Adentramos na praça correndo pelo meio das arvores tentando despistar a ruiva furiosa que nos perseguia. E eu estava agradecendo por ter pernas longas, porque de fato Merida corria muito rápido e por pouco ela não estava nos alcançando. A risada de Rapunzel ecoava pelo meio dos troncos que desviávamos na ultima hora, antes de dar de cara com a madeira.

– Meninos, estratégia de ultima hora! – A loira exclamou sorrindo depois de dar uma espiada para trás, vendo Merida se aproximando perigosamente. – Qual de vocês dois corre mais rápido? – Eu e Jack nos olhamos na mesma hora, mas ao contrário de mim ele estava adorando aquela situação.

– Podemos dizer que numa hora dessas, nós dois corremos muito bem. – Ele disse, olhando para trás também depois de ouvir Merida gritando por nós. – Mas o Soluço tem as pernas bem grandes. - Os dois olharam em minha direção. Sobrou pra mim.

Porque Odin?! Porque sempre sobra para o pobre Soluço?!

– Então Jack, estou contando com você para uma encenação dramática! – Nem eu e muito menos Jack sabíamos o que Punzie tinha planejado, mas na hora em que ela sussurrou no ouvido ele e colocou o pé em seu caminho, fazendo-o tropeçar, entendi do que se tratava.

Vi Jack caindo na grama, olhando para nós dois sorrindo como uma criança. Só percebi que parei de correr para vê-lo segurar o tornozelo com as duas mãos, reclamando de dor, quando Rapunzel me puxou pelo braço.

Os cabelos vermelhos de Merida se aproximaram perigosamente de Jack, o que só me fez correr mais rápido do que a loira que me puxava. Atravessamos mais árvores, desviamos de alguns galho e saímos do meio daquele mato algum tempo depois.

Corremos mais um pouco e paramos ofegantes perto da estatua em forma de sol. O cabelo loiro de Rapunzel estava solto e o meu provavelmente estava uma porcaria, mas isso não era importante na hora; Pobre Jack, uma costela dele provavelmente estaria quebrada agora. Ou estaria levando um belo cascudo.

Nessas horas um sentimento desperta dentro de mim. Aquele belo sentimento chamado “bem feito, eu avisei!”.

– Vamos esperar eles aqui, tudo bem? – Ela me perguntou, indo se sentar num banco de concreto que havia por perto. Sentei-me do lado dela, joguei a cabeça para trás e fechei os olhos por alguns minutos. – Soluço?

– Sim? – Falei ainda de olhos fechados, ouvindo os grilos em nossa volta.

– Seja Bem-vindo à Corona. – Abri os olhos e encarei-a, que como sempre estava com um grande sorriso no rosto, o que dava vontade de sorrir de volta para ela. Meu pai me disse que poucas pessoas tem um sorriso desses e quando mais novo, se ele encontrasse alguma, adotaria, levaria para casa, faria churros e viveria feliz para sempre. – Você vai adorar a cidade!

– Espero que sim. – E essa vontade de comer churros, de onde está vindo?

Ficamos olhando para o caminho que corremos até o banco e esperamos ver Jack e Merida se aproximando ou algo do tipo. E isso aconteceu; eles corriam para nossa direção. Eu esperava ver Jack correndo de Merida como se sua vida dependesse daquilo, mas não corria. 

Corriam juntos e pareciam preocupados com algo.

– Corram! – Jack gritou, passando por nós desesperado. Merida também passou correndo como um foguete, deixando seus cachos ruivos ao vento. E quando olhei para ver do que eles corriam, engoli em seco e fui puxado por Rapunzel de novo.

– Cachorros? – Gritei para Jack quando consegui alcança-lo. Ele apenas riu alto e continuou correndo, tentando alcançar Merida que agora estava na frente.

– Não acho que gatos saibam latir. – Merida gritou em nossa frente, correndo por algum caminho que nos levaria para algum lugar. Falando nisso, onde estávamos indo? – Se preparem para pular de novo o muro, seus vândalos! – Ah! Entendi.

Avistamos as grades dos portões e nos aproximávamos rapidamente com adrenalina correndo por minhas veias. Ouvia os cachorros latindo logo atrás da gente. Jack e Merida estavam na frente e chegaram primeiro nas grades, deixando eu e Punzie para trás.

Covardes!

Jack pulou primeiro nas grades e escalou-as facilmente, pulando para o outro lado. Depois foi a vez de Merida, que fez o mesmo só que mais rápido ainda. Olhei para Rapunzel e ela para mim.

– Vai primeiro! – Disse para ela, me virando para ver se faltava muito para os cachorros se aproximarem. Rapunzel apenas ficou me olhando. – Vai logo! – Mandei e ela obedeceu, escalando as grades e pulando para o outro lado bem na hora em que um grande cachorro preto corria em nossa direção e estava muito próximo.

- Merda, Soluço! - Ouvi Jack gritando também, mas o som da voz dele se misturou com um latido raivoso muito perto de mim.

Fechei os olhos porque sabia que não daria tempo de correr.

– Soluço! – Rapunzel me chamou através das grades, estendendo os braços em minha direção, mas era tarde de mais. Já sentia o bafo do cachorro contra meu rosto quando ele me derrubou no chão. - Não!

Fechei os olhos esperando o ataque, estendendo os braços em frente ao rosto para evitar um dano maior.

Poderoso Thor que ele só deforme meu rosto, mas não arranque pedaços importantes! 

Já tinha perdido minhas esperanças. As garras do cachorro arranharam minha blusa e batiam contra meu braço fortemente, enquanto eu me encolhia e tentava virar de bruços no chão. Infelizmente o peso do cachorro era muito para um magrelo como eu empurrar, mas senti o bafo do cachorro indo para longe do meu rosto no mesmo momento em que soltei um gemido de dor por causa de uma patada. 

– Vem cá, bafo de ração! – A voz de Merida gritava através da grade. – Rápido Frost, pega logo um galho! – Alguns segundos depois, Jack havia pegado um galho e batia contra o portão, fazendo barulho enquanto Merida gritava. – Vem cá me pegar, fedorento! – Ela corria de um lado para o outro, distraindo o cachorro. Ela não tinha medo de colocar a mão dentro da grade para incomodar o cachorro, nem temia que fosse mordida e perdesse a mão. Até chegou a bater no focinho do cachorro com a mão e teve tempo de tira-la de lá antes que fosse pega.

 Se fosse eu, duvido muito que estaria fazendo o mesmo.

É. Merida é a menina mais valente que conheci em toda minha vida.

– Soluço, rápido! – Ouvi Rapunzel gritar para mim, então levantei e corri para a grade. Minhas pernas tremiam tanto que escalar foi mais difícil, mas não impossível. Pulei para o outro lado e desabei sentado no chão. A loira se aproximou de mim preocupada e, depois que percebeu que estava tudo bem, me abraçou forte por alguns segundos. – Você conseguiu!

– Acho que sim. – Respondi ofegante e olhando para os dois que haviam salvado minha vida. Merida apoiava as duas mãos nos joelhos e respirava ofegante, enquanto Jack se encostava a uma arvore próxima, segurando o galho. Ele percebeu que estava encarando-o e sorriu, vindo para perto.

– Levanta logo que o segurança está chegando! – Ouvi Jack dizendo depois de jogar o galho para dentro da praça, fazendo o cachorro ir atrás. – Mandou bem, hein Ruiva? – Ele encostou uma mão nas costas de Merida, orgulhoso do trabalho que havia feito.

– Cala boca. Da próxima vez eu jogo você lá dentro pra distrair o cachorro, entendeu? – Ela respondeu para Jack, colocando as mãos na cintura, então olhou para mim e perguntou num tom amigável– Tudo bem? – Um cacho ruivo caia sobre a testa dela.

– Acho que meu coração vai sair pela boca. – Coloquei a mão sobre o peito, escutando as batidas aceleradas do meu coração e ela riu de mim, me ajudando a levantar.

O relógio eletrônico na esquina marcou meia noite e tocou uma musiquinha estranha.

– Acho melhor voltarmos para casa. – A loira disse, falando com todos nós. Se levantou, prendeu os cabelos num coque alto e apoiou um braço nos ombros de Merida, que suspirou irritada. As duas saíram andando pela calçada uma ao lado da outra, conversando. – É, Elinor vai nos matar. Ou então nos castigar. Ou arrancar nossas tripas. Ou ...

– Punzie, já sei disso tudo. – Merida disse, colocando o braço ao redor da cintura da amiga, olhou para trás e sorriu. - Eles mal chegaram e já causaram confusão. – Desviei meus olhos para o chão e fui para o lado de Jack. – Gostei deles.

– Também gostamos de você, ruiva! – Respondeu Jack, fazendo um coração com as mãos.

– Vai se ferrar! - Olhando aquela cena vi que Jack tinha razão. Isso vai se tornar uma boa história para nos lembrarmos daqui a algum tempo. – E se preparem para sentir a fúria da minha mãe. – Não, obrigado. Se a filha já havia me assustado, não quero imaginar o que a mãe dela seria capaz de fazer.

Andamos de volta para casa normalmente, pelo mesmo caminho que viemos. As luzes dos postes iluminando todo o percurso. Alguns carros passavam pelas ruas, mas ninguém andava mais pelas calçadas como nós quatro. Assim que chegamos à rua deserta da casa 2405, subimos as escadas e paramos todos em frente da porta.

As duas se olharam e acenaram com a cabeça apenas uma vez.

– Apenas confirmem qualquer coisa que nós falarmos, combinado? – Punzie disse, girando a maçaneta e abrindo a porta. Quando entramos, vimos à típica cena de filme; A mãe sentada na sala escura, vendo televisão sentada no sofá. As meninas caminharam em direção às escadas, mas na metade dos degraus a Senhora Elinor se levantou.

– Boa noite crianças. – Ela disse séria, indicando o sofá com a mão. As garotas desceram e foram para o sofá em silêncio, então Jack e eu seguimos e fizemos o mesmo. – Espero que tenham uma boa história.

Aquilo não iria prestar.