Último Romance escrita por Marina R


Capítulo 48
Capítulo 48


Notas iniciais do capítulo

Vocês sabem de cor que eu demoro para escrever, IMAGINA PARA FAZER O ÚLTIMO CAPÍTULO DA MINHA FIC?! Lerdei mas acho que o resultado foi satisfatório, espero que gostem



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/346970/chapter/48

Salto alto, vestido, maquiagem, jóias, e um quilo de vontade: minha lista de compras na semana antes da formatura. Eu, sinceramente, não entendia o porquê que meninas colocavam tanto esforço numa festa. Por mim, a formatura poderia apenas ter bufê, música, e todo mundo colocaria uma roupa solta e comum. Não seria ótimo?

Eu estava quase desistindo de ir nessa baboseira, quando Camila me ligou para insistir que eu a acompanhasse até o shopping. Disse não, porém ela já estava me esperando na calçada. Vesti uma roupa melhor, muito emburrada, e fui com ela.

Não levei dinheiro porque não queria ter que lidar com compras naquele momento. Na verdade, não queria lidar com nada! Estava finalmente de férias, finalmente livre do colégio! Cadê meu tempo livre e minha paz?

– Juliana, você não vai olhar nenhuma roupa? - perguntou Camila, enquanto eu estava sentada num banco e ela dentro do provador.

–Não.

– Porque? Já encontrou um vestido legal?

– Sim, vou com aquele rendado amarelo comprido, da minha mãe. As botas prateadas dela para combinar.

– O quê?! - berrou ela, fazendo a vendedora, que estava por perto, pular - Me diz que você está brincando!

– Claro que eu estou, Camila, pelo amor de Deus. Não achei vestido e não quero achar.

– Juliana, não vai dar para você furar com o Alex - disse ela - Vem fechar o zíper aqui, por favor?

Fui até o provador e entrei. Enquanto eu puxava, Camila continuou falando:

– Você prometeu que ia pra formatura com ele.

– Eu sei - respondi, vendo ela se apreciar no espelho - Mas eu não quero. Só queria gastar meu convite.

– É, e o outro você deu pro tio do Rodrigo, não é?

– Avô.

– Que burrice, deveria ter vendido.

– Eu ia, mas o Rô tava precisando... A família dele é muito grande e ele é próximo de todos, você sabe.

– Ah tá, essa é a única razão - comentou ela, num tom de sarcasmo claro.

Camila abriu a cortina e foi se ver no espelho gigante que a loja tinha. Balançou seu cabelo enrolado nas pontas, e se ajeitou dentro da roupa. O vestido era feito por paetês pretos e dourados, com um decote em V que Camila parecia amar.

– O quê você quer dizer? - perguntei.

– É óbvio que você deu o convite para agradar o Rodrigo. Também é óbvio que você está com ciúmes porque ele vai com a Laura.

– Não estou - falei, e ela virou de costas para o espelho para ver como ficava por trás - Não tem sentido, eu que falei para ele ir com a Laura.

– E aposto que você se arrependeu.

Camila virou-se e voltou para o provador, mas antes pediu para eu abrir o vestido. Fechou a cortina e eu retruquei:

– Você está insinuando que eu estou gostando do Rodrigo?

– Não. Eu estou falando que agora que você enxergou que ele está seguindo em frente, em vez de ficar sofrendo por sua causa, você está com saudade do tempo que tinha sua atenção total.

Fiquei calada. OK, aquilo provavelmente era verdade. Porém eu teria que engolir, pois não ia atrapalhar Rodrigo dessa vez. Eu não estava apaixonada por ele, tinha quase certeza disto, então não ia meter meu nariz só porque tive um momento de carência.

Camila saiu do provador vestindo suas roupas normais, e disse que nenhum dos vestidos era bom. Eu discordei, dizendo que todos os sete vestidos provados eram lindos. Então ela disse, séria:

– Não lindos suficiente para a formatura.

Nós passamos por mais umas três lojas, e em todas Camila experimentava diversos vestidos enquanto eu me sentava e bocejava alto. Acabou comprando um vestido simplesmente perfeito, na última loja. Preto e justo, com brilhos pequenos por toda a cobertura.

Eu já estava exausta de tanto caminhar pelo shopping, mas a garota insistiu que eu parasse de andar em direção ao estacionamento. Arrastou-me até uma loja que tínhamos passado, mais uma que eu havia ignorado a existência.

– Não me diga que você vai querer trocar de vestido? - perguntei, antes dela forçar meu rosto para eu olhar a vitrine da loja.

– Não vou. Você que vai comprar agora.

Então eu vi. O vestido mais lindo encaixado num manequim rosa-shock. Era branco e com um decote meio ousado que me fez duvidar, mas nada vulgar demais. A cintura era marcada e depois, uma saia com rendas adoráveis, que acabava antes do joelho. Era sem manga, e o recorte era maravilhoso. Por um segundo, achei ser simples demais para uma formatura, mas então Camila me obrigou a experimentar.

O vestido era o último da loja, e coube perfeitamente em mim, o que eu achei surpreendente ótimo. Fiquei sem jeito para sair do provador, por pensar que eu estava muito exposta por causa do decote. Camila mudou a situação, puxando meu braço. Meus peitos quase pularam para fora e, por pouco, eu não cai no chão. Ainda bem que a minha carinhosa amiga me ajudou antes que um mico fosse cometido.

Ela ajeitou o meu vestido e tirou o cabelo do rosto. A vendedora veio e abriu a boca, com um grande sorriso:

– Você está uma boneca! - disse a mulher, revelando sua voz grossa - Tem que comprar!

– Moça, você tem um salto rosa? - falou Camila, sem paciência.

A mulher balançou o rosto laranja por causa do bronzeado artificial, e rebolou para longe de nós. Camila não demonstrou emoções quando pegou no meu cabelo e arrumou-o, pegando em seguida um grampo que segurou minhas mechas no topo da cabeça. Camila saiu de perto e me deixou, descalça e exposta, na frente de um espelho inclinado.

Voltou em dois minutos, com muita bijuteria nas mãos, e a vendedora atrás segurando um sapato. Foi um pouco assustador vê-las se aproximando de mim, com aqueles olhos arregalados! Ainda mais medonho quando a vendedora fez força na minha perna, para que eu levantasse o pé e colocasse o salto. Depois, Camila me agarrou pelo punho e colocou pulseiras brilhantes, incríveis. Quando elas se afastaram, pude ter uma noção de como eu ficaria na noite de formatura.

E eu estava linda. Meus olhos brilharam ao ver como tudo combinava. O branco se fundiu com a minha pele. Avistei os brilhantes ao redor do meu pulso. O decote, que antes tinha me deixado incomodada, agora dava-me poder e confiança.

Dei uma pirueta depois que a vendedora me pedir para fazer tal coisa, e Camila me olhou como se estivesse orgulhosa do resultado. Alegre com a sua mais nova criação.
Sem dinheiro, devi a Camila. Compramos tudo e colocamos numa sacola amarela, agradecidas pela promoção que acontecia naquela semana. Fomos para casa em seguida.

Dentro de alguns dias, houve a cerimônia, a qual foi muito chata. Lá, era só colocar a beca e estar presente quando fosse pegar seu diploma. Quase tropecei quando fui fazê-lo, por causa de um flash que ardeu meus olhos.

As partes boas foram quando alguns professores fizeram discursos engraçados, e quando a turma se despediu. Sei que soa horrível, porém eu fiquei muito feliz com o fato que não teria mais que vê-los. Tudo bem, provavelmente esbarraria neles pela cidade, ou numa reunião daqui a vinte anos, onde todos exibiriam seus trabalhos e salários, colocando num cofre trancado seus fracassos.

Dois dias depois, era o grande dia. Uma ligação às oito da manhã me fez acordar. Era Alex. Sua voz desanimada me fez duvidar se o combinado estava de pé.

– Devo buscar você, Rodrigo e a acompanhante dele, certo? - confirmou ele.

– Sim.

– Porque eu estou fazendo isso mesmo? - as palavras saiam atrapalhadas e arrastadas da boca - Rodrigo não tem carona?

– Não. Os pais vão de carro buscar os avós, que moram numa cidade a algumas horas daqui. Vão hoje à tarde para voltarem na hora da festa.

– Ah. É porque você quer agradá-lo, entendi.

– Não é bem isso, é que...

– Juliana - ele deu um riso abafado - Poupa a voz. Vocês são melhores amigos... "Uma mão lava a outra." Enfim, onde a menina mora?

– No começo da cidade. Depois mando o endereço por mensagem.

– Então eu terei que buscá-la primeiro, senão a viagem vai ficar comprida à toa.

Concordei e ele perguntou se eu estava animada. Não soube responder. Desligamos minutos depois.

Passei metade da tarde no salão, ao lado de Camila, nós sendo paparicadas. Pintamos as unhas, escovamos os cabelos, e depilamos todas as partes do corpo possíveis. O último fato não foi nada agradável, porém necessário.

Em casa, minha mãe estava especialmente sensível. Ficava meio tristonha de vez em quando, abraçava-me sempre quando podia, e perguntava incessantemente se depois que eu fosse pra faculdade, eu sumiria. Todas as vezes eu não sabia muito o que dizer, e ficava sem jeito. Eu nem tinha certeza se conseguiria passar para alguma faculdade, muito menos se eu continuaria em casa, na mesma cidade...

Quando ela me viu, já com o vestido posto e de rosto maquiado, só faltou se afogar nas lágrimas.

– Você cresceu tão rápido, Juzinha - disse minha mãe, enxugando o rosto e colocando seu braço em volta da minha cintura - Parece que foi ontem que você nasceu, e agora você já se formou e tudo!

Meu pai chegou e me olhou de cima a baixo, sorrindo com os olhos marejados. Veio até nós pronto para se juntar ao abraço coletivo.

– Você está linda, filha - disse ele, depois de limpar a garganta - Estamos muito orgulhosos de você.

– Estamos mesmo - confirmou minha mãe, em meio a soluços - Mas você sabe que seu pai deve ter odiado esse decote.

Ele rompeu o abraço e respirou fundo antes de olhar feio para a esposa. Ela sorriu torto e nós três acabamos rindo. Nesse segundo, a campainha tocou, e meu pai disse:

– Deve ser o Rodrigo. Termina aí de se vestir, Ju, e desce.

Minha mãe me ajudou nos últimos detalhes. Coloquei o salto e estava pronta pra ir. Com medo de cair da escada, agarrei-me ao corrimão e vi, de longe, Rodrigo e meu pai conversando e rindo no andar de baixo. Ambos homens estavam bem vestidos, porém Rodrigo destacou-se ao meu ver, com seu terno cinza e gravata preta. Meu coração foi até a garganta quando o garoto transferiu o olhar para mim, analisando minha descida desconfortável. Seus olhos percorreram meu corpo e eu senti calafrios. Rodrigo caminhou até o fim da escada, quando eu estava nos últimos degraus, sem tirar os olhos de mim. Estendeu a mão antes de eu pisar efetivamente no chão.

– Você está... - falou Rodrigo, descendo os olhos.

– Obrigada - respondi, colocando o cabelo para trás da orelha - Você também está.

Ele riu e um momento estranho surgiu, nós dois com os olhos fixos no outro. Eu queria parar de olhá-lo só que era como se eu estava sendo hipnotizada - algo que Rodrigo conseguia fazer facilmente. Na verdade, aquilo parecia mais um jogo: quem desviar os olhar primeiro, perde. Depois de alguns segundos, desisti, bem a tempo da minha mãe chegar com uma câmera fotográfica.

– Tá bem, se juntem e vamos tirar algumas fotos! - falou a mulher, quase pulando de excitação. Quando viu nossas feições desanimadas, magoou-se - Meninos, formatura é um dia único em suas vidas! Temos que ter lembranças dele, não é? Agora, Juliana, segura o braço do Rodrigo para a foto e digam xis.

Obedeci ela, sem vontade de contrariar, e coloquei minha mão nos bíceps do garoto. O flash irritou meus olhos, ainda mais porque minha mãe quis tirar três fotos em sequência.

– Não deviam chamar os outros? - disse ela - Alex e a sua namorada, Rodrigo. Eles não estão num carro lá fora, esperando?

– Ah! - disse Rô, lembrando-se - É, sim. Eu vim aqui te chamar, Ju, porque eles já chegaram. Queria te avisar.

– Hm, então vamos lá.

– Nada disso - falou minha mãe - Chamem-os aqui, quero tirar mais fotos.

E eles vieram, depois de Rodrigo ir até o carro convencê-los. Quando me viu, Alex levantou as sobrancelhas, e sussurrou, em meio ao abraço:

– Caprichou, huh? Não precisa disso tudo pra chamar a atenção do Rodrigo. É só deixar a alça do sutiã à mostra. Ou acordar com o cabelo desgrenhado.

Revirei os olhos e sorri com os lábios franzidos. Avistei Rodrigo conversando com Laura, a qual estava deslumbrante, com um vestido da cor de seus cabelos de fogo. Eles deram um abraço e Rodrigo beijou a bochecha salpicada de sardas dela.

– Juliana complicou as coisas para mim - disse Alex, logo depois que deu olá para meus pais - Estava certo que a Laura iria ser a garota mais bonita da formatura, porém agora estou com sérias dúvidas.

– Ah, ele é meigo agora - disse Laura, referindo-se ao garoto de cabelo encaracolado - Mas no carro nós não paramos de discutir. Ele ficou o tempo inteiro contrariando minhas opiniões.

– Porque suas opiniões são equivocadas.

Alex sorriu, provocante, e Laura revidou.

– Mas entre a mais linda, eu e a Laura, ela ganha fácil - comentei, sendo honesta, e a ruiva abriu um enorme sorriso.

– Modéstia ganha vários pontos, Juliana - respondeu Alex - Mas será que isso foi uma tática para ganhar minha total afeição e conseguir o título de garota mais bonita da festa?

– Será? - indaguei, depois de rir alto e ver minha mãe se aproximando com a máquina.

Fizemos várias poses, cada uma pior que a outra, cada uma saindo da mente criativa da minha mãe. Eu fiquei no colo do Alex, encostei nas costas da Laura, fiz simbolo da paz, tudo encomendado e ordenado. Agradeci quando finalmente saí de casa, logo depois que minha mãe avisou que chegaria com meu pai uma hora depois. Assim que pisaram no gramado, meus amigos gargalharam, dizendo que ela era "uma figura". É, imaginem conviver com aquela figura todos os dias da sua vida!

O carro do Alex estava limpo porém desorganizado, como de costume. Rodrigo se sentou com a acompanhante atrás, e eu fui no banco da frente. Depois de acelerar, Alex já ligou o rádio e colocou um CD para tocar. Uma música de rock preencheu nossos ouvidos.

– The Smiths? - gritou Laura, tirando o cinto de segurança para chegar perto.

– Sim, a melhor banda da face da Terra - respondeu Alex, freando por causa de um quebra-molas.

– Desculpa, porém a melhor banda é The Cure, com certeza. Diria o The Smiths se eles não copiassem tanto o The Cure.

– Copiassem? O quê?! Como eles podem copiar se eles vieram antes?

– Alex, você está bêbado? - perguntou Laura, séria - The Cure surgiu nos anos setenta, The Smiths, oitenta.

– Claro que não!

– Claro que sim. Mais especificamente, setenta e seis. Não vou discutir sobre isso mais, é óbvio que The Cure é superior. Além do cantor ser um ícone por causa do seu estilo irreverente e único, as letras são bem melhores.

– Você quer mesmo falar mal das letras do The Smiths?

– Não as acho ruins, mas eu não aguento ouvir canções apenas sobre coração partido e ah-como-eu-sou-solitário-buá-buá.

Alex virou o rosto e abriu um sorriso, claramente impressionado. Levantou os ombros, rendendo-se. E então eles começaram a debater sobre outras bandas, Vampire Weekend e Foster The People, e eu e Rodrigo continuamos quietos. No meio da discussão, eu olhei para Rodrigo e fiz uma careta, uma expressão pedindo ajuda. Ele riu por um bom tempo, tentando abafar a risada para não chamar a atenção.

Observei na ida, o vasto céu cor de veludo azul. A noite era chuvosa e fria. Os bueiros cobertos por sacos plásticos fizeram a água quase subir o paralelepípedo. Os pingos de chuva percorriam a janela do carro como aquarela num papel, e as motos separavam a água marrom como se fossem tesouras afiadas.

Quando avistei árvores enfileiradas a poucos metros de distância, também vi o prédio branco e bem iluminado. Chegamos.

O estacionamento estava caótico, e nós demoramos bastante para encontrar uma vaga.

Nossa sorte era que Laura havia visto a previsão meteorológica no jornal do meio dia, e viu a probabilidade altíssima de chover. Por isso, trouxe quatro guarda-chuvas.

Com cuidado de não pisar em poças, chegamos na entrada glamorosa. Demos nossos convites individuais e nos deparamos com um salão gigantesco. A decoração era composta por tons creme e pastéis, na parte das mesas e recepção. Já no lado do bar e pista de dança, brilhosas cores escuras. A festa já estava cheia e a música pop, incrivelmente alta.

Depois de cumprimentar os colegas de classe, encontrei Camila e Rafael numa mesa, decorada por um vaso de vidro que continha flores vermelhas. Uma garrafa estava de pé ao lado dos dois. Eles estavam rindo bastante e se beijando nos intervalos. Levantaram-se quando me viram.

– Juliana, coloca um casaco - disse ela, virando o rosto do namorado - Não quero que o Rafael veja seus peitos!

– Deixa disso, Camilona - respondeu ele, segurando as mãos dela e olhando para mim - Nem estão tão expostos assim. Está perfeito, Juliana, você tá de parabéns.

Então eles gargalharam como se meus seios fossem a coisa mais hilária do mundo. Cruzei os braços e Rodrigo se aproximou, dizendo:

– Uau, vocês estão bêbados.

Camila e Rafael não negaram tal fato. Pegaram a garrafa de líquido transparente e passaram para nós. Eu olhei em volta, percebendo a quantidade de adultos ao nosso redor.

– Todo mundo bebe na formatura - comentou Rodrigo - Lembra da sua irmã? Ela virou uma garrafa de vinho na frente dos seus pais. Ninguém reclama porque é como um rito de passagem, entendeu?

Concordei, pensando que um pouco não faria mal. Quando notei, estava alta como o resto da mesa, rindo para as paredes, e quase caindo da cadeira. Depois de algum tempo, uma música eletrônica começou a tocar e as batidas me levaram até a pista de dança, eu sem controle e sem noção. Puxei meus amigos para virem também.

Durante a dança, eu estava a ponto de cair por tropeçar no pé de alguém, quando um braço forte me levantou. Quando fui agradecer, vi um garoto de beleza estonteante sorrir pra mim.

– Liam! - gritei, pulando para abraçá-lo - Ai meu Deus, quanto tempo que a gente não se fala!

– Verdade - disse seu sotaque americano - Você está a maior gata.

– Valeu - respondi alto, por causa da música ensurdecedora - E eu não preciso dizer o quanto você está lindo, né?

– É - e riu - Nós dois estamos lindos. Mas e aí, como você foi no vestibular?

– Não sei, sério... Não gosto de pensar muito sobre isso. Você se inscreveu pra que curso?

– Eu não fiz a prova. Vou voltar pra Nova Iorque ano que vem, planejo fazer administração. Quero abrir meu próprio negócio, sempre tive vontade.

– Aw, sério? - fiz bico - Mas que bom pra você.

– Pode deixar, eu vou vir te visitar, gata. Ou, melhor, você me visita lá!

– Tá, se eu ganhar na loteria.

Ele riu e passou a mão no cabelo liso. Virou o rosto para o lado, e avistou um grupo de adolescentes dançando como loucos. Eram os meus amigos.

– É... A parte ruim de beber.

– Com certeza - e sorriu - Aliás, você veio com alguém? Um namorado, quero dizer.

– Hm, vim com o Alex - respondi, apontando para o menino, o qual estava atrás da Laura - Mas nós não estamos namorando. Somos só amigos.

– Porque parece pra mim que ele foi sua sobra?

Eu olhei para baixo. Meus saltos cor de rosa estavam iluminados, e uma poça de refrigerante estava ao meu lado. Puxei Liam pelo braço e nos levei para a única parte calma da festa: a varanda.

– Aqui vamos poder conversar melhor - falei, observando o grupo de fumantes do nosso lado - O que você quer dizer com aquilo?

– Tá claro que você não queria vir com o Alex, e só veio porque o cara que você queria está ocupado.

– Não tem nada a ver - falei - Eu não estou gostando de ninguém agora, então não tem razão pra querer vir com alguém mais. Vim com o Alex porque somos amigos, não tem nada com ele ser "minha sobra" ou sei lá.

– Não me convenceu.

Revirei os olhos, parando de olhá-lo. Inclinei meu corpo na sacada, e avistei um lago embaixo de nós. Tossi por causa da fumaça do cigarro.

– Não importa. E você, veio com quem?

– Eu não sou homem de namoradas, Juliana. Minha companhia é eu mesmo.

– Soa um tanto triste. E não me convenceu.

Liam sorriu enquanto colocava o céu estrelado sob seu olhar, o qual estava preenchido por um tanto de melancolia. Ele respirou fundo e lentamente.

– Ei - disse, pegando o queixo dele para se virar - O que foi?

– É que eu estou lembrando do meu passado... Quando eu era um homem de namoradas.

Ele abriu um sorriso magoado e colocou o polegar em cima do cenho.

– O que houve? - perguntei.

– Acho que é o pouco de álcool que eu bebi mas... Eu estou afim de desabafar, posso?

Depois que eu confirmei com a cabeça, Liam me contou tudo. Sobre vir pro Brasil à força, deixar a garota dos seus sonhos nas terras americanas, e sobre ela desistir dele no segundo que Liam colocou os pés aqui. Seu nome era Lindsay, uma garota de personalidade complicada e olhos marrons. Liam me falou como ela fora difícil de conquistar, e como eles tiveram um breve romance de um mês, interrompido pela urgente viagem de negócios do pai. Lindsay aceitou em ter um relacionamento a distância, porém desistiu no primeiro dia longe do namorado. Arranjou um namorado qualquer e fez questão de fazer Liam saber.

– Ela é assim - disse ele - Uma chata! E eu ainda consigo só ter olhos pra ela, isso que me impressiona... Quando meu pai concordou em eu voltar pros Estados Unidos ano que vem, eu fui correndo ligar pra ela. Eu não sei se ela gostou ou não. Essa é outra característica dela, você nunca tem certeza sobre o que ela está pensando. Acho que ela já me superou.

– Você foi o primeiro namorado dela?

– Sim - e riu - Ninguém teve forças pra domar aquela fera antes, só eu, que sou muito estúpido.

– Você não é estúpido. E eu posso estar bêbada, mas tenho certeza que ela não te superou por completo.

Ele olhou para mim como se eu não entendesse, e colocou a mão no rosto.

– Vou te dizer o que você vai fazer - falei, segurando o ombro dele - Você vai tirar essa cara triste e se divertir nessa festa, do jeito que bem entender. Depois, você vai voar pros Estados Unidos, e surpreender aquela garota. Você vai tê-la de volta, Liam. Eu tenho fé nisso.

Antes de puxá-lo de volta pra dentro, vi seu rosto se iluminar com um sorriso. Meus amigos comemoraram nossa volta com um uivo engraçado. Dançamos metade de uma música, até sermos interrompidos por um homem no microfone.

– Testando, testando - e pigarreou - Boa noite à todos os formandos! Estão se divertindo? - um coro animado formou-se - Ótimo! Por um pedido adoravelmente insistente, vamos tocar uma valsa para os casais.

Camila chegou por trás de mim, sussurrando:

– Eu subornei o cara - gargalhou - Tudo para uma dança coladinha com o meu Rafa.

Ela fez um sinal e o namorado rebolou até seu encontro, bem a tempo da música lenta começar. Fiquei parada, sem saber o que fazer, quando Laura esbarrou em mim, sem querer, e puxou Rodrigo para a dança. Alex segurou meu braço e juntou meu corpo ao dele.

– Você não vai acreditar - disse ele, guiando-me para o centro da pista - Eu vi Sarah na recepção.

– O quê? A Sarah está aqui?! Quem chamou aquela coisa?

– Ninguém, aparentemente. Ela comprou o convite de um garoto, mas pelo jeito ele enganou a garota, dando o convite de outro ano ou sei lá, um convite inválido. Ela foi barrada.

Comecei a rir.

– Sério?

– Sim. Eu vi o momento, e foi hilário. Sarah estava tão brava! Toda maquiada e com um vestido dourado. Quase jogou sua bolsa de brilhantes na cabeça do segurança. Antes de sair, chamou-o de incompetente e fez a maior cara de emburrada.

– Nossa - falei, gargalhando - Como você namorou aquele ser?

Alex olhou para mim, com as sobrancelhas juntas e um sorriso torto. Percebeu que nós nunca havíamos conversado sobre aquilo.

– Eu não sei. Por algum motivo desconhecido, eu gostava bastante dela. Bastante. Pena que ela me enganou o tempo todo... Eu só fui um peão do seu jogo.

– Me conta mais. Como isso começou?

– Sei lá, depois que o Rodrigo terminou com ela pra ficar com você, Sarah foi se aproximando de pouco em pouco. Fingiu estar tão desprotegida, tão frágil, tão necessitada de mim. E eu acreditei. Começamos a namorar e ela foi perdendo esse ar de fraca, e por isso eu gostei mais dela. Nosso relacionamento era secreto, ela me pedia que fosse, e eu aceitava porque... Sei lá, achava excitante esconder! E então, um dia, ela disse que precisava que eu escondesse mais um segredo: ela era a Senhorita X.

Alex virou o rosto para encarar o palco colorido.

– Não me pergunte porque eu não terminei com ela logo ali. Eu sei que é ridículo falando em voz alta, mas Sarah conseguiu tornar esse segredo em algo tão ótimo... Eu me senti especial por saber quem era. Ela conseguiu me fazer acreditar que a melhor coisa do mundo era namorar a Senhorita X... E então ela me transformou num fantoche. Eu fazia tanta coisa ruim porque ela me pedia! Que nem naquele dia, que ela pediu pra eu te beijar à força. Lembra? Você ficou puta, certo que eu era a Senhorita X.

– Lembro. Foi um tempo depois que você foi na minha casa pra buscar o pen-drive da Sarah. Por isso que eu comecei a desconfiar.

– Certo. Outro pedido da Sarah, querendo se esconder mais e mais. No momento que eu percebi como eu estava sendo manipulado, e que o plano principal da Sarah era te machucar e reconquistar o Rodrigo... Eu me senti péssimo e terminei com ela na hora. Aí que ela começou a me dar um pouco de importância, pedindo pra voltar... Quando não conseguiu o que queria, me ameaçou com mil coisas e mandou eu me mudar de cidade. Então eu fui.

– Que nem ela fez comigo.

– Que nem ela fez com você.

Alex balançou a cabeça e seus cachos se mexeram. Ele respirou fundo.

– Por favor, vamos mudar de assunto - pediu ele, e eu aceitei - Querida acompanhante, como está?

– Bem - respondi, desanimada - Você?

– Nossa, estou tendo a melhor noite da minha vida! Você some toda hora, e Laura me bombardeia com perguntas e opiniões chatas sobre a visão dela sobre o mundo.

– Sinto muito sobre isso. A partir de agora, não desgrudo de você, e darei um empurrão da Laura quando ela se aproximar. Satisfeito?

– Nós sabemos que isso não vai satisfazer nenhum de nós dois.

As luzes corriam pelo chão, distribuindo as cores pela festa. O mar de corpos dançava com lentidão; rostos quase colados e corações disparados. Alex virou o rosto até achar Rodrigo e Laura dançando juntos. Ela falava sem parar e ele ria bastante. Não pude deixar de notar sua mão no fim das costas da ruiva.

– O que você acha dela? - perguntou Alex, olhando para a garota.

– Bonita. Engraçada. Culta. Inteligente. Interessante. Ah, merda.

Seus olhos verdes me olharam com graça, e um sorriso surgiu em seus lábios vermelhos.

– Você precisa falar logo pra ele - disse ele.

– Odeio quando você fala vagamente.

– Odeio quando você finge que não sabe do que eu estou falando.

Eu revirei os olhos, pensando "Odeio quando você está certo". Alex quis continuar:

– Por mais que Rodrigo te ache uma deusa, ele não vai esperar pra sempre. Ninguém merece ficar esperando por uma decisão por tanto tempo. Se você pedir, Rodrigo esperará por uma eternidade, mas você tem que ver que é injusto. Com você e com ele.

Virei o rosto, querendo desviar o olhar.

– Outro assunto - pedi.

– OK. Você acha que a Laura está gostando do Rodrigo?

– Não sei - respondi, franzindo o cenho, desconfiada - Você acha que ele está gostando dela?

– Não sei - e me olhou estranho - Juliana, você ao menos consegue disfarçar seu ciúmes?

– Cala a boca! E você, super caído pela Laura!

– Eu nem conheço ela!

– Mas tá na cara que você quer conhecer, mais do que tudo.

– Nada a ver. Você só está tentando mudar o foco.

– Você só diz isso porque não quer o foco sob você, menino apaixonado.

A música parou de tocar, e nós nos soltamos imediatamente. Sérios, olhamos um para o outro e saímos em direções opostas. Logo em seguida, encontrei-me com Camila, a qual me puxou para uma mesa e foi seguida pelo resto dos colegas. Conversa vai, conversa vem, e eu não conseguia tirar os olhos da Laura e Rodrigo. O que ela tinha que deixava os garotos tão vidrados? Não era uma pergunta muito difícil de responder, porém era a que mais me incomodava.

E o que eu estava querendo com aquele ciúmes? Eu estava tão bem sendo amiga, apenas amiga, do Rodrigo! Pra que terminar com algo que fluía tão bem? E por mais desconfortável que era confessar, eu achava-os um casal adorável. Laura era uma garota legal e Rodrigo merecia alguém daquela altura. Acho que isso que me irritava: e se ele achasse Laura mais legal do que eu?

Aquela situação era como um baralho. As cartas eram meus sentimentos, embaralhados e distribuídos em cima de uma mesa dura. Eu tinha poucos minutos para apontar qual carta era a certa, mas era difícil, pois elas estavam viradas para baixo. Eu não tinha pista do que fazer, que caminho tomar.

Decidi ignorar meus pensamentos e sair de perto daquela mesa. Quando estava pronta para fazer tal coisa, ouvi Camila berrar.

– Eu te desafio a subir no palco e cantar, Rodriguinho!

– Camila amor - disse o garoto, rindo - Eu não estou bêbado a este ponto.

Ela pegou a garrafa de vodca ao seu lado e jogou para Rodrigo, que pegou por sorte.

– Então fica.

Ele olhou para o resto das pessoas, todas incentivando com um sorriso brincalhão, e parou o olhar em mim, pra baixo porém curiosa. Rodrigo se levantou e Camila aplaudiu ele, gargalhando.

(NOTA DA AUTORA: que nem no outro capítulo, se vocês quiserem imaginar a cena melhor... http://youtu.be/ZBwjT-3t2O8?t=18s Ouçam a música enquanto leem. Ah, e copiem e colem, não cliquem direto porque o Nyah! está com um problema com isso ou sei lá!)

O garoto percorreu a multidão em poucos segundos, e subiu no palco com uma flexão de braços. A banda tinha acabado de terminar "Já sei Namorar", dos Tribalistas, e estavam se preparando para a próxima música. Assim que o vocalista virou as costas para pegar sua garrafa d'água no chão, Rodrigo aproximou-se e roubou o microfone. Tossiu antes de começar.

– Amor da minha vida, daqui até a eternidade. Nossos destinos foram traçados na maternidade... Paixão cruel, desenfreada. Te trago mil rosas roubadas pra desculpar minhas mentiras, minhas mancadas... Exagerado! Jogado aos teus pés. Eu sou mesmo exagerado. Adoro um amor inventado.

A banda se esforçou e começou a acompanhar o ritmo, o que surpreendeu a todos, que achavam que iriam expulsar Rodrigo. Um coro de palmas melódicas começou, animando os rapazes. Então Rodrigo começou a dar um verdadeiro show, dançando enquanto andava.

– Por você eu largo tudo. Vou mendigar, roubar, matar. Até nas coisas mais banais, pra mim é tudo ou nunca mais.

Era algo muito divertido de assistir seu rebolado, e eu percebi várias pessoas rindo e cantando junto.

Camila estava quase morrendo de rir. Ela quase não conseguia respirar. E o resto da mesa estava no mesmo estado. Confesso que eu também gargalhava sem parar, ainda mais quando Rodrigo, no solo de guitarra, jogou-se no chão. Depois tirou o paletó, mandando-o para o fim do palco, quase acertando a cabeça do baterista.

Quando terminou a performance, foi aplaudido bastante. Agradeceu o público e apertou as mãos dos integrantes da banda, pedindo desculpa com um sorriso. Voltou até a mesa com muita gente parando-o no caminho, elogiando a confiança, a voz e "a dancinha".

Sentou-se como se nada tivesse acontecido, e deu um gole no refrigerante que tinha pedido. Olhou para nós, fixados em seus movimentos, e soltou:

– Ah, oi gente. Vocês me viram cantando?

Todos nós começamos a tagarelar ao mesmo tempo, fazendo o menino soltar um riso de satisfação.

– Rodrigo, você é incrível - balbuciou Camila - Eu te venero agora. Qualquer coisa eu faço por você, sério.

– OK, vou cobrar mais tarde - disse ele, sorrindo duvidosamente. Virou o rosto para mim assim que as pessoas começaram a falar de outro assunto - Você gostou?

– Hm, eu? - fiquei nervosa - Ah, é, gostei sim. Foi engraçado demais. Eu amo essa música.

– Eu também. Eu ouvia quando eu estava secretamente apaixonado por você - confessou, gargalhando como se fosse a coisa mais deplorável que alguém poderia ouvir.

– Sério? - perguntei, aproximando minha cadeira de modo imperceptível - Parece que aquilo foi em outra vida. E na verdade, foi mais cedo neste mesmo ano.

– Nossa. Verdade! - franziu o cenho, olhando para um ponto qualquer - Muita coisa aconteceu nesse ano.

– Muita... Eu acho que esse foi o ano mais atrapalhado, louco e... O melhor ano que eu já tive.

Rodrigo olhou para mim com aqueles olhos cor do oceano, e sorriu com o canto direito da boca.

– Deve ser porque finalmente acabou a porra do colégio.

– Deve ser - falei, aderindo ao sorriso - Ou então por causa de você.

"Oh Deus", pensei, querendo me estapear. "Porque eu fui beber? Juliana, você não pode se mostrar vulnerável, não pode mostrar que está voltando a... Estou imaginando coisas, é o álcool. É, é o álcool."

Se eu pudesse criar uma barreira que impedisse a onda sonora de chegar nos ouvidos dele, eu criaria. O arrependimento rasgava minha pele de dentro pra fora, ainda mais quando eu vi Rodrigo me encarando, com a feição mais difícil de analisar que eu já vira. Eu daria tudo para descobrir o que ele estava pensando naquele momento.

– Você quer dançar? - perguntou ele, sem mudar a expressão corporal. Eu hesitei por um período tão comprido, que fez ele repetir - Você quer dançar? Vamos, só uma dança. Vamos nos divertir.

Balancei a cabeça e Rodrigo se levantou, ajeitando o colarinho. Estendeu a mão, para me ajudar a se levantar. Eu agradeci e ele me guiou até o começo da pista, onde uma menina estava mostrando a calcinha preta para todos, por causa do seu vestido exageradamente curto. Rodrigo me soltou lá, e avisou que já ia voltar. Depois de um minuto, depois de eu analisar todos os movimentos de dança da garota flexível, ele voltou e a música parou. Uma melodia calma percorreu pelo salão, e eu ouvi a garota da calcinha gritando palavrões.

O vocalista da banda avisou que haveria uma dança lenta, e convidou os formandos a se dirigirem para perto. Adicionou que era uma encomenda especial para seu novo amigo, Rodrigo, "um cara simplesmente foda".

– Porque você pediu uma música lenta? - perguntei.

– Eu queria conversar com você, no silêncio. E eu sempre gostei de danças mais calmas, apesar que eu sou terrível.

Eu sorri e vi nossos corpos separados por alguns centímetros, suficientes para criar uma tensão entre nós. Rodrigo deu o primeiro passo: estendeu a mão e colocou a outra em minhas costas, diminuindo notavelmente o espaço entre nós. Minha respiração ficou automaticamente curta.

– O que você quer conversar? - perguntei, depois de colocar minha mão no ombro dele.

– Só queria conversar.

– Ah.

– Você está gostando da festa?

– Olha, quando eu disse que você foi o motivo do meu ano ser o melhor, é porque a gente passou por muitas coisas e você sempre permaneceu meu amigo e a nossa amizade é a coisa que eu mais zelo. Só queria dizer que eu estou muito alegre que a gente voltou a ser amigos.

Eu falei tão rápido que quando acabei, Rodrigo parecia assustado. Foi tão ridículo o modo obsessivo que eu quis concertar a situação! Senti minhas bochechas arderam quando ele soltou uma gargalhada.

– Eu também estou muito feliz com isso - disse ele, depois de umedecer os lábios - Você é a melhor amiga que eu poderia pedir.

Sorri falsamente e me perguntei quando aquela música ia acabar. O tormento só tinha começado.

– E a Laura? É uma boa acompanhante, aposto.

– Ela é legal - disse ele, como quem fala do clima.

– E muito bonita.

– Sim, ela é bonita.

– E ela beija bem?

Ele engasgou na risada que tentou esconder.

– Que pergunta é essa, Ju?

– Que que tem? Somos amigos, amigos fazem esse tipo de pergunta.

– Mas o jeito que você disse foi...

– Para de enrolar.

– Sim, ela beija bem.

Virei o rosto e quase gritei comigo mesma, querendo saber porque eu quis tocar no assunto! Já sabia que uma resposta dessa viria, ainda mais porque nós estávamos sob o efeito das bebidas, porém não queria ouvir. Ele percebeu minha cara feia.

– Que mais, quer me dar detalhes de como é passar a língua dentro da boca dela?

– Juliana, qual é o seu problema? - perguntou ele, se atrapalhando na dança - Você me perguntou, eu respondi.

– Mas eu sou a sua ex, caralho, tem coisa que não se fala pra ex! - soltei o corpo dele, e ele deu um passo para trás. Coloquei a mão na testa quando vi o que tinha feito - Desculpa. Desculpa. É o álcool falando, Rô. Eu estava muito estressada por causa dessa festa. Desculpa por descarregar em você.

– Tudo bem - disse ele, como se fosse a coisa mais compreensível do mundo - Acho que eu também não gostaria de saber detalhes dos seus namorados.

Olhamos para longe, e a música acabou. Eu estava pronta para ir embora, quando o vocalista decidiu que outra música devagar seria uma boa pedida. Rodrigo puxou-me pela mão, e disse:

– Você não vai escapar tão rápido. Vamos dançar uma música inteira, sem discutir. Só ouvindo a letra e relaxando os corpos...

Aquilo ia ser um desafio. Sem conversa, não haveria como quebrar o gelo entre nós. Aceitei de qualquer jeito, e começamos a dançar.

Tentei achar um ponto morto onde eu pudesse encarar na maior parte da dança. Deste modo, livraria-me de ser hipnotizada pelos olhos do Rodrigo. No começo, ele foi destrambelhado, e passou maior parte do tempo olhando para os pés, tentando não pisar em mim. Não resisti a tentação de olhá-lo, já que ele não perceberia. Analisei sua testa, cenho franzido, sobrancelhas, olhos para baixo, nariz empinado, bochecha vermelha. Meu ponto fraco eram os lábios dele. Sob qualquer circunstância, eu não podia olhar para aquela área. Era a zona proibida, meu pico de loucura. Mesmo assim, fui me aventurar no desenho de sua boca, um pouco rachada no canto.

– Você dançou tão bem a poucos minutos atrás - comentei - Porque você está agora querendo prestar atenção nisso?

– Sei lá, eu estou... - olhou para mim - Sei lá.

E abaixou a cabeça novamente. Eu peguei meu indicador e levantei seu rosto, pelo queixo. Nos encarávamos como se estivéssemos num jogo. Minha mão gélida tremia por cima da nuca dele, e só de sentir os fios de cabelo roçando em minha pele, meu coração palpitou. Com medo de transparecer, levei a mão até o ombro dele, e ordenei sua permanência. Rodrigo pareceu notar o movimento, e apertou sutilmente minha cintura. Meus pelos do braço eriçaram.

Começando a sentir a queimação vindo das maçãs do rosto, encostei minha cabeça no ombro do garoto. Então nossos corpos estavam quase totalmente colados, e era como se eu estivesse em casa. Eu respirei fundo e pedi aos céus que aquele momento se eterniza-se. Soltamos as mãos e passamos a dançar abraçados. As mãos dele estavam no final das minhas costas e as minhas, na sua nuca novamente. Acho que nenhum de nós dois percebemos como estávamos grudados. Só sei que eu fiquei de olho fechado, balançando meu corpo de um lado para o outro.

Quando a melodia cessou, foi como se tivéssemos acordado. Soltamos um ao outro, e Rodrigo me olhou com a boca semiaberta. Era definitivo. Eu estava louca por ele de novo. Agora nem minha mente poderia driblar as sensações. Eu queria ele. Eu precisava dele. Eu amava ele.

Laura chegou por trás de nós, provavelmente a mais bêbada de todas.

– Solta o batidão! - berrou ela, para a banda, que começou a improvisar um funk.

"Eles são bipolares ou o quê? Que alternância horrível entre músicas."

Além de bonita, inteligente e aquele bando de qualidade que eu invejava, Laura dançava bem demais. Ela puxou Rodrigo para mais dentro, e ficou quase se esfregando no garoto, apelando para a vulgaridade. Apesar de ser um defeito horrível, Rodrigo parecia se divertir à beça com a dança. Eu estava tão ocupada me torturando, que não percebi Alex chegar perto:

– Você não contou pra ele.

Fiquei calada. Eu estava brava.

– Você tem que contar pra ele.

– Não tem nada pra dizer, porra!

– Não vem me dizer que não está apaixonada pelo Rodrigo, porque eu não acre...

– Vai se foder, Alex! Eu não vou me expor à toa, porque eu sei que vou levar um fora. Então não me enche!

Virei as costas e fui até a mesa, sendo seguida pelo garoto de cabelo cacheado. Fiz uma ligação e arrumei minha bolsa.

– Tchau - falei, fazendo Alex quase dar um escândalo.

– Onde você pensa que está indo? - berrou ele.

– Pra casa. Pra que eu vou continuar nessa merda de festa? "Celebração" uma ova, "ritual necessário pra todo adolescente" meu cu.

– Você não acha que está exagerando? Não deixe um momento arruinar sua festa!

– Eu tô cansada, Alex. A coisa mais desgastante do mundo é gostar de alguém, vou te falar! Eu tentei me convencer que Rodrigo não era nada pra mim, desde o segundo que eu descobri que ele me traiu entre aspas com a Sarah... Mas eu só estava enganando a mim mesma porque ele nunca, nunca, nunca saiu do meu coração e da minha mente. Nem por um milésimo. E isso é um porre! Se eu for pra casa agora, economizo alguns minutos de frustração e durmo mais. Resumindo: só ganho.

Ele ficou calado e viu que não tinha saída.

– Queria te fazer ficar mas não posso te obrigar a nada.

Eu agradeci, e abracei-o, cochichando em seu ouvido:

– Vai roubar a Laura!

Ele sorriu e confirmou com a cabeça. Cheguei no lado de fora e ainda chovia. Fiquei impressionada e vi um táxi entrando no estacionamento, de alguma forma ainda lotado. Percebi que ainda esperaria alguns minutos. E foi aí que eu comecei a chorar. Baixinho, quase impossível de perceber, a não ser pelo rastro claro de maquiagem que se formou ao longo da minha bochecha. Limpei superficialmente e odiei Rodrigo por me sentir mal. Falando do diabo...

– Juliana, espera aí - ouvi Rodrigo, ofegando.

Forcei-me a virar o corpo. Naquele momento, todo movimento era cansativo e irritante.

– Alex me avisou que você está indo embora!

– Sim - secamente falei.

– E não ia nem se despedir?

– Você estava ocupado olhando a bunda da Laura.

– Juliana - ele suspirou -, seu ciúmes tá me cansando.

– Vai tomar no cu. Não é ciúmes, só estou mostrando os fatos.

– E vai me dizer que o "fato" não é o motivo porque você que está indo embora agora?

– Não é mesmo. Estou cansada, quero dormir, e essa festa já deu o que tinha que dar.

– Como assim?

– As coisas não saíram do jeito que eu planejava - minha voz saiu trêmula.

– E como você planejou?

– Bom, se fosse do jeito que eu queria, a gente não estaria agora discutindo.

Olhei finalmente para o garoto, e ele disse, depois de dar um passo pra frente.

– A noite ainda não acabou - e segurou meu punho - Você ainda pode fazê-la dar certo.

"E como posso fazer isso?", pensei, e a resposta veio junto com o desejo que estava me consumindo: beijei Rodrigo com força. Só um beijo comum, um encostar de lábios que me fez enlouquecer. Eu queria ver a reação dele. Rodrigo estava de olhos fechados e só abriu eles para me seduzir ainda mais. Seu peito subia e descia mais que de costume, e ele puxou-me pela nuca, com tal desespero que eu também sentia.

Seus lábios me levaram para as nuvens e sua língua estava ácida por causa do álcool. Eu não acreditava quanto eu estava com saudade daquela boca sem perceber. Ficar aquele tempo todo longe do toque de Rodrigo deveria ser proibido por lei. E meu desejo era transmitido pelos meus movimentos, com as mãos puxando seu corpo contra o meu, gritando e pedindo por mais.

Estávamos desgovernados e eu perdi a noção que estava num espaço público, até que andei para trás e encostei numa superfície molhada. Obriguei-me a interromper o beijo, e vi que era o táxi que tinha pedido. O homem estava me olhando com desdém.

– Senhorita Juliana? - arriscou ele, e depois de eu confirmar, entrei no carro com Rodrigo. Falei o endereço e o homem passou a ignorar a cena que seguiu.

Voltamos a nos beijar, com a mesma velocidade e necessidade de antes. Rodrigo encostou os lábios na minha orelha, pescoço, e foi descendo até seu rosto chegar perto dos meus seios.

– Você tinha que vir com esse decote todo? - e riu - Você me provoca demais, Juliana.

Rodrigo beijou a área, e dirigiu-se de volta a minha boca, apertando meu quadril. À esta altura, eu estava sentada no seu colo. Achei-me inquieta por causa da excitação que sentia.

Eu estava com calor, muito calor, e daria tudo para não estar num táxi. Eu queria Rodrigo naquele segundo! Eu abri o zíper de sua calça preta e estava pronta para colocar minha mão lá dentro, quando percebi o que estava ocorrendo. Parei de beijá-lo e recuei o corpo, como uma garotinha assustada.

– Rodrigo, o que a gente tá fazendo?

Isso pegou ele de surpresa. O garoto respirava muito rápido e estava adoravelmente vulnerável, todo desarrumado. Depois de se recompor, falou:

– Bom, essa é uma pergunta boba - e sorriu - Acho que nós dois sabemos o que é isso. Já vimos besterois americanos suficientes, até tivemos aulas de biologia. Se lembra?

– Não é disso que eu me refiro - falei, revirando os olhos.

Saí do seu colo e, entre beijos no pescoço, ele perguntou:

– Então o que você quer saber?

Não quis enrolar. A chuva molhava a janela fria e embaçada.

– Depois de hoje, nós vamos voltar a namorar ou o quê?

– Você quer?

Você quer?

Rodrigo virou o rosto para a janela e observou a placa de PARE que estava por perto. Ainda olhando para fora, ele falou:

– Juliana, você já notou quanto tempo nós passamos pensando nas coisas, tentando defini-las? Isso só cria preocupações desnecessárias. Porque não fazer algo espontâneo alguma vez? Deixar rolar.

– Por mais que eu queira, não, eu não posso deixar isso só "rolar". Eu preciso saber.

– O quê? - virou-se para mim.

– Que a história não vai se repetir. Que nós não vamos perder tempo.

– Eu não posso prever uma relação.

– E eu não posso passar por aquilo de novo.

Rodrigo se chateou com o comentário, e eu tentei explicar.

– Rô, a gente teve muitos momentos bons, mas eu não posso me magoar daquela maneira de novo.

– O nosso problema era a Sarah, a qual está bem longe agora. E você sabe que eu só fiz aquilo pra te proteger, não te traí de fato!

– E se você querer um dia?!

Rodrigo pegou minhas mãos suadas e olhou nos meus olhos, sereno.

– Eu não posso afirmar quem eu vou ser amanhã. Ninguém pode, Juliana... Agora eu vejo que isso tudo tem a ver com a sua confiança.

– Eu confio em você! - achei - Só estou com medo...

Ele colocou meu rosto entre suas mãos, e encaixou seus lábios nos meus. O beijo mais delicioso era calmo e doce. Rodrigo encostou sua testa na minha, dizendo baixo:

– Juliana, é agora ou nunca. Vou esclarecer suas opções. Você pode não ficar comigo, seguir sua vida, começar uma nova etapa. Talvez seja uma coisa boa, uma repaginada. A gente tenta ser amigos, porém nós dois sabemos que não vai durar muito tempo. Se escolher essa, eu saio agora mesmo do táxi, sem problemas. Ou então você pode dar uma nova chance a nós. Ju, a gente pode fazer dar certo dessa vez! Mas você precisa confiar. É a escolha mais arriscada.

Eu desviei o olhar enquanto percebia meu batimento subindo, junto com o medo que me consumia. Rodrigo balançava os pés e o motorista bisbilhotava, assistindo pelo retrovisor.

– Você quer voltar ou não? - perguntou ele, pela última vez.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

CORRE PRO EPÍLOGO!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Último Romance" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.