A Rosa Que Sangra escrita por Wondernautas


Capítulo 28
Coroa de acúleos


Notas iniciais do capítulo

Eu demorei mt, eu sei T-T. Perdão, perdão T-T, mas o cap está aqui. Narrado por ninguém mais, ninguém menos que nossa "querida" Asuka!!



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Minha pele ainda pode sentir o que o peso daquelas mãos deixou para mim. Minha mente, transbordando ira. Meus olhos, apenas como puros reflexos dessa verdade. Ainda assim, creio que devo manter um sorriso no rosto. Talvez seja algo controverso, considerando a surra que levei minutos atrás, daquela maldita. Porém, de um jeito ou de outro, atingi vitória em minhas investidas, mesmo que parcial.

– Vagabunda que ela é. – falo comigo mesma, enquanto caminho pela rua, já bem distante do local do ocorrido.

Desde o início, meu plano com aquele encontro era chantagear a Yuzuriha. De fato, isso não deu muito certo, mas acabei alcançando algo que não foi lá tão ruim. Uma guerra é composta por várias batalhas e, desse embate, eu saí como a vitoriosa. Só não sei se, no fim, tudo valerá a pena. Espero que sim...

– Todos vão me pagar, com toda a certeza! – exclamo, ao parar diante da entrada do prédio do meu apartamento. – É preciso fazê-los sofrer, como eu sofri. Vão sentir na pele tudo o que senti!

Na verdade, não é meu o apartamento de fato. Estou apenas de aluguel, pois minha estadia pela cidade é temporária. No fundo, ainda não desisti de correr atrás da Jessie, por assim dizer. É como um vício, uma droga da qual não consigo me libertar. Talvez nem queira mesmo me libertar. É uma das raras coisas no mundo que dão um pouco de sentido à minha vida.

Por outro lado, procurar passatempos divertidos como reencontrar “velhos amigos” por aí é algo que compensa os meus fracassos pessoais. Essa é a razão por ainda permanecer tão perto do Kardia e de seus amigos, nesse lugarzinho medíocre. De certa forma, essa situação me agrada sim. Gosto de ver tudo em movimento. Monotonia é algo que me enlouquece.

– Estou precisando de sexo. – afirmo para mim mesma, enquanto caminho, subindo as escadas do prédio. – Deixar tudo de lado para viver alguns momentos de prazer é uma opção um tanto quanto tentadora...

Em poucos segundos, já me posiciono perante a porta do meu apartamento alugado. Com a chave já em mãos, – na direita, para ser mais precisa – direciono-a para a fechadura. Girando-a, abro e, ao entrar, fecho e tranco mais uma vez.

– Posso resolver isso depois de tirar uma soneca, antes que eu caia esturricada em um canto qualquer. – articulo, encaminhando-me para o quarto que utilizo para dormir.

Nada mais me importa no momento. Preciso esquecer a Jessie, esquecer o Kardia, esquecer a Yuzuriha, esquecer o Kazuya, esquecer todos. Preciso, definitivamente, me jogar na cama e me entregar ao sono que quer, agora, tomar conta de mim. E é isso mesmo o que faço.

– Asuka, Asuka... Será que você não está indo longe demais? – pergunto para mim mesma, em baixo tom, antes de cair no sono e perder, por completo, a consciência.

Afinal... Qual a resposta desse questionamento que tanto me persegue? Sim? Não? A confusão que agora me assola é tamanha que sinto como se não pudesse enxergar um palmo à minha frente. Minha mente está conturbada, envolta por nebulosas densas e obscuras. Nebulosas que eu mesma fui construindo, através de cada ato egoísta que pratiquei.

Não sei dizer por quanto tempo durmo. Porém, é um sono “merecido”. Meu desgaste desses últimos dias me deixou como um trapo. Quem sabe, talvez eu esteja indo mesmo longe demais, ultrapassando limites que jamais deveriam ser ultrapassados? Afinal de contas, qual a finalidade em tudo isso? Por que chegar tão longe apenas para ver tudo em movimento?

“Você está enlouquecendo, Asuka. Se continuar assim, se tornará uma lunática desvairada que não se importa com os sentimentos alheios. Uma pessoa que, no fim da vida, estará sozinha”. Essas foram as últimas palavras que ouvi dos lábios dela... Jessie. Será que você tinha razão ao afirmar tal coisa? Será que, hoje em dia, já sou uma lunática desvairada? Será que sempre estarei sozinha, afinal de contas? Será que...

Meu celular toca, aliás, um dos meus dois celulares, despertando-me do meu sono. Apesar de cansada, acabei não dormindo de modo profundo. Meus olhos se abrem. Estou, agora, jogada de costas na minha cama, sem ter noção de quanto tempo passei dessa forma. Ao virar meu rosto para o lado esquerdo, encontro meu aparelho tocando e vibrando, a meros centímetros do meu rosto. Ao deitar, não havia notado que o largara aqui. Dirigindo meu respectivo braço em sua direção, o tomo e, ao ler o nome “Kazuya” na tela, atendo, com certo desprezo:

– O que foi, moleque? É melhor que tenha uma boa razão para me importunar durante uma soneca das boas.

– Deixa essa rispidez de lado, vagabunda! Foquemos nos nossos planos! – exclama ele, do outro lado da linha, me enlouquecendo de raiva com o tom imperativo e petulante que utiliza para falar comigo. – Não podemos fraquejar.

–  Quem você pensa que é, seu imbecil? Não sou o seu irmão para você me tratar como bem entender e me manipular como acha melhor! Olha lá como fala comigo!

– Está sensível, é? –  debocha ele, enquanto escuto os sons de suas risadas provocadoras. –  Uma criminosa como você não deveria reagir assim. Para alguém que está familiarizada com o derramamento de sangue, críticas assim deveriam ser consideradas leves.

– Criminosa? Familiarizada com derramamento de sangue? Mas que palhaçada é essa, Kazuya? –  questiono, em fúria. – Só por que eu coloquei em risco a vida de um cachorro? – fico indignada, erguendo meu tronco para frente, assentando-me na cama, então. – Um certo delinquente fez ainda pior, creio eu... Já que induziu o irmão mais velho a cometer um estupro, para que depois pudesse lhe oferecer o “falso ombro amigo” e, então, tentar conseguir uma noite com ele. É você quem tem a mente distorcida nessa história toda! Nem quero imaginar quais os nojentos pensamentos que vivem na sua cabeça.

– Não desvie do assunto, vadia. Digamos que você sabe do que eu estou falando. – afirma, com um timbre ainda mais irônico. – Quem deveria dar um basta na palhaçada não sou eu não...

– Seja mais direto! – impero. – Não estou a fim de participar das suas gracinhas infantis!

– Não deve ter visto os noticiários da tarde, suponho... – conclui o garoto. – Não sei como pode dormir depois do que fez.

Erguendo meu rosto, meus olhos passam a encarar  a janela bem diante de mim. Ela ainda está aberta e, através da mesma, é possível ver o escuro céu da noite. Me lembro do quanto meus pais gostavam de observar a cortina negra de estrelas, se lembrando de cada boa experiência que viveram um dia... De fato, dormi bastante.

– Uma mulher, hoje mais cedo, foi baleada próxima à sorveteria nova da cidade. – diz ele, quebrando o meu transe bruscamente, segundos em que minha atenção se tornou escrava da bela visão noturna. – Está entre a vida e a morte, em estado grave.

– E o que tenho a ver com isso? Não perco meu tempo vendo jornaizinhos televisivos mequetrefes...

– A baleada é aquela amiga da Yuzuriha. Um pequeno bebê pode perder a mãe a qualquer instante...

– A Sasha? Está insinuando que eu atirei nela? Ligou para me acusar?

– Pare com esse teatro: nós dois sabemos que você tentou cometer um homicídio, mas errou no alvo. É a falta de experiência com armas de fogo, não é, vagabunda?

– Chega! – grito, em fúria. – Você está passando dos limites! Se eu pudesse, socaria agora a sua cara para calar essa sua boca imunda!

– Socaria a minha cara? Eu imaginei que alguém do seu nível fosse preferir resolver as coisas com um tiro de revólver. É mais prático, não acha?

Meus lábios se abrem para proferir outras palavras, mas antes que eu seja capaz de falar algo, o pivetinho insiste:

– E... Tem certeza que sou eu quem passou dos limites e não você? Quem é o assassino, ou melhor, assassina nessa história toda? – ironiza, fazendo referência ao que eu disse há pouco, me irritando ainda mais. – Se estava disposta a matar, deveria ter feito isso com o Albáfica, pois assim o serviço seria mais útil. O que acabar com a vida daquela modelo de quinta categoria trará de bom para nossos planos?

– Basta!!! Nossa aliança está desfeita, cansei de você!

– Tudo bem, eu não preciso mais mesmo dessa união. Posso seguir sozinho de agora em diante. Até por que não quero me envolver com uma assassina. – afirma, com uma certeza enfurecedora. – Além disso, cometer um homicídio é uma atitude desnecessária. Sua loucura serviu para me provar que errei ao me aliar a uma lésbica desequilibrada e vulgar da sua classe.

– Pare agora com essas acusações, moleque maldito! Senão...

– Senão o quê? – me provoca ele, instigando ainda mais a minha ira fervorosa. – Vai contar tudo para o meu irmão? Vai dizer para ele que nós dois estávamos manipulando-o para destruir a relação do Albáfica e do Manigold, para que no fim nos dois alcançássemos nossos objetivos?

Me calo, contra a minha própria vontade. Mas fazer o quê, falar o quê? Não possuo argumentos para confrontar esse garotinho asqueroso. Afinal... Eloquência é um dom que ele tem para dar e vender, até mais do que eu. Por tal motivo, ele prossegue, sem a intenção de cessar, provavelmente:

– Eu quero meu irmão todo para mim e você quer destruir cada um dos amigos do Kardia, começando por aqueles dois. Mas ainda assim, não entendo sua intenção nisso. Seu passatempo se resume a destruir vidas, é isso?

– Não quero mais perder nenhum segundo da minha existência trocando palavras com alguém de personalidade tão sofrível quanto a sua. – respondo, desviando do assunto. No fundo, já estou mesmo sem armas para confrontá-lo. É melhor acabar com isso de uma vez por todas.

– Você é mesmo um monstro, Asuka. Uma psicopata descontrolada. Talvez devêssemos interná-la. – ele satiriza, do outro lado, entre risos irritantes e insistentes. – Pode deixar que, quando for presa, farei minha parte para que possam colocá-la no melhor dos sanatórios. Seu problema é psiquiátrico... – encerra, enquanto continua a rir, debochadamente.

– Nossa aliança está quebrada, se esqueceu? Se você não entendeu a minha posição nisso tudo até agora, não precisa entender mais nada. Além disso, não lhe devo satisfações. Passe muito mal, Kazuya. E nunca mais gaste um centavo sequer ligando para mim!

Antes que o irmão mais novo de Minos diga mais alguma coisa, eu lanço meu celular contra a parede, com toda a minha força. Ao se chocar nela, ele se quebra em alguns pedaços. Era exatamente isso o que eu gostaria de fazer com esse moleque...

Meus olhos observam o trajeto dos pedaços do aparelho, que caem ao chão. E dessa forma continuo, como um zumbi sem consciência, até meu dorso se encontrar, de uma só vez, com o lençol da minha cama, quase que um minuto inteiro depois.

– Maldita hora em que fui me aliar com esse moleque! – reclamo, fitando o teto sobre mim. – Que vontade de desfigurar aquele rostinho de porcelana! Se eu tiver chance, acabo com você, Kazuya! Farei com que se arrependa de me afrontar desse jeito! Não vai ficar barato não, mas não vai mesmo!!!

Com um profundo suspiro, fecho meus olhos. Por alguns segundos, os mantenho assim, enquanto vou pensando em todos os frutos que minhas ações me deram. Pouco a pouco, vou me acalmando, deixando que a figura daquele pivete desgraçado abandone meus pensamentos...

No passado, semeei discórdia e agora a colheita é de solidão. Estou colhendo o que plantei, devo admitir. Mas... Tudo bem. Desde o começo dessa trilha, eu já tinha ideia de qual destino estava a me esperar. O que posso fazer é aceitar a minha própria realidade. Deve ser a melhor alternativa a ser adotada...

– Não importa o que eu faça, continuo sentindo esse vazio...  Nada preenche esse vácuo. Não importa o que eu tente, essa dor não desaparece nunca. – falo para mim mesma, ao tocar, levemente, meu seio esquerdo com minha respectiva palma. – Você me faz tanta falta... O que  me diria em um momento desses, Jessie?

Reabro minhas pálpebras. É quando tomo consciência da grande verdade: tudo poderia ter sido diferente. Se eu tivesse continuado com Kardia, os acontecimentos em minha vida não sairiam dos trilhos jamais. O resultado de tantos erros é este: aqui, sozinha, apenas eu e as farpas das minhas decisões erradas. Entretanto, se fosse de tal maneira, se eu ainda estivesse com Kardia, o buraco em meu coração continuaria a existir. Estou cada vez mais crente de que a felicidade é um direito que não possuo. E, sendo assim, fosse lá qual caminho escolhesse, o resultado seria o mesmo para mim: angústia, sofrimento e desilusão.

– Eu juro que tentei buscar um sentido pra tudo, mas não consegui. Acabei me tornando uma louca mesmo. Nem tenho mais ideia do que é certo, do que é errado... – admito para mim mesma, mas pensando em Jessie, como se nesse momento, ela pudesse me ouvir. Se de fato pudesse, apenas saber disso me faria mais feliz. Ou, ao mínimo, me faria capaz de sorrir.

Me levanto. Virando meu corpo para a direção da porta do quarto, decido sair daqui. Descalça e com passos leves, vou indo em direção à cozinha. E, instantes depois, já me encontro nela. Perante a pia e a faca que sobre ela está, a afiada lâmina parece chamar por mim como  o canto de uma bela sereia.

– Eu posso dar um fim a tudo isso, não posso, Jessie? – pergunto, levando minha palma direita para a ponta da faca, acariciando-a com meu dedo indicador. – Por favor, me diga: eu posso dar um fim a tudo isso?

Um sorriso toma conta de mim. Sinto como se ela estivesse aqui, ao meu lado, me apoiando. Sim, você está aqui comigo! Eu posso sentir! Todos eles estão errados: pois eu não estou louca!!!

De repente, me lembro daquele namoradinho do Manigold, Albáfica. Ele tem a mania de comparar as pessoas com rosas. Sinceramente, não vejo lógica total nessa visão. Para mim, flores são flores e pessoas são pessoas. Por outro lado, em parte, quem sabe, talvez... Seja uma opinião coerente. Pode ser que nós, humanos, passemos a vida inteira tentando criar espinhos ao nosso redor, para que possamos nos defender das adversidades. É um instinto natural evitar a exposição do que há no coração que, dentro de nós, bate. A grande questão é: falhamos. Pois, como os das rosas, nossos espinhos são falsos: apenas acúleos que, como máscaras de cristal, se quebram facilmente. A verdade é que as rosas são frágeis e indefesas. É inegável: pelos menos isso, com essas flores, todos nós temos em comum.

– Que assim seja! – grito, agarrando a faca por seu cabo e retirando-a da pia, enquanto me viro de modo brusco e rápido.

Erguendo-a diante de mim, observo a sua atraente ponta, enquanto a minha última decisão do caminho que escolhi um dia se torna cada vez mais nítida entre meus pensamentos. Dúvidas não mais restam. As nebulosas estão se dissipando e minha visão está, finalmente, mais clara. É chegada a hora...

– Pois bem! – exclamo para mim mesma, no mesmo momento em que a seriedade se instala em minha face. – Se esses malditos acúleos insistem nessa farsa e não tenho o que é preciso para arrancá-los à mão... Terei eu que cortar essas flores do mal pela raiz.


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Notas finais do capítulo

Abraços! Espero que tenham gostado^^