O Entregador de Estrelas escrita por Beatriz Azevedo


Capítulo 14
A primeira vêz que incío uma conversa




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Me vi acordando embaixo de um cobertor grosso. Olhei para meu casaco e bolsa de carteiro pendurados em uma cadeira simples de madeira e depois do momento que minha vista passou a se adaptar com a claridade vinda da janela eu me vi em um quarto bonito com visao para a igreja principal de Nordstrand. Me sentei na cama e dobrei a manga da minha blusa revelando meu braco revelando um misto de roxo e vermelho na minha pele palida de frio.

Fechei os olhos desapontado. Eu nao havia conseguido me controlar novamente e meu braco, vitima do meu desespero estava marcado.

Coloquei minha mao na testa afastando meu cabelo castanho dos olhos. ‘Eu estou louco?’ Tentei lembrar do momento anterior, mas minha cabeca doia demais e eu acabei desistindo.

Meus devaneios acabaram quando ouvi um ruido vindo debaixo do chao e me veio a atencao de que eu nao sabia onde eu estava nem onde o Mathew estava.

Me levantei num pulo e coloquei meu casaco. Andei em direção à porta com cuidado e ao descer as escadas esbarrei com um a provável governanta da casa. Ela carregava uma bandeja com biscoitos e chá.

“Esta se sentindo melhor?” Ela perguntou sorrindo.

“Você fala inglês?” Perguntei fechando um pouco os olhos ja que sua imagem brilhava. Era um brilho esquisito e indeciso. Queria brilhar, mas não tinha certeza se deveria por isso piscava.

Ela fez que sim.

“Nao parece muito alemao não é?”

A encarei em silêncio e seu sorriso sumiu rapidamente.

“Chamaram um doutor. Nao gostaria de tomar banho e esperar por ele?”

Fiz que não com a cabeça e ela entortou o lábio. Esperei alguns segundos procurando algo que tirasse seus olhos azuis curiosos de mim, mas ao notar que ela continuava e nada a interromperia eu tomei coragem e falei.

“Por que me trouxe pra cá?”

“Sr e Sra Bay lhe encontraram jogado na rua... eles sairam para chamar um medico.” Ela sorriu. “Não gostariamos ver um menino que acabou e chegar no obtuario amanha, gostariamos?”

“Não havia mais ninguem comigo?”

Ela pensou um pouco e depois fez que nao. Um mal estar me consumiu e eu me apoiei no batente da escada. Ela se aproximou de mim curiosa.

“O doutor podera’ examinar suas feirdas-” Ela continuou, mas minha mente parou de ouvi-la ao me lembrar da ferida na minha perna.

“Eu realmente preciso ir.” Falei no meu tom normal e ela demorou alguns segundos para entender o que eu havia falado. Ao perceber sua cara curiosa corri em direcao a porta, mas antes de passar me apoiei no batente, respirei fundo e falei “Conhece alguma Matilda?”

Ela me encarou ainda um pouco espantada e fez que sim de leve.

“Quantas?”

“Tres.”

Suspirei derrotado, mas resolvi complementar a discricao enquanto tentava me lembrar do sobrenome da Matilda.

“O pai dela trabalha com livros e ela e’ mais ou menos da minha idade.”

Ela fez que nao com a cabeca.

“Nesta discricao nao conheco nenhuma.”

“Obrigado de qualquer forma.” Respondi me virando.

“Mas conheco alguem que pode a conhecer.” Ela se aproximou de mim e me puxou em direcao ‘a cozinha. Sentei na cadeira indicada enquanto ela tirava dois livros da estante e os colocava na mesa, depois ela abriu uma gaveta e tirou um oculos grosso que quando colocado em seu rosto robusto a fez parecer uns 10 anos mais velha.

“Faz um tempo que nao falo com ele. Talvez ele tenha morrido.” Ela abriu um dos livros e comecou a olhar os varios nomes esquisitos junto com nomes de ruas que eu nunca pensei que poderiam existir.

“Eu preciso a encontrar...” Susurrei.

“Sua namorada fugiu dos seus bracos, eh?” Ela falou levantando os olhos para me encarar.

“Nao.” Respondi.

“O meu marido sumiu ha anos.” Ela falou com um suspiro novamente tirando seus olhos do livro para me encarar.

A encarei em silencio e ela continuou.

“Ele disse que ia em uma viagem por 3 dias e que ia achar um emprego que nos levaria de volta para Londres. Ha! E eu acreditei. Ele nunca voltou.” Ela fez que nao com a cabeca e sorriu tristemenete. “Deve estar na Australia com os cangurus agora.” Ela ajeitou o coque loiro tentando tirar minha atencao de seu rosto que ficava cada vez mais vermelho.

“Perdao, madame, mas e se tiver... acontecido um acidente?”

Ela franziu a testa e parou de ler o livro de vez.

“Perdao, o que?”

“Acidentes de trem nao sao tao incomuns” Falei enconlhendo os bracos timidamente.

“Agora o que um menino como voce anda lendo para ter estas ideias?” Ela fez ua breve pausa e voltou a falar “O trem dele chegou ‘a estacao ha mais de 20 anos.” Ela falou seca e voltou novamente a ler o livro de enderecos. Pensei um pouco e voltei meus olhos castanhos a seus azuis.

“Voce sabe ler?” Perguntei.

“Nao... Bom, nao de verdade, eu reconheco algumas palavras necessarias e sei assinar meu nome, so isso.” Desta vez ela nao tirou os olhos do livro.

Brinquei com meus dedos e esmo que para mim custasse muito abrir a boca para falar bobagens, pela primeira vez eu estava desesperado por sons e o silencio me apavorava trazendo o pensamento ‘Eu estava sozinho no meio da neve.’ Dentro de minha cabeca.

“Como voce conheceu o seu marido?” Perguntei.

Ela finalmente fechou o livro e olhou para o relogio.

“Eu nao me lembro... foi a uns 23 anos atras.”

“Voce lembra se se amavam?”

Ela pensou um pouco.

“Foi um casamento arranjado?” Perguntei e ela fez que nao.

“Sim, eu o amava.” Ela falou num suspiro apos alguns instantes.

“E como era?”

Ela franziu a testa e fez um olhar de reprovacao.

“Eu nao sei se eu amo de verdade.” Falei me levantando e me abracando ja que de repente comecei a sentir frio.

“Por que?” Ela perguntou provavelmente o motivo de eu me levantar, mas eu respondi como uma indagacao ‘a minha afirmacao anterior.

“Por que eu nao consigo sentir esta necessidade que todos parecem ter! Eu nao quero ninguem perto de mim! E’ sufocante... Eu nao consigo retribuir as palavras carinhosas que alguem me diz, para mim elas sao como facadas de gelo no estomago. Eu nao consigo nem formar frases completas!” Soltei o no’ do meu cachecol que parecia me asfixiar. “Eu so’ consigo pensar na minha avo e que eu tenho que ir atras da Matilda e de que eu vou morrer!” Senti minha voz ficando rouca enquanto a governanta me encarava assustada e imovel na cadeira. “Eu sinto tudo indo embora o tempo todo e eu nao sei se aqui e’ o lugar certo ou o lugar que minha mente me leva! Eu nao consigo confiar em ninguem e nao consigo agradecer a quem confia em mim por que de repente me vem o barulho do trem que minha mae entrou e...”

Me sentei novamente com medo de cair e coloquei minha cabeca entre meus bracos para esconder as lagrimas que continuavam caindo sem que eu conseguisse as impedir.

“A Victoria quer saber se eu a amo, mas eu nao consigo!”

Ela alisou minhas costas e eu me afastei asusstado.

“Voce deve se lembrar do que sentia pelo seu marido. Dizem que se voce vive um sentimento intenso voce vai o sentir o tempo todo pelo resto da sua vida. Eu preciso saber e fingir...”

“O fato de querer fingir que ama ela mostra que voce se importa e nao deixar sua mae ir mostra que a ama.”

“Nao!” A encarei novamente. “Eu nao deixo minha mae ir por que nunca vou a perdoar! Eu me sinto mal pela Victoria por que eu nunca vou amar ela e ela vai ficar com um coracao quebrado igual o que minha mae fez comigo!” Segurei minha bolsa de carteiro com forca. “Por que se eu vir minha mae, eu juro que eu -”

“Nao diga isso!” Ela se levantou para ficar do meu tamanho. “Voce esta doente! Precisa se curar, precisa achar uma chave que cure sua cabeca que da voltas e voltas e voltas.”

Ela soltou meu rosto e eu tentei evitar pensar na Victoria. Observei ela rasgar um pedaco de papel e escrever um endereco e um nome do livro que ela tinha aberto novamente. Ela me entregou o papel. “Aqui esta o endereco dele. Nao quer esperar o doutor?”

“Nao, obrigado.”

Sai da casa e olhei para meu reflexo na janela. Meu rosto estava avermelhado como o ceu, mas logo foi perdendo a cor por causa do frio.

“Mathew?” Susurei esperando que eu ouvisse omo um grito. Nada nem ninguem respondeu. Olhei para o papel e identifiquei 3 letras. Como eu estava perdido resolvi gastar meu tempo procurando pela rua que minha mente nao conseguia ler.


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