Sinal escrita por Universo das Garotas


Capítulo 20
20º Capítulo




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20º Capítulo – Beatriz


Voltei para minha casa logo depois de passar três dias no Hospital. Frederico passava as manhãs e as noites comigo. Fez questão de deixar minha mãe em casa, concordando em me trazer direto para minha após abastecer minha sempre escassa dispensa. Ele fez de tudo para agradar mas eu me mantive fria e distante. Na verdade de luto. Porque eu sentia como se tivesse perdido mais de uma pessoa muito querida no último mês.


Fui para meu quarto dormir, logo depois de tomar uma banho com um Frederico me aguardando na sala. Ele trouxe para comermos uma sopa de frutos do mar preparada pelo seu mestre de cozinha Julian. Adorava aquele homem e o mínimo que ele deveria ser intitulado era de Deus da cozinha porque mestre é singelo demais em relação ao que aquelas mãos faziam.


Mas ainda assim, mesmo a comida de Julian não despertou meu apetite. Apenas comi para que os olhos de Fred não me questionassem mais do que estavam fazendo. Ele decidiu não dizer nada, apenas recolheu os pratos e colocou – os de volta na bolsa térmica que trouxe. De minha casa não foram usados nem os talheres e nem tampouco os copos. Frederico pensou em tudo para não me dar trabalho.

Foi embora despedindo-se com um beijo e com a promessa que voltaria pela manhã. Eu dispensei a sua companhia alegando compromisso de manhã cedo. Na verdade tinha sido surpreendida com este compromisso. Ontem a tarde, enquanto chegava em casa com Frederico uma tal de Anne Roch me ligou da sede da Companhia Engenheiros da Moda, para falar do testamento deixado pelo meu pai. Eu disse que não estava interessada em nada mas ela logo usou chantagem para me dobrar. Alegou que se eu não fosse resolver esta pendência a empresa não teria como pagar os funcionários já que as contas e movimentações de meu pai estavam congeladas desde a sua morte. Eu era a única herdeira. Horrorizada com a possibilidade de prejudicar inocentes aceitei dar uma passada rápida para me inteirar do testamento. A mulher deu-se por vencida e disse que me aguardava as 09hs na sede.


Eu não pisava lá desde que tinha 13 anos. Frederico após muita discussão aceitou que eu viesse sem ele mas conseguiu me deter de vir dirigindo meu próprio carro. Para isso, praticamente me obrigou, por meio da ajuda da minha mãe, a usar os serviços de seu motorista. Deixei de argumentar apenas enquanto estivesse com meu punho enfaixado (e seriamente dolorido). Mas não me sentia confortável com isso.


O Sr. Carlos deixou-me em frente ao enorme edifício onde ficava a sede da Companhia Engenheiros da Moda. Desci do carro usando salto alto, saia cinza e blusa vermelha de cetim. Nos lábios batom vermelho e apenas rímel nos olhos. Quis parecer simples e madura. Não sabia quem encontraria pela frente mas me sentia mais segura vestida como uma mulher feminina e elegante.


Fui para a recepção e uma Secretária mais velha e muito bonita pela idade, sorriu para mim:- Sou Beatriz Figueiroa. A Sra. Anne Roch me aguarda.


A mulher tentou disfarçar mas olhou para mim de maneira curiosa. Decerto sabia exatamente quem eu era. Chamou pelo telefone por alguém e concordou com a minha entrada, me oferecendo um crachá de acesso as salas superiores do prédio. Depois de indicado o caminho, segui sozinha para o elevador.


As portas abriram em uma ampla sala, com uma vista panorâmica da nossa Cidade. Não era a melhor paisagem, porque não tínhamos uma vista de muito verde ou uma beleza de mar, mas a imensidão de prédios não fazia muito feio por detrás daquelas imensas janelas de vidro. Uma outra recepcionista aguardava atrás de um balcão imenso de mármore, com as letras CEM gravadas em dourado. Ela levantou o olhar e disse:

– Sra. Figueiroa, por favor pode entrar.


Entrei na sala e dentro estavam cinco pessoas. Dois homens mais velhos de terno sentados em cadeiras próximas e três mulheres de pé folheavam papéis em cima da mesa. Uma era do meu tamanho no entanto mais jovem do que eu, loira e magra, usava um terninho preto que se agarrava ao seu corpo. Atrás dela estava uma mulher mais velha que eu pelo menos uns 10 anos, mas usava um vestido azul apertado que valoriza seu porte elegante e destacava seu cabelo vermelho. A terceira era estonteantemente linda. Parecia a Gisele Bündchen vestida de executiva. Cabelos loiro escuro, longos, penteados de maneira elegantemente de lado. Usava blusa social impecavelmente branca combinada com uma saia lápis preta. Nas orelhas, diferentemente das colegas, usava uma imensa joia, com uma pérola de cada lado. Linda e absurdamente elegante!


– Olá Beatriz, sente-se – disse a modelo executiva apontando uma das cadeiras próxima da mesa onde folheavam papéis. Ela sentou também em uma poltrona atrás desta mesa, enquanto que as outras mulheres permaneceram de pé – quero apresentar para você as pessoas que administram a CEM. Esta é Gil Moreira, Diretora de Recursos Humanos - apontou a Sra. Ruiva que apertou a minha mãe gentilmente – esta aqui é sua xará Beatriz Linhares – a loira mais nova sorriu simpática para mim – responsável pela Diretoria de Produção – este aqui é João Canedo advogado Sênior da empresa e este outro é Gilberto Morais – os dois se levantaram para me cumprimentar abotoando seus paletós e colocando as duas mãos sobre a minha para cumprimentar.


Vendo que ela tinha apresentado todos com exceção de si mesma eu falei:

– Bom dia a todos. É um prazer conhece-los. Não me recordo de ouvir de você Anne Roch o que eu realmente vir fazer aqui hoje.


Ela não pareceu se importar com meu tom, que soou menos educado do que eu pretendia mas os demais olharam para ela ansiosos com sua reação. Após alguns segundos ela resolveu sorrir e disse para mim:


– Ana Beatriz Figueiroa, seu pai me incumbiu de apresenta-la as dependências de sua nova empresa. Parece que você desconhece as novas diretrizes da Companhia Engenheiros da Moda. Tenho a impressão de que não vem aqui desde que era uma garota, então após este tempo vou lhe mostrar como tudo mudou. Para melhor. A propósito, eu sou a Presidente da empresa.


Minha cabeça girava com as informações que estava ouvindo. Era certo que eu não sabia de muita coisa da empresa desde que rompi meu pai. Mas daí meu pai ter colocado na direção da empresa várias mulheres me surpreendeu. E a notícia de que havia mudanças também. Nas horas seguintes passeamos pelas dependências da empresa enquanto que a Presidente me apresentava pessoalmente para alguns funcionários e gerentes de setores. Todos me olhavam curiosos, talvez esperando encontrar algum ET que recusou a fazer parte daquela grande empresa. Enquanto eu andava, a Sra. Gisele Bündchen ficava me mostrando todas mudanças que se processaram no sistema produtivo da sede. A começar pela manufatura de roupas e maquinarias. Eram todas de primeira geração, com boas instalações pelo que pude apreciar. Eles tinham um sistema climatizado para que os trabalhadores não sofressem com calor ou abafamento. Além disso havia turnos de quatro em quatro horas para que os funcionários pudessem descansar e recomeçar após 30 minutos. Haviam banheiros a cada 20 metros, uma regra imposta por meu pai para que não fosse necessário gastar muito tempo para atender as necessidades fisiológicas.


Além disso, em cada setor produtivo ela ia me mostrando o quanto bem eram remunerado os trabalhadores de cada cargo em relação à média paga pelo mercado. Os salários da CEM superavam a dos concorrentes em mais de 20%.


Ao final do que durou umas duas horas de caminhada e demonstração, a Sra. Anne Roch me relatou:

– Resumindo, Beatriz, a empresa de seu pai modernizou suas instalações, para atender melhor tanto a demanda do mercado quanto o bem estar de seus trabalhadores. Pagamos bem, temos boas instalações e otimizamos o tempo de trabalho. Após algumas análises temos a melhor hora de trabalho calculada pela média de produto gerado por fração de tempo. E isso com o bem estar do funcionário garantido!


Eu ouvia a tudo completamente atônita, incapaz de pronunciar alguma coisa. Pelo que pude perceber meu pai passou o resto da vida tentando enriquecer mas ao mesmo tempo se redimindo do que tinha feito. Não foi redenção completa mas ele parecia ter tentado. Anne Roch observava de perto minhas reações a tudo que ela mostrava e sorria satisfeita de me ver tão surpresa.


– Agora podemos seguir para minha sala novamente para a leitura do testamento formal. Adianto que já sei o conteúdo. Semanas atrás seu pai me fez ciente de todas as suas vontades. Isso incluiu os desejos que ele tinha para você.


Eu engoli em seco. Ansiosa pelo que estava por vir e emocionada pela informação de que meu pai tinha pensado em coisas para mim pouco antes de morrer. Lembrar dele fez a dor enterrada vir mais uma vez à tona. Eu sentia meu peito se apertar até encolher.


Fomos caminhando para área superior do prédio e encontramos o andar com vista panorâmica mais uma vez.


Os dois homens mais velhos retornavam para o interior da sala da Presidente após a nossa chegada.- Podemos começar senhores – Anne Roch praticamente os convocou.
E foi realizada a leitura. Os bens pessoais foram deixados todos para mim. Meu pai não estava mais casado. Sua última mulher tentou angariar muitos bens no divórcio mas tudo que levou foi uma modesta pensão e um apartamento de classe média no mesmo bairro em que moro. Na verdade provavelmente o apartamento devia ser igual ao meu, porque foi objeto de investimento que meu pai fez no começo da Companhia. Na mesma época, ele me deu o meu de presente. Um apartamento que ele mesmo investiu dinheiro para sua construção e o carro que ele havia projetado. Nada na vida me deu mais orgulho...


De volta a leitura do testamento, o advogado pessoal de meu pai Gilberto Morais passou a palavra para o advogado sênior da empresa para que fosse apresentada os percentuais de ações da Companhia:

– As ações da CEM estão atualmente divididas em: 2% para pequenos investidores como alguns trabalhadores da empresa, 28% para investidores externos e 70% exclusivas do Sr. Figueiroa. Agora pela manifestação de última vontade, as ações ficarão com a seguinte divisão: 2% continuam para os trabalhadores que já investiram e 28% permanecem para os investidores externos. Dos 70% restante haverá uma redistribuição - todos sem exceção seguraram a respiração para as próximas palavras - 21% serão disponibilizados para a compra de novos acionistas e o restante 49% ficará para a única herdeira do Sr. Figueiroa.


E olhou para mim. De uma hora para outra eu fiquei mais que milionária e quase uma acionista majoritária da empresa. Anne ainda me encarava, avaliando minhas reações. Não esbocei nenhuma e atrevi a dizer:

– Poderiam incluir na venda de mercado as minhas ações. Os valores adquiridos reverteriam para a empresa e.....


– Não, Ana Beatriz. Não poderíamos coloca-las. Seu pai gravou as com cláusula de inalienabilidade. Elas só podem pertencer a você ou a um herdeiro seu. Não podem ser vendidas e nem negociadas. Ele queria que você fizesse parte desta empresa.


– Mas eu não posso administrar ações dessa empresa sem compor a Diretoria e isso é algo que não estou disposta! Tenho uma vida, meu escritório e os clientes que confiam no meu trabalho. Não posso largar tudo porque meu pai quis que eu virasse de uma hora para outra uma empresária! Sinto muito, mas eu realmente não farei parte disso. Tenho o poder de recusar essa herança.


– Por favor, Senhores me deem licença – disse Anne Roch com cara de poucos amigos para os presentes. Eles me olharam e se retiraram da sala. Rapidamente.


– Seu pai construiu um império a margem de tudo que aconteceu. Você não sabe muito sobre essa empresa como pude perceber. Não vou permitir que você destrua tudo que ele conseguiu. Agora preste atenção a algo que eu não disse na frente dos demais – ela abaixou o tom de voz para quase um sussurro e eu tive que me inclinar para ouvi-la – Seu pai queria transmitir para você todas as suas ações. Eu o convenci que dado seu histórico social, favorável aos trabalhadores, você poderia tomar decisões que afetariam o futuro da companhia. Então sugeri que ele desse a maioria das ações mas que sozinha você não poderia decidir nada. A propósito eu gerencio as ações dos acionistas externos. Assim, 49% das ações estão na minha responsabilidade. Você terá que comparecer no máximo em duas reuniões mensais. Não vai precisar trabalhar diariamente na companhia. Deixe isso comigo.


Ela ia dizendo isso tudo de uma maneira tão controlada e autoritária que me lembrava Frederico. Isso deveria ser característico de quem controla empresas. Mas ela tinha razão em parte. Eu poderia frequentar as reuniões de acionistas e poderia ajudar em questões realmente sociais. Isso não poderia ser tão difícil, certo?

– Preciso de tempo. Não vou responder sobre isso nesse momento – eu disse diretamente a ela.


– Claro que precisa. Posso sugerir algo? Venha essa semana se tiver tempo e conheça as atividades diárias da empresa. Participe o quanto puder da rotina de decisões administrativas e jurídicas. Você vai se orgulhar do quanto sustentável essa empresa se tornou. E eu tenho orgulho de fazer parte disso. A propósito, poderia começar hoje com algo que se tornou rotina na vida das mulheres que gerenciam esta empresa.

– Bem, o que exatamente?


– Toda quarta-feira, após o trabalho, seguimos para o LiverPool e tomamos uma rodada de tequila! É sagrado para nós mulheres pelo menos uma vez na semana e como você irá fazer parte disso podemos começar hoje!


Eu olhei bem para ela. Uma mulher como aquela tomava tequila em uma bar como o Liver? Seria no mínimo engraçado ver as pernas longas dela encaixadas dentro da minúscula mesa do boteco. Não tive escolha. Curiosa para entender a rotina daquelas três mulheres acabei indo.


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