Laura E Edgar - Um Novo Olhar escrita por Bia


Capítulo 3
Minha Abelhinha, Melissa e Dona Margarida




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Minha Abelhinha, Melissa e Dona Margarida (Capítulo 3)

Acompanhei Guerra até a porta do Jornal. Ele parecia preocupado comigo, mas eu estava bem, ao menos queria acreditar nisso. Fui ao fórum cuidar do andamento de alguns processos e depois me encontrei com um antigo cliente. Tudo transcorria como nos outros dias, apesar de que hoje não fosse um dia comum para mim. Mas tentava levar como se fosse, apenas eu, e o Guerra, sabíamos que não era.

Já estava quase hora de pegar minha filha na escola, mas queria fazer uma surpresa para ela e fui até uma loja elegante onde vendia artigos importados e comprei uma bela boneca para Melissa, tenho certeza que alegraria ainda mais o dia da minha menina. Ao chegar à escola, como sempre Melissa estava sentada em um banco perto da escadaria principal, assim que me viu veio ao meu encontro e me abraçou como sempre fazia e me deu um lindo sorriso. Neste ponto a vida tinha sido generosa comigo, tinha minha filha, apenas lamentava que o fato de não ter dado a mãe que realmente merecia. Nem sempre a vida é justa. A vida seria perfeita se Laura fosse a mãe de Melissa e não Catarina.

Antes de ir embora da escola com minha menina, fui até a sala da Madre Superiora para saber como Melissa estava se saindo na escola. A Madre, como sempre me chamava atenção pelo fato da minha filha ser bastarda, reconheço que isso me irritava bastante, mas a menina precisa estudar e não tinha culpa dos meus erros do passado. Já bastava eu pagar caro por cada um deles. Mas, respirei fundo e encarei a Madre, por minha filha era capaz de tudo.

- Dr. Vieira, Melissa é uma menina bastante aplicada, mas sempre receio por sua origem. Tenho medo que a mãe da menina apareça na escola. Seria um escândalo.

- Madre, não tem com que se preocupar, a mãe da minha filha – fiz questão de enfatizar isso. – não aparecerá na escola. Ela sabe perfeitamente as regras impostas pela senhora. Eu mesmo faço questão de trazer e levar minha filha para casa dela. Não há motivos para ser diferente.

- E quando a sua esposa como vai?

- Do mesmo jeito. – não queria me prolongar na conversa.

- Estimo a melhora se sua esposa.

- Obrigado.

Ao sair, peguei minha pequena no colo e ela me contava animadamente como tinha ficado encantada com uma história que uma das professoras tinha contado na classe. Fomos para minha casa, Matilde já tinha preparado um pelo lanche, com bolo, biscoitos e sucos para mim e Melissa. Minha filha ficou feliz em ver a mesa cheia de guloseimas, mas tive que mandá-la antes para o banho.

Depois que lanchamos, deixei o presente para Melissa em cima da sua cama, ela ficou radiante quando viu sua boneca nova, pediu para Matilde brincar com ela e ambas ficaram no quarto brincando enquanto eu fiquei no escritório revisando uns papeis. Mas pouco tempo depois, fiquei com minha menina até e dispensei a Matilde pelo resto da noite. Era tão bom passar àquelas horas com a Melissa, já era perto da hora de dormi, eu a coloquei na cama e comecei a contar mais uma história para ela, como sempre, fazia as vozes das personagens e observava que seus olhinhos começavam a ficar pesados de sono, sentava ao seu lado e a via adormecer, depois a beijava e ia para o escritório. Não tinha sono, e logo hoje não seria diferente. Sempre me fazia mil questionamentos, queria ter saído dessa casa, mas não tive coragem, poderia trocar todos os móveis, mas não tive coragem também, tudo era exatamente igual ao dia que Laura saiu daqui. Será que Guerra tinha razão e seria melhor eu encontrar outra pessoa. Talvez fosse melhor, mas não tinha vontade. Certamente não seria como foi com a Laura. Também, não poderia ficar eternamente esperando por alguém que não voltaria. Quem disse que eu quero a Laura de volta. Para quem estou mentido, eu tivesse a chance de consertar as coisas, se a Laura, ao menos, tivesse mandado uma única carta, mas nem isso. Ela apenas me deixou nesta casa cheia de lembranças. E eu fiquei aqui, condenado a ficar assim, vagando por esta casa e lembrando de uma época que não volta mais. Certa vez, pouco depois do divórcio, cheguei a conversar com o Dr. Assunção, quem sabe ele poderia me dar uma pista de Laura, mas ele disse que ela pedira para não dá seu endereço para mim, senti nisso uma imensa negativa, ela não queria que a procurasse, e a única coisa que poderia fazer, por mais que me doesse, era acatar sua vontade.

Sei que era tarde quando fui me deitar, mas não tinha noção das horas. Mal consegui dormir apenas rolando na cama que um dia foi nossa, nem isso tive coragem de mudar, na realidade não foi falta de coragem, e sim de vontade, a espera de algo que nem sei se vale a pena esperar, e tão pouco há motivo para esperar.

Na manhã seguinte, eu estava no escritório e Melissa brinca em frente a minha mesa com a sua boneca nova e as outras que e já tinha na casa, observava minha filha brincando e tinha tanto orgulho de ser pai dela, me comovia seus gesto, me juntei a ela e comecei a brincar com ela, foi tão agradável, era sempre uma alegria compartilhar estes momentos com minha menina. Pouco depois Matilde trouxe suco e biscoitos amanteigados para nós, lanchamos sentados no chão, como se fosse um pequeno piquenique.

Para minha alegria, mamãe veio almoçar e passar à tarde conosco. Trouxe compotas de figo e ameixa. Melissa adorou o presente da avó. Ter minha mãe em minha casa me fazia feliz, ainda mais junto a Melissa, a menina adorava a avó e eu e minha mãe lamentávamos o fato de não passarem mais tempo juntas. Ver a maneira como minha mãe se dedicava a neta, era uma alegria ter as duas em casa naquele momento, mas não posso negar que sempre tinha aquela ausência. Apenas duas das três mulheres mais importantes da minha vida estavam ali.

Pouco depois, de tanto brincar, Melissa tirou um pequeno cochilo em seu quarto e eu aproveitei a companhia da minha mãe. Era mais fácil ir visitá-la que ela vir aqui, mas como ela queria ver Melissa, minha mãe sempre vinha a minha casa.

- Sua filha está cada vez mais bonita. Queria poder conviver mais com minha neta. – Dona Margarida lamenta não ser tão presente.

- Eu também gostaria muito que a senhora convivesse mais com a Melissa, mas infelizmente é difícil. – Eu lamentava por minha mãe.

- Se ao mesmo a mãe de menina fosse alguém agradável de conviver, mas não posso ser vista indo a casa da minha neta, traria suspeitas e mais um escândalo agora não seria conveniente.

- Eu sei mãe, tento ser discreto por Melissa, não quero ver minha filha ser discriminada por ser bastarda... Detesto esta palavra.

- Compreendo meu filho, mas é a origem da menina, e é por isso que devemos ser discreto. Melissa é um encanto de menina, e não merece que nada de mal aconteça a ela, mas sabe o quanto é preconceituosa a sociedade em que vivemos.

- E eu não sei. Para muitos até hoje sou casado, e que minha esposa está em tratamento dos nervos no interior. - Disse em tom de sarcástico - Casado. Nem sei por onde anda a Laura, casado com uma mulher que fez questão de se divorciar de mim, não é irônico. Não sei onde estava com a cabeça quando deixei Dona Constância me convencer em manter esta farsa. – Agora sentia uma imensa raiva.

- Sua cabeça estava no desejo de proteger a reputação da Laura. – Disse Dona Margarida enquanto fazia um carinho nos cabelos do filho.

Edgar se levante de súbito do sofá e anda de um lado para o outro.

- O que tanto de consome meu filho? – Com tom preocupado.

- Mãe, sabe que dia foi ontem?

- Não, por quê?

- Ontem fez seis anos que eu e a Laura assinamos o divórcio, que não a vejo, que não tenho notícias dela.

- Então é por isso que está assim.

- Assim como?

- Angustiado, deprimido, infeliz...

- É assim que me sinto mãe...

- Meu filho eu não gosto de te ver assim. Isto te faz mal.

- Me faz mal... Nem sei mais o que me faz mal. Guerra me fala a mesma coisa, mas não consigo não sentir. É aperto aqui dentro, pensei que, com o passar dos anos, tudo ficaria mais fácil, mas é como reviver tudo aquilo novamente a cada dia. Mas ontem, foi muito pior era como se tudo fosse potencializado, se não fosse pela Melissa, a presença dela aqui...

Edgar volta a se sentar em uma das poltronas da sala, quase esparramado na poltrona, Dona Margarida vai até onde está o filho e o acaricia mais uma vez.

- Você ainda não superou, não é mesmo?

- Mãe, até antes de ontem, eu acreditava que tinha deixado muita coisa para trás, mas ontem tive a certeza que não. Ainda está lá, não sei se foi o dia, não sei se foram as lembranças que apareceram todas ontem, sei que há ainda muita mágoa, tanta dor.

- Meu filho, não quero te ver assim.

- Impossível. Mas ao mesmo tive a companhia da Melissa, se não fosse por ela eu nem sei como teria passado por tudo aquilo.

- Mas é bom a Melissa não te ver desse jeito.

- Não vai ver, ela está adorando ficar um pouco mais comigo e minha filha me dá ânimo, sem ela tudo seria mais difícil, nem sei como teria suportado todos estes anos.

Edgar respira fundo.

- Mãe, eu não consigo não pensar na Laura. Ela se foi, mas eu fiquei, ela se divorciou de mim, mas eu continuei casado com ela. Eu fiquei aqui com as lembranças e ela simplesmente saiu da minha vida sem olhar para trás. Eu sinto tanta raiva da Laura por ela ter me deixado, há momento que sinto mesmo é ódio dela, de mim, mas depois...

- Quanto ressentimento meu filho. – Dona Margarida abraça o filho.

- E como não me ressentir? Eu perdi a Laura por problemas meus, pelos meus erros. Se eu tenho ressentimento da Laura é por ela ter me deixado para trás, mas sinto de mim por ter sido o causador de toda a dor que ela sentiu naquela época. Mas, se ao menos, ela tivesse tentado me compreender, se tivesse me dado uma única chance de tentar resolver tudo, mas foi tão intransigente.

- Edgar, tudo isso faz tanto tempo. É melhor esquecer tudo isso, deixar no passado.

- E eu não sei... Acredita realmente que gosto disso? Mãe, ninguém mais do que eu gostaria de Melissa fosse filha da Laura, que nossa vida tivesse levado outro rumo, que ela estivesse aqui comigo e com o filho que perdemos. Não há um único dia que não pense nisso. E tudo isso veio com tanta força ontem, que por um momento pensei que não fosse suportar, se não fosse minha filha...

- Edgar, meu filho do que adianta se martirizar assim, principalmente agora, Laura está longe só Deus sabe onde e também não deu nenhuma notícia o que significa que provavelmente ela tenha seguido em frente. Siga em frente você também, tente colocar a cabeça no lugar, tenta pensar na Melissa, ela agora é sua família. Também gostaria que sua vida com a Laura tivesse tomado outro rumo, mas a vida nos causa estas facetas vez ou outra. Quero te ajudar, mas quem precisa fazer isso é você mesmo, meu filho, este é um caminho que terá percorrer sozinho, no máximo que posso fazer é tentar segurar sua mão, mas não posso fazer você esquecer a Laura, cabe apenas a você tentar.

- Há momentos que penso que posso viver mil anos, mas nunca terei a capacidade de esquecer a Laura. Mas, por outro lado, ela foi embora e levou consigo uma parte minha. Esquecer é algo que não vai acontecer, esta certeza carrego comigo. Eu a deixei ir, mas ela ficou em mim.

Edgar abaixou a cabeça e colocou as mãos em volta dela. Dona Margarida não vi os olhos marejados do filho.

Dona Margarida ficou mais um tempo com Edgar, ao menos esperou Melissa acordar para fazer companhia ao pai. Mas tinha que ajudar o filho a sair daquela tristeza, queria tanto ver o filho feliz novamente, queria poder ajudar, e talvez pudesse ajudar, mas de outra forma.

No caminho de volta para casa, Dona Margarida, não conseguia tirar da cabeça uma forma de ajudar Edgar. Seu filho era um homem bom, um advogado muito competente e principalmente um pai maravilhoso, tinha sido um marido exemplar e agora vivia numa angústia e solidão que a incomodava. Não queria ver o seu primogênito passando o resto da vida almoçando em uma mesa cheia de cadeiras vazias. Seu filho merece ser feliz novamente. E se dependesse dela, o veria feliz.


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