairro bruxo pela roupa das pessoas, mas, além disso, não podia sugerir mais nada.

Levantando o capuz do robe, Gina vagou por uns minutos, se negando a perder a esperança de encontrar alguma pista, mesmo estando praticamente perdida numa das maiores cidades da Europa. Passava observando as lojas, as pessoas, contando os segundos. Buscando qualquer sinal.

Quando ela virou uma esquina, viu uma mulher robusta, mais ou menos da sua idade, fazendo um discurso em cima de um pequeno púlpito; tinha fartos cabelos loiros e se expressava com naturalidade e veemência. Depois de uns minutos de observação, Gina franziu o nariz ao pensar que qualquer disputa com aquela mulher poderia se tornar uma guerra.

Ela parou ali, na esperança de conseguir informações das pessoas em volta do púlpito. Entretanto, o pequeno grupo que a mulher reunia em torno de si parecia hipnotizado, como se estivessem embebedados pelo discurso. Gina observou por alguns minutos, até que a mulher terminou seu discurso eloquente sob discretos aplausos, desceu do púlpito improvisado e começou a distribuir jornais.

Gina ficou na ponta dos pés, tentando enxergar qualquer coisa que estivesse impressa no papel. Ela não falava nada de romeno, mas pôde reconhecer uma palavra estampada na manchete do jornal devido ao contato com Carlinhos. Rezistență.

Resistência.

Gina quase pulou de alegria.

Encaminhou-se rapidamente em direção à mulher, que se virou abruptamente quando Gina se aproximou e escondeu os jornais num bolso interno da capa. O sorriso bonito que ela carregava no rosto bronzeado morreu lentamente, como se a visão da ruiva à sua frente fosse alguma poção amarga que ela estivesse sendo obrigada a tomar.

Isso não vai ser fácil, Gina pensou exasperada.

"Olá! Por favor, eu vi você distribuindo alguns panfletos e acho que pode me ajudar." Ela falou, um pouco mais rápido do que deveria.

"Desculpa... Eu não... falar sua idioma..." A mulher tentou se expressar já se afastando de Gina, como se ela fosse uma turista indesejável em épocas de guerra.

Gina fechou o caminho da mulher, mais alta e mais robusta do que ela.

"É muito importante, senhorita! Procuro Carlinhos Weasley." A loira arregalou tanto os olhos que Gina teve certeza de que ela entendia muito bem o que tinha ouvido e agora não poderia fingir mais.

Ela conhecia Carlinhos! Gina quase deu um gritinho de satisfação.

"Eu não vejo porque Carlos teria qualquer interesse no que uma bruxa inglesa que aparece sem avisar pode dizer para ele." Ela disse com um forte sotaque e Gina viu o brilho de algo como ciúme cruzar os olhos da mulher.

Não era possível que teria que lidar com uma situação dessas, naquele momento! Seu gênio explodiu e ela se viu segurando forte o braço da mulher.

"Eu quero que você me escute bem." Gina sussurrou com os dentes cerrados. "É um caso de vida ou morte e eu preciso ver Carlinhos. Se você não me levar até ele por bem, serei obrigada a chutar seu traseiro até encontrá-lo."

A mulher se admirou mais uma vez e Gina percebeu que ela a olhava divertida. "Acho melhor você me soltar, vadia inglesa, senão eu..."

"Mirela!" Uma voz familiar soou por trás de Gina, mesmo que ela não conseguisse entender as palavras. "Ce se întâmplă aici?"

Reconheceria a voz de um dos seus irmãos até embaixo d'água. Gina soltou a mulher e virou cento e oitenta graus, quase se jogando nos braços fortes de Carlinhos. Somente então ele a reconheceu, retribuindo a intensidade do abraço.

"Gina! Por Merlin! O que você está fazendo aqui?" Ele perguntou, abaixando o capuz dela e fazendo um cafuné nas mechas ruivas, sob o olhar atônito de Mirela.

"Precisava ver você!" Ela disse e escondeu o rosto no peito do irmão. Era tão bom senti-lo perto dela, mesmo sabendo que não era o momento ideal para aquilo.

"Calma, Gi." Carlinhos a tranquilizou, sentindo a tensão através da irmã. Então ele levantou o olhar, cruzando com os olhos claros e confusos da romena à sua frente. "Mirela, essa é minha irmã, Gina."

Gina se virou para ela e viu que a romena ruborizava automaticamente, notando a semelhança dos cabelos vermelhos e sardas pela primeira vez. Carlinhos continuou as apresentações. "Gina, essa é Mirela Barzin, um membro importante da Resistência na Romênia."

"Merlin!" A romena falou, colocando a mão sobre o seio. "Por que você não me falou antes, Carlinhos!?"

Gina não deu tempo para que seu irmão respondesse.

"Talvez porque você estivesse ocupada me chamando de vadia inglesa." Ela alfinetou enquanto Carlinhos prendia a respiração e Mirela a encarava, ainda que estivesse com seu rosto vermelho. Gina foi até ela, segurando-a no braço novamente, com gentileza dessa vez. "Não se preocupe com isso, Mirela. Eu também não sou um exemplo de gentileza. E agora nós temos assuntos mais urgentes para tratar."

Carlinhos tomou as rédeas da conversa, visivelmente relaxado pelo fato de que não teria que separar um duelo entre as duas mulheres geniosas e com potencial enorme de estrago. "No próximo quarteirão há um pequeno bar, onde poderemos sentar e conversar melhor."

"Não! Não há tempo! Você tem que vir comigo para a Inglaterra." Seu irmão a olhou interrogativamente, enquanto Mirela observava curiosamente. "Precisa se proteger. O Ministério vai atacar o lugar onde você fica, essa noite. O que é muito fácil por sinal, já que você não faz a menor questão de se esconder decentemente." Ela completou com o dedo indicador em riste, em tom de reprovação que lembrava muito Molly Weasley.

"Por que Rony, Gui ou Jorge não vieram me avisar?" Carlinhos perguntou, balançando a cabeça perplexo. "Por que mandaram você?! É muito arriscado!"

"Eles não sabem de nada! Quase ninguém sabe, na verdade. Eu tentei avisá-los para que entrassem em contato com você, mas não pude…" Gina respondeu baixinho.

"E como você sabe?" Carlinhos perguntou e se arrependeu no momento seguinte quando uma sombra de desconforto muito breve cruzou o rosto dele e Gina teve certeza que aquela reação tinha algo a ver com o sua proximidade com Draco Malfoy. "Bom, não importa, não é?" Ele mudou de assunto, resignado. "O que interessa é que temos que tirar as pessoas do campo de treinamento de dragões."

"Que pessoas?!" Gina o olhou atônita.

"Os nascidos-trouxas e mestiços que estamos ajudando a se esconder do Regime Inglês!" Mirela respondeu, com um claro orgulho na voz. "A Romênia é um bom lugar para recomeçar." Ela afirmou com forte sotaque e sorriu abertamente.

Gina sentiu seu estômago dar três voltas em torno de si mesmo.

"Você criou um campo de refugiados num lugar de treinamento de dragões?!" Ela falou se dirigindo ao Carlinhos, com surpresa na voz.

Seu irmão deu de ombros, como se não fosse grave.

"Eles não tinham para onde ir." Gina sentiu, ao mesmo tempo, uma onda de amor e uma vontade imensa de dar uns cascudos nele, por se expor dessa forma. "De qualquer forma, não são muitas pessoas. Podemos pedir ajuda às famílias da capital para abrigar as crianças. E se os adultos quiserem, podem ficar e lutar."

"Ficar?" Gina perguntou, segurando no braço do irmão. "Você não está pensando em enfrentar o Ministério, não é?"

"Eu não vou abandonar meu povo, Gi. Nem os meus dragões." Ele disse, apertando a mão dela de forma tranquilizadora e Gina percebeu com o canto de olho como Mirela inflava de orgulho. "Eu agradeço muito seu aviso, mas não vou fugir com você."

Não vou fugir como você.

As palavras ecoaram na mente de Gina, mesmo que elas não tivessem sido proferidas pelo seu irmão, tampouco tivessem sido intencionadas por ele. E ela se sentiu pequena, enquanto seu irmão apontava para algum lugar acima do ombro dela.

"Vamos. Precisamos achar um ponto para aparatar." E se apressou a frente, contando que as duas mulheres fossem segui-lo. "Temos que cruzar o Rio Dâmboviţa e logo estaremos lá."

Elas permaneceram paradas, por um tempo, olhando-o se afastar.

"Ele é muito cabeça dura, não é?" Gina comentou, mais para si mesma do que para Mirela.

"Sim. E tão corajoso, valente, dedicado…" Mirela respondeu distraída, mirando as costas de Carlinhos. Apesar da tensão da situação, Gina a olhou com um sorriso brincalhão nos lábios. Foi suficiente para que a loira abaixasse o olhar, muito vermelha, e o seguisse com passos apressados.

Gina sorriu, se perguntando se seu irmão já havia percebido a natureza dos sentimentos de Mirela.

Suspirou e seguiu a mulher, sabendo que muitas vezes era mais fácil travar uma guerra contra um regime totalitário do que declarar abertamente aquilo que sentíamos.

***

Eles chegaram ao campo de treinamento imenso e passaram as próximas duas horas transportando pessoas, abrigando mantimentos e preparando os cinco dragões que haviam lá naquele momento. Sabiam que o Ministério faria qualquer coisa para imobilizar os animais, mas deixá-los preparados para o ataque era o melhor que podiam fazer.

Gina teve que discutir três vezes com Carlinhos sobre a necessidade de ela voltar para a Inglaterra antes que o ataque começasse. Sabia que aquela era uma necessidade real e que ela tinha mil razões racionais para partir, mas não podia.

Queria se convencer de que ficaria por Carlinhos, pela Resistência, por ela mesma, para provar para si que não era covarde. Mas sabia que havia uma outra razão, tão ou mais forte quanto todas as outras.

Draco.

Ela precisava se certificar de que Draco ficaria bem; já havia prejudicado-o demais, tinha consciência disso. E, agora, não poderia lidar com a idéia de que algo mais acontecesse com ele.

Por isso ela tinha ficado até aquele momento, como se estivesse esperando-o, mesmo sabendo que as chances de encontrá-lo eram remotas.

Estava andando pelo campo aberto, transportando de um galpão para o outro um carregamento de poção que havia preparado na Inglaterra, seguida por dois homens que ficariam para a luta, quando ouviu uma explosão no galpão norte do campo, onde ficavam os dragões. Era lá que o Ministério atacaria primeiro, com certeza.

Começou, ela pensou ansiosa.

"Vai precisar de nós para te escoltar, senhora?" Um homem perguntou, com um forte sotaque romeno.

"Se protejam da melhor forma que puderem." Ela sacou a varinha, negando levemente com a cabeça. "Eu posso me virar sozinha."

Eles hesitaram um instante, olhando-a com preocupação. Foi preciso que ela os encarasse zangada para que eles saíssem correndo em direção a explosão, para ajudar como pudessem. Logo depois, Gina fez o mesmo caminho, ajeitando os frasquinhos de poção explosiva que havia posto cuidadosamente sob a capa. Levantou o capuz e se preparou para o combate.

Quando a luta chegou até ela, Gina perdeu a noção do tempo.

Jogou feitiços, criou explosões com poções, desviou de ataques e alvejou muitos comensais, tomando cuidado de tentar identificá-los da melhor forma que podia, antes de executar os ataques.

Gina tinha aprendido a ser prudente na batalha: não se expunha, não cometia atos irresponsáveis. A gravidez impedia que ela fizesse muitas estripulias e, por isso, ela se mantinha nas sombras.

Inevitavelmente se lembrou de seu pai, dizendo anos antes que as poções eram armas mais discretas que as azarações, mas não menos eficientes.

Era absolutamente verdade: ela tinha criado um caos.

Gina sorriu abertamente, ao olhar ao redor e visualizar os comensais imobilizados, as consequências das explosões, o resultado do seu trabalho.

Sentia o suor escorrer pelo corpo e encostou na parede de um galpão para descansar. Só precisaria de um minuto para se recompor, então procuraria seu irmão e, com sorte, poderia vislumbrar Draco no meio daquela confusão de fogos, gritos, poeira e feitiços.

Estava prestes a sair do seu esconderijo quando sentiu uma varinha no seu pescoço. Ela fechou os olhos, pensando num jeito possível de sair dessa situação, mas o Comensal não estava disposto a dar brechas.

"Jogue sua varinha no chão, vire-se de costas e ande." Ele disse com voz abafada pela máscara. "Eu vou estar bem atrás de você, até chegarmos onde os outros prisioneiros estão."

Ela fez como tinha sido mandado, sua mente trabalhando freneticamente para arranjar uma maneira de sacar um frasquinho de poção sem que ela fosse azarada. Quando finalmente tomou a decisão de se arriscar e pegar o objeto, vislumbrou um clarão vermelho brilhar atrás de si e, virando o rosto, viu que o comensal que a encurralara tinha sido subitamente estuporado.

Mirela tinha aparecido e Gina não pensou que ficaria tão feliz em vê-la. O rosto da mulher estava rígido e sujo com fuligem.

"Você é irresponsável." Ela disse bruscamente, se aproximando agressivamente e apontando a barriga de Gina, que arregalou os olhos: estava se escondendo há tanto tempo embaixo de inúmeras capas e casacos que tinha pensado que o aumento da barriga havia passado despercebido por todos. "Não merece trazer uma criança para esse mundo se não se preocupa com a segurança dela."

Gina sentiu como se tivesse levado uma bofetada dolorida. Era claro que Mirela tinha razão, mas queria ver seu irmão, ver Draco, garantir que eles ficariam bem.

"Eu não posso…"

"Não quer!" Mirela ofegou, suor escorrendo da testa bronzeada. "Aqui não ganharemos, mas, graças a você, também não perderemos. Já fez tudo que podia, nas suas condições. Carlinhos está no galpão leste, organizando as vassouras que estão subindo para os ataques aéreos. Procure-o e faça com que ele tire você daqui."

"Eu-"

"VÁ!" A romena gritou e se virou, ignorando totalmente o débil protesto de Gina e correndo em direção a escuridão, balançando os fartos cabelos loiros enquanto corria.

E Gina sabia que ela estava certa.

***

Gina achou Carlinhos onde Mirela havia dito que ele estaria.

Ele estava organizando a subida frenética de pessoas em vassouras, que estavam carregando poções para serem jogadas nos comensais pelo ar.

Suspirou sonoramente quando avistou sua irmã, num misto de alívio e irritação. "Onde infernos você estava, Gina?! Quase enlouqueci pensando que você poderia ter sido pega!"

Ela não respondeu sobre os perigos pelos quais tinha passado, sabendo que aquilo só deixaria seu irmão mais aflito, preferindo ir direto ao ponto. "Eu preciso de uma vassoura para voltar para Inglaterra."

Carlinhos fez um careta e Gina percebeu que seu rosto estava um pouco chamuscado e que suas roupas tinham marcas de fuligem.

"Agora você quer voltar? Juro que nunca vou te entender, Gina." Ele suspirou de novo, resignado dessa vez. "Você não pode voltar para Inglaterra numa vassoura. Vai morrer de frio ou alvejada antes de chegar na fronteira com a Hungria." Ele fez um gesto autoritário com a mão para calar o protesto que estava se formando na garganta dela. "Eu sei que você voa bem, mas isso não significa que seja seguro. Vamos ter que cruzar o campo de treinamento e usar a Rede de Flu do galpão oeste. Ela vai te levar de volta para o centro capital e, de lá, será mais fácil você conseguir uma chave de portal para a Inglaterra."

"Posso me virar, assim que sair daqui." Gina assentiu, entre aliviada e agoniada.

Eles cruzaram o campo rapidamente, protegendo um ao outro dos feitiços e de alguns ataques mais afoitos de comensais. A batalha parecia se concentrar no local onde estavam os dragões, que rugiam com uma ferocidade que fazia os pelos da nuca dela se arrepiarem.

Desejou ardentemente que Draco não estivesse lá.

Entraram correndo num galpão que parecia servir de escritório para o campo de treinamento de dragões, com muitos troféus na parede, quadros com prêmios e uma lareira salvadora atrás de uma grande mesa de mogno.

"Se apresse, Gina! Não sei quanto tempo esse lugar vai ficar sem ser invadido!" Carlinhos disse, puxando-a pela mão quando percebeu que ela estava observando a sala.

Quando ele levantou a varinha para convocar o pó para a Rede de Flu, Gina sentiu que eles não estavam sozinhos.

"Charlinhos, esper-"

"Expelliarmus!"

A varinha de Carlinhos ricocheteou e pousou no chão, num ponto longe do alcance dele e de Gina. Ela olhou para o objeto pensando se poderia sacar sua varinha rápido o suficiente para convocá-la, mas não teve tempo, pois uma voz arrastada, arrogante, conhecida, se manifestou nas sombras.

"Você, de capuz." Draco Malfoy a chamou. "Nem pense em tentar convocar a varinha dele. Se afaste lentamente e mantenha suas mãos onde eu possa vê-las."

Gina se manteve no lugar, muito pelo choque de saber que Draco estava apontando a varinha para ela e Carlinhos, sem ao menos saber que era ela que estava ali.

Carlinhos estava imóvel, com a mandíbula cerrada e o corpo tenso, prestes a agir. Carlinhos, diferente de Gui, sempre fora mais adepto da ação do que da premeditação e, naquele momento, aquela era uma péssima característica.

Ela precisava pensar rápido, não podia deixar Draco machucar Carlinhos e... Não podia deixar Carlinhos machucar Draco. O pensamento a fez prender a respiração, mais uma vez.

Draco interrompeu suas idéias, quando começou a fazer aquilo que fazia de melhor: contar vantagem. Se Gina não estivesse tão tensa, certamente teria rolado os olhos.

"Cabelos ruivos, rosto sardento, exalando pobreza... Ora, ora, se não é um Weasley." Ele arrastou a frase preguiçosamente, aproveitando o momento. "Aquele que gosta de dragões, suponho... Espero que você goste de mim também, porque temos muito para conversar."

Carlinhos franziu a testa diante do comentário, certamente sem entender que Draco estava se referindo ao próprio nome, e Gina enjoou subitamente quando as palavras dele, a postura dele, a compleição, absolutamente tudo a lembrou de Lúcio Malfoy.

Ele não podia fazer isso com Carlinhos. Não podia fazer isso com ela!

Tentou se comunicar com o irmão com os olhos, dizer que ela lidaria com a situação, que podia lidar com Draco Malfoy, mas Carlinhos estava com os olhos presos no lugar da onde a voz saía, como se estivesse medindo qualquer oportunidade para um ataque.

Draco saiu das sombras e mesmo sua máscara de comensal não ocultava sua identidade para Gina por causa dos cabelos que pareciam quase brancos através da luz da lua que entrava pela janela, por causa do seu tom de voz e do seu jeito, que ela tinha aprendido a reconhecer tão bem.

Estava... assustador.

Ele se virou diretamente para Carlinhos, se aproximando lentamente. "Só me resta saber em quais condições eu vou te levar daqui…"

"NÃO!" Gina não percebeu que tinha dito aquilo em voz alta, nem que tinha se movido para diante de seu irmão ou que seu capuz tinha caído. Só se deu conta de tudo isso quando percebeu os dois pares de olhos, verdes e cinzas, mirarem sua imagem com espanto.

"Gi, não!" Carlinhos a puxou para si, pondo-a atrás dele. "Eu posso cuidar dele."

Draco fez um gesto suave com sua varinha para retirar a máscara do rosto, como se precisasse ver melhor para acreditar no que seus olhos estavam lhe mostrando. Claramente surpreso, Gina teve a impressão de que ele tinha perdido a capacidade de falar, com os olhos claros arregalados de incredulidade e o queixo levemente caído.

"Malfoy?!" Foi tudo que Carlinhos disse quando reconheceu Draco; Gina sentiu que o corpo dele relaxava instintivamente, certamente pensando que o comensal marido da irmã seria um problema menor do que um comensal desconhecido.

Mas ela via melhor. Via que Draco se recuperou rapidamente do susto e da surpresa, para dar lugar a raiva tão tradicional naqueles olhos cinzas. Via que o rosto dele perdia a expressão, se escondendo por trás de uma outra máscara, de frieza, de cálculo, de rancor.

Ela sabia que devia falar algo, que se demorasse mais seria esganada nos próximos segundos.

"Draco, eu -"

Eles ouviram um barulho de passos se arrastando entrando no galpão e Carlinhos e Draco ficaram mais uma vez alertas, subitamente.

"Seja lá quem estiver aí!" Uma voz vinda da entrada gritou. "Saia com a varinha para o alto, antes que a gente exploda esse maldito lugar."

Draco rolou os olhos.

"Sou eu, seus idiotas! Malfoy." Ele gritou de volta, nunca tirando os olhos de cima de Gina e Carlinhos. "Mais uma vez chegaram atrasados: não tem ninguém aqui, já revistei tudo. Avisem a todos que esse galpão e seus arredores estão seguros, que ninguém mais precisa vir aqui."

Depois dessas palavras, ele esperou para ter certeza que os comensais tinham ido e o silêncio permeou o ambiente entre os três.

Carlinhos e Draco se encararam estreitando os olhos, mas algo no olhar cinza de Draco estava distante, como se ele encarasse belicosamente Carlinhos pelo simples hábito de ser desagradável com um Weasley. Então Gina percebeu: ele estava evitando a todo custo olhar para ela.

Draco se dirigiu a Carlinhos, continuando a ignorar Gina totalmente. "Tire-a daqui e você tem minha palavra de que levarei os comensais embora agora, e você poderá fugir."

Carlinhos assentiu, ainda rígido devido à tensão. "Eu tiraria a Gina daqui com ou sem sua promessa, Malfoy. Nem que eu tivesse que derrubar com as mãos todos os seus amigos."

"Estou bem aqui!" Gina os lembrou acidamente. "Não precisam falar como se eu não estivesse."

Eles continuaram se encarando e Gina bufou irritada.

"Apenas faça o que eu falei, Weasley." Draco suspirou cansado, virando as costas e partindo para se encontrar com os outros comensais. "Antes que eu volte a pensar e mude de ideia."

Ele não olhou uma vez sequer para ela e Gina não podia se sentir pior.

Ela se projetou para segui-lo e conversar, mesmo sabendo que possivelmente não haveria mais conversas entre eles, mas Carlinhos segurou seu braço, impedindo que ela fizesse qualquer movimento.

"Gina, não." Seu irmão foi firme. "Ele deu uma chance para que você escapasse, seja lá por qual razão. E, mesmo apavorado com a ideia do Malfoy estar te protegendo – e a mim também, por consequência – não podemos desperdiçar essa chance."

Ela assentiu tristemente, reconhecendo a verdade das palavras do irmão. Voltaria para a Inglaterra e somente lá teria seu momento para lidar com Draco.

Por enquanto, já acalmava seu coração saber que ele e seu irmão ficariam bem.

Deu um abraço forte de despedida em Carlinhos, desejou boa sorte e foi embora pela lareira.

***

Com a letargia que a gravidez lhe impunha, o simples ato de tomar banho e se preparar para dormir em seu quarto levava um tempo que, há uns meses, Gina não teria se dado ao luxo de perder, pensando que sempre haveria uma conta para fazer, um ingrediente para testar, um cliente para agradar.

Agora era diferente… Nas últimas semanas, perdera sua agilidade habitual; não se movia de forma lerda, mas sim lânguida, deliberada e quase graciosa, de um jeito que ela aprendera que era o das mulheres grávidas. Tinha gestos calmos, sonhadores, sempre levando a mão até a barriga, sentindo o bebê dar as primeiras tentativas de chute.

Da primeira vez, envolvida no turbilhão de emoções de perder Harry, a guerra e sua juventude com uma gravidez não planejada, Gina não tinha aproveitado o suficiente - ousava dizer que sua gravidez tinha sido muito mais curtida pelos seus pais, Gui e Jorge do que por ela mesma.

Agora, no auge dos seus recém-completados 24 anos, Gina se sentia muito mais madura e tranquila para aproveitar cada instante da sua gestação, mesmo que ela tivesse sido tão não planejada quanto a anterior.

Sim, aquela era a palavra correta, estava tranquila; sua família estava bem, Carlinhos bem escondido na Romênia - se recuperando do susto sob os cuidados de Mirela, Gina supôs - e tudo voltara ao normal.

Com exceção de Draco, é claro.

Mas pensar nele a deixava inquieta e ela evitava o máximo que podia, embora soubesse que não poderia agir assim para sempre.

Haviam voltado da Romênia há três dias e ele não dera qualquer sinal de vida desde então. Gina só tinha certeza de uma coisa: ele não deveria estar satisfeito, tampouco feliz. Ela queria acreditar que ele a deixaria em paz, que se esqueceria da sua existência, mas o silêncio dele parecia com aquele que antecede o bote de um dragão.

Suspirou, se encaminhando para sua penteadeira. Pensar nisso naquele momento não traria nenhum benefício.

O sol já havia se posto há muito e Gina tinha levado quase duas horas para se aprontar; lavou seus longos cabelos ruivos com cuidado e tirou a leve maquiagem que usava para disfarçar suas sardas. Se aproximou da grande penteadeira e parou para se olhar no espelho: sua barriga já estava evidente demais para ser escondida, mas, estranhamente, aquilo não a apavorou naquele momento. Passou delicadamente a mão sobre a proeminência do ventre, se permitindo sorrir. Então, com uma admiração quase melancólica, seus olhos caminharam até seus seios, visivelmente maiores, mais pesados e atraentes. Mas para quem?

Gina balançou a cabeça para afastar a ideia e suspirou: ela já tinha aprendido que, na sua vida, não havia espaço para aquele tipo de indagação.

Colocou um shorts curto, confortável, e vestiu uma blusinha que mais revelava do que escondia e que, em breve, não poderia ser mais usada - Gina não saberia dizer se era devido aos seios que se tornaram muito proeminentes ou a barriga, que crescia a olhos vistos.

O outono havia chegado, mas ela ainda sentia calor com facilidade e não era raro jogar as cobertas para o lado para conseguir dormir.

Aquele traje ficava perfeito então.

Ela riu diante da sua ideia de 'perfeição' e deu de ombros para si mesma, se lembrando de que ninguém a veria vestida daquele jeito mesmo.

Se sentou para pentear os cabelos diante da sua penteadeira e estava bastante concentrada na tarefa quando ouviu passos firmes subindo as escadas, seguidos pelos gritinhos de repreensão de Della.

Dave, ela pensou e sorriu.

Provavelmente ele havia se esquecido de pedir algo que precisaria no dia seguinte e entrou esbaforido pela casa, possivelmente trazendo alguma quantidade de lama, para o desgosto de Della. Não seria a primeira vez.

Por precaução, caso ele quisesse tratar de algum assunto importante, ela vestiu o grande roupão que estava no encosto da sua cadeira e continuou penteando o cabelo, calmamente.

Os passos continuavam a se aproximar.

Quando se tornaram mais fortes e os gemidos de Della mais insistentes, Gina franziu a testa.

O que estava acontecendo?

Os passos se aproximavam velozmente da porta do seu quarto e ela sequer teve tempo de colocar em prática sua idéia de que seria prudente trancar a porta e pegar a varinha.

Era tarde demais.

Quando a porta se abriu com um estrondo - revelando um Draco Malfoy mais frio do que ela jamais vira, olhando-a com olhos que pareciam lanças prateadas -, Gina não havia sequer abaixado a escova.

Apenas o encarou, com olhos arregalados.

Ele estava todo de preto, como era seu costume, e seu robe esvoaçou atrás de si quando se ele se deslocou para fechar bruscamente a porta com um movimento da varinha, não dando tempo para Della entrar no quarto. Com receio, Gina reparou que os nódulos dos seus dedos estavam mais brancos do que o normal, dada a pressão que fazia ao segurar o objeto.

Permaneceu imóvel uns instantes, nos quais o estômago de Gina deu algumas voltas em torno do próprio eixo, enquanto sentia o olhar dele pesando sobre si, medindo o quadro que ela devia estar formando, com os cabelos ruivos caindo pelas costas e ombros, em frente ao espelho, em meio à bagunça de dos seus objetos pessoais.

Draco sorriu.

Aquele sorriso.

E isso era um mau sinal.

Certa vez, quando estava vivendo com os trouxas, Gina vira na tevelisão um programa sobre como certos macacos mostravam os dentes numa careta de desafio e não como um sorriso. Era bem difícil não fazer aquela associação com Draco, naquele momento.

"Boa noite, Draco." Ela disse, decidindo que o melhor a fazer era demonstrar certa civilidade, mesmo que a última coisa que quisesse naquele momento era estar ali, sozinha com ele.

"Não estava esperando minha visita, Weasley?" As palavras eram suaves e transbordavam sarcasmo, num tom que trazia a ela mais medo e alerta do que um grito o faria.

"Mais do que isso, Malfoy." Gina respondeu frisando o sobrenome, exatamente como ele havia feito. "Eu estava desejando sua visita."

Um silêncio constrangedor dominou o ambiente e os olhares se mantiveram presos um no outro.

"Juro que nunca vou poder te acusar de ser covarde." Draco disse, ainda no mesmo lugar e num tom de voz calmo, mas que não escondia sua fúria crescente; Gina já era capaz de reconhecê-la facilmente. "Você acha que não tem razões suficientes para querer me evitar?"

"É claro que tenho." Ela tremia por dentro, mas manteve a voz firme.

Sabia que tinha ido longe demais ao frustrar a prisão de Carlinhos e ao fazer com que ele declarasse retirada da Romênia para que ela não fosse achada, mas tinha que encarar seus problemas de frente.

"É por isso que eu acho que quanto mais cedo tivéssemos esse encontro, melhor seria." Ela depositou calmamente a escova sobre a penteadeira, se levantando e apertando o roupão em torno de si. "Não se ganha nada em ficar enrolando para tomar uma poção amarga."

O rosto dele se crispou de raiva e Gina recuou instintivamente. Ela buscou sua varinha que estava em cima da penteadeira com os olhos e ele percebeu o movimento.

"Accio varinha." Draco executou o feitiço com rapidez surpreendente e a varinha de Gina cruzou o ar obedientemente, direto para as mãos dele. Ele a colocou dentro das suas vestes calmamente.

Seu olhar de gelo percorreu toda a figura dela e era mais fulminante do que qualquer outra coisa que ela já tinha experimentado antes. Gina duvidou que ele olhasse para alguém daquela forma, nem mesmo para os trouxas. Draco girou a varinha dele nos dedos sem tirar os olhos dela, como se estivesse debatendo internamente qual membro dela ele arrancaria primeiro.

Estava verdadeiramente encrencada, ela pensou calculando como chegaria até a porta e fugiria para longe daquela fúria gelada.

Mas, subitamente, se sentiu cansada e só esperou, levantando o queixo.

"E então?" Gina perguntou corajosamente, quando o silêncio se estendeu por tempo demais.

A frase pareceu ter rompido a barreira que Draco havia criado para conter sua raiva e rapidamente Gina viu a expressão dele mudar. Os frascos da sua penteadeira e as fotografias sobre a lareira começaram a tremer violentamente quando a ira de Draco se manifestou através de magia. Ela teve que desviar do caminho de uma foto de James que se estilhaçou atrás do lugar onde a cabeça dela deveria estar.

Malfoy se encaminhou diretamente para ela, alcançando-a em quatro passos.

"Sua pobretona hipócrita!" Ele sibilou e Gina ouviu seus perfumes e frascos se quebrarem ao atingir o chão. "Você descumpre nosso acordo dezenas de vezes achando que sempre sairá impune, com esse odioso nariz sardento empinado e contando vantagem as minhas custas! Que porra foi aquela na Romênia? Você está colocando seu pescoço a prêmio e o meu também, sua garota idiota!" Ele segurou dolorosamente no braço dela com sua mão livre, sacudindo-a como se assim pudesse colocar algum juízo na sua cabeça.

"Carlinhos é meu irmão e eu o amo! Não podia deixar que o Ministério fizesse mal a ele!" Ela disse, lutando ao máximo contra sua própria vontade de esganá-lo por tratá-la daquela forma. "Não que eu espere que você, um bastardo que não ama ninguém, possa entender isso."

As palavras saíram numa torrente violenta e Draco ficou levemente mais pálido, como se ela tivesse esbofeteado-o. Ele libertou o braço de Gina sem resistência quando ela fez um movimento brusco para se soltar. O que ela disse tinha atingido um nervo, ainda que não pudesse explicar o porquê.

"Não me toque de novo!" Gina quase gritou, dando um passo para trás.

"Com todo prazer!" Draco respondeu, finalmente levantando a voz.

Ele fechou os olhos brevemente, como se estivesse contanto até dez para não usar uma maldição. Quando os abriu, já tinha recuperado o controle novamente.

"Você me chantageou e eu cedi em um acordo detestável que só me trouxe problemas. Mas cumpri minha parte, enquanto você passeava por Londres esfregando na minha cara o fato de que você era minha mulher e ainda assim se metia com a Resistência como e quando tivesse vontade, mesmo sabendo o quanto isso poderia nos prejudicar."

Gina se arrepiou inconscientemente diante da ideia de eles estarem juntos em alguma coisa, mas se manteve imóvel, sem abrir a boca e o encarando fixamente, esperando pelo fim das palavras gélidas.

Vendo a impassibilidade dela, Malfoy continuou falando, com um tom que quase se assemelhava a fatalidade. "Por Merlin, eu só queria distância de você e, em troca, você transformou tudo num inferno por causa dessa maldita família de coelhos."

Ele a olhou com os olhos brilhantes, como se estivesse prestes a fazer algo agradável para ele.

E que certamente vai ser desagradável para mim, Gina pensou apreensiva.

"Agora chega, isso acabou. Arrume suas coisas, vou te mandar para a mansão da minha família na França enquanto arranjo um lugar mais distante ainda da Inglaterra. Desconfio que só o Canal da Mancha não seja suficiente para te parar."

Gina foi acometida com um desconforto crescente.

"Você não pode nos tirar da nossa casa, da minha loja!" Ela disse pensando em James e quase completou com 'não pode nos afastar da minha família', mas mudou de ideia, preferindo uma abordagem menos ofensiva. "James nunca sequer saiu da Inglaterra!"

"Não só posso, como vou fazer." Ele a olhou diretamente nos olhos, desafiador. "Além disso, eu não falei que o garoto iria com você." Um sorriso malicioso e desagradável brotou nos lábios finos dele. Gina sentiu como se estivessem tentando arrancar sua alma do corpo. "Vou ficar com ele por perto, para garantir que ficará seguro, enquanto a Sra. Malfoy se recupera de um mal súbito de Varíola de Dragão, sem previsão de retorno. Com certeza ela vai apreciar os benefícios de um clima mais quente."

"Você não pode me obrigar, Malfoy!" Gina disse, começando perder o controle. "Não vivemos mais numa época onde a mulher deve fazer tudo o que o marido quer. Longe disso, aliás." Ela empinou o nariz o máximo que pôde e lançou um olhar de desafio que ele rebateu na mesma intensidade.

Draco fez um som de tsc, antes de falar.

"Mais uma vez me interpretando mal. Eu não disse que usaria minha influência como marido para te obrigar. Acontece que eu também sei algumas coisinhas sobre chantagem…" Ele estreitou os olhos com o ar vitorioso de um predador antes de abater a presa. "Se você não tem o menor pudor ou receio de se expor ao se envolver com a Resistência, eu não vou hesitar em revelar uma ou outra das suas transações com as poções fortificadas."

"Você não faria!" Gina afirmou com voz estridente. "Não ouse tentar me fazer acreditar que você colocaria sua cabeça a prêmio só para me punir ou prejudicar!"

"Ah sim, você me acha um covarde." Ele retrucou colocando a mão pálida casualmente no queixo, como se estivesse comentando o tempo. Permaneceu em silêncio por uns instantes, antes de completar calmamente. "O que você chama de covardia, eu chamo de autopreservação. Mas estou bem-disposto a abrir mão disso se você insistir em me desafiar. Então, colocando em outros termos, se você não for para França, eu revelo parte das suas pequenas ligações, somente o suficiente para que eles não cheguem até mim imediatamente. No mínimo, isso vai te garantir uma estadia duradoura em Glastonbury, o que me dará tempo de sumir com o garoto e minha mãe. Quando descobrirem sobre sua identidade e a do menino, nós já estaremos longe e você nunca mais vai ver seu filho."

Não podia suportar. Gina quase engasgou com o desespero que a invadiu. Involuntariamente, se lembrou da noite do seu casamento, onde ela tinha feito o que ele queria para não sofrer uma Maldição Cruciatus. Hoje, ela teria aceitado a maldição de bom grado, no lugar de se separar de James.

"Não..." Ela murmurou, sem saber o que dizer. "Não pode fazer isso..."

Draco rolou os olhos. "Vamos, Ginevra, estou sendo bondoso. Se você fizer o que estou mandando, eu levarei o menino para te visitar de vez em quando e-"

Gina não deixou que ele sequer terminasse a frase e, com o desespero permeando suas ações, ela correu irracionalmente sob o olhar surpreso de Draco, dominada por uma vontade louca de abraçar seu filho e fugir dali. Chegou até a porta e girou a maçaneta com toda força, esperando sair o mais rápido possível e-

Trancada.

O feitiço do bastardo tinha trancado a porta e ela não podia abri-la sem uma varinha.

De forma distante, ela ouviu o barulho do atrito entre o vidro quebrado dos seus fracos e porta-retratos. Ela se virou encostando suas costas na superfície da porta e então tudo pareceu se passar em um só segundo.

Com horror, Gina viu todos os cacos de vidro se aglutinarem magicamente no ar, tomando a forma de três estacas cristalinas e pontiagudas, que dispararam na sua direção sob o olhar endurecido e semicerrado de Draco, imóvel no meio do quarto, varinha em punho.

Ela fechou os olhos esperando o contato e sentiu uma dor aguda na bochecha direita, quando uma delas passou de raspão por ela, indo se cravar na porta atrás de si junto com as outras duas estacas. Todas ao redor da sua cabeça.

Levou a mão até o machucado e sentiu um filete de sangue escorrer dele.

Ele não está mesmo para brincadeira, Gina pensou cerrando os dentes. Mas nem eu estou.

Gina se afastou da porta e se projetou em direção a ele, com o terror guiando seus movimentos. Precisava recuperar sua varinha e faria isso nem que precisasse arrancar a pele dele com as unhas. Entretanto, Draco foi mais forte e a segurou pelo braço com a mão esquerda e ela quase rodou.

Malfoy a empurrou bruscamente até a cama.

"Chega de fugir, Weasley." Draco disse e havia uma veia ficando evidente no pescoço pálido. "Você fez por merecer isso. Não me faça te azarar, porque é exatamente o que estou tentado a fazer." Ele falou entredentes, apontando a varinha diretamente para o rosto dela.

Ela se endireitou buscando refúgio na cama e só conseguia pensar que não poderia se afastar do seu filho. A ideia a fez ficar com lágrimas nos olhos. Pela primeira vez em muito tempo, Gina Weasley teve vontade de chorar de medo. Não por si, mas pelo seu filho.

Observando a reação dela com olhos desconfiados, Draco pareceu hesitar e ela aproveitou sua chance, sem saber ao certo como conter as lágrimas ou controlar as emoções.

Tinha que usar sua última cartada, mesmo que isso só garantisse a ela só mais algumas semanas.

Era a única coisa que podia fazer, sem varinha e à mercê dele.

"Não faça isso, Draco." Ela apertou uma almofada sobre o ventre, como se com isso pudesse proteger o bebê que estava ali. "Por favor!"

"Por que eu deveria fazer qualquer coisa por você?" Ele perguntou voltando a erguer a varinha. "Você já me causou problemas demais."

Gina fechou os olhos, sabendo que não haveria alternativa.

"Pelo bebê, não faça isso. Não quero dar à luz num lugar estranho e longe de James."

Dessa vez Draco abaixou a varinha totalmente e seus olhos se estreitaram em duas fendas cinzas, ameaçadoras.

"Que bebê?" Ele perguntou de forma cautelosa depois de instantes que pareceram séculos, como se tivesse medo da resposta.

"O que eu estou carregando nesse exato momento." Gina disse e respirou fundo, tomando coragem. "Seu filho."

A sorte está lançada, ela pensou aterrorizada.

Um silêncio ainda mais pesado se postou entre eles, se estendendo por eternos minutos; tão palpável que ela achou que poderia tocá-lo se esticasse as mãos.

Exasperada, ela pensou que se Draco se mantivesse imóvel como uma pedra de mármore por mais um segundo, ela certamente iria xingá-lo.

Por fim, parecendo sair do transe, ele andou até a penteadeira, tirou a varinha dela da capa, juntou com a dele e as colocou metodicamente sobre o móvel.

Gina entendeu que aquele era o jeito dele de dizer que ele não queria ameaçá-la, mas, como sempre, não tinha conseguido expressar o sentimento com palavras.

Então, Draco caminhou até ela, desconfiado.

"Mostre." Ele demandou friamente, com os olhos fixos nela.

Ela se inclinou para trás, encostando as costas da cabeceira da cama. Suprimiu certo instinto rebelde que dizia que ela devia mandá-lo para um lugar não muito gentil, mas então se resignou. Afastando a almofada que segurava e o grande roupão, ela levantou a blusinha indiscreta cobrindo como pôde os seios avolumados.

A voz na cabeça dela zombou, dizendo que ela não fora tão recatada na hora de conceber aquela criança que carregava agora, mas Gina a ignorou.

Draco se aproximou ainda mais, com os olhos que pareciam dois pratos cinzas, de tão grandes. Gina viu dentro deles medo, cansaço, raiva, surpresa, indignação e algo mais, que ela teve medo de tentar interpretar.

Ele olhava fixamente a barriga de seis meses de gravidez e Gina teve certeza que poderia se perder dentro daquele olhar se Draco insistisse em mantê-lo sobre ela. Foi então que ele finalmente abriu a boca.

"Por que não me disse antes, Ginevra?" Draco suspirou e passou a mão pelos cabelos longos desarrumando-os, sem nunca tirar os olhos arregalados da barriga proeminente.

Por quê? Gina pensou em um milhão das razões que a fizeram esconder aquilo por tanto tempo, começando pelo medo de que ele a faria desistir do bebê, o menosprezaria ou tentaria tirá-lo dela. Contudo, não verbalizou nenhuma delas e preferiu uma abordagem mais segura.

"Faria alguma diferença?" Ela fungou e limpou as lágrimas com as costas da mão num gesto que teria feito Draco se arrepiar de nojo se ele não tivesse tão concentrado na barriga dela.

"Eu não teria te assustado assim." Ele arrastou mais as palavras e Gina teve a impressão que agora quem estava assustado era ele. "Não teria-" Ele gaguejou e engoliu em seco, antes que conseguisse falar novamente. "Não teria feito metade das coisas que eu te fiz. Merlin, nunca conheci uma mulher mais rebelde e teimosa que você, Weasley!"

Dessa vez os olhos deles se encontraram e Gina teve consciência de que havia ruborizado.

Seu espírito estava em desordem e ela não pôde controlar outra lágrima teimosa que rolou sobre sua bochecha, acompanhada de um soluço. E depois outra e outra.

Começou a chorar copiosamente; ainda estava muito abalada diante da perspectiva de se afastar de James.

Depois de hesitar um momento, Draco se sentou na beira da cama dela e, vendo a situação de Gina, deu tímidos tapinhas encorajadores na sua mão, como se estivesse mais sem jeito do que Hagrid dançando valsa.

"Não precisa chorar mais." Ele repetiu suavemente uma e outra vez, enquanto Gina tentava recuperar sua calma.

Era muito estranho ouvir a voz dele, ainda arrastada, mas desprovida de raiva, zombaria ou indiferença… Era como ter alguém com ela.

Aquilo não era verdade.

Não podia ser.

Era tão absurdamente esquisito - e ao mesmo tempo reconfortante - ficar na presença dele sem brigar, ofender ou estar com a guarda levantada. Ela tentou clarear sua mente, sabendo que precisava se recompor para encarar aquela situação propriamente, entender o que se passava ali. Ficar chorando como uma garotinha não era sua característica.

Aquele pensamento a ajudou a se recompor, mas todo seu esforço quase foi por água abaixo quando Draco esticou a mão, como se fosse tocar sua barriga. Ela prendeu a respiração e ele parou a mão a pouquíssimos centímetros de distância do seu ventre, hipnotizado.

Era como se estivesse travando uma dura batalha interna, dividido entre tocá-la ou não; entre aceitar a situação ou não. Gina desconfiou que ele tinha achado um meio termo que o satisfez, com a mão parada no ar, e ela constatou que um simples movimento seu faria a mão dele repousar na sua barriga.

Eles permaneceram assim uns instantes, como se o tempo tivesse parado. Então, as palavras de Draco, proferidas baixinho, arrepiaram até o último fio vermelho de cabelo dela.

"Toujours Pur."

Sempre puro.

Ela se lembrou que aquele era o lema da família Black, da ascendência materna de Draco.

Gina estremeceu porque as ideias preconceituosas contidas na frase deveriam ter causado repulsa nela, mas não o fizeram, simplesmente porque significava que Draco estava aceitando o bebê e, ela ousava dizer até mais, que ele tinha de alguma forma se afeiçoado à ideia.

Gina não sabia se chorava de tristeza – diante da certeza de que seu filho, um sangue puro apesar dos pesares, cresceria com aqueles ideais presentes na casa dos seus antepassados – ou se chorava de alívio, uma vez que Draco ajudaria a proteger o seu bebê.

Ele interrompeu sua linha de raciocínio mais uma vez, recuando a mão e quebrando o encanto. "Quando ele vai nascer?"

"Em janeiro, pelas minhas contas." Ela murmurou, verbalizando o evento do nascimento do filho em voz alta pela primeira vez.

Draco retraiu um leve sorriso de orgulho, como se tivesse se dado conta de algo. "Me deixa feliz saber que meu filho foi concebido na Mansão Malfoy, sob meu teto." Ele disse e Gina revirou os olhos. Draco, por sua vez, a ignorou e continuou. "Não tem com o que brindar?"

Foi a vez de Gina o encarar de olhos arregalados.

"Eu-eu não tenho nada aqui." Ela gaguejou bobamente.

Não dava para acreditar que até uns minutos atrás ele estava tomado pela raiva, ameaçando despachá-la para a França. Agora parecia uma criança que tinha ganhado um brinquedo novo e atraente.

Então, percebendo a confusão dela, Draco colocou a expressão de zombaria tradicional no rosto.

"Por que está me olhando com essa cara de idiota, Ginevra? Está pensando que encontrou um jeito de desarmar minha raiva?"

"Não pensei nada disso." Ela sussurrou, sem saber ao certo o que tinha efetivamente pensado.

Draco a olhou ceticamente e cruzou os braços sobre o peito, antes de retomar seu raciocínio.

"Apesar da surpresa, estou satisfeito com a ideia de ter um filho – mesmo que seja seu também -, mas isso não significa que nossa guerra acabou. Estamos apenas dando uma trégua, pelo bem do herdeiro dos Malfoy." Ele disse com sua voz mais arrogante.

"E o que isso quer dizer?" Ela ousou perguntar, ainda com a voz trêmula.

"Que ainda temos contas a acertar, mas, por enquanto, você permanece onde eu possa ficar de olho em você."

Ele havia tentado soar sombrio, mas Gina não teve medo porque ele deixou escapar seu outro sorriso. O verdadeiro. Um que raro e ao mesmo tempo hipnotizante.

"Draco," Ela murmurou, não conseguindo conter sua surpresa. "você é a pessoa mais estranha e desconcertante que já encontrei. Bom, talvez não mais que Luna, mas você entendeu."

Ele levantou uma sobrancelha ofendida "Vou desconsiderar que você acabou de me comparar com a Di-Lua Lovegood."

Gina continuou, ignorando a interrupção dele. "A maioria dos outros homens, no seu lugar, não teria perdido a chance de jogar na minha cara a… cena, com Blaise e me acusaria de tentar fazer assumir um filho que não é seu." Ela levantou o queixo, reunindo a coragem que lhe faltava para expressar um pensamento que a acompanhava nos últimos meses, ainda que tivesse ruborizado um pouco. "Tinha certeza de que você iria me acusar de ter casado grávida, para te humilhar."

Draco fez uma careta, como se fosse extremamente desagradável se lembrar da cena entre Gina e Blaise.

Se afastou dela em direção a penteadeira e guardou sua varinha na capa, deixando a de Gina sobre a superfície. Lançou a ela um olhar demorado, sombrio, quase irritado.

"Weasley, sem me gabar da minha habilidade com a matemática, eu sei contar até nove e, se não fosse o meu filho que você está carregando, é muito provável que a natureza já teria te obrigado a colocar essa criança no mundo."

Ela ficou mais vermelha, pela primeira vez sem resposta diante das grosserias de Malfoy.

"E ainda me sinto obrigado a dizer mais: eu te acho capaz de tudo e de algumas coisinhas a mais, como chantagem, ameaça, manipulação. Mas não desse gênero de baixeza. É tão… não-Ginevra." Draco deu de ombros, não se importando por não ter achado uma palavra melhor.

Gina tomou um tempo para se recuperar das palavras dele e organizar suas ideias, antes de rebater.

"Entretanto, não seria tão incomum entre as mulheres cujo comportamento você julga mais adequado do que o meu." Ela provocou deliberadamente, já voltando pouco a pouco a sua postura habitual, mais impetuosa e venenosa.

"Você não é uma mulher como elas." Ele disse em tom arrogante e Gina prendeu a respiração. "Você é a minha mulher."

A boca de Gina formou um perfeito 'O'.

"Ah." Foi tudo o que ela disse, simplesmente porque achou que pelo menos um som deveria fazer, para não deixar evidente sua perplexidade. E fracassou terrivelmente.

Draco deu um meio sorriso, obviamente percebendo a reação desconcertada dela.

E se divertindo com isso, o que era mais revoltante!, Gina pensou ultrajada.

"Nos veremos em breve, Ginevra." Foi tudo o que ele disse, o sorrisinho idiota nunca deixando seu rosto.

Sem dar mais tempo para que ela dissesse qualquer coisa, ele acenou educadamente e saiu do quarto dando passos largos, deixando-a sozinha, com o queixo levemente caído.


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