Deuses e Diamantes escrita por André Tornado


Capítulo 16
Surpresas.


Notas iniciais do capítulo

"Preferias que cantasse noutro tom
Que te pintasse o mundo de outra cor.
Que te pusesse aos pés um mundo bom
Que te jurasse amor, o eterno amor."
Rádio Macau, Cantiga de Amor



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Não tinha havido uma noite, mas Goku sentiu, ao despertar, que se tinham passado uma imensidão de horas, que o sol, algures, numa memória distante mas familiar, nascera e que ele precisava de se levantar daquela cama. Espreguiçou-se com espalhafato, deliciando-se com a macieza do colchão. Estavam todos muito bem alojados, disso não havia dúvida.

Estirou os braços por cima da cabeça, abriu a boca emulando uma caverna. Ao querer mexer as pernas, sentiu um peso sobre as coxas e levantou a cabeça. Descobriu o filho mais novo a dormir ferrado, deitado sobre ele, babando-se, ressonando ao de leve, o que lhe arrancou um sorriso. Voltou a cabeça para a esquerda e viu que Trunks também dormia da mesma maneira de Goten, abandonado e inocente, na cama do lado. Voltou a cabeça para a direita e descobriu Vegeta ajeitando uma das luvas. Envergava o seu uniforme de combate e estava com uma cara de poucos amigos.

- Levanta-te, Kakaroto – disse-lhe, sem o encarar. – Temos de saber onde irá acontecer esse famoso torneio.

- Hai, Vegeta… – concordou com pouca convicção.

- Acorda-os.

E, depois, o príncipe escancarou a janela e entrou uma luz radiosa pelo quarto adentro. Debruçou-se sobre o parapeito e ficou a observar o que quer que se visse dali. Trunks resmungou alto, tapando a cabeça com o travesseiro. Goten resvalou simplesmente para o colchão, saindo de cima das pernas do pai, continuando o seu sono profundo. Goku sentou-se na cama, coçou o cabelo, bocejou uma segunda vez. Abanou o filho e chamou pelo filho de Vegeta. Goten entreabriu um olho.

- Hum?...

Goku sorriu-lhe.

- Vamos, levanta-te. Temos um longo dia pela frente.

- O torneio vai começar… hoje, ‘tousan? – Perguntou o miúdo com a voz rouca.

- Não sei. Se calhar… Olha, acorda aí o Trunks, está bem?

- Hai… – respondeu ensonado.

Vegeta continuava a olhar pela janela, demasiado parado. Goku agarrou nas suas botas e começou a calçar-se. O seu estômago protestou e passou uma mão pela barriga.

- Já comia qualquer coisa… O que é que estás a ver, Vegeta?

Como não obteve resposta, juntou-se ao príncipe e olhou também pela janela.

Na verdade, não se via nada. Era uma imensidão ilimitada de branco, que lhes bafejava a cara com um hálito gelado.

Os dois rapazes levantaram-se contrariados e vestiram os respetivos dogi ainda meio adormecidos. Vegeta dirigiu-se para a porta do quarto e Goku fechou a janela. Levou a mão à túnica e retirou o diamante que guardava aí. Estava totalmente inundado pela bolha alaranjada, emitia uma espécie de calor, mas não brilhava. Apertou-o e, ao fazê-lo, sentiu-o amolecer como se tivesse entre os dedos gelatina. Ou algo como um coração. Arrepiou-se.

Focou-se noutro assunto e perguntou:

- Vegeta, não queres comer?

- Eu quero comer, ‘tousan – choramingou Goten e recebeu uma cotovelada de Trunks.

O príncipe carregou uma sobrancelha.

- O que é que se passa? – Ao reparar no diamante, Vegeta acrescentou: – O diamante está a dizer-te alguma coisa?

- Hum… Não. Acho que precisa de comer, tanto como eu.

- Não digas disparates! – Exclamou zangado. – Isso é só uma pedra.

- Mas faz parte de mim…

- Porque é que está dessa cor?

- Não sei… Talvez a Ozilia saiba.

A porta escancarou-se e apareceu a criatura. Indiferente, sobranceira, distante, tinha contudo uma gota de suor discreta na testa, mal tapada por uma trança dourada, que denunciava o seu nervosismo. Envergava um novo vestido, que lhe mostrava os ombros pequenos e redondos, que se abria em folhos cobrindo-lhe as pernas, a emular uma nuvem.

- Pergunta-lhe – provocou o príncipe, sorrindo de viés.

E Goku ia mesmo perguntar-lhe:

- Eh…

Não fosse ela dizer, olhando Goku diretamente nos olhos:

- Vem comigo, saiya-jin.

- Pelos vistos, os deuses não conhecem as regras da boa-educação – tornou a provocar o príncipe, mas desta feita num tom zangado. – Entras aqui sem bater à porta, nem sequer um cumprimento e desatas a dar ordens.

Ela ignorou-o e Vegeta rosnou.

Goku disse:

- Não saias daqui, por favor. Eu… já venho. Cuida dos rapazes.

Vegeta rosnou mais alto.

Gohan acabava de sair do seu quarto e viu-o a seguir a criatura. Interpelou-o curioso:

- ‘Tousan, onde vais?

Mas Goku abanou a cabeça, levantou um braço, fazendo-lhe sinal que ficasse e que não o seguisse. Viu a silhueta de Piccolo atrás do filho mais velho. A porta do quarto dos dois humanos artificiais estava fechada e como eles não emitiam ki, ou pelo menos uma aura muito percetível, pois gostavam de esconder a sua parte mais humana, não conseguiu dizer se eles estavam ali dentro, ou não. Mas deveriam estar. Para onde poderiam ter ido? Eram tão estrangeiros quanto ele naquele mundo.

Acariciou a barriga que estava mais vazia que um balão furado. Esperava que o lugar para onde a Ozilia o levava tivesse comida, porque ele estava, realmente, cheio de fome.

***

Gohan espreitou para dentro do quarto do pai e descobriu Vegeta encostado à parede, com um pé assente nesta, braços cruzados, carrancudo e de olhos fechados. Goten e Trunks pararam com os cochichos quando o viram espreitar. Ficaram ainda mais empertigados ao repararem que Piccolo vinha logo atrás.

- O que foi que aconteceu, Goten-kun? – Perguntou Gohan.

- Foi a Ozilia, nii-chan. Apareceu aqui e quis que o otousan fosse com ela. Acho que foi por causa do diamante.

- Do diamante?

- Hai – disse Trunks. – O diamante de Goku-san estava cor-de-laranja.

Gohan espreitou por cima do ombro. Piccolo negou com a cabeça, indicando que desconhecia o que poderia estar a acontecer para Ozilia ter convocado Son Goku. Não considerou perguntar a Vegeta. Estava demasiado calado e, pelo estilo, irritado, o que indicava que também não sabia de nada.

- Nii-chan?

Olhou para Goten que saltitou até ele.

- Vai acontecer alguma coisa ao ‘tousan?

- Não, Goten. Ele deve ter ido encontrar-se com o deus Lux e Ozilia veio buscá-lo. Só isso.

- E esse Lux é mau?

- Acho que não… Não, não é mau. Porque é que dizes isso?

- Ele é um deus que esmaga galáxias com um dedo.

- Nani?

- Foi o que Goku-san disse quando esteve na minha casa – explicou Trunks.

- Mas estamos aqui… para um torneio – gaguejou Gohan. – Foi Lux que nos convidou. Ele não… vai ser mau anfitrião.

Olhou para Piccolo que tinha uma cara tão fechada quanto a de Vegeta, procurando apoio para o que tinha acabado de dizer. Pois ele não acreditava nas próprias palavras e corou ligeiramente por estar a mentir ao irmão. Respirou fundo e prosseguiu:

- Os torneios têm regras e vai ser só uma exibição de luta. Esse Lux deve estar aborrecido, ou coisa parecida. Eh… Esmagar galáxias já não deve ser entretenha, prefere juntar os melhores guerreiros do Universo para que lutem entre si para ele assistir. Vai ser um torneio curto, vão ver… Nós somos muito fortes e vamos eliminar a concorrência facilmente. Vamos ganhar todos os troféus… Não querem levar uma lembrança deste mundo para casa? Vai ser especial, vão ver. Claro que acredito que existam guerreiros tão poderosos quanto nós, pois nós viemos da galáxia do Norte e poderão existir lutadores equivalentes nas outras galáxias… Lembras-te, Goten, quando o pai nos contou sobre aquele torneio do Outro Mundo em que conheceu Pikkon? Pois, acredito que este torneio vai ser parecido. Vai ser… – Mordeu a língua ao dizê-lo, porque estava a ser um mentiroso descarado. – Vai ser divertido.

- Nós somos prisioneiros, não somos convidados de Lux.

 O timbre suave, mas frio, da voz de número 18 fez Gohan voltar-se. Descobriu os dois gémeos na porta do quarto. Observavam a cena e escutavam a conversa. Não sabia há quanto tempo estariam ali, mas sentiu-se incomodado por as suas mentiras terem alcançado outros ouvidos que não os do irmão, do amigo do irmão, de Vegeta e de Piccolo. Corou, apanhado naquela declaração inventada. Número 17 infundiu-lhe um arrepio desagradável. A olhar para ele estático, um rosto inexpressivo, olhos fixos e sem pestanejar, aquele lenço vermelho ao pescoço, braços cruzados, pareceu-lhe um boneco mortífero. Fora-o em tempos… Continuava poderoso, tinha a certeza, Gohan era mais poderoso do que ele, tinha maiores certezas ainda, mas aquele ambiente tenso estava a deixá-lo inquieto. Resolveu interpelá-lo:

- A deusa que nos acompanha é tua amiga.

As íris azul-marinho de número 17 moveram-se ligeiramente, como que para focarem melhor o alvo.

- Ozilia está do nosso lado e ela vai ajudar-nos.

- Ela não nos vai ajudar – respondeu número 17 utilizando o mesmo timbre suave, mas frio, de número 18. – Ela não nos deve qualquer lealdade. Está aqui pelos seus próprios motivos. Nós não vamos interferir nos assuntos dela e ela não interferirá nos nossos.

- Mas o meu pai está aqui para… ajudá-la a lutar contra Lux.

- Estamos aqui para participar num torneio.

- A boneca tem razão – disse Vegeta continuando encostado à parede, de olhos fechados e referia-se a número 18. – Somos prisioneiros. Estamos aqui encerrados e não nos podemos mover livremente. Essa é a minha definição de prisioneiro.

- Devemos esperar por Goku – disse Piccolo conciliador, mas nervoso.

- Hai, devemos esperar por ele – concordou Vegeta entre dentes. – Ele é que tem o maldito diamante que nos poderá tirar daqui.

Trunks sentou-se na beira da cama, assentando o queixo nas duas mãos, com um longo suspiro de enfado que não procurou disfarçar. Goten sentou-se ao lado dele, a fazer beicinho, tão enfadado quanto o amigo.

Gohan cruzou os braços e acrescentou:

- Acredito que o meu pai não se vai demorar.

Número 17 e número 18 entraram no quarto e encostaram-se à parede oposta àquela onde estava Vegeta.

A tensão era palpável no ar, mas cada um reservou os seus pensamentos para si, recolhendo-se no seu silêncio particular, autocontrolando-se, serenando os maus pressentimentos, reservando o ki, à espera de novidades e à espera de Son Goku.

***

A caminhar à sua frente, sem se voltar, Ozilia revelou em surdina, um murmúrio que ele teve dificuldade em escutar:

- Os deuses estão a interligar-se a ti. É por isso que o teu diamante está dessa cor.

O diamante que segurava na mão direita estava cada vez mais vivo e alaranjado. Pelo menos não estava mole e era um alívio. Não conseguia era perceber onde estariam aqueles deuses de que falava Ozilia, pois andavam os dois por um longo corredor abobadado, largo, forrado de uma pedra verde, sem qualquer tipo de iluminação, mas todos os detalhes estavam perfeitamente visíveis. Ele olhou para as suas botas pretas. Cada passo ecoava naquelas paredes verdes de uma forma sinistra.

- Para onde estamos a ir?

- Verás.

- Porque é que os deuses se querem interligar a mim?

- Tu estás aqui comigo e os clãs começam a agitar-se.

- Hum… Sabem qual é a principal razão de eu estar aqui?

- Sempre souberam.

- Então, Lux… Também sabe?

- Claro.

Goku engoliu em seco. Teria preferido o efeito surpresa…

- E o que é que está a acontecer?

Ozilia parou. Sorriu-lhe e pousou uma mão no peito dele, mesmo sobre o coração. Os dedos finos dela eram quentes e o calor penetrava fundo e talvez fosse essa a intenção da criatura. Goku sentiu-se esquisito ao ser tocado por ela.

- Lux está a preparar um torneio. Apenas isso.

As sobrancelhas de Goku uniram-se sobre o nariz. Uma minúscula gota de suor surgiu-lhe na testa.

- Nani?...

- Apenas isso, saiya-jin.

Depois, ela afastou-se e ele sentiu que ela levara, nos dedos finos, todo o calor do peito e do corpo inteiro. O diamante estremeceu na sua mão, lançando um fiapo de luz para o ar. O diamante que ela usava agora pendurado ao pescoço também brilhou. A forma de os deuses se interligarem com ele, pensou Goku. E só. Aquela situação estava a baralhá-lo.

O corredor terminava numa porta dupla, a acompanhar a altura do teto, também redonda no cimo. Exibia duas argolas de ferro e encontrava-se ladeada por duas colunas grossas onde se enrolavam plantas trepadeiras, o que era demasiado estranho pois não havia terra onde pudessem estar enterradas as raízes, mas aquilo eram plantas verdadeiras. Junto às colunas ardia uma tocha, uma de cada lado, e ao ver a luz do fogo Goku encantou-se.

- Tudo ilusão, saiya-jin – disse Ozilia. – No mundo dos deuses não existem limitações físicas, como expliquei uma vez, mas Lux pretende receber-te num ambiente que possas reconhecer.

- Ah… Este Palácio do Tempo é diferente de qualquer lugar que eu já conheci, é verdade. Mas se o Lux sabe por que razão estou aqui, porque é que me está a receber desta maneira?

- Para que não te sintas limitado. Ele quer-te no teu máximo poder.

O que poderia ser potencialmente prejudicial, analisou ele. Lux não o faria para que lhe fosse desvantajoso, pelo contrário. Estendia uma armadilha de conforto, de possível reconhecimento, mas era tudo uma ilusão, como Ozilia dissera. Goku armou as suas defesas interiores. O diamante estremeceu outra vez.

Ozilia assentou as mãos nas duas metades da porta e empurrou.

Apresentou-se um salão descomunal, mergulhado numa nuvem de fumo. Uma mesa comprida dominava o salão e o seu tampo estava repleto de iguarias diversas. Goku sentiu o estômago colar-se às costas. Nunca tinha visto tanta comida junta e estava com uma fome de cavalo. Mas a mesa estava ocupada, os lugares totalmente preenchidos por um conjunto eclético de seres estranhos, de diversos tamanhos, cores e feitios, acotovelando-se para disfrutar da farta refeição que lhes estava a ser oferecida por quem se sentava num trono posto num palanque, no extremo mais afastado da mesa.

Num primeiro momento, Goku julgou tratar-se de Lux, mas depois verificou que era Valo que presidia àquele banquete. Ele apertou os dentes. Estava incrivelmente esfomeado.

Os seres pareciam tão esfomeados quanto ele. Nem levantaram a cabeça dos respetivos pratos quando a porta se abriu e devoravam a comida fazendo um barulho ensurdecedor, grunhindo e bufando, espalhando pedaços por todo o lado, emporcalhando tudo em redor. Goku começou a analisar uma maneira de conseguir alcançar uma das bandejas para poder também ele comer qualquer coisa, pois os lugares estavam todos preenchidos e não havia uma nesga que pudesse utilizar para se sentar àquela mesa. A companhia asquerosa não o incomodou, estava disposto a suportar aqueles alarves para matar a fome que o atormentava. Mas Ozilia fez-lhe sinal com uma mão para que a seguisse e ele soltou um suspiro desanimado. A boca encheu-se-lhe de saliva.

- Bela Ozilia!

A deusa olhou para o lado esquerdo. Uma criatura humanoide, envergando uma couraça sobre uma túnica larga, saltou de um recanto da parede e aproximou-se deles. Era também um deus, pois usava um diamante pendurado num colar. Moveu-se deslizando, com delicadeza, mas seria tudo menos delicado. Era um guerreiro, apercebeu-se Goku e muito poderoso. Seria parente de Valo, pois havia semelhanças entre eles, traços incrivelmente iguais partilhados por ambos os rostos.

- Ouvi que tinhas regressado, mas jurei apenas acreditar quando te visse.

- Argia – ciciou Ozilia.

- Não existe outra deusa mais bela do que tu. Sem dúvida.

Tomou-lhe uma das mãos e fê-la rodopiar. Ela rosnou, mostrando os dentes.

- E a tua presença fez-nos falta.

- Não saí de livre vontade.

- Ah! Bela, mas terrivelmente rebelde. Um problema… Mas eu conseguiria satisfazer-te os desejos.

Ela sacudiu a mão e soltou-se dele. Continuava furiosa, o diamante a faiscar dardos rosáceos de luz.

- Aceito! Se conseguires convencer o teu irmão a desistir desta loucura.

Ele inclinou a cabeça ligeiramente, semicerrando os olhos amendoados numa expressão trocista.

- Nunca te julguei idiota, Ozilia. Impulsiva, sim, mas dedicada a uma causa inferior não combina contigo. Existe mais em ti do que parece à primeira vista. E isso torna-te ainda mais bela.

- Talvez vocês me tenham empurrado para a idiotice.

- E deixavas-te corromper dessa forma tão mesquinha?

- Parece que a corrupção é norma entre os clãs, agora. Não fui eu que comecei a tradição.

- Cada vez te adoro mais.

De repente, o deus voltou-se para Goku mudando para uma expressão neutra. Fez-lhe uma vénia cortês, dobrando as costas como num passe de dança.

- Saiya-jin, perdoa a minha má educação. Agradeço a tua presença nos nossos humildes domínios.

Goku disse inquieto:

- Ah… Yo… Chamas-te Argia, não é?

- Ao teu dispor. – Olhou para Ozilia, novamente com um olhar melado. – Não acredito que tenhas sacrificado tudo… por ele.

- Talvez tenhas uma surpresa.

- Já estou surpreendido.

Ela entrelaçou o braço no de Goku e puxou-o.

- Voltaremos a ver-nos, Argia.

- Conto com isso, Ozilia.

Dirigiram-se, de braço dado, para o palanque onde Valo os tinha estado a observar. O diamante de Ozilia acalmou-se, o de Goku borbulhava incandescente. O aroma da comida entrou-lhe repentinamente pelas narinas e o seu estômago roncou.

- Não posso comer qualquer coisita? – Perguntou num lamento. – Estou cheio de fome…

- Não deves tocar em nada do que está a ser servido aqui.

- Ahn? Porquê?

- Os deuses estão a alimentar os seus escravos. Tu não vais querer ser um deles, saiya-jin.

Goku fez uma careta. Lembrou-se do que tinha comido na noite anterior e perguntou-se se aquele aviso também seria verdade para todos os alimentos que eram disponibilizados dentro daquele palácio.

Valo levantou-se do trono. Assim que o fez, todos os seres que se alimentavam com uma ferocidade que rivalizava com qualquer saiya-jin faminto, pararam de comer e caiu um silêncio tumular no salão. Quando Goku olhou, a mesa estava, inexplicavelmente, vazia.

O palanque cobria-se com uma alcatifa púrpura e acedia-se a este por meio de pequenos degraus forrados. O trono, onde o deus estivera sentado, era feito de ouro, com um espaldar alto decorado com desenhos embutidos no próprio metal. Valo desceu os degraus como se levitasse, arrastando a cauda do enorme manto branco que lhe cobria os ombros com uma majestade impressionante. O diamante que ostentava era negro como um carvão. Estava mortalmente sério e assustador, mas Goku não se deixou intimidar. Ozilia continuava enroscada no braço dele e tentou sacudi-la, mas o diamante que tinha na mão atrapalhou-o. Tal como Argia, Valo também lhe fez uma vénia.

- Saiya-jin. Espero que tu e os teus companheiros estejam bem alojados.

- Hai… Está tudo bem.

Valo estendeu-lhe um pequeno cartão preto que entalava delicadamente entre o polegar e dois dedos, as unhas amarelas. Goku recebeu o cartão com a boca, pois tinha as mãos ocupadas, uma com Ozilia, a outra com o diamante. Valo não expressou qualquer sinal de contrariedade, surpresa ou despeito. Manteve uma máscara neutra afivelada ao rosto oval, que poderia ser considerado perfeito. Mas sorriu afável para a deusa.

- Bela Ozilia. Começas a provocar-me ciúmes.

- Preferia que fosse terror.

- Sabes que isso será impossível. Mas a tentativa é louvável, sem dúvida. Lux está agradado.

- Também não está aterrorizado?

- Dificilmente. Ele vai querer ver-te.

- E eu estarei disponível para o grande Lux.

- Totalmente… disponível?

- Totalmente.

Valo encarou Goku com indiferença. Ele piscou os olhos. Gostaria de poder falar, mas tinha o cartão entre os lábios. Segurou-o com os dentes e foi capaz de sorrir. O diamante arrefeceu repentinamente e, pelo canto do olho, viu que escurecia. A pedra de Valo, no entanto, começava a clarear. Os deuses interligavam-se com os diamantes, recordou.

Valo explicou:

- Tu e os teus companheiros acedem ao recinto do torneio com o auxílio desse cartão. Deverás inseri-lo na coluna prateada que se encontra no teu quarto. Só tu o poderás utilizar, já que és o único que possuis o diamante dos deuses. Se qualquer outro dos teus companheiros utilizar o cartão, será desintegrado. Esperamos pelos bravos guerreiros da galáxia do Norte daqui a duas horas para o sorteio. Não se atrasem, ou Lux entenderá o atraso como uma ofensa pessoal.

Abriu um braço num gesto abrangente, indicando a mesa nua rodeada de seres mudos e cabisbaixos. Um arrepio incomodou Goku.

- Os nossos guerreiros. Ozilia disse-te que são escravos, mas eles são livres de lutar pelo nosso estandarte. Espero que te satisfaças com a sua têmpera e as suas habilidades. O grande Lux pretende espetáculo.

Acrescentou após uma curta pausa:

- O torneio vai começar dentro de duas horas. Compreendido?

Goku assentiu com a cabeça, a indicar que compreendera. Dobrou o pescoço numa vénia, para responder à vénia de despedida de Valo. Ozilia forçou-o a dar meia volta, puxando-o pelo braço.

- Ah, saiya-jin!...

- Hum? – Goku olhou por cima do ombro.

Valo mostrava-lhe um sorriso impercetível.

- Tens comida preparada na antecâmara dos vossos alojamentos. Não quero que tenham fome durante a vossa estadia no Palácio do Tempo. Lembra-te: vocês são os convidados especiais do grande Lux.


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Notas finais do capítulo

E tivemos a apresentação do terceiro deus, Argia, que significa luz no idioma basco, o guerreiro. Com Lux, o tirano, e Valo, o mensageiro, está composta a tríade divina desta história.

Próximo capítulo:
Sorteio.



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