Inopino escrita por Roberta Matzenbacher


Capítulo 2
Capítulo dois


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente!
Quero agradecer os reviews (de novo, Mandy, sem você eu não existiria, hahahahaha) e todo o carinho nessa minha nova Fic.
Ah, uma coisa: para quem não comentou ainda e quer fazer isso agora no segundo, bem... Não faça! (calma, deixe eu explicar!) Comente no primeiro capítulo também, pois foi uma introdução à fanfic e eu preciso de sugestões e o que vocês pensaram... Só depois, comentem aqui no dois, pode ser? Combinadinho?
Então, resumindo, aqui vai mais um capítulo.
Eu sei, eu sei que vocês devem estar super ansiosos para a parte em que Dimitri encontra Rose, mas isso vai demorar um pouquinho mais. Quero que tudo fique perfeito para o encontro dos dois e as reações de Dimitri quando vê Rose.
Espero que gostem e leiam as notas finais!



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Capítulo dois

Eu ainda me lembrava de quando aquela missão começara.

Fazia mais ou menos sete meses que recebêramos um comunicado vindo de Oregon. A princesa Dragomir fora avistada passeando pelas ruas de Portland durante a madrugada; ao seu lado, a dampira Rose Hathaway. Era de se esperar que duas adolescentes fugitivas e indefesas demonstrassem maior temor ao andar à vista dos Strigoi, dizia o relatório. Porém, a verdade era mais difícil de engolir. Ambas seguiam despreocupadas em direção ao campus de uma universidade, local onde pareciam constituir residência permanente. De lá, passaram a ser deliberadamente seguidas pela patrulha responsável por aquela região.

Entretanto, como nenhum dos guardiões de vigília soubera informar há quanto tempo ambas estavam morando naquela residência — uma espécie de república, ao que tudo indicava —, muito menos se tinham planos de se mudar para breve, a urgência fizera com que fosse cada vez mais necessário a tomada de providências imediatas.

Claro que ninguém era ingênuo a ponto de pensar que uma operação daquela magnitude não custaria muito dinheiro, e por muito tempo algumas pessoas especularam que sua majestade real em pessoa, a Rainha Tatiava Ivashkova, a estava patrocinando. Ninguém despenderia tantos recursos caso não houvesse interesse direto no retorno da última Dragomir, diziam as línguas, mas, apesar das fofocas, nada fora de fato comprovado.

De todo modo, fora assim que a maior parte das unidades de guardiões fora deslocada de seus postos pelos Estados Unidos, e que eu virara um dos líderes da missão. Ainda hoje não saberia explicar como tudo ocorrera tão depressa, mas como meu trabalho não era realmente fazer perguntas, deixei que meu foco caísse sobre o que mais importava.

Só que eu também me lembrava bem da maneira ardente como a diretora Kirova tomara impulso nos planejamentos, nos treinamentos, no enjambre da força tática. Ela fizera questão de se inteirar de cada mísero detalhe na rotina das alunas, na organização da república estudantil, nos arredores perimetrais da residência, no que faríamos ao chegar, ou como procederíamos ao resgate e de que modo traríamos Vasilisa de volta à Academia.

Não notara nada de anormal, na época, que de seus lábios saíssem somente perguntas referentes à princesa, sempre no singular, nunca englobando as duas estudantes fugitivas. A verdade era que, pensando bem, parecia que a dampira nem existia. Confesso que não perdera muitos pensamentos sobre a questão ou percebera qualquer problema no fato.

Até agora.

Enquanto encarava o fulgor em seu olhar, a amarga certeza me atingiu. Aquele plano nunca fora feito para resgatar as alunas, pelo menos não a ambas. Rose Hathaway era quase um efeito colateral. Se a encontrássemos, bom; mas se não... tanto melhor.

Seria uma mentira dizer que aquela constatação não me acertou em cheio, mas tentei manter a compostura e não demonstrar o meu choque ao receber aquela informação. Mesmo que ela mudasse inteiramente as táticas, mesmo que ela impusesse um novo norte à missão, mesmo que ela fosse contra tudo aquilo em que eu acreditava, eu não iria discutir.

Não cabia a mim questioná-la, ainda que cada fibra do meu corpo discordasse dela.

Parecia que horas haviam se passado enquanto encarava Kirova nos olhos, mas tinha a certeza de que todos aqueles pensamentos não me tomaram mais que alguns segundos. A sobrancelha dela, entretanto, fora aos poucos se erguendo em direção à testa, uma exigência tácita para que eu demonstrasse que havia entendido o seu recado.

— Não se preocupe, diretora. Eu farei conforme me foi ordenado. — Eu garanti, muito embora dizer tais palavras tivesse me causado um embrulho no estômago.

Aparentemente alheia ao meu estado, Kirova assentiu com satisfação.

— Ótimo, então creio que estamos conversados. Está dispensado, Belikov.

— Com sua licença. — Eu acenei de leve com a cabeça e me dirigi à saída de sua sala mais que depressa, ansioso por colocar alguma distância entre nós. Ela não voltou a proferir nenhuma palavra ou se dignou a olhar em minha direção, e aquilo não poderia ter vindo em momento mais oportuno, pois eu não tinha certeza de que estava fazendo um bom trabalho em esconder o desgosto em minha expressão. Ou a revolta.

Assim que fechei a porta, escorei a mão na parede e respirei fundo. Precisava de alguns instantes para me recompor, e não queria que mais ninguém me visse naquele estado. Normalmente eu sabia disfarçar as minhas emoções muito bem, mas em situações como aquela a máscara intransponível demorava um pouco mais para dar as caras. Eu só conseguia pensar que, mais uma vez, uma dampira era descartada com tanta facilidade, quando a única coisa que fazia era exercer o seu direito de ser livre.

Não que eu concordasse com a escolha que ela e a princesa tomaram. Eu não achava que fugir da escola tivesse sido a opção mais sensata, mas mesmo assim... deveria haver um motivo que as levara a fazer isso, certo? Pelo menos eu sempre imaginara que sim. Eu sentira na pele o quanto o sistema vampírico podia ser rígido e difícil, e nem todos concordavam em viver de acordo com ele, em especial aqueles que nasceram para viver à margem.

Como Rose Hathaway.

Tive de rir comigo mesmo. Aquele nome já virara uma constante em minha vida e eu sequer conhecia a pessoa por trás dele. Talvez nem tivesse a chance de conhecê-la, se dependesse de Kirova. De repente, a pressão em meus ombros foi demais e eu só precisava de uma boa noite de sono para esquecer tudo aquilo. Quando a missão finalmente estivesse acabada, eu voltaria a ser um dos guardiões invisíveis e seguiria com a minha vida sem tomar conhecimento da podridão que permeava a superfície da sociedade Moroi.

Em nome de minha sanidade.

≈VA≈

Depois de parcialmente recuperado do choque inicial pelas palavras de Kirova, segui o meu caminho para o prédio dos guardiões, aproveitando que estava com o molho de chaves de Alberta para me esgueirar pelos fundos. Agora era eu quem não queria ser visto por ninguém.

Minhas esperanças, no entanto, desmoronaram quando avistei a chefe dos guardiões sentada em sua posição costumeira atrás da sua mesa de trabalho. A pasta com os documentos que eu analisava antes estava posicionada com cuidado no canto, à esquerda dela, completamente organizada e limpa. Claro, ainda era possível perceber as manchas amarronzadas de café espalhadas por algumas páginas, mas, no geral, quase tudo estava impecável.

Sem olhar na minha direção, Alberta esticou uma das mãos e virou a palma para cima. Assim que posicionei o molho de chaves ali, ela disse:

— Acho que você vai gostar de saber que consegui salvar a maior parte da papelada.

Hesitei um pouco antes de responder.

— Ah, que ótimo. Obrigado. — Minha voz não soara nenhum pouco animada. Aquilo chamara a atenção de Alberta, pois seus olhos subiram imediatamente na minha direção, e ela passou alguns segundos analisando meu rosto com atenção.

Tentei manter a minha expressão indiferente, mas Alberta tinha uma habilidade fora do comum para ler qualquer pessoa, inclusive uma muralha impenetrável como eu.

— A reunião não foi como você esperava. — Ela constatou.

— Na verdade, como eu não sabia o que esperar, não posso dizer que fiquei surpreso.

— Kirova pode ser difícil, às vezes.

— Às vezes? — Desdenhei, soltando um riso duro, incrédulo. A resposta da guardiã foi erguer uma das sobrancelhas, em silêncio. Suspirei. — Me desculpe, Alberta. Eu sei que você só está querendo ajudar. Preciso descansar, acho que vou para o alojamento.

Antes que eu conseguisse alcançar a porta, porém, ela me interrompeu.

— Belikov, você sabe que eu respeito o seu espaço e entendo que não queira falar sobre o assunto, mas... às vezes, na vida de um guardião, chega o momento de decidir entre aquilo que é certo, aquilo em que acreditamos, e aquilo que nos ordenam.

Eu ergui meu olhar para encarar Alberta de frente, o cansaço repentinamente esquecido. Eu a conhecia há uma quantidade considerável de tempo, e sempre me parecera que a guardiã fosse extremamente compenetrada em seu trabalho. Ela me auxiliara em diversas situações antes, mas nunca tão diretamente como agora. Havia algo em seu semblante que me passava uma leve insegurança, como se ela estivesse em dúvida se suas palavras seriam bem recebidas ou não. Por outro lado, também consegui perceber uma preocupação genuína, e me perguntei se ela tinha conhecimento do que Kirova me pedira mais cedo.

Tomando meu silêncio como um encorajamento, ela continuou:

— Eu sei que os seus valores são honrados, e sei que o seu coração é bom. Por favor, não deixe que as aparências definam o seu julgamento.

Franzi o cenho, sem entender aonde ela queria chegar com aquilo.

— Quais aparências, guardiã Petrova? — Mas ela apenas meneou a cabeça.

— Só... preste atenção quando o momento chegar. Lembre das minhas palavras.

Encarando seu rosto, fiquei dividido entre a curiosidade e a exaustão. Uma parte minha estava intrigada com suas palavras, mas a outra estava apenas querendo escapar do olhar escrutinador da guardiã, o mais rapidamente possível, e desmaiar em cima de uma cama.

Pela primeira vez, o cansaço me venceu.

— Eu vou me lembrar, pode contar com isso. — Eu disse, então me virei para partir.

Saindo da sala de Alberta com a mente difusa, caminhei calmamente até meu quarto no alojamento dos guardiões, tentando não me aprofundar nos pensamentos que já tomavam conta de minha cabeça. Ajeitei o casaco melhor sobre os ombros quando o frio do lado de fora me atingiu. Aquela época do ano era traiçoeira em Montana. O outono estava quase em seu auge, mas o clima ainda não havia se estabilizado, e a temperatura oscilava muito.

Tudo estava claro ao redor, o sol emanando seu brilho amarelado sobre as árvores e as flores nos jardins da Academia. Permiti-me apenas mais um momento para aproveitar o ar livre da manhã, uma oportunidade muito rara para mim. Eu passava muito tempo por lá, era verdade, em especial durante as minhas rondas, mas sempre a trabalho, e eu não sentia que isso contasse realmente como tempo de qualidade.

Mas então, como sempre acontecia naqueles instantes em que eu me permitia parar, fui sentindo um aperto muito familiar tomar conta de meu coração. Esse aperto não aparecia com frequência, mas quando enfim dava as caras, consumia tudo. Minha mente sussurrava acusações e eu era obrigado a concordar com ela. Era justo que eu ficasse ali aproveitando o ar da manhã quando Ivan jamais voltaria a fazer o mesmo? Soltando um suspiro profundo, virei o rosto para longe do céu. Agora eu me lembrava por que vivia me afogando em trabalho e não me permitia ter tempo para pensar na vida. Porque a vida me esmagava.

Quando atingi a recepção, dei uma rápida conferida nos arredores, mas não avistei o vigia. Como estava tarde, suspeitei que o velho Ricky tivesse escapulido para dar um cochilo — e realmente, lá estava ele, com a cadeira escorada nos fundos da salinha atrás do balcão, constatei assim que espiei para dentro. Vi que sua cabeça pesava para trás, as mãos cruzadas despreocupadamente em cima da pança, enquanto sua boca emitia um ronco terrível de se ouvir. Sorrindo, esgueirei-me sem fazer muito barulho e desliguei a televisão, que fazia uma exibição do filme Dirty Dancing. Ricky adorava aquele filme.

Depois disso, foi um pulo até chegar a meus aposentos. Quando entrei no quarto, as formas arredondadas de meu colchão me convidaram a me afundar nelas, e eu quase cedi ali mesmo. Mas, no fim, acabei controlando a preguiça e rumei ao meu pequeno banheiro privado, largando o casaco no encosto da cadeira enquanto passava. Liguei o chuveiro e separei roupas limpas e, enquanto esperava a temperatura da água mudar, escovei os dentes. Todos os meus gestos eram lânguidos, eu agia sem pensar muito a respeito. Logo, estava limpo e me sentindo quase renovado, pronto para me lançar sob as cobertas macias.

Uma pena o mundo dos sonhos não entender o conceito de dormir como uma pedra.

Eu estava em Baia novamente. A princípio demorei para reconhecer os contornos dos móveis dispostos pelo aposento, mas não havia dúvidas de que aquela era a casa de minha mãe. Na verdade, foi mais o aroma da comida do que qualquer outra coisa o que me alertou para o fato de estar de volta ao meu antigo lar. Anos me separavam da última vez que sentira o cheiro do pão preto que somente ela sabia preparar.

Guiado pelo meu nariz, a barriga já dando sinais de vida, fui me esgueirando pela casa à procura da cozinha, mas parecia que, quanto mais eu caminhava, mais afastado ficava. Eu olhei ao redor para me orientar, na dúvida se havia me esquecido do caminho. Não, eu ainda reconhecia a estante com a coleção de livros de minha mãe, e a poltrona de minha avó estava no mesmo lugar que eu me lembrava, repousada no cantinho da sala de estar.

Por que então não conseguia chegar até a cozinha? Minha mãe por acaso fizera alguma reforma da qual eu não tivesse conhecimento?

Tentei mais uma vez, assomando pelo corredor adjacente. Por fim, avistei a porta que dava para o meu cômodo preferido na casa. Já era capaz de divisar a luz clara escapando para fora, e meu estômago novamente se contraiu em expectativa. Porém, antes que eu adentrasse na cozinha, algo puxou a atenção do meu olhar, e me virei naquela direção para ver melhor.

Era a salinha de magia da vovó, e a porta estava completamente escancarada.

Meu corpo se enrijeceu de imediato. Nunca, em mais de quinze anos que eu morara naquela residência, eu vira sequer uma fresta aberta naquela porta. Vovó vivia nos alertando para não sermos enxeridos, pois vejam só o que aconteceu a todas aquelas crianças devoradas por Baba Yaga. A curiosidade era a ruína das crianças, dizia, e meninos levados eram punidos das formas mais terríveis que se pudesse imaginar.

— Mas eu não sou mais um menino, sou? — Sussurrei, sentindo um sorriso travesso se abrir em meus lábios.

Meus pés foram me levando devagar, cada passo calculado para não emitir um ruído. Minha mão alcançou o portal, e por um segundo mais hesitei antes de entrar completamente no cômodo. Ali dentro estava abafado e escuro, e tive que cerrar os olhos para conseguir ver alguma coisa. Sentia minha pele tremer de leve, com resquícios dos meus medos de infância, mas não havia nada de muito estranho ali. O espaço era apertado, com um tapete gasto e um festão cheio de fitas e flores de plástico pendurado na parede.

Não podia negar que a decepção me atingiu em cheio. Passara tantos anos imaginando o que poderia existir dentro daquelas quatro paredes que a constatação do que realmente se escondia ali foi como um murro no meio do estômago.

Uma mesa com duas cadeiras. Nada mais do que isso. Tinha de admitir que o menino dentro de mim estava insatisfeito, como quando ele descobrira que Papai Noel não era nada mais do que um folclore popular — obrigado por isso, Karolina. Esquadrinhando meus olhos pela saleta, não havia nada que chamasse muita atenção para todo o misticismo que rondava vovó Yeva. Quando crianças, ouvíamos inúmeras histórias de que ela era uma ved’ma, e que sua capacidade de prever eventos futuros era certeira como um tiro no alvo.

Mas não havia nada sobre a mesinha. Quero dizer, nada que indicasse algo mágico. A única coisa que chamava atenção no escuro era o contorno de uma toalha de tricô dependurada desajeitadamente sobre o tampo. Isso e uma rosa vermelha pousada bem no centro.

Espere... uma rosa vermelha?

Franzindo o cenho, avancei alguns passos para dentro da sala. Era impressão minha, ou aquela flor acabara de se materializar ali? Eu não lembrava de tê-la visto antes, porém lá estava ela, brilhando como um fogaréu na escuridão. Com medo de que ela fosse se desintegrar sob o meu olhar, aproximei-me devagar, cada vez mais perto, e calmamente estendi uma das mãos até pairar acima dela. Com muito cuidado, dedilhei as pétalas fechadas, tão macias quanto aparentavam à primeira vista. Contornei seus padrões irregulares e desci até o caule, levando uma espetada no dedo no momento seguinte.

Roza. Era assim que a flor se chamava em russo. Surpreendi-me ao perceber que havia um sorriso se abrindo em meu rosto, mesmo sem entender o que aquela loucura significava. Agora com mais confiança de que ela não iria se despedaçar sob minhas mãos desajeitadas, aconcheguei-a entre as palmas, levando-a até o nariz para aspirar seu perfume. Assim que o fiz, senti as pétalas tremelicarem de leve, e observei, abismado, a rosa começar a se abrir.

De repente, sem nenhum aviso, ouvi a voz de minha avó soar nas proximidades.

— É linda, não é? — Sua presença à porta me pegou de surpresa, mas antes de poder criar uma justificativa plausível por ter invadido seu espaço privado, observei que não havia sequer um traço de reprimenda em seu rosto enrugado. Se possível, ela parecia satisfeita em me ver ali. Engoli em seco, hesitando um pouco para responder à sua pergunta.

— É muito linda, sim. Eu acho que nunca vi algo assim tão bonito antes. — Respondi por fim, sem me importar em esconder o meu deslumbramento.

— Ah, disso eu sei muito bem. — Ela disse, com uma risadinha matreira.

Seu comentário me fez franzir o cenho em confusão.

— O que quer dizer, vovó? — Continuei a observando de perto enquanto ela se aproximava de onde eu estava, vindo se postar bem ao meu lado.

Yeva soltou um suspiro, quase que de resignação.

— Você nunca se permitiu admirar algo assim tão belo. Nunca permitiu que ela invadisse seus pensamentos, tomasse seu coração, se misturasse à sua alma, se fundindo tanto a você ao ponto de não haver mais como saber quando se trata de quem.

— Vovó, ainda estamos falando sobre a rosa?

— É claro, meu querido! Você não percebeu? A rosa representa algo maior.

Tive de sorrir diante de seu comentário.

— Eu percebi, mas o que isso tem a ver comigo?

Em vez de me responder, ela me lançou outra pergunta:

— Meu neto, você já teve o amor em sua vida?

Pisquei rapidamente, aturdido. Aquela conversa fazia cada vez menos sentido.

— O amor? Eu não sei, vovó, sempre fui focado em meu trabalho.

— Ouça-me então, e preste atenção no que vou lhe dizer agora. — Ela se aproximou um pouco mais, enfiando o braço por meio do meu para se apoiar melhor. Eu me abaixei um pouco para que ela conseguisse falar sem precisar erguer tanto o pescoço, pois vovó era uma mulher de baixa estatura. Seus lábios se moveram com rapidez quando ela ditou: — O mais importante que existe no mundo são as coisas que aparecem quando menos esperamos. — Ela apontou para a flor que ainda estava em minhas mãos. — Elas surgem, e você pode até se perguntar se está pronto para elas ou não, pode duvidar se são a melhor opção para você, mas se a velhice me ensinou algo é que há algumas oportunidades na vida às quais precisamos nos agarrar sem pensar muito. Que se não fizermos isso, elas vão embora.

— Eu não sei se entendo o que está dizendo.

— É claro que não, seu momento ainda não chegou. Mas quero que se lembre disto quando a hora chegar: o toque de alguém pode despertar algo dentro de nós. Assim como o seu toque despertou a beleza dessa rosa, com dedicação e carinho, tenho certeza de que você pode mostrar o seu melhor para quem vier a surgir em seu caminho.

Mesmo incerto, assenti com vigor.

— Obrigado, vovó. Suas palavras são sábias como sempre. — A confusão em minha mente devia estar aparente, pois minha avó riu de leve e estendeu sua mão pequena e enrugada até meu rosto, afagando-o com carinho.

— Não perca muito tempo tentando entender as palavras desta velha. O que vale é o que este momento o fez sentir. É algo que eu achei que precisasse saber antes de encontrar.

— Encontrar o quê, vovó?

— Você saberá.

E com isso, o meu sonho evanesceu.


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Notas finais do capítulo

Ui, que dramático!
E aí, gostaram? Eu, particularmente, fiquei super em dúvida quanto a postar esse capítulo, pelo fato da rosa e toda a alegoria com a Rose e tal. Não sabia se ficaria bom o fato de Yeva aparecer do nada no sonho dele e ficar falando essas metáforas e ainda antes mesmo dos pombinhos se conhecerem, mas no fim acho que ficou legal.
E por falar em alegorias, eu usei uma citação de Guimarães Rosa como filosofia de vida para Dimitri e também viajei muito naquela parte das montanhas, afinal ele não é o mestre das lições Zen por acaso, né?! kkkkk. Acho que ele teve por quem puxar, afinal.
Bom, eu sei que algumas de vocês podem ter achado meio idiota o fato de ele querer mandar Kirova se danar e atirar tudo pra cima e tal, mas eu quis retratar um Dimitri também impulsivo, mas que já sabe ser controlado, ao contrário da Rose. Não que internamente ele não possa ser uma confusão de sentimentos. Acho que isso o deixa menos perfeitinho e com aquela fama de Deus Fodão que a Rose e todos os outros vivem querendo aumentar, na verdade, o torna mais real, pelo menos pra mim. Enfim... Não sei vocês.
Espero que todos tenham gostado... Mereço Reviews?
Até mais, beijos,

Roberta Matzenbacher

Atualização em 06/04/2023

Oi, gente. Para quem estiver lendo isso depois de 06 de abril de 2023, não estranhem que as notas iniciais e finais dos capítulos não condigam mais com o conteúdo da fic, porque eu venho reescrevendo Inopino desde o ano passado, e muita coisa foi mudada. Eu ainda mantive o fato do Dimitri sonhar com a Yeva, mas para aqueles que leram a versão anterior da fic, talvez tenham notado que o conteúdo está muito mais denso e detalhado.

Por muitos anos, eu fui fascinada pelo personagem Dimitri. Sempre achei que ele fosse muito mais do que aquele estereótipo de dampiro fodão, porém quando estava escrevendo a fic, confesso que tateava muito no escuro com ele. Escrevi muitas coisas de modo experimental, coisas que eu acreditava que faziam sentido na época, e até acho que faziam mesmo (na época, ênfase nisso). Mas agora, depois que um tempo se passou, depois que fiquei mais velha (estou com 27 agora), senti que algumas coisas que antes eram meio turvas passaram a fazer sentido, pois são experiências que eu mesma vivi. Acho que isso finalmente deu o toque que faltava no meu Dimitri de antes, aquela dose de sabedoria na medida certa, a balança entre os demônios do passado dele e a tentativa de seguir em frente, sempre olhando a vida pelo lado positivo.

Eu admiro muito o Dimitri, e acho que sempre admirarei. Não apenas como personagem, mas porque conheci pessoas como ele na vida real. Resilientes. Tenho certeza de que quem ler esta nova história que eu estou criando vai perceber essa nuance e vai entender que ela faz todo sentido no contexto do Dimitri.