Quando Tudo Aconteceu escrita por Mi Freire


Capítulo 53
Capítulo LI


Notas iniciais do capítulo

Eu simplesmente amo feriado e ainda mais quando ele se prolonga. Não é como se a minha vida fosse muito interessante, então não há muito o que se fazer além de escrever por horas e horas.



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Quando a Marina me ligou naquela tarde após chegar do colégio para me contar que o Bernardo estava com a ideia fixa de vir até BH falar comigo porque eu ignorava todas as suas chamadas, eu não pensei duas até criar coragem de ligar pra ele e tirar aquela ideia absurda da cabeça dele. Não havia fundamentos. Primeiro que ele ainda é menor de idade, precisaria de autorização para pegar o avião. Segundo que ele gastaria a maior grana por achar que ainda me ama ao ponto de cometer tamanha loucura. Terceiro e último e mais importante, eu não iria querer vê-lo. Ele não poderia simplesmente ir até aqui para conversar comigo.

Afinal, o que de tão importante ele tinha pra dizer?

― Nem pensar, Bernardo! Ficou maluco? – eu estava nervosa por ter que discutir com ele por telefone. Porque ele tem que ser sempre tão infantil? ― Não e não! Eu não quero que você venha até aqui.

― Mas Clarissa, você não atende nenhuma das minhas ligações! Eu estou começando a ficar maluco, de fato. Eu sei que você me odeia, eu sei que você não queria falar comigo nunca mais, mas será que custa muito, pelo menos uma vez na vida você me dar uma oportunidade?

Suspirei forte, me dando por vencida.

― Fala, Bernardo. Fala! O que é que você tem tanto pra dizer? – finalmente perguntei, com medo da resposta. ― Não me faça me arrepender de ter ligado pra você.

― Só me escuta, está bem? – eu não respondi, mesmo assim ele ficou um minuto calado como se estivesse ganhando forças para continuar aquele dialogo. ― Eu soube que você está namorando, que você está super feliz nessa sua nova vida e que você parece gostar da sua nova companhia. Eu soube de tudo isso e muito mais. O Miguel acabou contanto tudo pra mim mesmo sem querer. Não o culpe por isso. Eles são nossos amigos e deve ser tão difícil pra eles quanto para nós.

― Entendi. – voltei a falar, impaciente. ― Eu não os culpo, claro que não. Eu já sabia que isso ia acontece no momento em que os vi parado na porta da minha casa. Mas Bernardo, você não me ligou só pra dizer isso não foi? Não enrole! Está tarde! Fala de uma vez.

― O.K. O.K. Tenha paciência. – ele riu. ― Pelo visto você não mudou em nada, Clarissa. Vamos lá, como eu estava dizendo.... Por um lado eu gostei de saber que você tinha encontrado um novo alguém que gostasse mesmo de você, não tanto quanto eu gosto, mas alguém que estivesse ao seu lado já que eu não posso estar. – apesar de toda aquela ladainha eu achei melhor não interrompe-lo. Ou aquela história não acabaria nunca e eu precisava ir dormir. ― Mas por outro lado, eu fiquei triste. Afinal, não é nada fácil descobrir que a pessoa que você ama encontrou outro alguém, independentemente de quem seja. Eu pensei bastante nisso. Eu não devo ser egoísta ao ponto de achar que você vai permanecer sozinha pelos próximos mil anos enquanto estivermos separados. Você é adorável, a melhor pessoa que já conheci e claro que isso uma hora ou outra iria acabar acontecer. Mas a grande verdade é que não estou preparado para te perder, não completamente. E era por isso que eu tanto queria falar com você. Você seguiu com sua vida, está feliz, está namorando, está vivendo e eu, bom, continuo na mesma lama. Mas ninguém pode dizer que eu não tentei, só que eu simplesmente não consigo. Não consigo seguir a vida enquanto o meu coração ainda bate por você mesmo a quilômetros de distância de mim. E como meu último pedido, antes de tomar uma grande decisão na minha vida. Talvez a maior delas. Eu gostaria que você fosse sincera comigo, de verdade, assim, muito sincera mesmo e me dissesse, nem que fosse pela última vez, se você ainda me ama ou não mais, simplesmente deixou de me amar e me substituiu. Porque se a resposta for positiva eu não posso mais simplesmente viver dessa maneira, sempre pra baixo, sentindo-me muito mal, definitivamente eu preciso seguir. Mas se a resposta for negativa Clarissa, eu te juro, de todo o meu coração, que eu farei de tudo para te reconquistar, pois eu sim, ainda te amo muito e te quero de novo apesar de todos os erros que eu cometi no passado. Eu preciso do seu perdão. – houve um pausa. E naquele momento eu senti, depois de tanto tempo, que o Bernardo estava chorando. E era um choro sincero, de verdade, nada forçado. E eu estava tão distante dele que não poderia fazer nada e meu coração se comprimiu ainda mais. ― E então, o que você me diz?

Engoli em seco, completamente perdida. Sem reação.

Eu precisava dar uma resposta pra ele, sendo positiva ou negativa, eu não poderia ser injusta com ele quando tudo que ele precisava naquele momento é que eu fosse sincera, verdadeira. Depois de tanto tempo separados, que pode até parecer pouco, mas é como se fosse muito mais tempo, pela primeira vez eu pude sentir e saber o que se passava com ele, em São Paulo. Ele estava mal, ele sofria, ele já não era mais o mesmo e ninguém precisou me dizer isso, nem mesmo ele próprio, eu pude perceber aquilo enquanto ele me falava tantas coisas. E apesar de toda a raiva que eu senti dele eu não poderia aceitar a ideia de que a pessoa que eu tanto amei na vida, a primeira e talvez única, estivesse naquela situação por mim. Não parecia justo. Não era justo nem com ele e nem comigo e se eu pudesse fazer alguma coisa para mudar aquilo, então eu faria.

Pois qualquer coisa é válida.

Ele me deu duas opções e uma delas eu teria que escolher naquele momento para dizer. Independentemente de qual resposta eu desse, ele iria se sentir melhor depois de sofrer e aceitar os fatos como eles são e isso já era o bastante. Até porque eu não posso fazer muito por ele.

― Então você quer uma resposta, não é isso? O.K. Eu vou te dar uma resposta, mesmo que ela não seja exatamente o que você gostaria de poder ouvir. – sentei-me na minha cama, sentindo o corpo fraquejar. Eu precisaria ser rápida naquele instante, certamente Isabel não ia demorar muito para vir até o quarto para ir dormir. ― Eu não te amo mais, Bernardo. Agora, eu amo o Artur. E ele me ama também. Nós somos felizes e eu espero que você seja também. Eu já amei muito você sim, mas você feriu o meu coração ao quebrar a minha confiança. Eu acreditava em você, eu confiava em você, eu precisava de você e o que você fez? Você optou por me magoar mesmo sabendo que você era tudo pra mim. Eu não guardo mais magoas daquele tempo e nem tenho ódio de você. Por mais que eu diga e tente não gostar mais de você, tudo o que eu digo, na verdade, é da boca pra fora. Porque nem por um minuto eu consigo te odiar, não é bem ódio, é raiva. Raiva por você ter estragado tudo entre nós. Hoje poderíamos estar juntos, mas não estamos mais. E você precisa aceitar isso. E é por isso que todo esse tempo eu tentei manter distância, porque eu sabia que não seria fácil para nós dois mantermos contato. Nosso amor foi tão real ao ponto de não conseguir se transformar em amizade. Assim será mais fácil, acredite. Para nós dois. Então, por favor, não volte a me ligar e nem a me procurar. Me esqueça e com certeza você encontrará alguém que possa me substituir dentro do seu coração.

Com lágrimas presa nos olhos eu desliguei o celular, porque não havia mais nada a ser dito. Ele queria uma resposta e foi isso que eu fiz, eu dei uma resposta a ele. Porque acima de tudo, eu quero que ele seja feliz mesmo com outra, mesmo sendo outro. E eu sabia que se fosse o cruel o suficiente, ele iria começar a sentir raiva de mim também, deixando o amor que sente por mim de lado, com o tempo, esquecido.

Os dias seguiram normalmente, e eu me sentia cada vez mais ligada ao Artur, que a todo tempo era maravilhoso comigo, mesmo com as intervenções de sua mãe, que vez em outra voltava de suas viagens. Nada que ela pudesse fazer era capaz de nos separar. E era isso que eu mais admirava em nós, a força que tínhamos quando estávamos juntos.

O Bernardo ainda algumas vezes me vem à cabeça, mas tenho percebido que isso agora acontece com menos frequência quando eu tento ocupar a minha mente com coisas mais importante. E eu acredito que não vai demorar muito para ele sumir completamente.

O mês de Maio já está chegando ao fim e ao mal posso esperar para que as férias de Julho comecem logo. Eu e o Artur temos muitos planos, será as nossas primeiras férias juntos e eu quero que seja inesquecível.

― Arturzinho, meu filho, vem ajudar a mamãe da cozinha. – gritou a Dona Cida, interrompendo as nossas partidas no videogame.

Ás vezes chega a dar nojo como ela trata os filhos como se ainda fossem bebezinhos.

Artur e Yuri me tornaram craque em jogos de corrida, apesar de sempre caírem na risada por minhas performances. Como se inclinar o meu corpo para os lados para frente para trás fosse fazer os meus carinhos andarem mais rápido.

Artur largou o controle na minha mão e saiu correndo para ajudar a mãe, eu e o Yuri ficamos em silêncio jogando no quarto.

Era um sábado nublado e estava uma ventania fria á fora.

A casa estava toda trancada com o aquecer ligado.

Não demorou muito para escutarmos a discursão vindo do corredor.

― ... só você não vê que sua namoradinha está tentando conquistar o seu irmão, filho. – ela praticamente gritava, com se cuspisse as palavras. Eu e o Yuri abaixamos o volume da televisão para pode ouvirmos melhor a briga. ― Aquela garota quer ficar com vocês dois! Ela está enganando vocês. Ela quer tirar meus dois únicos filhos de mim!

Me dei conta que ela estava falando de mim, pra variar. Olhei para o Yuri naquele momento, assustada. E ele me olhou de volta, como se não entendesse exatamente do que aquela louca estava falando.

Ouvimos um choro vindo da sala de estar, largamos os controles sobre a cama e o videogame ligado e corremos até lá.

Cida estava chorando, ou melhor, fingindo chorar como se o mundo estivesse prestes a acabar. Todos acreditavam naquela ceninha, menos eu.

Olhei para o Artur parado no canto da sala em pé, olhando para a mãe como se sentisse muito por aquilo. Ele sentia-se culpado por tê-la feito chorar. Claro, aquilo fazia parte dos planos dela para envenena-lo.

― Ela aproveita quando você não está para ficar se insinuando para o Yuri. Ela quer vocês dois na palma da mão para conseguir tudo que quer, especialmente destruir a nossa família. Ela é uma cobrinha!

O quê? Mas o que eu fiz pra ouvir tantos absurdos?

― Mãe, você ficou doida? – Yuri ajoelhou-se diante dela, tentando acalma-la. ― Esqueceu de tomar seus remédios? Você está completamente errada. A Clarissa não é isso que você está dizendo. Que absurdo! Ela nunca se insinuou pra mim! Nunca! Ela é linda e tudo mais, mas ela gosta mesmo é do Artur. Será que você não percebe?

Novamente olhei para o Artur, praticamente implorando com os olhos para que ele também me defendesse. Ele, melhor que ninguém, sabia que eu nunca fui esse tipo de garota.

Mas ele continuou paralisado.

― Vocês estão vendo o que ela está fazendo? Olhem pra ela! Ela está adorando ver nossa família sendo destruída...

Abri a boca para me defender, mas o Artur foi mais rápido.

― Sai daqui, Clarissa. Sai daqui agora! – ele gritava comigo como se eu fosse um cachorrinho de rua. O rosto todo vermelho, as mãos tremendo, os olhos repletos de magoa. ― Você não vê o mal que está fazendo a minha mãe? Olha só pra ela!

Eu não podia acreditar que aquilo estava acontecendo justamente comigo, que sempre tentei ser a melhor namorada possível. Logo quando justamente eu acreditava que estava tudo bem entre nós e....

― Saí logo daqui. – ele gritou pela última vez.

E eu saí. Porque não ficaria ali entre aqueles três malucos.

Ao tocar na maçaneta da porta da minha casa, eu ouço a porta da casa do Artur bater. Viro-me para trás e vejo o Yuri, confuso.

― Clary, me desculpe por aquilo. Os dois ficaram malucos! Eu sei que você não é esse tipo de pessoa. Eu não sei o que acabou de acontecer, eu ainda tô tentando entender...

― Tudo bem. – sorri. ― Pelo menos você acredita em mim.

Entrei em casa me sentindo muito mal, como se tivessem acabado de pisar em mim sem dó. E na verdade, foi exatamente isso que aconteceu. Por sorte, a casa era inteirinha só minha. Meu pai decidiu levar a Isabel aquela tarde de sábado para irem ao teatro da cidade.

Desabei sobre o sofá, sentindo as lágrimas escorrem pelo meu rosto. O impacto do meu corpo caindo sobre o estofado fez com que a pasta do meu pai caísse no chão, inclinei-me para pegar, quando novamente caiu algo. Um envelope lacrado dessa vez. Um envelope típico de carta, destinando a.... Mim. Uma carta pra mim!

No primeiro momento fiquei com medo de abri-la. Pois, se meu pai havia guardado ou escondido, não sei, só poderia ser dos meus pais verdadeiros atrás de mim, fingindo um falso amor paternal, só pra conseguir dinheiro.

Então quer dizer que eles haviam nos encontrado!

Mas aí, quando virei o verso do envelope eu vi que estava enganada, pois ali estava a letra bem desenhada do Bernardo.

Era uma carta do Bernardo pra mim.

Estava infeliz o bastante com a minha vida para deixar a curiosidade falar mais alto, mesmo que meu coração estivesse quase saindo pela boca só de ler o seu nome no verso do envelope.

Querida Clarissa,

Estou escrevendo essa carta agora que finalmente tenho o seu endereço, consegui com os nossos amigos, mas te peço que por favor, não os culpe por isso. Eu sou bastante insistente, você sabe. Talvez esse seja um dos meus maiores defeitos, ou uma das minhas maiores qualidades. Isso só depende de você.

Pela primeira vez te confesso que essa não é a primeira carta que te escrevo. Eu já escrevi tantas outras e da última vez eu jurei para mim mesmo que seria a última mesmo que nunca fosse enviada. Porque naquele momento só eu sabia o quanto elas me faziam mal. Mas hoje eu sei o quanto estava enganado. É engraçado como vemos as coisas diferentes com o tempo. O amor que sinto por você, nem mesmo com o passar dos anos poderia me fazer mal. É puro demais, intenso demais, verdadeiro demais para me fazer infeliz. E pelo contrário, por ele ser justamente tão grandioso demais foi que o manteve vivo e forte todo esse tempo em que estivemos separados.

Há algumas semanas atrás eu te liguei para pedir algumas respostas e, bem, você simplesmente optou por dar a resposta errada, mesmo quando te pedi para ser sincera de todo o seu coração. Demorei um tempo pra entender o porquê de você ter feito aquilo comigo, mas então eu entendi que você, naquele momento, achou que seria o melhor pra mim. Mas você não tem como saber disso, se você não está aqui ao meu lado. Você não pode simplesmente decidir por nós dois o que é melhor para cada um. Talvez o melhor pra você, não seja o melhor pra mim e é por isso, e muitos outros motivos, que mesmo depois de você ter me pedido centenas de vezes para nunca mais te procurar eu ainda estou aqui escrevendo essa carta pra você.

Há cerca de uma semana, ainda com as suas palavras daquela noite martelando na minha cabeça eu parei de me sentir tão mal. E sabe porquê? Porque eu soube que você me enganou. E com todos os motivos eu tinha pra ficar com raiva de você, eu fiquei feliz. Feliz por saber que você ainda me ama, que você ainda se importa comigo, que você ainda pensa em mim, que você por mais que não queira ainda me quer, que você gostaria de poder estar aqui ao meu lado e que nunca conseguirá amar outra pessoa da mesmo forma que me ama. Eu sei de todas essas coisas e você nem precisou me dizer, porque você tem medo de se machucar outra vez, você tem medo que eu brinque com seus sentimentos, você tem medo de sofrer, você tem medo de me perder. E por tanto medo você preferiu mentir pra mim, me enganar, ocultar seus sentimentos acreditando ser o melhor pra mim. Porque você tem o péssimo habito de tentar sempre decidir por mim achando ser o melhor. Mas você está enganada e esteve todo o tempo em que tentou não só enganar a mim, mas também a si mesma. Lembra do ano passado, quando você achou que o melhor seria se afastar de mim com medo do que sentia em relação a nós dois? Lembra também de quando você fingiu um romance de mentirinha com o Diego tentando me afastar de você achando ser o melhor para nós dois?

Nós temos que parar com isso! Temos que parar de decidir um pelo outro e decidirmos as coisas juntos a partir de agora. O que você acha?

Será que você não percebe que quanto mais você tenta me afastar de você, mas difícil você torna as coisas e não mais fáceis?

Não faça mais isso, Clarissa. Não adiantar. Quantas vezes você tentou e até hoje, depois de mais de uma ano que a gente se conhece, eu ainda estou com você de uma forma ou de outra?

Pra finalizar, eu quero que você saiba que continuarei tentando te reconquistar. Agora muito mais que antes. Porque tudo que eu precisava era saber que você ainda me ama. Nós ainda vamos ficar juntos, pode apostar. Passaremos por cima de todas essas dificuldades, desavenças, desafios, todo esse transtorno, a bagunça que a nossa vida se transformou. Vamos superar cada uma dessas coisas, não só dessa vez, mas como também todas as vezes em que isso voltar a acontecer durante as nossas vidas e por fim, estaremos juntos. Firmes e fortes, como deve ser. O destino quis assim, que pertencêssemos um ao outro. E quem sou eu para dizer o contrário? Se eu te conheci, me apaixonei, te amei, senti por você o que nunca antes senti por nenhuma outra, se a experiência que vivi ao seu lado foi a mais intensa que eu poderia sentir, não tem como ser por acaso. Algo assim eu não quero sentir por mais ninguém e está mais que provado que não sentirei, por mais você queira e por mais que eu tente. Estamos selados para todo o sempre. Eu tenho convicção disso e quero que você tenha também.

Um beijo e até logo,

Bernardo.

Se eu já estava chorando antes mesmo de começar a ler essa carta, eu estava chorando ainda mais agora por culpa. Eu sempre o culpei pelo nosso termino e agora eu sabia, após ler aquela carta, que ele nem sempre foi o único culpado. Eu também passo a maior parte do meu tempo pensando em soluções para afasta-lo de mim achando ser o melhor para nós dois. Ele tem razão: é um péssimo habito e eu definitivamente deveria parar. Isso está acabando com todo mundo, inclusive comigo mesma.

O Bernardo é realmente muito esperto. Eu o enganei aquela noite por telefone, porque novamente achei ser o melhor, o mais fácil. Eu tinha esperança que ele seguisse sua vida sem mim, mas eu estava enganada. Eu tenho me enganado todo esse tempo para fugir da minha própria realidade. E agora, sentindo-me patética, pressiono a carta de encontro ao meu peito, soluçando aos prantos, querendo que de alguma forma o Bernardo estivesse ali e me levasse para bem longe para vivermos em paz, porque isso sim é tudo que eu mais quero.

Mas afinal, porque meu pai teria escondido aquela carta de mim?

Provavelmente ele também tem o péssimo habito de acreditar que certas ações seriam o melhor. Eu também não o culpo. A única culpada ali sou eu mesma e isso deve mudar.

Os dias seguintes passaram muito depressa e não foram os melhores dias da minha vida. Eu estava evitando o Artur da mesma forma que ele me evitava. Eu o evitava por estar confusa quanto aos meus próprios sentimentos por ele e ele me evitava para não ter que tocar no assunto daquela tarde, quando ele me expulsou de sua casa. Desde então não paramos conversar sobre aquilo.

Nem parece que somos namorados. Como se tivéssemos dado um tempo.

Não havia um se quer dia em que eu não lia a carta do Bernardo quando me sentia sozinha. Assim como também passei a ler todas as coisas que ele me escreveu quando estávamos namorando e que estavam guardadas dentro de uma caixa no alto do meu guarda-roupa.

Aquilo já não me fazia mais tanto mal, não quando eu definitivamente aceitei a verdade: pertencíamos um ao outro, de um jeito ou de outro. Nossos destinos foram selados. Ter todas aquelas coisas junto a mim novamente, era como se ele estivesse ali. E eu me dei conta do quanto eu amava tudo nele: a aparência, o jeito, a caligrafia, o romantismo, o sorriso de lado, o som da sua voz, a macies de seu toque, a cor dos olhos, ou basicamente, tudo, ainda mais que antes.

Engraçado como a gente se dá conta da importância das coisas quando elas estão fora do nosso alcance.

Outras vezes eu me pegava pensando que nada que eu pudesse fazer além de admitir meus sentimentos mudaria aquela situação, até porque ainda somos duas crianças. Ele mora lá em São Paulo, naquela pequena e antiga cidadezinha do interior e eu moro aqui, no centro de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Eu não poderia simplesmente fazer minhas malas, deixar tudo de novo que conquistei para trás e voltar pra São Paulo, para viver com o Bernardo. E ele não poderia também largar a sua vida toda lá, inclusive a Liz, para vir morar aqui comigo em BH.

Por enquanto deveríamos nos contentar com isso: as coisas como estão. Quem sabe o tempo nos trouxesse uma solução.

― Meninas, vem até aqui. Sentem-se. – Vicente chamou-nos até a sala de estar. Eu estava fazendo meu dever de casa no quarto e Isabel jogando no celular também no quarto. ― Preciso falar com vocês.

Sentei-me em frente ao meu pai e Isabel na poltrona.

Fiquei nervosa, tudo ultimamente que vinha do Vicente era uma novidade. Nunca sabíamos o que esperar dele. E quase sempre o que ele tinha a dizer afetava sua vida tanto quanto afetava a nossa.

― Eu e a Aline marcamos a data do casamento.

― O quê? Quando? Onde? Ela vem morar aqui com a gente?

― Tenha calma, Isabel. – ele sorriu. ― Uma coisa de cada vez.

Ansiosamente eu esperei que ele continuasse, sem eu precisar ficar interrompendo com as inúmeras perguntas que eu tinha em mente.

― Vamos nos casar em 5 de Julho. – ele sorria, como se aquele fosse o acontecimento mais feliz da sua vida. E eu não duvidava que fosse. ― E a pedido dela, vamos nos casar em São Paulo. Afinal, lá está toda a sua família e amigos. Eu não poderia tirar isso dela. Quanto a ela vir morar aqui, ainda não decidimos isso. Por enquanto. Mas quando acontecer, não se preocupem. Vocês duas serão uma das primeiras a saberem.

Isabel dou um pulo da poltrona, assustando-me.

― Então, quer dizer que vamos pra São Paulo em Julho? – ela estava tão feliz que seu sorriso se estendia de orelha a orelha. Há tempo eu não a via assim. ― E eu vou poder ver o Edu novamente?

Por incrível que pareça, eles ainda estão namorando. A distancia.

Vai fazer um ano. Ou já fez. Não sei.

― Isso mesmo, Isabel. Vamos pra São Paulo em Julho.


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Notas finais do capítulo

Satisfeitos? Eu estava louca pra escrever esse capítulo! Já adianto que talvez no próximo capítulo ou no seguinte, eles vão se reencontrar finalmente. Não vai ser fácil, mas prometo surpresas. E aí, quando as coisas forem se acertando aos poucos já caminharemos para a grande final!