"Algumas coisas na vida são tão bizarras, que só podem ser verdadeiras."-Marley & Eu

Passei pela sala de estar, com meu pijama comprido e cabelos amarrados em um rabo de cavalo baixo. Luke se moveu no sofá e me olhou.

–Seu cabelo acorda lindo hein? –ele debochou.

–Obrigada. –respondi revirando os olhos. –Quer café da manhã?

–O que você vai comer? –ele perguntou já ao meu lado.

–Suco de goiaba e torradas, por quê?

–Vou querer isso também. –ele sorriu.

–Pois bem.

Peguei o garrafão de suco na geladeira e despejei em dois copos, depois peguei fatias de pães na torradeira. Tomei um gole do meu copo esperando as torradas ficarem prontas.

–O que você vai fazer hoje, moça?

–Estava pensando seriamente em sair para correr.

–Mas está nevando.

–Isso nunca me impediu de correr, eu faço isso sempre.

–Onde?

–Central Park. –respondi sorrindo.

–Ótima escolha.

As torradas finalmente ficaram prontas e as ingerimos.

–Então... –Luke Dean começou – Você vai pentear o cabelo ou vai andar na rua com ele assim mesmo?

–Vou me arrumar ainda, moço. Fique a vontade para fazer o que bem entender nesse apartamento, não precisa ficar querendo me expulsar. –rebati.

–Do que você está falando, garota maluca? Eu vou correr com você.

–Hãm?

–Exatamente. A Kate está dormindo e a Emily também, não tenho nada de bom para fazer.

Bufei longamente.

–Ok. Se arrume logo.

Fui para meu quarto, vesti uma leging grossa e um motelom listrado de laranja e branco. Meu cabelo eu penteei e prendi em um coque desarrumado. Fui até o banheiro e fiz minha higiene matinal.

–Pronto. –anuncie para Luke.

Ele estava em pé no meio da sala, com um jeans azul escuro, tênis e motelom cinza.

–Pelo menos seu cabelo não está tão alto agora. –ele disse.

–Já vi que vai ser uma longa manhã. Anda, vamos logo. Quanto antes começarmos, mais cedo isso irá acabar. –falei andando até a porta. –Espera, você está de gesso. Como pretende correr?

–Eu dou meu jeito. –Luke deu de ombros.

–Está louco, desse jeito terei que correr só na rua enquanto você me espera sentado!

–Eu gostei da ideia.

Revirei os olhos. O elevador chegou, apertei o botão e seguimos caminho até o térreo em silêncio.

–Você tem um cérebro de girino, sabia? –falei.

–É essa sua opinião sobre mim?

–Sim.

–Certo, moça.

Fiz alguns alongamentos rápidos e comecei a correr no quarteirão, toda vez que eu passava por Luke, ele encarava uma mulher diferente na rua e quase apanhou do marido de uma delas. Eu ri por longos minutos, ao ponto de minha barriga doer.

–Para de rir, Rachel. Cresce, moça.

–Não me mande crescer, Roach. Até porque, você quem precisa crescer.

–Por que eu, garota? –ele aumentou o tom de voz.

–Porque você é um...verdadeiro galinha. Mexe com todas as mulheres na rua e na minha casa também.

–Faz parte do meu charme.

Revirei os olhos e voltei a correr, colocando os fones de ouvido e ignorando Luke toda vez que passava por ele.

✶✵✴

Alguns dias se passaram. Luke continuava a atormentar todos na casa. Principalmente eu, é claro. Kate continuava o ignorando ao máximo possível. Quando ela estava em casa, provavelmente estava no quarto e quando não estava, era possível estaria com Emily ou na biblioteca mais próxima.

Era domingo e véspera de ano novo. Eu havia acordado cedo para correr no Central Park e tive de sair com passos leves de casa, senão Luke insistiria à ir junto e eu sinceramente não suportava mais apenas correr pelo quarteirão. Cheguei ao Central Park e havia outros corredores, que eu até já havia feito amizade. Um deles era Richard Meisner. Ele era moreno, dos cabelos cacheados, um pouco mais alto que eu, era uma pessoa tímida e muito talentosa.

–Oi Richard!

–Rachel, que saudades. Eu te liguei, mas você não retornou...

–Ligou? Mil desculpas, nem sei onde está meu celular para ser sincera. E desculpa por andar sumida, digamos que eu ganhei um novo hospede que é um verdadeiro chato.

–Por quê?

–Eu o encontrei na estrada congelada quando estava indo visitar meus pais e desde então ele está comigo e com a Kate. Só estou aqui porque fugi.

–Ele é algum tipo de cãozinho por acaso para te seguir onde quer que você vá?

–Parece viu?! Tive que me limitar a correr apenas pelo meu quarteirão essa semana inteira.

–Nossa. –Richard comentou enquanto se alongava. Me juntei a ele e voltei a puxar assunto.

–E como vai a vida?

–O de sempre. Trabalho, trabalho e mais trabalho.

–Que horror, Richard! Você irá sair hoje pelo menos né?

–Hoje à noite? Não sei, Rach...

–Eu estava pensando em ir à Times Square, para poder assistir a virada do ano.

–Sério, Rach? Aquilo é uma droga.

–Ah qual é Richard! Melhor do que ficar em casa. Por favor, vamos. –fiz beicinho e sorriu.

–Ok. Vou pensar no seu caso, estrelinha.

–Oba! –corri e dei um abraço em Rich.

Começamos a correr pelos passeios do parque, envolta tudo estava congelado. Era bem frio naquela época do ano e mesmo assim se via corredores, crianças e casais apaixonados. Cerca de duas horas depois voltei para meu –quer dizer, nosso- apartamento. Luke estava no sofá para variar, Kate no quarto e Fumaça deitado em cima da minha cama brincando de arranhar algo...

–Fumaça! Esse é o meu celular! Droga, você arranhou a tela dele toda... Gatinho malvado!

Ele olhou para mim com cara de desdém. Afinal, ele não entendia o que ele falava. Não o podia culpar por isso e se culpasse, seria covardia.

–Kate! Está acordada?

Ouvi um gemido vindo do outro quarto e abri a porta.

–Esse gemido foi um sim?

–Na verdade foi um não, mas já que você me acordou... O que quer, loira?

–Hoje tem a descida da bola, lembra? Você vai?

–Naquela porcaria? Não, muito obrigada. Eu gosto de não ter meus pés esmagados, obrigada de novo.

–Ok. Talvez eu vá com o Richard.

–Hm... Que bom. –ela disse com a cabeça enfiada no travesseiro.

–Kate, tem algo para comer na geladeira?

–Tem lasanha, é só você esquentar no microondas.

–Obrigada, Kate.

–Nada. Agora me deixe morrer entre os lençóis. –ela disse se cobrindo mais e eu ri.

Fui até a cozinha ignorando os chamados de Luke. Tirei a lasanha da geladeira e coloquei em um prato de plástico no microondas.

–Rachel. –Luke apareceu no vão da porta. –Aonde você vai hoje?

–Talvez ver a descida da bola lá na Times Square com um amigo. Você está de muletas e perna engessada. Nem pense em ir.

–Mas eu vou e já que você não quer minha companhia, eu posso muito bem ir sozinho. Não sou criança para você determinar onde eu vou ou deixo ir.

–Francamente Luke, suas palavras foram tão maduras. –revirei os olhos. –Você quer comer?

–Daqui a pouco, eu sei me cuidar. Não se preocupe.

–Ótimo. –respondi e esperei o apito quase estridente soar pela cozinha. Peguei meu prato, passei pro Luke e sentei no sofá para ver algo na TV.

✶✵✴

Peguei uma blusa rosa qualquer, um casaco bonito, um jeans, botas novas e deixei tudo separado em cima da cama. Corri para o banho e não pude demorar muito, voltei para o quarto e soltei um suspiro de alivio ao ver que Fumaça não havia destruído nada durante minha ausência. Me vesti, fiz uma maquiagem leve e soltei os cabelos. Olhei-me no espelho, satisfeita com o resultado.

Richard havia me ligado menos de uma hora antes, dizendo que iria sim comigo a Times Square e que me encontraria lá o mais rápido possível. Ainda estávamos na metade da noite (ou seja, eram umas nove e meia da noite, dez horas no máximo), porém teríamos de chegar lá o mais rápido possível, antes que o lugar fosse completamente tomado por uma multidão de loucos e turistas. Ou pior, os dois juntos.

Passei pela sala de estar procurando Fumaça. Kate e Luke estavam discutindo.

–Qual o seu problema em usar blusas dentro de casa, garoto? –Kate quase gritava para Luke.

–Eu estava trocando de roupa, insuportável. Ou a nervosinha esqueceu que a sala de estar é o meu quarto?

–Conhece uma coisa chamada banheiro, gênio?!

–Sim e a Rachel estava lá.

–Ótimo! –ela bufou e notou minha presença finalmente –Rachel, eu lamento, mas eu não aguento ficar perto desse menino. Ele vai arruinar minha virada do ano com a Emily se ele ficar aqui.

–Não se preocupe, Kate. Ele vai comigo.

–Eu vou? –Luke perguntou vestindo uma blusa branca de gola “v”.

–Sim, ou você quer ser defenestrado pela Kate? Pois é o que ela vai fazer se você continuar aqui.

–Defenestrado? –ele perguntou confuso.

–Defenestrar é o ato de jogar algo ou alguém pela janela, asno. –respondi.

–Credo, vocês estão de TPM ou o que?

Kate olhou para mim com o ódio evidente nos olhos. Eu precisava tirar Luke dali ou uma explosão nuclear aconteceria.

–Vamos! –puxei Luke pelo braço e peguei seu casaco, que se localizava perto da porta com os outros casacos.

–Você é maluco de tocar no assunto “TPM” ou o quê? Queria perder a perna que ainda funciona? Era só me falar, não precisava irritar Kate!

–Ah, tanto faz. Quanto drama.

Gravei as unhas em seu braço e ele gemeu de dor.

–Drama é o seu...

–Vamos manter o nível da conversa ok? Uma moça como você não deveria se rebaixar assim.

–A culpa é sua! –gritei e saí do elevador assim que ele chegou ao térreo, enquanto Luke tentava me acompanhar com as muletas.

Fiz sinal para o primeiro táxi que passou, ele me ignorou e Luke começou a rir descontroladamente ao meu lado.

–Como assim você mora em Nova Iorque e não sabe fazer sinal para um táxi?

–Eu sei sim!

–Não, definitivamente não sabe. É assim...

Ele fez sinal para outro táxi que passou e ele parou imediatamente.

–Aprendeu? –ele sorriu para mim.

–Idiota. –respondi e entrei no táxi.