Estávamos todos sentados no sofá, de frente para a senhora Elinor. Eu e Jack estávamos apoiados nos braços do sofá, enquanto as meninas sentaram em cimas das almofadas. Elinor estava de braços cruzados e nos olhava com aquela costumeira cara que as mães fazem quando escutam alguma coisa muito absurda.

Também, ninguém acreditaria na história que aquelas duas contaram!

Na história delas, eu e Jack fomos ameaçados por drogados enquanto voltávamos para casa, então Merida chegou dando uma voadora no negão de dois metros e meio, enquanto Rapunzel dava pauladas na cabeça dos anões amigos do negão que estava fumando maconha. Jack gritava igual uma menininha, segundo Merida, e eu estava jogado atrás de uma lata de lixo.

Não seria mais fácil elas terem contado a história de verdade?

– Vocês acham mesmo que eu vou acreditar nisso? – A mulher em nossa frente falou, batendo o pé contra o chão várias vezes, irritada. – Se isso de fato tivesse acontecido, você acha que a Rapunzel bateria em anões? – Todos olhamos para a loira que abraçava uma almofada. – Ela não faria mal nem à uma mosca! Imagina bater em anões, que ela gosta tanto. – A loira olhou para Elinor, confusa. Acho que todos nós olhamos confusos para ela.

– O que?! – Jack perguntou para mim depois de olhar desconfiado para Rapunzel. Ele estava mais perdido do que eu no meio daquela história toda, mas pelo menos eu fiquei quieto. – Você gosta de anões? – Rapunzel olhou para ele balançando a cabeça confusa e erguendo os ombros.

– Mãe, você deve estar confundindo ela com a Branca de Neve. – Merida disse, revirando os olhos. – O fato é que você acreditando ou não, foi isso que aconteceu. – Ela cruzou os braços igual à mãe, olhando para Elinor desafiadoramente. Pude sentir aquela costumeira atmosfera de brigas familiares surgindo entre as duas.

Elinor cobriu os olhos com uma mão e suspirou irritada, olhando para todos nós através dos dedos e vendo Merida lhe mostrar a língua.

Aquilo já não estava bom, agora que não iria prestar mesmo.

– Então, vocês querendo ou não, serão castigados. - Viu só? Eu não disse? - Vão limpar aquele sótão inteiro, e não quero que saiam de lá antes que terminem , ouviram? – Só três de nós responderam. Merida preferiu se levantar e subir as escadas correndo para o quarto dela, eu acho. – Me desculpem por isso, meninos. – Elinor se sentou na poltrona que havia por perto e parecia cansada, mas bem mais relaxada do que quando chegamos em casa.

– Não, tudo bem! – Jack disse, se levantando. – Soluço adora fazer limpezas, não é mesmo? – Olhei pra ele e revirei os olhos, o que só rendeu uma risada da parte dele. – Vai ser bom para os braços magrelos dele.

– Jack, não fale assim com o Soluço! Ele ainda deve estar meio mal. – Rapunzel disse, me defendendo. Ele apenas mostrou a língua para ela e levou uma almofadada bem na cara. Rapunzel se levantou quando ele jogou a almofada de volta e foi para perto da mulher na poltrona. - Boa Noite Elinor!- A loira deu um beijo carinhoso no topo da cabeça dela, logo depois correndo para as escadas, igual Merida fez.

Quando me levantei, vi os olhos de Elinor me encarando. Acenei com a cabeça cumprimentando ela e fui para o lado de Jack que estava me esperando no primeiro degrau da escada. É desconfortante quando alguém fica me encarando por muito tempo, então prefiro sair de cena quando isso acontece.

Subi as escadas em silêncio junto com Jack, e quando cheguei ao topo, ouvi a porta sendo aberta novamente. A voz de Elinor cumprimentou a pessoa que havia acabado de entrar e um arrepio percorreu toda a minha espinha.

– Boa noite Astrid. Como foi o show de hoje?

– Foi muito bom, a senhora deveria ter ido! – Olhei para Jack ao meu lado e arregalei os olhos quando ouvi o primeiro passo que Astrid deu na escada. - Bem, vou subindo! Amanhã preciso me encontrar com Flynn cedo.

Nada bom, nada bom! Ela está subindo e vai me encontrar no caminho! Preciso me esconder logo ou não terei coragem de encarar Astrid depois do desmaio que tive na frente dela.

Certo, pense rápido Soluço! Vou correr. Correr até o quarto!

Por reflexo, saí correndo pelo corredor até chegar em frente à porta de meu novo quarto e entrar. O coração batendo rápido, as pernas voltaram a tremer e era como se eu estivesse em pânico. Só notei que deixei Jack para trás quando tranquei a porta, me joguei na cama e afundei meu rosto no travesseiro.

Eu tinha coragem para enfrentar um cachorro que iria deformar minhas cara, então onde eu arrumaria coragem para falar com Astrid? Pelo menos o cachorro não tiraria sarro de mim por ter desmaiado na frente dele. Eu acho. Ou pelo menos não entenderia. Cachorrês é muito complexo.

Havia tantas coisas para se pensar na hora que provavelmente meus neurônios deveriam estar entrando em greve, então fiz a primeira coisa que me veio à cabeça.

– Alô, pai? - O celular de modelo antigo se apoiou contra meu ouvido quando ouvi a voz de meu pai do outro lado.

Seria bom falar com o velho Stoick.

–

Meus olhos estavam pesados e teimavam em ficar fechados, mas consegui abri-os devagar. Olhei ao redor e vi que tudo estava calmo e tranquilo, como uma manhã de sábado deve ser. Pássaros cantando, arvores balançando com o vento da manhã e alguém tentando derrubar a porta do meu quarto novo.

Não, espera.

– Hey! Bela adormecida acorda! – Alguém estava tentando derrubar minha porta!– Temos que fazer a limpeza do sótão hoje, esqueceu?! – E pelo jeito agradável, provavelmente era Merida. – Se você não sair em cinco minutos, consigo arrombar essa porta em um, ouviu?! - Obrigado Thor por eu ter trancado a porta de noite!

– Já vou, não precisa arrombar a porta! – Gritei enquanto me sentava na cama e procurava meu tênis. Ouvi os passos de Merida se afastarem da minha porta e enfim conseguir me espreguiçar sem ter que me preocupar com a porta sendo destruída.

Quando saí no corredor, uma escada descia do teto até o chão e consegui ver Rapunzel sentada de costas para o buraco que era a entrada para o sótão. Jack já estava lá em cima pelo jeito, pois a voz dele e de Merida eram altas e inconfundíveis.

Cheguei lá em cima rapidamente, vi um monte de caixas e objetos jogados para todos os lados, mas a cena que se passava em frente de Punzie era o que mais me chamou a atenção.

– Tudo o que você consegue fazer, eu faço melhor! – Jack disse cruzando os braços e olhando desafiadoramente para Merida, que segurava uma vassoura cheia de raiva. – Vamos lá ruiva, admita logo.

Acenei para Rapunzel sentada no chão e fiquei parado perto da parede livre, junto com as vassouras e alguns baldes cheios de água. E então eu finalmente ouvi a frase que deu inicio à uma grande guerra de limpeza.

– Admitir uma mentira? – Ela debochou dele, se apoiando na vassoura. – Você não é capaz de fazer metade das coisas que eu faço, Frost. – Pude ver faíscas saindo dos olhos dos dois quando eles se encararam. – Volte pro seu sitio no meio do nada, porque cidade grande é só pros fortes. – Round 1: O golpe de fúria de Merida é usado.

– Só volto pro meu sítio se você cortar esse cabelo ruim e usar uma peruca decente. – E Jack Frost defende-se com glória com seu escudo ofensivo.

– Pessoal? – Rapunzel usa a magia da interrupção com eficiência e entra no meio da batalha. Round 1: Empate.– É melhor limparmos logo antes que Elinor venha ver o que está acontecendo aqui. - Jack sorria malignamente quando pegou uma vassoura maior que as outras, enquanto Merida o encarava com cara de poucos amigos.

– Acho que eles não te ouviram. – Eu disse, vendo os dois se encarando mortalmente. Rapunzel apenas deu de ombros e foi pegar uma vassoura também, então fui atrás dela para evitar confusão. Só que é impossível evitar confusão perto daqueles três e o que era para ser uma limpeza de castigo, acabou virando uma guerra.

Começamos a varrer o chão; Jack e Rapunzel começaram da direita para a esquerda, então eu e Merida começamos da esquerda para a direita. O que um acabava de varrer, o outro ia lá e sujava tudo de novo só para irritar. Jack e Merida chegaram até a começar um duelo de vassouras, usando elas como espadas.

– Você nunca vai ser melhor do que eu, ruiva! – Jack exclamou, derrubando a vassoura de Merida no chão e rendendo ela contra uma parede de caixas. – Renda-se e eu terei piedade.

– Nunca! – Ela respondeu, se encostando às caixas já sem saída. Ah! Odin, aquilo duraria para sempre?! – Prefiro a morte! – Então ela tirou uma sapatilha que estava usando e atirou em direção de Jack.

O que ela não esperava - muito menos eu - era que ele conseguisse desviar. E que a sapatilha fosse derrubar uma pilha de caixas pesadas com coisas de vidro e metal que eu e Rapunzel separamos em um canto.

E que Rapunzel estava em baixo da pilha quando ela desmoronou.

Já posso me jogar da ponte ou preciso ver um funeral no segundo dia em que estou em Corona?

Os grandes olhos verdes de Punzie olharam para cima quando percebeu que as caixas estavam caindo, só houve tempo da menina colocar os braços em cima da cabeça.

Dois vultos passaram do meu lado correndo; um vermelho e outro branco, e eu torci para que algum deles conseguisse chegar a tempo.

– Rapunzel! – Gritei, vendo que não daria tempo para ela sair do caminho. Fechei os olhos quando ouvi o barulho de vidro se quebrando, caixas caindo e um gemido de dor. – Punzie! - Gritei de novo, enquanto corria para o amontoado de caixas com um fio de esperança restando.

Por favor, que ela esteja bem.