O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 7
Capítulo Sete




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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Sete

Artemis não era uma pessoa muito otimista. Gostava de pensar que esperar o pior era apenas garantir que algo bom, quando viesse, fosse duplamente melhor. Assim, viera para Boston esperando que a Academia fosse só uma cópia pálida da perfeição da Academia Real de Nova York, mas tivera uma ótima surpresa.

O prédio era enorme, lindo e antigo, os quartos espaçosos e confortáveis como os de um excelente hotel. Os alunos residentes eram ainda divididos por nivelamento, e não por idade, impedindo que Artemis deslocasse os olhos das órbitas ao revirá-los sempre que ouvisse alguém reclamar de pés machucados.

Pés machucados, imagine. Artemis nem tinha mais pés. Tinha coisas feitas para serem comprimidas dentro de sapatilhas, que eventualmente sangravam.

O único deslize até o momento havia sido contratar a Berklee, mas ouvir a professora Victoria Romanoff vociferar contra alunos preguiçosos era um deleite que quase – quase – chegava a compensar isso.

– Balé é isso, é dor, suor, sangue e cansaço! Se você não consegue lidar com isso, não merece ser uma bailarina! – Kate já tinha os olhos marejados, mas a professora ainda continuou. – Se sair dessa sala, Catherine, você perde a sua chance de dançar em dezembro!

Artemis abaixou o olhar. Se fosse ela a professora, Catherine já estaria de fora fazia muito. Terminaram aquela série de exercícios em um silêncio constrangedor, mas o clima foi gradualmente melhorando enquanto Gabriel cantarolava Do you think I’m sexy.

– Isso tudo aqui é praga da Lily – ele disse por fim, em tom de sofrimento, ao término da aula. – Estou ficando velho por causa do olho gordo dela. Daqui a pouco vou ter artrite, olha – e ele esticou as costas ainda mais, fazendo uma careta dramática de dor.

Artemis não tinha certeza se Gabriel sabia o que era artrite.

– Você tem o quê, dezenove? – perguntou, esticando-se para alcançar a garrafa de água quando a professora bateu palmas, dispensando-os.

– Não importa – Gabriel espreguiçou-se obscenamente. – Você tem planos para agora? Apolo me chamou para conversar sobre a apresentação.

– Chamou você para conversar sobre a apresentação? – Artemis repetiu, um pouco descrente, pondo-se de pé e organizando suas coisas em sua mochila cinza. – Uau. Isso certamente mostra alguma coisa sobre ele.

– Yeap – Gabriel também se levantou, jogando sua mochila por cima de um dos ombros. – Consegue imaginar Apolo e eu planejando a apresentação mais importante da sua vida sozinhos? – Ele riu. – Entende as chances que isso tem de virar uma ópera gay entre o Slash e o Axl Rose?

– Você já me convenceu – Artemis revirou os olhos. – Estou indo. Vocês dois são patéticos.

– Awn – Gabriel fez, dando um pulinho. – Eu sabia que podia contar com você. Anime-se um pouco, eles já estão esperando por nós.

{...}

E estavam mesmo. O professor ergueu a cabeça quando eles entraram, parecendo tão empolgado com aquilo quanto Artemis. Estava sentado em uma poltrona, com ares de quem adoraria estar em outro lugar, mas com um ar clássico de aristocracia entediada.

Mas Apolo, Artemis descobriu, até mesmo se sentava de forma errada. Com a cadeira ao contrário, ele tinha o encosto entre as pernas, os braços bronzeados em cima do encosto e o queixo sobre as mãos. Não dava para ver a estampa de sua camiseta azul escura direito, mas Artemis viu letras e suspeitou que fosse uma banda de rock.

Seu cabelo loiro estava ligeiramente bagunçado, mas talvez, ela considerou, isso fosse um efeito do corte. Seus olhos castanhos haviam se voltado para ela, e Artemis se viu flagrada o observando – embaraçada, recompôs-se e desviou o olhar, sentando-se em um sofazinho enquanto Gabriel gravitava para perto de Apolo.

– Então você quer conversar sobre a apresentação? – Artemis perguntou, desconfiada.

– Sim. – Apolo quase sorriu, erguendo-se na cadeira para conversar melhor. – Senti sua falta.

– Eu imaginei que o motivo principal fosse se encontrar comigo, mas ao menos você se deu ao trabalho de arrumar uma desculpa – Artemis suspirou. – Sobre o que quer conversar? Ainda não temos uma história.

– Eu nunca sequer assisti a uma peça de balé – Apolo explicou-se. – E a maioria dos meus colegas também não. Preciso ter uma ideia geral de tudo para poder passar isso para eles e prepará-los um pouco.

– Você nunca assistiu a uma peça de balé? – O professor perguntou, surpreso. – Mas Lena gosta tanto delas.

– Ela tentou me trazer algumas vezes – Apolo pareceu embaraçado. – Quando eu era menor. Depois que eu dormi pela terceira vez, por algum motivo ela desistiu.

– Você costuma vir? – Gabriel perguntou ao professor, animado. – Gosta de ver garotinhos de meia-calça?

– Gabriel, você é muito constrangedor – Artemis disse, com um suspiro. – Sente-se. – Virou-se para Apolo de novo. – Você pode estar no comando dos seus colegas, ou qualquer coisa assim. Mas sequer vai tocar na peça?

– Guitarristas não tocam em orquestras – Apolo encolheu os ombros.

– Então por que estamos--

– Se não quiser conversar com ele – o professor Chamberlain a interrompeu, sem altear a voz. – Converse comigo. Goste ou não, eu sou o responsável por isso tudo. Melhor assim?

Artemis suspirou, ela não usaria o termo melhor. Mas não custava nada tentar, na verdade. Qualquer coisa era válida para evitar a tal ópera gay.

Gabriel começou explicando a Apolo a duração comum de peças clássicas, a divisão em atos, as trocas de figurinos. Conseguiu fazê-lo entender a disposição do anfiteatro e onde os músicos ficariam, prometendo levá-lo lá no dia seguinte. Artemis estava mais ouvindo do que participando, até que Gabriel se virou para ela.

– Ninguém falou nada do papel principal, falou?

– Não – ela o respondeu, desinteressada. – Por quê?

– Ah – ele deu de ombros, e teria parecido desconfortável se Gabriel sequer fosse capaz de se sentir desconfortável. – Provavelmente vai ter uma audiência, então, não é?

– E por quê?

– É o que geralmente acontece – Gabriel explicou, e então assumiu um tom de repreensão debochada. – Tsc, Artemis, você não pode ir simplesmente pegando o papel principal com suas mãozinhas ávidas.

Artemis o encarou.

– Então quem vai competir comigo?

Gabriel ficou em silêncio, o que fez Apolo rir.

– Você é realmente tão boa assim ou eles que são muito ruins?

– Ei!

– Uns quatro ou cinco deles se salvam – Artemis respondeu, com descaso, mas olhando para Gabriel. – Qualquer audiência será inútil, mas podem fazer, eu não ligo.

– Eles não são nada do que você esperava, são? – David perguntou, achando graça.

Artemis preferiu não respondê-lo, o olhando de soslaio. O professor tinha as costas muito retas e as pernas cruzadas; havia recebido a mesma educação primorosa do que ela. Preocupar-se-ia com ele depois.

– É frequente terem audições, então? – dirigiu-se a Gabriel.

– Acho que vai ter para os outros papéis – ele encolheu os ombros –, depende de quem quiser dançar.

– Alguém recusaria? – Artemis perguntou, surpresa.

– Acontece. Ou por medo, ou porque não vão estar aqui. Tipo o Michael, ele está para voltar agora, mas não vai estar aqui em dezembro, daí pediu para não contarmos com ele. O que é uma pena – acrescentou, pesaroso. – Ele fica ótimo de meia-calça.

O último comentário fez Apolo se virar para Gabriel, com um ar genuinamente curioso.

– Não é meio estranho? Ter que usar meia-calça e tutu?

Imbecil.

– Homens não usam tutus – Gabriel se apressou a informar. – Mas se você quiser muito--

– Não.

– Ah. – Ele fez um biquinho. – Okay, então.

Artemis revirou os olhos, sentando-se melhor no sofá e dobrando uma das pernas sob as coxas.

– Tsc – o professor fez de repente, com uma risadinha. – Sua mãe deixaria você se sentar assim, Artemis?

O choque foi tão grande que a garota virou-se para ele em susto.

– É o meu trabalho – ele disse, como se pedisse desculpas.

– David – Apolo disse, lentamente, com um olhar meio de reprovação para o professor – é psiquiatra. Ele tende a fazer comentários constrangedores.

Seu tom era defensivo, e Artemis sentiu-se um pouco grata quando o professor nada mais disse.

– Você tinha comentado com a Lily outro dia que tinha tido uma ideia, não tinha? - Gabriel perguntou.

Havia sido no dia anterior, e Lily havia feito a cara mais falsamente compreensiva do mundo, dizendo que sem dúvida conversariam sobre aquilo no futuro. Artemis tinha vontade de ranger os dentes só de lembrar.

– Tive – respondeu, portanto, decidida. – É uma tragédia original, com dois personagens principais.

Gabriel deu uma risadinha, e Artemis se virou para ele, surpresa.

– Eu espero que você saiba My heart will go on – o garoto disse para Apolo, que riu.

– Fique quieto – Artemis pediu para Gabriel, incomodada. – Titanic não seria um original.

– Sabia que vocês dois poderiam fazer Titanic? – Gabriel não se calou, é claro que não. – Artemis ruiva e Apolo loiro, perfeito. – Ele pareceu pensativo enquanto observava Apolo. – Mas não sei se posso escolher entre você e o Leonardo Di Caprio, ele é a minha queda da adolescência.

– Você não saiu da adolescência – Artemis o informou. – Na verdade, a julgar pela sua maturidade, é como se ainda estivesse permanentemente preso no jardim de infância.

Mas a verdade era que já estava quase se afeiçoando a ele.

– Tragédia – o professor repetiu, pensativo. – Uma tragédia de verdade ou um daqueles romances chorosos para menininhas? – e ele olhou para Apolo quando disse isso, fazendo o garoto rir e balançar a cabeça.

– Eu já disse, John Green não é como você pensa.

– Você leu John Green? – Artemis perguntou, sem conseguir se conter. – Por quê?

– Eu não consegui evitar – ele argumentou, dando de ombros. – Todo mundo estava lendo.

– Oh, então esse é o seu gosto literário. O que mais você leu, Crepúsculo? Tomou partido de um dos garotos, também?

– Team Apolo, é claro – ele a respondeu, com um sorriso que trouxe uma sensação engraçada ao estômago de Artemis. – Você é bem-vinda, a gente pode fazer camisetas e tudo mais.

– Ganho autógrafos? Estou dentro – Gabriel se voluntariou, animado, fazendo Apolo rir.

(Artemis não deveria ter achado lindo o garoto rindo de forma espontânea, todo iluminado de dourado.)

– Queria ter pena de você, Artemis, mas não tenho – o professor comentou.

– Por que me chama pelo meu primeiro nome?

– Eu não sei. O que é interessante, porque eu geralmente erro o nome dos meus alunos. Mas consegui gravar o seu.

– O meu você sabe? – Gabriel perguntou, como uma criança retardada, e Artemis revirou os olhos, suspirando.

– Prestem atenção – pediu, erguendo as mãos para apertar mais seu rabo de cavalo, decidida. – Só vou explicar uma vez.

{...}


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Notas finais do capítulo

Já estamos no capítulo sete! Olha que número lindo. Tenho certeza de que comentar em capítulos de números lindos dá sorte *dica dica dica dica*
Alguém reparou que eu tenho usado muitos parênteses na história? Tenho mesmo. Decidi que os adoro, e que os diálogos internos da Artemis são ótimos.
Estão gostando, amores?
Mil beijinhos.



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