Laura E Edgar - Um Novo Olhar escrita por Bia


Capítulo 4
Expectativa




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Expectativa (capítulo 4)

Já fazia mais de três semanas que tinha enviado aquela carta a Isabel. Pensava no convite que me fizera. Estava disposta a aceita, mesmo com todos os inconvenientes que poderia resultar com a minha volta. Realmente aquele dia tinha sido terrível para mim, a lembrança do Edgar sempre me acompanhava. Seria tão simples se ao menos tivesse o deixado para trás, mas o trazia comigo, no meu peito, na minha alma.

Via Dona Eulália, todas as tardes, ela tinha prazer na minha companhia e sentia o mesmo por ela. Era bom tê-la por perto. Tinha por mim o cuidado, o carinho e a compreensão que não vi Dona Constância Assunção demonstrar, principalmente depois de ter me renegado por causa do meu divórcio. De alguma maneira a adotei um pouco como minha mãe. Mas, tinha um porém, nunca contei a verdade sobre minha condição. Para ela eu era apenas uma moça pobre da cidade grande que conseguiu emprego aqui e por isso veio para o interior. Como reagiria se soubesse que sou uma mulher divorciada, não gostava de esconder a verdade, mas sei que há muito preconceito e que isso poderia me prejudicar.

Por que será que as pessoas não aceitam que um casamento pode chegar ao fim. Não conseguia conceber para mim um casamento infeliz e cheio de problemas, não queria um marido para mostrar a sociedade, queria mais e muito mais, não precisava de alguém para existir. Sinto uma imensa falta do Edgar, mas não precisava dele como uma muleta, mas porque o amava. Lamento que o tenha deixado, acabaria o odiando pela vida que me queria proporcional. Sei que muitas mulheres sofrem caladas as humilhações que muitos homens as impõem. Mas não quero isso para mim, não preciso disso. Se o preço que tinha que pagar para me livrar de todo aquele tormento era deixar o Edgar, então pagaria, por mais caro que me fosse e custou muito mais que poderia supor naquela época.

As aulas na escola continuavam a me trazer grande prazer, adorava lecionar e sentia cada vez mais vontade de ensinar e aprender com aquelas crianças, mas tinha o convite da Isabel, tinha decidido voltar ao Rio de Janeiro caso minha amiga decidisse voltar. Seria bom ficar um tempo com a Isabel.

Sentia pena em deixar aquele lugar, mas a oportunidade de colocar em prática minhas ideias sobre educação em uma escola maior, com mais recursos me fascinava. Mandei uma carta a Sandra pedindo que me informasse sobre escolas que tivesse interesse em contratar novas professoras.

Minha querida amiga Sandra me mandou uma lista de escolas, mas não tinha nenhum emprego específico. Tomei coragem e mandei meu currículo a algumas delas, como sempre tomei o cuidado de não informar minha condição de divorciada, principalmente para as escolas tão tradicionais.

Dias depois recebi a carta de uma escola tradicional de freiras para meninas, A diretora do colégio, que é uma Madre Superiora gostaria de conversar comigo antes. Fiquei entusiasmada com a possibilidade de que ali, ao menos, havia uma promessa de emprego, assim caso Isabel voltasse poderia morar com ela sem me preocupar com meu sustento, já era um bom começo, tinha feito uma pequena poupança poderia me manter sem o auxílio de ninguém, pelo menos por um tempo. Trabalhar com meninas seria maravilhoso, poder ensiná-las, ler para elas, como não me encantar, mostrar que poderiam ir além de futuras donas de casas e esposas, mas que poderiam construir um futuro por elas mesmas, descobrir um novo horizonte. Era como se um novo mundo abrisse as portas para mim.

Por outro lado precisaria me despedir da vida pacata que levava ali, tinha sido maravilhoso ficar este tempo todo interior, mas já era hora de buscar novas perspectivas. Sentiria falta das crianças e da Dona Eulália, do aroma de alecrim que me acompanhava na ida e na volta da escola, que me fazia lembrar dele, sempre ele e da vida que tive um dia. Tudo parece tão distante, mas ainda me lembro como se fosse ontem.

No dia seguinte, assim que cheguei da escola, Dona Eulália, como na vez anterior, estava com uma carta de Paris nas mãos, fiquei feliz em ver que Isabel não demorou para mandar uma nova carta. Dona Eulália me deixou sozinha para que eu pudesse ler em paz a missiva que minha Isabel enviara.

Querida Laura,

Sua última carta foi o sinal que esperava para colocar um ponto final em minha estadia me Paris, estava buscando um significado e agora sei que precisa de mim tanto quanto preciso de você.

Sabemos querida o quanto foi difícil todo aquele período, mas estou disposta a seguir em frente e voltar imediatamente para meu país. Quero rever a todos que amo e isso inclui você. Quero ter novamente com a minha gente e com meu povo. Meu tempo de Paris agora é uma lembrança e assim que receber esta carta já estarei dentro de um navio. Por isso sugiro que arrume suas malas e volte para nossa querida cidade, estarei em breve aí e a quero encontra já estalada na nossa casa. Será um imenso prazer dividir a casa com você. Tenho tanto que contar, mas farei isso pessoalmente, quero te abraçar e ver como anda minha professorinha favorita. Por favor, entre em contato com tia Jurema, mas não conte que estou voltando, quero fazer uma surpresa a ela. Amiga agora é vida nova e te espero no Rio de Janeiro.

Um imenso abraço que darei daqui pouquíssimos dias...

Isabel.

- Nossa! Isabel já está chegando.

Chamei por Dona Eulália e disse que Isabel chegaria em poucos dias e que eu teria que voltar ao Rio de Janeiro, ela ficou eufórica por mim por um lado, mas agora seguira sua jornada sozinha novamente, mas ao menos deixa uma amiga que cuidou de mim como se fosse sua filha, sentiria saudades de D. Eulália, mas ela entendia que era o melhor que poderia fazer naquele momento.

Tinha tanto que arrumar e tão pouco tempo para deixar tudo pronto, inclusive a casa da Isabel. Corri na cidade e mandei um telegrama para Sandra pedido que avisasse à tia Jurema, em seguida fui à escola comunicar minha saída, o diretor já estava avisado que não permaneceria ali por mais tempo e por isso já tinha até feito uma carta de recomendação para levar a escola na capital federal.

Estava tão assoberbada que nem me lembrei que minha volta ao Rio resultasse em um provável encontro com Edgar, ou qualquer pessoa de suas relações. Apenas pensava em voltar e como seria maravilhoso encontrar Isabel novamente depois de tantos anos.

Dona Eulália me ajudava a empacotar meus pertences e lamentava a minha partida, disse a ela para ficar feliz por mim, era uma chance nova em uma escola nova e maior e a volta para perto daqueles que eu amava, por um momento a imagem de Edgar veio a minha mente, mas não queria pensar nisso.

Dois dias depois estava tudo arrumado e minhas malas estavam prontas para meu novo destino. Pela manhã tive tempo de ir a escola e me despedir dos meus amados alunos, sentiria tanta saudades deles, e conheci a nova professora, uma moça simples, mais jovem que eu, desejei sorte a ela e meus aluninhos ficaram tristes com a minha partida, fiquei com o coração na mão, alguns me deram cartinhas de presentes e outros me abraçaram com tanto carinho que tive vontade de desistir, mas segui em frente. À tarde fui até a estação de trem que ficava do outro lado da cidade, Dona Eulália fez questão de estar presente na minha partida, me deu um abraço forte e me desejou sorte, também fez um bolo de milho para eu comer durante a viagem de volta para meu destino.

Entrei no trem e ao sentar naquela poltrona de madeira fitei mais uma vez Dona Eulália, ela acenava enquanto chorava, fui feliz ali, mesmo que não fosse a mesma felicidade que tive enquanto fui casado com Edgar, pensei comigo, respirei fundo e o ouvi o primeiro apito da caldeira, a máquina começou a se locomover, a estação começa a ficar para trás e continuava a olhar a imagem distante de Dona Eulália até se perder de vez. De alguma maneira parte da minha história estava agora ali, parte de meu coração também ficou ali, lugar de gente simples e vida pacata. Houve um tempo que pensei que viveria ali para sempre, que teria sempre a lembrança comigo, mesmo velhinha. Mas agora, estava naquele trem, em busca de uma vida nova, na mesma cidade que deixei para trás anos antes. Encontrar com o passado seria inevitável, mas certamente o encontro mais esperado era o mesmo que mais temia. Não procuraria, mas poderia esbarrar nele em alguma esquina, não nego tinha um desejo imenso de ver novamente Edgar, mas tinha medo de encontrá-lo, não sei se meu coração, algum dia, estará preparado, mas fugir não era mais a resposta. Esquecer, há muito já tinha desistido.

Enquanto o trem atravessava as fazendas e sítios percorrendo seu curso, meu pensamento já estava no Rio, rezava para que tudo ficasse bem. Logo a Isabel estaria na cidade e uma nova vida nos aguardava, ao menos era a esperança que tinha em meu coração. Os pensamentos voavam longe... Estava curiosa para conhecer a nova escola e até tinha mandado uma carta comunicando minha mudança definitiva para a cidade, como seria a nova escola. Pensava no abraço que daria em meu pai, no Albertinho e na minha querida tia Celinha, ver minha prima Alice e quem sabe até minha mãe Dona Constância.

Poder comer uma bomba de chocolate na Colonial, fazem tantos anos que sonhava com esta guloseima, poder ir ao teatro São Pedro, quem sabe até ir a praia, tantas desejos e sonhos, voltar a freqüentar a livraria Garnier, passear no Paço Imperial, era minha cidade, os lugares que freqüentava na minha mocidade.

Como será que estão todos? Enquanto o trem cortava vales e atravessa pontes, minha ansiedade aumentava, voltava ainda algumas horas para chegar, mais não via a hora de chegar. Tentei ler um livro, mas não consegui prestar atenção, apenas pensava como seria recebida depois de tanto tempo. De fato estava muito ansiosa, será que Sandra conseguiu avisar tia Jurema? Espero que sim. Voltar era a única coisa em que pensava. Mas, de repente, a imagem de Edgar dominou a minha mente, como será que ele estaria.

- Edgar. - Disse baixinho, apenas pare eu ouvir.

Será que vou reencontrá-lo? Pensei comigo. O desejo de encontrá-lo era muito grande, mas reconheço que o medo de saber que tinha me esquecido entristecia. Mas que direito teria eu, depois de todos estes anos.

- Edgar...


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