O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 74
Capítulo Setenta e Quatro


Notas iniciais do capítulo

Olá, amores e amoras! Ainda não respondi a todos os reviews nem li a história provavelmente maravilhosa e recém-postada da Marie, ou seja, estou fazendo um esforço supremo para ignorar minhas atualizações só porque prometi que postaria esse capítulo hoje e vou ter aulas o dia todo. Indo ao que interessa, eu, contudo, li o review que a minha fada madrinha, inspiração suprema e princesa fofinha que é a Marie deixou no primeiro capítulo e estou completamente sem palavras para agradecê-la. Só quero respondê-lo quando as tiver na ponta da língua para te deixar tão boba e tão feliz como você me fez, Ma. Obrigada, obrigada, obrigada. Amo você, muito.



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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Setenta e Quatro

Mesmo que a noite estivesse fria, David dirigia com o ar condicionado ligado. Não ouvia música alguma, pensativo enquanto fazia o caminho costumeiro até sua casa. Com a apresentação cancelada, os músicos da Berklee já estavam empacotando suas coisas e voltando para suas casas, decepcionados e aborrecidos pelo tempo perdido. Alguns ainda dormiam na Academia, mas, dispensado de suas obrigações, David apreciava voltar a dormir em sua própria cama.

Por algum motivo Gabriel não dirigia, então David havia o deixado na entrada da escola. Antes de sair do carro, o garoto ainda se demorara e pedira com aquela sua cara de pau mais inocente se não ganharia um beijo de boa noite; David o havia enxotado do veículo em resposta.

Depois daquilo, fora tomar um café para se distrair, encontrando, por acidente, um dos seus sócios do hospital. Havia se esquecido de que costumavam ir juntos para lá. Hills continuava o velho de fala mansa de sempre, mas havia confessado que precisavam dele e o chamado de volta. Era bom o bastante para David, que, tinha de reconhecer, já se sentia melhor fazia um tempo.

Já estava chegando ao seu bairro. Era um lugar afastado do centro, cheio de casarões antigos. Comprara uma das maiores residências (com oito quartos e uma sala de jantar para dezesseis pessoas) por capricho, só para que se sentisse mais em casa. O que o lembrou de Gabriel de novo, do garoto se espreguiçando – de forma obscena, é claro, mesmo que por acaso – e dizendo que adoraria ir à França um dia.

Talvez David o levasse.

Jogado no banco do passageiro, seu celular vibrou. David se virou para a tela, desinteressado, não esperando ver o rosto do garoto sorrindo para ele dali. Quando Gabriel sequer tivera tempo de fazer aquilo? Encostou o carro e pegou o aparelho, atendendo-o antes que parasse de tocar.

– Já não deveria estar dormindo?

Mas a voz do outro lado não era de Gabriel.

– David? Gabriel está com você?

A não ser que estivesse enganado, era Artemis – uma absolutamente desesperada Artemis. Preocupado, David tamborilou os dedos no volante.

– Não, eu o deixei na Academia há uns quarenta minutos. Aconteceu alguma coisa?

Ouviu a garota respirar fundo.

Acabei de chegar. David, você precisa vir. A Academia... eu não sei como, parece que ela está... – ela pausou, sem palavras. – Pegando fogo por inteiro – sussurrou, desesperada. – Quase todo mundo já saiu, mas Gabriel...

A voz da garota morreu em agonia, e então houve uma pausa em que, imóvel, David ouviu do outro lado da linha o distinto som de pessoas correndo, pneus cantando e vozes incansáveis. Se ouvisse com cuidado, talvez pudesse ouvir até mesmo seu coração batendo.

– Não vou demorar – disse por fim, voltando a dar partida no carro. – Vá. Vou procurar por você assim que chegar.

{...}

Viu a Academia de longe, diminuindo a velocidade enquanto se aproximava. O incêndio não chegava a ser tão terrível quanto Artemis havia feito parecer e, ainda assim, fazia com que David segurasse o volante com um pouco mais de força. A ala dos bailarinos ardia, a entrada parcialmente obstruída pelas chamas e por destroços.

Os bombeiros pareciam já vir tentando conter o fogo fazia um tempo, mas era evidente que não haveria salvação. A imprensa também já havia chegado, David notou, estacionando bem ao lado de um furgão branco. Desceu do carro procurando pelas ambulâncias, correu até as três que viu à distância. Procurou em vão, sem encontrar o garoto.

Olhou então ao seu redor, por cima das cabeças dos paramédicos atarefados. O cabelo vermelho de Artemis era fácil de ser visto sob a luz do dia, mas naquela penumbra demorou a localizá-la. Andou até onde a garota estava com dois de seus colegas, notando com o canto dos olhos que o pai de Apolo estava por perto. Mas por quê?

– Artemis – chamou.

A garota se virou para ele de imediato, seu rosto puro desespero.

– Que bom que você veio – ela lhe disse, se aproximando, em um sussurro grato. – Não tiraram Gabriel ainda, Isabella disse que ele estava desacordado.

Sua voz estava tesa, quase como a própria menina estivesse no limite. David ergueu os olhos para o prédio, o colega de cabelo escuro e olhos claros de Artemis dizendo para quem quisesse ouvir como nada daquilo teria acontecido se todos houvessem saído no momento em que ele sentiu o cheiro de gasolina.

– Cale a boca, Michael – a outra menina disse, parecendo magoada, mas David se virou para ele.

– Gasolina?

É claro. Como um incêndio daquele porte poderia ter sido acidental? David olhou para Artemis, surpreendendo-se ao não ver perturbação alguma em seu rosto.

– Doutor. – Charles se aproximou por fim, estendendo-lhe a mão. Era dado a formalidades a cada virada de Lua. – Como soube? Alguma matéria já foi ao ar?

– Artemis me ligou, não sei se algo já foi à televisão – David respondeu. Não o via desde a tarde em que Gabriel recebera alta e os dois se encontraram no corredor, o homem ainda desolado com a lenta recuperação do filho. – Veio como representante? Apolo está em casa, não está?

– Está, graças a Deus. Lena ficou com ele. – Charles virou-se para observar o incêndio. – E não, o Times vai esperar um pouco. Estamos aguardando detalhes e uma história mais... longa.

Aquilo fez os lábios de Artemis se franzirem, David se sentindo estranhamente a par do que se passava.

– Gabriel! – a garota morena gritou de repente, atraindo a atenção de todos para a entrada.

Um bombeiro carregava o garoto por cima de um ombro, mas vinha mancando. Tornozelo torcido, David arriscaria, andando até ele mal a tempo de ouvir o ofego de Artemis. Correu o olhar pelo corpo inerte do garoto como se também fosse possível diagnosticá-lo assim, à distância.

– Eu sou médico – disse ao bombeiro, com sua melhor voz calma de quem está no comando. – O garoto está desacordado? Passe-o para mim – pediu, mas já estendendo os braços para pegá-lo.

Levantando o equipamento de proteção que lhe cobria o rosto, o homem lhe agradeceu com os olhos.

– Deve ter sido a fumaça – julgou, sua própria respiração difícil. – Está um inferno lá dentro. O encontrei no corredor, acho que ele é o último. – Balançou a cabeça, cansado. – Espero que seja.

David assentiu sua concordância, trazendo Gabriel para si com cuidado. Ele era mais leve do que havia imaginado que seria, mas não esboçou reação alguma enquanto era levado para seu colo. Desmaiado, encontrava-se completamente imóvel, seu cabelo castanho coberto de fuligem fazendo cócegas na parte exposta do pescoço de David. Era possível ouvir seu coração bater, mesmo que devagar, sua respiração rasa o bastante para mantê-lo vivo.

(Até onde David havia visto, a maioria dos colegas de Artemis havia, com alguma dificuldade, precisado apenas da ajuda dos bombeiros para sair por conta própria do prédio. As ambulâncias estavam ocupadas com queimaduras e torções, mas mais ninguém havia desmaiado, nem sido exposto a fumaça por tempo o bastante para ter complicações respiratórias para isso. Um efeito colateral do acidente do último fim de semana?)

– Você não está uniformizado – o bombeiro disse de repente, acusativo.

– Só vim porque era uma emergência, não estou de plantão essa noite – David balançou a cabeça, já se afastando, sem se dar ao trabalho de explicar que sequer trabalhava para o pronto-socorro. – Obrigado.

Mas mal havia dado três passos quando Artemis o fez parar, tendo corrido até ele.

– Gabriel – foi tudo o que ela disse, sua respiração tremida. Correu os olhos pelo garoto, seu rosto vermelho. – Ele não...

– Consigo senti-lo respirar. Deve ter desmaiado por conta da fumaça, depois do acidente de sábado eu não esperaria outra coisa – David mentiu de leve, esperando acalmá-la.

Artemis assentiu, mas o desespero não havia abandonado seus olhos. Observava Gabriel de forma fixa, por fim arriscando erguer a mão para encostar em seu cabelo. Seus dedos finos entrelaçaram-se nos cachos, saíram de lá cinzentos.

Ela pareceu à beira das lágrimas ao observar a própria mão suja.

– Cuide do Gabriel – pediu, morna, a voz trêmula. Ergueu seus olhos azuis para David de uma forma que o fez ter vontade de abraçá-la. – Eu não suportaria perdê-lo também.

– Eu vou.

Artemis assentiu, abaixando o olhar. Parecia estar reunindo uma tênue calma superficial, que, ele sabia, a abandonaria logo. Mas, sem lhe dizer mais nada, ela acariciou o ombro de Gabriel uma última vez antes de lhe dar as costas, andando na direção de Charles. David a observou partir só com uma vaga preocupação, sabendo que estaria em boas mãos.

Acabou voltando sua atenção para Gabriel. Encontrava-se tão tranquilo ao tê-lo seguro que chegou a se perguntar se alguma vez havia se preocupado tanto. Estudou o garoto, lembrando-se sem querer de todas as péssimas cantadas, daquela bunda estrategicamente sempre voltada para sua frente em uma provocação quase obscena, daquela gargalhada alta.

Com seu cabelo castanho sempre levianamente arrumado, suas covinhas e sua baixa estatura, era muito fácil que se passasse por um menino. Sua expressão, também, ora era insegura e tímida – adorável – ora hiperativa como a de uma criança após muito açúcar – o que se aproximava terrivelmente da verdade –, tudo aquilo o fazendo parecer tão mais novo como o fato de ter um rosto tão liso como o de uma criança.

Ao tê-lo tão perto, contudo, e levá-lo até uma das ambulâncias, David se via lembrando de encontros casuais no corredor (ou até mesmo dos falsamente casuais, em que Gabriel vinha de meia-calça vê-lo), dos músculos esguios aparecendo enquanto ele usava suas regatas de treino, do suor molhando o cabelo em sua nuca e da expressão seriamente carinhosa com que ele fitava Artemis às vezes.

Dezenove anos não era o mesmo do que quinze.

– Se você tivesse se atrasado um pouco mais... – acabou dizendo baixinho, pensativo, sentindo o corpo do garoto junto ao seu ainda febril. – Ou talvez se eu tivesse levado a sério sua proposta de café da manhã na cama no dia seguinte... – mas dizia aquilo por dizer. Só entendia agora que não haveria problema algum em ter aceitado o convite, você é tão homem quanto eu. – Não importa, importa?

E David poderia estar sorrindo sem que ninguém soubesse.

– Você não me deixa escolha se não cuidar de você.

{...}


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