O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 64
Capítulo Sessenta e Quatro


Notas iniciais do capítulo

Sinto tanto pela demora! Ainda me amam?



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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Sessenta e Quatro

Talvez houvessem lhe dado morfina, porque Apolo abriu os olhos como se saísse de um prolongado coma. Demorou a focar a visão, sentindo pontadas de dor de cabeça e um curativo na testa. Pela sensação, havia levado quase dez pontos, mas não dava para ter certeza quando nem ao menos conseguia pensar direito.

– Apolo? – Sentiu o movimento mais do que o ouviu, e logo a mão de sua mãe estava sobre seu ombro. – Finalmente você acordou, eu estava tão preocupada! – A voz estava embargada de choro, mas era possível ouvir seu sorriso. – Seu pai foi tirar Zoe daqui um pouco... Como está se sentindo? David estava--

– Oi – Apolo conseguiu dizer, emudecendo-a de imediato. Descobriu que tinha a voz rouca e que a respiração estava mais rasa, e que o corpo doía um pouco, talvez de ficar deitado por muito tempo, mas, Deus... – É bom te ver.

Olhos dourados, rosto avermelhado de vontade de chorar, cabelo loiro caindo em descuido sobre os ombros. Sardas como as suas, lábios tão raramente sem batom. É maravilhoso.

– Eu sei – ela lhe disse, com um sorriso bobo. Havia sempre sido tão linda? – David disse que você ficaria bem e que acordaria tão logo o efeito da medicação passasse, mas ainda assim... – seu lábio inferior tremeu, e ela respirou fundo, abrindo então um sorriso corajoso. – Como está se sentindo?

– Bem. O que aconteceu comigo? – Apolo ergueu a mão, com cuidado, para encostar na própria testa. Havia de fato um curativo ali, e a menor pressão dos dedos fez com que doesse. Lena ergueu a mão para parar a dele, segurando-a com ternura.

– Com o impacto, você acertou o volante, mesmo com o cinto. Charles já está com o seu carro, e eu exigi a instalação futura de air bags. – Abriu um pequeno sorriso de provocação. – Se ele consegue fazer um calhambeque de 77 andar por aí, pode muito bem equipá-lo com segurança.

Apolo sorriu, aquela discussão era antiga.

– Não fale assim do meu carro. Ele vai ficar okay?

– Infelizmente sim. – Lena então o olhou por um longo tempo, os olhos dizendo muito, mesmo com os lábios comprimidos. – Eu tive tanto medo – murmurou por fim, balançando a cabeça e abaixando o olhar. Abriu um sorriso que quebrou o coração de Apolo, e lhe ergueu olhos cheios de lágrimas. – É bobagem, eu sei. – Afagou seu cabelo, sempre delicada. – Seu pai não demora a chegar. Preciso avisar David de que você acordou, ele vai querer falar com você sobre o que aconteceu.

Lena beijou sua testa antes de se afastar, e, ali, naquela cama de hospital, era como se todas as outras questões – Artemis, seu Festival, Gabriel, Andrew, o carro – parecessem estar a anos-luz dali. (Em posterior visita, Anna lhe explicaria que anos-luz mediam distância, não tempo, mas Apolo ainda achava que dava no mesmo.)

{...}

– E então os deuses te devolveram – foram as palavras de boas-vindas ao mundo dos vivos de David. – Compreensível – acrescentou, com um pequeno e quase invisível sorriso.

Apolo sorriu de volta.

– Sabe como Gabriel está?

Alguma coisa na expressão do psiquiatra barra violinista se suavizou, mas era difícil apontar o quê.

– Você se culpa demais – ele disse por fim, olhando ao seu redor com certo enfado. – O garoto recebeu alta esta tarde.

– Andrew?

O mero fato de David ter se virado para olhá-lo antes de responder fez com que Apolo quase entendesse, o que não tornou mais fáceis as palavras seguintes.

– O garoto morreu cerca de onze horas depois do acidente – o professor teria parecido frio se não houvesse acrescentado, em um tom muito mais gentil: – Não poderia ser sua culpa, ele era hemofílico. Teve uma hemorragia interna grave e seu quadro se tornou irreversível.

Mas a sensação de responsabilidade não arrefeceu. Apolo lembrava-se bem demais do volante debaixo das suas mãos, da luz ofuscante e do impacto violento. Lembrava-se de Andrew, uma versão masculina da prepotência de Artemis ao seu lado, lembrava-se de Gabriel no banco de trás. Como não poderia ter sido sua culpa?

– O que aconteceu?

– Vocês estavam acima do limite de velocidade quando o conversível parou de repente – David contou, antes de abaixar os olhos para a maca e traçar com o dedo uma linha nela. – Talvez o outro carro não tenha tido tempo de frear, ou, mais possivelmente, o motorista estivesse embriagado. Vinha tão rápido quanto vocês, provavelmente também voltando daquele circo que vocês chamam de Festival. – Pausou, sem erguer os olhos. – A polícia não pôde ir atrás dele, porque saiu sem prestar socorro. Alguém ligou para a emergência pouco depois, talvez algum outro motorista que tenha dado de cara com o acidente.

– Era um carro prateado – Apolo disse, porque aquele pouco era quase tudo do que se lembrava. – Grande. Uma caminhonete, talvez. E os faróis estavam altos.

– Faróis altos? – David repetiu, mas com desatenção, erguendo o rosto. – Não vai adiantar de muita coisa, a não ser que você se lembre da placa. Seu pai vai querer vê-lo quando chegar, e eu preciso ir – acrescentou, dando um passo para trás, e Apolo assentiu com certa hesitação.

– Tudo bem. David?

– Sim?

A dor de cabeça aumentou enquanto Apolo não soube o que dizer. Perguntar dela para quê? Tudo o que precisava saber sobre Artemis havia aprendido na noite do Festival.

– Artemis não esteve aqui – David disse, entretanto, como se Apolo fosse transparente como vidro. – Não quis ficar por perto por conta dos seus pais, receio.

A sensação de dormência começou pelo estômago, até que Apolo se viu incapaz de sentir qualquer coisa. Assentiu – ou achou ter assentido – quando David foi embora sem dizer mais nada, um ar de insuportável compenetração em seu rosto.

Acabou abaixando o olhar, sem conseguir sequer ficar bravo. Não havia esperado acordar e ter Artemis soluçando sobre sua maca, ou ainda dormindo na poltrona do canto, e ouvir dos médicos que nada fora capaz de tirá-la de perto dele. Mas – assim como tivera a certeza de que ela iria ao seu Festival – não duvidaria, agora que estava consciente, de que ela tivesse vindo vê-lo pessoalmente.

Perguntou-se se estava sendo infantil. Mimado, carente e sedento de atenção como um imaturo irmão mais novo, incapaz de entender os adultos – mas chegou à conclusão de que não. Encarou as próprias mãos e percebeu que não havia cobrado de Artemis mais do que qualquer outra pessoa cobraria. Estava no direito de se sentir magoado e traído e, no entanto, porque doía tanto, e algo que não era rancor?

Foi devagar que percebeu que talvez não devesse ter sido tão paciente. Não deveria ter relevado tantas críticas, talvez não devesse ter sido tão gentil. Não deveria ter tido tanta certeza em algo bom por trás de toda aquela fachada, e então, talvez, não teria errado tão feio. (Estava arrependido?)

Havia realmente concordado em esperar? Aceitado de bom grado o namoro em segredo, as mágoas que isso provocaria? Havia, de verdade, entendido quando ela simplesmente não respondera a nenhuma das suas declarações? Havia a aceitado por completo? Apolo havia achado que sim, mas, revendo tudo isso, percebia que não.

Não havia aceitado nada daquilo nem por um segundo. Havia se refreado na esperança de que fosse apenas uma fase, um começo clichê de romance, algo que escondesse algo mais doce e morno por dentro. Nunca acreditara que Artemis fosse realmente só o que parecia ser: não havia ido tão mansa e tão linda para a sua cama? O recebido às escondidas em seu quarto na calada da noite, dançado apenas para ele no telhado, o beijando tão apaixonadamente que não havia deixado dúvidas de que o amava de volta?

Qualquer outra pessoa não teria se surpreendido nenhum pouco por Artemis não ter ido vê-lo, percebeu. Tanto no show quanto no hospital; não estiveram namorando escondido e então ficado sem se falar por semanas? A Artemis que todos conheciam jamais dobraria os joelhos e se renderia à consideração e à saudade; por que havia tido tanta certeza de que ela era mais do que isso?

Com uma dor de cabeça terrível, Apolo se deu conta de que, desde a noite do Festival – não importando há quanto tempo tinha sido – , sua decepção maior fora consigo mesmo. Não com Artemis, não por completo. Estivera com raiva do próprio estúpido erro, e não ter alguém para culpar além de si mesmo era muito pior do que qualquer coração partido.

{...}


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Notas finais do capítulo

Toda essa angústia está fazendo a taxa de açúcar do meu sangue baixar, preciso de fofura... Acho que vai sobrar para David e Gabriel! Gostando, meus lindos? Mil beijinhos da Maeve!