A Rosa Que Sangra escrita por Wondernautas


Capítulo 24
As raízes de um sentimento


Notas iniciais do capítulo

Depois de mais de um mês sem nenhuma atualização, estou postando! Perdão a quem ainda acompanha a fic, espero agradar com esse cap, dando inicio a nova temporada. Abraços!



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Me sinto inseguro. Algo está acontecendo, mas nada a ver com as loucuras da Asuka. Na verdade, acho que ficaria até mais contente se fosse.

Albáfica e eu começamos a namorar sério há alguns dias.  Porém, a nossa relação está diferente. Aliás, ele está diferente e é justamente esse o fato que vem me intrigando. Será que meu azulzinho estava mesmo preparado para um namoro sério? Ou a razão de sua repentina mudança é outra?

Pensei, por alguns momentos, em perguntar para ele e colocar tudo em pratos limpos. Mas tive medo da resposta. Manigold, desde quando você é tão frouxo?

- Cara, você tá bem? – questiona meu companheiro de atividades físicas, me tirando do meu mundo de pensamentos e reflexões internas.

- Ah, mais ou menos, Matheus... – respondo, olhando-o por alguns segundos.

- Me chamou de Matheus? Ixi, tem coisa estranha ai... – brinca ele. – Você sempre me chama de Matt, como todo mundo...

Matheus é um amigo. Frequentamos a melhor academia da cidade durante as tardes da semana. Ele também estuda na mesma faculdade em que Albáfica, nossos amigos e eu estudamos.

No momento, nós dois estamos em uma das várias salas de atividade do local. Distanciado dele por alguns centímetros, permaneço correndo na esteira, enquanto ele se movimenta, assentado em um aparelho abdominal.

- Cara, você tem razão. Tem coisa muito estranha sim... – admito. – Só gostaria de saber o que é.

Escuto as risadas comportadas do Matt. Não consigo deixar de me preocupar com essa situação: será que o Albáfica não me ama mais? Essa possibilidade me aterroriza...

- Quem diria que o maior pegador da faculdade, um dia, ficaria desse jeito por outro homem...

Apesar do comentário, não sinto sarcasmo no tom de voz dele. Pelo contrário, uma seriedade contrariadora. Matt é alguém com a mente aberta, sem preconceito algum. Por outro lado, devo admitir que nem mesmo eu sonhava viver uma fase como essa.

- O que está acontecendo? – questiona ele, sem cessar seus movimentos.

Desligo a esteira com a minha mão esquerda. Caso eu persevere com ela no atual estado em que me encontro, posso acabar dando de cara no chão.

- Essa a questão: eu não faço ideia. – falo, um tanto quanto desmotivado, me virando na direção dele e me assentando na esteira, apoiando então meus braços sobre os joelhos.

- Explica melhor... – pede ele, notando meu olhar cabisbaixo.

- Ele está estranho nos últimos dias. Está distante mesmo quando estamos juntos, evita minhas provocações, está saindo comigo cada vez menos...

Matt continua a me ouvir, assim como continua a forçar os braços do aparelho com suas mãos. O esforço para tal tarefa é evidente, comprovado por sua respiração demasiadamente descompassada.

- Não me disse nada, nem me fez nenhuma reclamação. – prossigo – Mas está óbvio que está preferindo sair com a Yuzuriha do que comigo.

- Então é isso. – conclui – Suspeita que ele esteja te traindo...

Não respondo. Meu olhar, para ele, tão afirmativo quanto vazio, dispensa qualquer palavra.

- Você precisa confiar mais no seu taco. – opina – Até porque aquela garota é sem sal demais. Se for para trair, é melhor ter bom gosto, não acha não?

- Ela é gostosa. – brinco, sorrindo.

- Pensei que você também era. – rebate ele, entre risos – Todas geralmente falam isso.

Será? Será que minha preocupação é desnecessária? Será que está tudo normal com o Alba? Será que eu estou procurando penas no canil?

- Vocês se amam. Foi você mesmo quem me disse isso, lembra?

Sim, nós nos amamos sim. Eu não tenho dúvidas. Mas será que o nosso amor é eterno? Temo que, no fundo, ele tenha prazo de validade.

- Manigold, você está me ouvindo? – indaga ele, interrompendo os movimentos e se assentando.

Perdi o foco outra vez, assim como perdi também o meu sorriso. Porém, não foram meus pensamentos em relação ao Albáfica os responsáveis. Não agora.

- Foi mal... – digo, revivendo minha falsa alegria.

- Cara, você está mesmo meio mal...

Matt volta a se dedicar ao aparelho abdominal. Por sorte, ele não percebeu que acabei me perdendo na visão do seu corpo, suado e sem camisa. É um moreno da mesma cor de pele que eu, com um físico tão bem definido quanto o meu e um legítimo pegador, assim como eu era, de cabelos e olhos negros. É inegável o fato de que ele também é bem cobiçado na faculdade.

- Céus, eu é quem estou agindo da pior maneira nisso tudo. – penso, desviando meu olhar para o outro lado.

É a primeira vez que me pego observando outra pessoa, desde quando me entreguei ao meu sentimento pelo Alba e descobri essa minha inclinação “diferenciada”. Quem sabe seja eu quem está confuso nessa história toda?

- Bora ir para um barzinho hoje? – sugere ele, chamando para si o meu olhar, novamente.

- Barzinho?

- É. Se for o caso, você pode descolar uma mina perfeita para devolver a suposta traição.

- Não, dispenso. Eu amo o Albáfica.

- Eu também dizia isso há uns meses trás, quando eu ainda estava com a Bárbara. Só que o amor passou tão rápido quanto chegou.

- Não era amor.

- Foi o que eu percebi depois de tudo. Mas você acha que, enquanto eu estava com ela, eu tinha ideia disso?

Não tenho o que dizer, apenas tenho como fitá-lo: indiferente.

- Tá sem argumentos? – pergunta, irônico.

- Ah, vai pra...

- Opa, olha a boca! – exclama, interrompendo os movimentos com a máquina e se levantando, sério – Deve ser sua falta de modos que está espantando ele, que é tão certinho.

- Preciso conversar com o Albáfica.  – declaro, erguendo-me da esteira, mantendo meu fixo olhar sobre o rosto do Matt.

- Agora que percebeu isso? Já estava demorando, não acha não?

- Acho. Pior que eu acho.

- Manigold, Matt. Tudo certo? – alguém nos cumprimenta.

Nós dois, de pé, guiamos nossos olhares para a direção de onde vem a voz. É o Dohko. Kardia vem logo atrás.

- Tudo mais ou menos. – falo, assim que trocamos nossos descolados cumprimentos.

- Mais ou menos? É você mesmo? – Kardia, cruzando os braços e arqueando suas sobrancelhas.

- É alguma coisa a ver com a tal da Asuka? – Dohko, tentando entender, com a feição preocupada.

- Não. – respondo – Minha relação com o Alba anda meio esquisita.

- Relação esquisita?  - o escorpiano, desta vez - Não estão mais...

- Estamos sim. – o interrompo – Não é esse o problema.

- Então qual é? – o libriano, na aparente tentativa de me ajudar.

- Pessoal, me desculpem, mas já está na minha hora. – Matt se manifesta, ao dar uma rápida olhada no relógio em seu pulso direito.

Cumprimentando cada um de nós, ele se afasta, sendo observado por Kardia e por mim. Suspirando, o namorado de Dégel comenta:

- Cara, se eu não estivesse comprometido, esse ai eu pegava.

- Esse quem? – Dohko, ao olhar para Kardia.

- O Matheus, parceiro! – exclama, jogando seu braço direito ao redor do nosso amigo.

- Queria era ouvir a opinião de um certo aquariano sobre isso. – ao pausar por alguns instantes, prossegue – Além disso, o Matt é hétero.

- O Manigold também era. – debocha. – Mas eu não troco meu Degelinho por ninguém! Amor é outra coisa!

Os dois continuam a dialogar, como se esquecessem da minha presença. Por outro lado, acabo me esquecendo da de ambos. A palavra “amor” que escutei me transfere para outro mundo.

Está sendo dolorosa essa sensação. Não sei definir, mas é como se o meu medo houvesse adquirido, não sei quando, o poder de me desestabilizar totalmente. Mas... Do que tenho medo? Do meu próprio amor. Afinal, se amo o Albáfica, qual a razão de tudo isso estar acontecendo? Será que nosso sentimento, então, é falso? Não nos amamos de verdade?

- Manigold, você tá querendo trocar o Albáfica por alguém e está sem jeito de dispensá-lo? – questiona Kardia, assim que Dohko e ele percebem a minha “navegação em águas desconhecidas”.

Recuperando a objetividade para o meu olhar, decido lhe oferecer a devida resposta:

- Nunca. Mas suspeito de que seja esse o caso dele.

Tenho certeza: meu amor por ele é verdadeiro. Amo o Alba com todas as minhas forças. Deveria eu acreditar na veracidade do que sente por mim, mas está cada vez mais difícil.

- Explica melhor. Somos seus amigos, aliás, somos amigos dos dois. – afirma o “melhor amigo” do Shion.

Respiro fundo. Ainda é difícil falar sobre isso com alguém. O que preciso é discutir esse assunto com o Albáfica. Somente com ele a situação poderá ser esclarecida.

- Estou suspeitando que ele se apaixonou pela Yuzuriha.

- Pela Yuzuriha? – Kardia, boquiaberto.

- É, por ela sim. – confirmo, encarando-o.

- Tem certeza? Eles parecem tão amigos... – Dohko se manifesta.

- Ele e eu também éramos amigos e olha como já estamos hoje...

- Não é só ciúme besta não? – o libriano expõe sua opinião.

- Não sei, não sei! – me exalto – Ele está muito estranho ultimamente.

A mão de Kardia pousa sobre meu ombro direito. Me olhando sério, ele declama:

- Ele não seria louco de te trocar por ela.

- Kardia, você é mesmo um idiota. – afirma o outro, com os olhos entrefechados.

- Bem, já vou indo. Ele saiu mais cedo, foi ao cinema com ela. Preciso estar lá para conversar sobre isso o quanto antes.

- Não fique tão bolado assim, Manigold. – recomenda Dohko, me fitando com solidariedade – Ele te ama, todos nós sabemos disso.

- E caso tenha se apaixonado pela Yuzuriha? Não seria de estranhar, considerando que eles andam unidos demais para o meu gosto.

- Se fosse esse o caso de fato, alguém como ele não esconderia a verdade, nem manteria uma relação já falida apenas por aparência. Ninguém melhor do que você sabe disso.

- Talvez o certo seja “sabia”. – afirmo, movimentando-me em direção a saída da academia – Ele vem mudando tanto que, às vezes, nem o reconheço mais. Até mais pessoal! – exclamo, sem me virar para eles, acenando com as costas da minha mão direita.

Os dois nada dizem, enquanto eu me afasto de ambos. Para falar a verdade, não é necessário. O que falariam seria o mesmo que já ouvi. “Albáfica vê Yuzuriha como amiga, nunca teria nada mais com ela do que apenas amizade”. “Albáfica te ama, nunca te trairia”. “Albáfica é uma pessoa que se dá ao respeito, não se relacionaria com duas pessoas ao mesmo tempo”. “Albáfica é uma pessoa fantástica e por isso lhe conquistou”. Será que tudo na minha vida se resume a ele? Será que me faz bem considera-lo tão importante assim? Não estou errado ao fazê-lo?

- Eu te amo, seu gostoso. – declaro, observando a foto no papel de parede do meu celular. É ele, de lado, atento a tela do computador, assentado em sua amada “cadeirinha da imaginação”. Tirei a foto há algumas semanas, quando atualizava a produção de seu livro.

Continuo atravessando a academia, sem olhar para nada. Tudo o que me importa é observar quem tanto me é precioso na tela do meu aparelho. Em instantes, já me encontro na rua. Cada passo é tão insignificante que chego ao apartamento sem mal perceber.

É o Albáfica, ele quem me faz ficar nesse estado de transe. Apesar de ter observado a fotografia apenas por alguns poucos minutos, meus pensamentos não adotaram outro foco se não o cara mais importante da minha vida.

- Talvez, eu deveria me focar um pouco mais na faculdade. – aconselho, a mim mesmo, fazer tal coisa.

Diante da porta do apartamento, paro e retiro as chaves do meu bolso direito da minha bermuda. A abro e, assim que entro, fecho. Sem pensar mais nada, retiro minhas peças de roupa e as atiro ao sofá. Só o que resta colada em meu corpo é minha cueca preta, que em breve também será abandonada em um canto qualquer. Meu destino é o banheiro, logo a minha frente.

- Mas o quê que é isso!? – me assusto, saltando para trás, assim que entro no banheiro e me deparo com uma visão nada esperada.

É um homem, sem roupa alguma, assentado ao chão, abaixo do chuveiro. O que ele faz? Aquilo que qualquer cara se sente tentado a fazer, quando está sozinho em casa. Mas não é essa a questão, e sim: o que ele faz aqui?

- Dá para você me explicar o que está fazendo?

Ele olha para mim. A expressão de imaculado prazer é substituída por uma súbita vergonha. Catando suas roupas com sua mão direita, jogadas ao seu lado, ele esconde seu baixo ventre e se levanta. Pelo que parece, o interrompi na hora H.

- Me desculpa, Manigold. – pede – O Albáfica me pediu para trazer uns livros para ele, mas aí lembrei que não tinha ninguém em casa e...

Começo a rir em frenesi. Claro, não consigo evitar. Encontrar um dos meus melhores amigos em um flagra como esse é impagável, ainda mais conhecendo a razão da sua “sede de prazer”.

- Quem mandou brigar com o Kardia e fazer greve de sexo, hã?

Ele não responde, com o rosto corado.

- Dá pra ver que uma semana sem ele te deixa louco, né? – provoco, avaliando-o rapidamente.

- Sei que o apartamento não é meu, mas poderia me dar licença para me vestir? – indaga, ignorando minhas brincadeiras.

- Com toda a certeza, meu amigo. – deixo claro, saindo do banheiro e fechando a porta, dando para ele a liberdade de se vestir.

Caminhando para a sala, me assento no sofá. A academia me deixara exausto, mas o hilário momento reviveu toda e qualquer chama de energia que havia se apagado. Posso até dizer que me revigorou e me preparou para a conversa com o Albáfica, a conversa que já não pode esperar mais.

- Me desculpe. – pede ele, saindo do banheiro, após pouco mais de um minuto – Algo semelhante nunca se repetirá.

- Dégel... – o chamo, vendo que ele atravessa a sala e vai, avidamente, em direção a porta.

Ouvindo a minha melancólica voz, ele cessa seus passos, quando sua mão direita já está estendida, bem próxima a maçaneta. Com absoluta certeza, o ser mais inteligente que já conheci em toda a minha vida captara o meu estado de espírito sem que eu precise descrevê-lo. Na realidade, nem mesmo eu saberia completar uma tarefa como essa.

O namorado de Kardia, virando-se para mim, vem calmamente até o sofá e se assenta ao meu lado esquerdo. Normalmente, ele se incomodaria com o fato de conversar comigo agora, estando eu apenas de cueca. Mas um verdadeiro amigo coloca sempre como prioridade ajudar as pessoas com quem compartilha tal amizade. Dégel é assim.

Respiro fundo, como se me preparasse para desabafar mil e uma coisas presas em minha garganta. Olhando profundamente nos olhos dele, pronuncio:

- Preciso muito falar com você...


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