Último Romance escrita por Marina R


Capítulo 45
Capítulo 45


Notas iniciais do capítulo

Ganhei três recomendações desde o capitulo passado! Vocês me querem fazer chorar? Muito obrigado, não tem coisa que me deixa mais feliz



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– Eu tenho um - disse Hugo, estalando os dedos - Juliana, não adianta você fugir sem ter nas mãos aquele vídeo... Alex e Rodrigo, vão até o quarto da Sarah e peguem o laptop branco que deve estar, provavelmente, na escrivaninha. Vocês tem que ligar, clicar na pasta escrito "SX" e apagar tudo que tem lá, e depois apagar tudo da lixeira também, me ouviram? Depois, peguem também o pen-drive preto na terceira gaveta do criado-mudo. Ele tem um cordão rosa amarrado. É lá que a Sarah coloca os arquivos mais importantes, como reserva. Lá também está o seu vídeo, Juliana. Garotos, vocês saem pela janela do quarto. Eu coloco uma escada para vocês descerem sem problemas. Eu e a Juliana vamos sair pela porta mesmo, porque só comigo que ela vai poder sair sem complicações. Vou inventar uma história para os caras. Tudo certo?

Nós três balançamos a cabeça. Mesmo ainda tendo dúvidas, ficamos calados. Hugo foi na frente, abrindo a porta com uma cautela invejável. Peguei minha mochila com roupas, que estava do lado de fora. Fui atrás do Hugo, Rodrigo atrás de mim, e Alex logo em seguida. Hugo segurou meu braço com força e colocou-me ao lado dele. A escada terminou e eu pude ver homens jogando baralho a poucos metros. Hugo fez gestos por trás do corpo para mandar Alex e Rodrigo passarem. Os dois andaram nas pontas dos pés, e subiram outra escada perto de nós.

Meu braço estava começando a formigar quando Hugo entrou na sala de estar e fez todos os outros homens olharem para ele. Pareciam farejar algo de errado, como cachorros bem treinados. Hugo ignorou e continuou a me guiar até a porta de entrada. Um cara colocou-se na nossa frente, usando camisa listrada e feições estranhas.

– Quê que cê tá fazendo com essa guria aqui? - perguntou ele, expondo seu sotaque do interior.

– Sarah tem planos para ela. Mandou eu levá-la para uma casa.

– Mentira. Ela teria comentado com a gente.

– Não teria nada - contrariou Hugo - Principalmente com você, que ela está louca pra demitir. Mas se você quiser, liga pra Sarah. Aposto que ela vai adorar ver seu próximo deslize.

O homem franziu os lábios e revirou os olhos. Os outros caras pararam de nos encarar e continuaram a mexer o baralho. Hugo e eu saímos da casa e então ele soltou meu braço. Pediu desculpas pela força aplicada.

– A parte mais difícil passou - disse ele - Agora vamos no jardim colocar a escada para aqueles dois.

Andamos calmamente pela estrada de pedra que levava até o jardim, quando Hugo me puxou pra trás com brutalidade e nos fez recuar alguns passos.

– Merda - sussurrou ele - Sarah ainda não foi embora. Está na frente do carro, falando com alguém no celular.

Espiei por cima do ombro dele e era verdade. Nós não podíamos ir até o jardim, nem os meninos poderiam descer a escada, porque Sarah estava logo em frente e veria, sem dúvidas.

– Devemos esperar? - perguntei, e ele concordou com a cabeça - Mas eu tenho que avisar os meninos para eles ficarem longe da janela!

– Verdade. Toma - disse ele, tirando meu celular de seu bolso e entregando-me.

Agradeci e digitei uma mensagem rápida para Rodrigo. Perguntei-me porque não tinha enviado para o Alex. Hugo bisbilhotou meus movimentos e falou, assim que eu coloquei o celular no bolso:

– Esse Rodrigo é um garoto bom?

Parei para pensar por um segundo. Milhares de momentos maravilhosos nossos inundaram minha mente, porém tentei lembrar de coisas ruins que ele fizera também.

– Acho que tirando o fato que ele traiu, mentiu, e me usou... Ele é um cara bom.

– Hm. Antes de você descobrir sobre ele e a Sarah, ele já tinha feito algo de errado?

– Nada absurdo - respondi - Nossa relação era quase perfeita... - suspirei - Eu nunca fui tão feliz, infelizmente.

– É isso que eu queria ouvir. Então eu vou te contar, dane-se o trato da Sarah. Eu não trabalho mais pra ela, de qualquer forma.

– Do que você está falando? - perguntei, com os pensamentos embaralhados.

Ele olhou para frente e balançou a cabeça.

– Agora é um momento ruim - disse ele - Depois do almoço nós podemos nos encontrar para conversar? No parque.

– Claro - respondi, desconfiada.

– Duas da tarde. Se estiver com medo de mim ou sei lá, pode levar outra pessoa junto.

No fundo, ainda havia um lado de mim que pensava duas vezes antes de confiar no Hugo, afinal, ele tinha me sequestrado. Porém resolvi não ouvir esse lado.

– Não estou com medo. Te encontro as duas.

Sarah finalmente entrou no carro e sumiu de vista em poucos segundos. Hugo pegou uma escada suja de barro e estendeu até alcançar o segundo andar. Não precisei mandar mensagem para avisar, já que Alex viu e abriu a janela. Ele foi o primeiro a descer. Em volta do seu pescoço, o barbante rosa que segurava o pen-drive da Sarah. Rodrigo desceu com certo desequilíbrio típico dele, e ajeitou a camisa quando pisou na grama.

– Deletaram tudo? - perguntou Hugo, meio preocupado.

– Tudo - respondeu Rodrigo.

– OK. E agora? - perguntei - Pedimos um táxi? Eu estou sem dinheiro.

– Eu também - respondeu Hugo.

– Tudo bem, eu tenho dinheiro - falou Alex, piscando o olho para mim.

– Eu também tenho! - comentou Rodrigo, tão rápido que deu vontade de rir - Posso ajudar a pagar.

– Relaxa, eu tenho grana - retrucou Alex.

– Mas eu também... - começou Rodrigo.

– Nossa, Juliana, você é disputada - interrompeu Hugo, rindo.

Eu segurei um sorriso e olhei para o chão.

– Vocês dois pagam, OK? - falei - Muito obrigada, vamos.

Ligamos para um táxi e este chegou pouquíssimo tempo depois. Antes de entrar, ficou aquela dúvida de quem sentava onde, mas no final Hugo sentou-se na frente e eu fiquei no meio dos outros dois meninos. Assim que o carro partiu, Alex estendeu a mão para o Rodrigo. O último ficou parado por um segundo, então sorriu e os dois deram um aperto de mão.

– Conseguimos - disse Rodrigo.

– Sim, conseguimos - concordou Alex.

– Que legal vocês dois juntos - falei - Estranho também.

Eles riram.

– A gente teve que resolver a nossa raiva antiga para poder te salvar - disse Alex.

– É, nós percebemos que era o único jeito. Valeu a pena, já estava cansado de te odiar, cara.

– De volta pra você - disse Alex, e nós três rimos - Aé, Juliana, esqueci de te contar. Me dá ai esse seu broche feio.

– Como é que é?

– Me dá - repetiu ele, e eu finalmente tirei o acessório da minha blusa. Ele sorriu quando segurou o objeto - Quer ouvir uma boa notícia? Isso é uma micro câmera.

– O quê? - Hugo, Rodrigo e eu gritamos ao mesmo tempo.

– Sim. Juliana, eu disse pra você que desconfiava que você ia ser sequestrada, então gastei minha grana nessa micro câmera. Ia te dar pessoalmente, implorar pra você usar, mas quando vi a Camila comprando uma roupa pra você, achei a chance perfeita. Coloquei o broche antes da mulher da loja começar a embrulhar como presente, e a Camila nem viu...

Nós três ficamos olhando para Alex, todos com bocas abertas e acredito que com o mesmo pensamento: "Isso é genial. Achamos a solução".

– Então contanto que você não tenha ficado deitada o tempo todo - concluiu Alex -, temos toda a prova para incriminar a Sarah.

– Eu não acredito - falei, sorrindo.

– Vou passar os vídeos para o computador, fazer uns cortes para focar no que interessa e pronto. Eu tiro as suas partes, Hugo, se você quiser... Voto para a gente postar em alguma rede social ou algo do tipo, porque espalha a notícia muito mais rápido. Vou tentar postar hoje, o mais rápido possível.

Todos nós balançamos a cabeça, concordando. Percebi que eu não poderia ir para a casa ainda, porque eu supostamente estava no colégio. Quando comentei isso, Rodrigo também se assustou por ter esquecido do detalhe.

– Então vamos nós quatro passear e relaxar - sugeriu Alex -, e depois almoçamos, que tal?

– Pode ser - falei, e vi Hugo aceitando com um movimento de cabeça - Mas tem o problema do dinheiro.

– Eu pago seu almoço - disse Alex - E Rodrigo paga o prato do Hugão.

Rodrigo deu um sorriso acanhado e concordou. Hugo então riu e mandou o taxista mudar de percurso. Nós fomos até um shopping pequeno e vazio, ainda mais sem gente por causa do horário. Entramos em papelarias, lojas de roupas, perfumarias e até uma loja minúscula de brinquedos. Hugo mostrou-se extremamente engraçado, acho que foi por não estar mais naquele ambiente terrível de trabalho.

Quando deu o horário de almoço, levamos um susto porque o tempo tinha passado muito rápido. Comemos no único self-service do lugar. Na hora de pagar a conta, segurei o riso quando Rodrigo viu o total da conta dele adicionada com a conta do Hugo. Porém Rodrigo deveria esperar um valor grande, já que o prato de Hugo se resumiu em uma montanha de carne, arroz e batata-frita.

Estávamos saindo do restaurante, quando Alex e Rodrigo viram uma loja que não tínhamos batido o olho antes: uma loja só de videogames. Os dois arregalaram os olhos e olharam para mim.

– Podem ir, eu não quero entrar lá não - falei.

– Eu também não, já passei dessa fase a dez anos - disse Hugo, rindo.

Rodrigo e Alex se entreolharam e saíram correndo até o lugar, quase tropeçando um no outro. Eu ri e balancei a cabeça.

– Acho que é a hora perfeita para a gente conversar - disse Hugo.

Eu afirmei com a cabeça e nós fomos até um banco que se localizava bem na frente da loja de videogames. Do nosso lado, uma barraquinha que vendia jujubas, com a vendedora quase caindo no sono.

– OK vou começar. Não me interrompa até eu terminar, combinado? - disse ele, e eu concordei - Eu acho injusto vocês terminarem sem você saber o que Rodrigo realmente fez, por isso vou contar. A primeira coisa que você tem que entender é que ele foi o primeiro amor da Sarah. Ela amava ele, Juliana, de verdade. Ela amava tanto ele que tinha segundos que ela pensava em parar de ser essa menina má e injusta que ela é. Acho que a única coisa que impedia ela de ser boa, é que ela sabia que o sentimento não era recíproco. Sarah até comentou comigo que ela sabia desde o começo que Rodrigo te amava, só que ela é tão confiante e cheia de si que jurava que conseguiria fazer Rodrigo te esquecer. E ela tentou, fez de tudo. Começou a se embelezar mais; cuidar do cabelo; das unhas; comprou novas roupas; adquiriu uma personalidade mais adorável, porém falsa; e tentou ser mais carinhosa. Ela sentia que Rodrigo estava se aproximando, mas numa velocidade que ela não suportava! Começou a enlouquecer com o simples fato que não conseguia fazer um garoto se apaixonar por ela. Quando ele trocou-a por você, Sarah começou a alimentar um ódio sombrio, e a criar um plano, que foi em poucos executado.

Hugo respirou fundo e me viu esperando ele voltar a falar, meus olhos vidrados e concentrados. Continuou:

– Primeira parte do plano: criar uma banda. Sarah concluiu que esse era o melhor jeito de fazer ele se aproximar, já que Rodrigo ama música mais que quase tudo. Ela pediu pro pai dela encontrar vários artistas bons, e o homem assim fez, já que ele obedece tudo que a filha pede. No começo, ela ficou muito empolgada porque percebeu que Rodrigo estava passando menos tempo com você. Decidiu virar amiga dele, uma bem legal mesmo, bem atenciosa e companheira. Então teve a viagem. Pra começar, toda vez que Rodrigo comentava de te ligar, ou apenas pegava no celular, Sarah dava um escândalo. Inventava um história de "olha aquilo", "vamos em tal lugar agora", "tenho que te contar um negócio urgente". Por isso ele te ligou tão pouco na viagem, Sarah, além de atrapalhar, encheu os horários da banda com compromissos. Lembro que depois do show, ouvi Sarah no celular com uma amiga, falando que tentaria fazer Rodrigo transar com ela. Deixaria ele bêbado e torceria que ele deixa-se ela abrir as pernas. No dia, eu vi tudo desenrolar. Sarah comprou bebida para todo mundo e o resto da banda incentivou Rodrigo a beber, como comemoração. Ele acabou cedendo. Acho que foi a primeira vez que ele ficou bêbado na vida, porque ele bebeu pouco e já estava alto. Sarah decidiu provocar, fazendo um strip-tease em cima da mesa. Foi nojento ver a felicidade dela quando viu Rodrigo, com você no telefone, falando da calcinha que ela vestia. Quando terminou a ligação, Rodrigo estava com muita raiva e triste, ao mesmo tempo.

A lembrança me deixou com a respiração rápida. Lembro de ter ficado devastada depois de falar com ele pelo celular. Ouvir o outro lado da história era incrivelmente estranho.

– Sarah puxou ele para o banheiro - continuou Hugo -, e o resto da banda foi para a varanda, a maioria fumar. Por isso, consegui ouvir o que Sarah falava por trás da porta. Ela perguntou se ele estava bem, e ele começou a chorar, falando de você, achando que você ia terminar com ele já que ele estava sendo um péssimo namorado. Rodrigo estava desabafando, quando de repente, ele parou de falar e eu ouvi um barulho. Ele disse algo tipo "Você me fez cair". A Sarah gritou um "O quê" e começou a falar que ele estava bêbado e acabou desequilibrando. Ele retrucou falando "Não, estava esquivando de você tentando me beijar! Que porra é essa Sarah, somos amigos". Ela disse que não, que eles eram algo mais, tinham uma química incrível e que era impossível dele negar. Ele negou em seguida, com muita firmeza. Então eu ouvi Sarah falando algo tipo "Transa comigo" e ele ficou chocado, falando que não, que não gostava dela assim, e que nunca gostaria. "Eu estou com a Juliana e amo ela demais... Achei que você entendesse isso", foi exatamente o que Rodrigo disse pra ela. Sarah xingou-o de dez mil coisas e saiu do banheiro, puta da vida. Sumiu até a manhã seguinte. Voltou quando estava todo mundo se arrumando para ir pra praia. Ela pediu mil desculpas para o Rodrigo, botou a culpa na bebida e na carência que estava sentindo na noite anterior. Disse também que não queria atrapalhar as coisas dele com você, que achava vocês o casal mais lindo do mundo, e que queria continuar sendo amiga dele. Rodrigo acreditou nessa merda e os dois fingiram que nada tinha acontecido.

Hugo parou um segundo para respirar e olhou para a loja. Alex estava mostrando um CD para Rodrigo, e os dois falavam sem parar.

– Quer que eu termine de contar depois? - perguntou Hugo - Deve estar cansativo de ouvir.

– Quê?! Se você parar agora, eu te bato, Hugo!

– Tá, vou tentar resumir mais. Depois da viagem, Sarah ficou mais obsessiva em tirar Rodrigo de você. Ela realmente não ligava mais em que ele gostasse dela. Agora era um jogo que ela precisava ganhar para provar pra si mesma que podia ter o controle das coisas, e que o garoto sempre seria dela, não importando como ela faria isso acontecer. Então, em uma sexta-feira, estava tudo planejado para The Beginners ensaiar, como sempre. Eu estava arrumando os amplificadores na quinta-feira, quando peguei a Sarah ligando para todos os membros da banda, menos Rodrigo, e cancelando o ensaio. Perguntei pra ela o que pretendia com aquilo. Ela abriu o jogo pra mim. Iria ameaçá-lo.

Eu franzi o cenho. Aquilo estava mostrando-se mais interessante do que eu pensava.

– Quando perguntei como, ela me contou do vídeo. O mesmo que usou para te ameaçar ontem. Sarah me disse, com os olhos arregalados, que aquilo daria certo, porque Rodrigo se importa mais com você do que com ele mesmo. Ela falou que iria convencê-lo a terminar com você, e era isso que ela mais queria: poder tê-lo nas mãos. Depois de ver o vídeo, Rodrigo percebeu que no mínimo você mudaria de cidade e perderia o respeito dos seus pais, já que eles são bem rígidos com drogas, segundo ele. Porém Rodrigo tinha consciência que o provável era você e João irem presos. Ainda por cima, Sarah disse que se ele contasse a verdade para você, ela mandaria os capachos te agredirem. Ela percebeu que com esse vídeo, Rodrigo faria tudo que ela quisesse. Então ficou fácil. Sarah mandou ele fingir namorar com ela e terminar com você. Até disse exatamente o quê ele tinha que dizer. Quando você falasse mal dela, Rodrigo deveria pedir pra você não fazer tal coisa. Ele deveria também dizer como Sarah era impossível de resistir e que ele não tinha conseguido se segurar.

Tudo estava se encaixando tão perfeitamente e meu coração batia tão rápido que eu estava num estado nervoso e chegava a tremer. Não conseguia acreditar que era verdade. Nem sabia se devia acreditar. Você passa tanto tempo colocando algo como verdade absoluta, que quando uma coisa lhe faz acreditar no contrário... Você fica com muitas dúvidas. Foi assim que eu me senti. Estava chocada e confusa. Hugo abriu a boca para falar, mas viu os meninos saindo da loja, rindo um pro outro.

– No pen-drive, veja os vídeos da pasta com seu nome.

Balancei a cabeça como afirmação.

– Tudo muito caro, a gente acabou não comprando nada - disse Alex.

– Mas o cara deixou a gente jogar um jogo muito massa de luta, vocês viram? - perguntou Rodrigo.

– Não, a gente ficou ocupado conversando - respondeu Hugo.

– Conversando sobre o quê? - perguntou Alex, depois olhando pra mim - Juliana, você está pálida.

– Nossa, você está bem? - preocupou-se Rodrigo, franzindo o cenho.

– Tô - falei, com os pensamentos cheios demais para dar respostas com mais de uma sílaba. Esforcei-me e disse - Vamos embora.

Os homens ouviram-me e chamaram um táxi, porque estavam preocupados que eu fosse desmaiar.

– Você quer que eu pegue sal pra você pôr debaixo da língua? - perguntava Rodrigo, segurando meu braço para eu "não cair" - Ou neste caso eu devo pegar um doce? Nunca sei o quê melhora nessas horas... Você quer água!?

"Por favor, para de ser legal e atencioso comigo", eu pensava. "Não faça eu me sentir mal por ter sido grossa com você esse tempo todo, quando o que você estava tentando fazer é me proteger... Me proteger! Ah não, tem algo errado, produção."

Alex disse que o carro dele estava estacionado na casa da mãe, e que não era tão longe, então iria a pé. Deu tchau para nós, entregou-me o pen-drive e prometeu me ligar. Hugo disse que ia pegar o ônibus até a casa de sua ex, onde ia surpreendê-la. Fiquei feliz por ele. Antes de sair, olhou para Rodrigo e piscou pra mim, sorrindo de modo engraçado. "O quê o Hugo espera? Que agora que eu sei a verdade, eu e Rodrigo vamos automaticamente voltar? Que quando nós entrarmos no táxi, vamos nos beijar e tudo poderá ser como antes?", pensei. "Não é tão simples assim."

Rodrigo sentou-se ao lado do motorista e ficou me observando, sentada no banco de trás e fingindo não se importar, pelo retrovisor. Quando o carro freou, Rodrigo jogou dinheiro no colo do homem e apressou-se para abrir a porta pra mim.

– Eu não sou deficiente, Rodrigo - falei, ignorando sua mão estendida para me ajudar a levantar.

– Eu sei, Ju.

Parei de andar e olhei pra Rodrigo. "Ju" tinha soado tão estranho saindo da boca dele, pela primeira vez. Ele não havia me chamado daquele jeito há muito tempo. Ele pareceu incomodado ao ver minha reação. Eu estava incomodada por ter reagido daquele jeito. As coisas estavam tão estranhas entre nós... Voltei a andar como se aquilo não tivesse acontecido.

– Quer ajuda a subir na escada, pelo menos? - perguntou ele.

– Não! - respondi, mais alto do que queria, fazendo-o recuar - Eu estou bem, não preciso da sua ajuda.

– Você ainda está pálida, sua boca está muito branca.

Lambi os lábios e virei meu rosto, começando a encarar a porta.

– Não preciso de você. Pode ir embora.

Forcei-me a não olhar Rodrigo, mas percebi que ele saiu imediatamente, com passos pesados e barulhentos. Virei o rosto e vi a porta da casa dele batendo com força. Eu não sabia porque tinha agido daquela maneira.

Entrei em casa já sendo bombardeada por perguntas da minha mãe sobre como tinha sido passar a noite na casa da Sarah, dormir na casa da Sarah, almoçar na casa da Sarah. Aleguei ter muito dever de casa, e pedi para nós conversarmos mais tarde. Ela aceitou e eu entrei no quarto o mais rápido possível. As cortinas do Rodrigo estavam fechadas. Fechei as minhas e criei uma escuridão no cômodo. Liguei o laptop e conectei o pen-drive. Várias pastas surgiram, com vários nomes de pessoas. Decidi não bisbilhotar, e ver apenas a minha.

Havia três vídeos. O primeiro era o meu com o João. Pulei o segundo e fui para o terceiro, por causa da nomeação "TEM QUE EDITAR", que chamou minha atenção. Descobri qual era o vídeo no segundo que a câmera captou uma grama verde e flores ao longe. Era o vídeo que eu descobri da "traição" do Rodrigo. Ia parar de ver, mas decidi assistir com outros olhos.

– Agora estamos a sós - disse Sarah, entrando no quarto.

Um silêncio preencheu o local e ela fechou a cara.

– Rodrigo! Eu te dei meia hora pra você decorar a porra do texto! E nem é longo! Você é burro?

Ele não tirou os olhos do chão por um segundo, nem quando disse:

– Eu não consigo fazer isso. Não vou fazer um vídeo horrível desse pra você mandar pra minha namorada.

– Sua namorada por pouco tempo, amor - disse ela, sentando no colo dele com um sorriso estampado - Nos próximos meses e até a eternidade, você é meu.

Rodrigo empurrou ela para Sarah sair de cima dele, e ela quase caiu no chão por isso. Ficou irritada.

– Vou te dar mais uma chance, idiota. Ou você diz suas falas na hora certa, e atua bem, ou eu mando agora um amigo meu quebrar o pescoço da sua namorada. Que tal?

Rodrigo fechou os olhos e selou os lábios. Sarah saiu do quarto e entrou de novo.

– Agora estamos a sós - repetiu.

– Finalmente - disse ele.

– Boa ideia falar que nós vamos ensaiar pra Juliana, quando o que nós estamos fazendo é namorar.

– É, eu sou um gênio - respondeu Rodrigo, com um mau-humor inegável que fez a Sarah fazer uma feição raivosa por um segundo.

– O que você quer fazer agora, amor? - perguntou, sentando no colo dele.

– Acho que você já sabe.

Sarah lambeu os lábios e tentou beijar a boca de Rodrigo, mas ele recuou totalmente e empurrou o ombro da menina, de leve. Sarah berrou um xingamento.

– Esqueci de comentar que nem morto eu vou te beijar - disse ele, dando um sorriso que ela odiou.

– Vai sim - gritou a menina -, não quero saber!

– Sarah, eu vou vomitar se a gente se beijar. Você vai querer gravar isso?

– Você não vai vomitar - disse, sorrindo -, você vai querer mais.

– Acho que você não está entendendo o nojo que eu estou sentindo de você. Eu não vou te beijar. Beije o que quiser, menos minha boca.

– Eu aceito isso se você fazer exatamente o que está no resto do script. Sorria quando tem que sorrir, segure meu quadril quando eu coloquei que deve segurar.

– Tá - respondeu ele, seco.

Então eles começaram a cena de novo, mas na hora que Sarah tinha que tirar a camisa dele, Rodrigo falou que precisava lavar o rosto. Sarah, vermelha de raiva, mandou ele ir no banheiro do quarto dela. Quando ele entrou, ela olhou pra câmera.

– Hugo, como eu posso lidar com isso? - falou ela - Que menino teimoso!

– Sarah, você já está pedindo demais dele. Hoje você confessou ser a Senhorita X, ameaçou o amigo e a namorada do coitado, e agora está obrigando ele a fazer essa cena toda... Ele tem muito o que processar.

– Você acha que eu ligo? - perguntou ela, soltando uma risada abafada - Ele que supere isso e faça o que eu mando!

Rodrigo saiu do banheiro com o rosto inchado e seus olhos avermelhados. Sarah balançou a cabeça, como se não pudesse acreditar em tal coisa, e disse:

– Você foi no banheiro chorar?! Cara, você é tão menininha.

– Me deixa em paz - rosnou ele, passando a manga da camisa nos olhos.

– OK. Espero que essa seja a última vez que a gente faz isso, então vire seu rosto de modo que a câmera não enxergue bem. Vou apagar essa luz de trás para a Juliana não ver suas lágrimas de garotinha.

Rodrigo mostrou o dedo do meio com um sorriso sarcástico. Sarah devolveu a gentileza e apertou o interruptor. A cena começou de novo, e desta vez continuou no modo que eu conhecia bem. Aquela era a que tinha virado o vídeo que Sarah mandou. A única diferença é que, no final, quando Sarah estava puxando a calça dele, a câmera estava retirando-se e eu pude ouvir um berro do Rodrigo:

– Tá, agora sai de cima de mim!

– Porra, agora vou ter que cortar esse áudio na edição, otário!

– Você acha que eu ligo?

O vídeo parou com uma imagem do gramado, e eu comecei a rir, talvez por causa dos gritos deles dois, ou talvez por perceber como eu estava enganada. Ainda estava digerindo o novo lado da história, e era complicado, porém tudo encaixava. Era como um quebra-cabeça que eu tinha montado mas que faltavam peças importantes para formar a figura. Agora eu finalmente tinha achado-as e encaixado-as, e a imagem era surpreendente e inesperada.

Eu abri a minha cortina e vi que as de Rodrigo ainda estavam fechadas. Tomou-me uma vontade de ir conversar com ele, contar que agora eu sabia de tudo e que agradecia a ação dele. Porém era inegável que uma barreira tinha sido construída e nos separava. Depois do que tínhamos passado, eu não sabia como ter uma conversa confortável e natural com Rodrigo. Eu não sabia como derrubar a barreira. Naquele segundo, achei que era o nosso fim, como amigos e como amantes. Sarah conseguira mesmo nos separar, mesmo quando o plano dela tinha sido descoberto.

Fechei as cortinas e vi meu celular vibrar. Uma mensagem do Alex:

"Postei o vídeo."


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