– Anjo, aproveite a sua vida. - Jimmy disse.

– Como posso aproveita-la sem você? - Respondi.

Eu estava sonhando. Mas era como aqueles sonhos realistas de semideuses, que realmente acontecem. Eu estava no mundo inferior conversando com o fantasma do Jimmy. Como filha de Hades, eu meio que posso ficar vagando por aí pelo mundo inferior. Sim, eu já recebi vários sermões sobre isso, "deixe os mortos em paz", diz sempre Paul, um dos servos de papai.

– Eu vou sempre estar com você, bem aqui. - Jimmy disse. E se inclina e toca no meu coração, deixando uma sensação fria e quente ao mesmo tempo.

– Mas não é a mesma coisa. - Eu disse.

– Anjo, eu nunca vou te deixar, vou sempre estar com você, aonde quer que você vá. - Ele colocou sua mão no colar de contas do acampamento meio-sangue, havia quatro contas de argila, e um anel. - Esse anel foi minha mãe que me deu, uma semana antes de morrer, há 5 anos, ela me disse para dar esse anel a pessoa que ganhar meu coração para toda a eternidade. Quero que fique com ele. - E disse isso enquanto tirava o anel do colar de contas, depois pegou minha mão e colocou o anel no meu dedo. - Enquanto estiver com esse anel, eu sempre vou estar com você.

O anel, que estava fantasmagórico junto com Jimmy, ao encontrar seu lugar no meu dedo, brilhou e se tornou físico.

– Eu te amo. - Jimmy disse.

– Eu te amo. - Respondi.

– Posso te esperar a eternidade toda, não se apresse em morrer. - Ele passou a mão pelo meu rosto. - A espera vale a pena. Precisamos ser fortes e esperar o tempo que for preciso.

– Como posso me tornar imortal? - Perguntei, angustiada. - Como posso me juntar a Ártemis, sabendo que só serei feliz quando morrer?

– Cada coisa tem seu tempo, e seu preço. - Jimmy disse. - A felicidade é cara, não se ganha de graça, mas seu preço não é pago com dinheiro, e sim por ações. Precisa ser merecida. Faça-se merecer, sacrifique-se, torne-se imortal e viva bem longe da morte, ao lado de Ártemis.

– Como uma filha de Hades pode viver longe da morte? - Perguntei. - É como um alimento, que nos dá força. Eu desejo a morte, não gosto da vida.

– A morte é muito mais fácil e simples do que viver. - Jimmy disse. - Mas isso para pessoas boas como nós. É quando ganhamos o que merecemos por tudo o que fizemos na vida. E é por isso que você precisa viver.

– Não. - Murmurei, pois sabia que meu tempo com Jimmy tinha acabado, eu o sentia mais distante e menos luminoso. - Não, não. Fique.

– Você precisa viver. - Jimmy disse. - Vá. E não se esqueça que eu sempre estarei com você.

Ele se inclinou e me beijou.

– Fique comigo. - Sussurrei, quase sem voz.

– Eu vou te esperar. - Ele sussurrou. - Eu te amo.

– Eu te amo. - Sussurrei de volta.

E então tudo se desfez como areia. E eu estava novamente em meu beliche no chalé 13.

Uma semana havia se passado desde que cheguei ao acampamento.

Eu não estava com muito humor, então, dois dias depois de chegarmos, James foi se encontrar com Hermes e devolveu todos os amuletos ao deus.

Thalia anda paciente comigo, não me pressionando com relação à caçada. Ela anda com os amigos que ainda estão vivos, pois é, ser imortal é triste neste sentido, seus amigos morrem e envelhecem e você continua lá, jovem e saudável para sempre.
Me sentei na cama e cocei meu olho, mas alguma...

Tirei minhas mãos do rosto e as examinei. E lá estava, sólido como uma pedra. O anel que Jimmy me deu.

Respirei fundo. - Jimmy estava comigo. - disse a mim mesma. - Preciso continuar.
Me levantei com uma sensação nova, não sei descrever, era como se eu voltasse a ter os pés no chão. Sabia o que tinha que fazer agora.

Me troquei, coloquei um short e uma camiseta. Eram umas 9 horas da manhã, o sol já estava começando a esquentar.

Saí do chalé 13 e fui até o chalé de Ártemis. A porta estava aberta, mas mesmo assim eu bati. Thalia estava sentada na cama conversando com mais quatro caçadoras.

– Hã.. Thalia, posso falar com você?

– Claro, querida, sente-se. - Ela chegou para o lado da cama e deu uma palmadinha no lugar ao seu lado. Me sentei. - O que quer dizer?

– Eu, hã.. pensei no assunto e... - Hesitei por um momento. - Eu quero entrar para a caçada.

Thalia sorriu, as outras caçadoras também.

– Precisamos de Ártemis para aceitar seu pedido. - Thalia disse. - Betha, faça um arco-íris, precisamos mandar uma mensagem.

Betha era uma garota de uns 13 anos, com as roupas de caçadora, e com o rosto semelhante à Freddy, um filho de Íris. Ela tirou do bolço um prisma do tamanho de uma maçã, foi até a janela e fez sua mágica, um arco-íris apareceu e ela jogou um dracma dizendo "Oh deusa Íris, aceite essa oferenda e conceda-me falar com minha senhora Ártemis"

E então Ártemis apareceu.

– Olá, Betha, Thalia, aconteceu alguma coisa? - Ártemis parecia uma garota de uns 12 anos, com cabelos castanho-avermelhados presos em uma trança e olhos castanhos de um amarelo prateado, seu rosto era muito bonito e tinha uma voz muito doce.

– Não, na verdade é que, Bianca... - disse Thalia. - digo, Angelica quer se juntar a nós.

– Ah, sim. Ótimo. - Ártemis sorriu. - Será bem vinda, Angelica.

– É isso mesmo que quer? - Thalia perguntou, uma ultima vez.

– É, sim. É isso mesmo. - Eu disse, firme, antes que eu recuasse.

– Então repita: "Eu me comprometo com a deusa Ártemis. Dou as costas para a companhia dos homens, aceito a virgindade eterna e me junto à caçada."

Você conhece a sensação de ter um déjà vu? Foi exatamente isso que senti, e a essa altura eu já deveria estar acostumada a essa sensação, mas dessa vez foi forte demais. Depois de segundos de confusão, repeti o que ela me pediu, cada palavra.

– Se a senhora Ártemis aceitar seu compromisso, então você será da família.

Olhei para Ártemis, ela tinha a expressão séria, mas um pequeno sorriso estava preso no canto de sua boca.

– Eu aceito.

Respirei fundo.

E uma nova sensação tomou conta de mim. Como se uma chama crescendo em meu peito. E isso me deu confiança, de que eu ainda poderia voltar a ser feliz.

– Bem vinda às Caçadoras. - Thalia disse, me abraçando.

– Seja muito bem vinda, Angelica. - Ártemis disse. - Sei que será muito feliz.

– Obrigada. - Eu disse, forçando um sorriso.

– Se me dão licença, preciso resolver alguns problemas. - Ártemis disse.

– Adeus, minha senhora. - Betha disse, cancelando a mensagem.

– Angelica, essas são Betha, Kate e Laura.

– Oi. - Disseram elas.

– Oi. - Respondi.

– É muito bom ter mais uma irmã na caçada. - Laura disse.

– Espero que sejamos muito amigas. - Disse Kate.

– Em breve estaremos ao lado de Ártemis, assim que acabarmos nossa missão. - Disse Betha.

– Nossa missão. - Disse Thalia. - Precisamos recrutar novas caçadoras.

– Estou de olho em uma filha de Apolo, - disse Kate. - Tenho que conversar com ela.

– Uma filha de Démeter também. - Disse Laura.

– Então podem ir. - Disse Thalia. - Bianca, fique mais um pouco.

Continuei onde estava. E as outras três saíram.

– Olha, vamos em bora hoje à tarde, quer aproveitar esse tempinho para se despedir? - Ela me perguntou, calma.

Confirmei com a cabeça.

Ela se levantou e foi em bora.

Fiquei mais uns minutos sentada, pensando.

Primeiro eu preciso falar com Nico di Angelo.

Me levantei e voltei ao chalé 13.

Nico estava sentado em sua beliche, parecia que tinha acabado de acordar.

– Nico, - Eu chamei, entrando no chalé.

Ele levantou a cabeça e me viu.

– Bia. - Ele deu um leve sorriso. Acho que poucos já viram esse sorriso.

Me sentei na cama ao lado, para ficar de frente a ele.

– Nico, eu decidi entrar para a caçada. - Eu disse.

Vi uma pontada de dor em seu rosto.

– De novo, Bia?

– Desta vez vai ser por um longo tempo. - Eu disse, meio triste.

– Eu preciso de você. - Ele disse.

– Nico, olha só pra você. - Eu disse. - Já é um homem adulto.

– Os adultos ainda precisam de alguém. - Ele disse.

– Eu não vou embora para sempre, ainda vou te ver. - Eu disse.

– Você disse isso na última vez. - Nico disse.

– Você precisa ser forte, Nico. - Eu disse.

– Não. Você vai embora. Como todos. Ninguém me quer por perto. - Nico abaixou a cabeça e deixou sua franja cair sobre o rosto.

– É claro que te quero. - Eu disse.

– Não, você não quer. - Ele disse, se levantando. - Assim como na outra vez, entrou para a caçada para se livrar de mim.

– Isso não é verdade. - Eu disse.

– Não se preocupe. - Ele disse, mal deixando-me falar. - Não precisará mais se preocupar comigo.

– Nico...

Mas ele não ouviu. Se virou e correu porta a fora.

Me levantei e corri até a porta, mas era tarde demais, Nico era rápido. Quando cheguei à porta já era tarde, ele tinha desaparecido.

Suspirei, eu precisava dar um tempo a ele. Depois eu falo com ele, pensei.

Olhei em volta, os outros dois pequenos filhos de Hades, Vivian e Billy, não estavam mais em suas camas. Deviam estar no refeitório.

Fui então em direção ao refeitório. Ninguém me incomodou por eu ter chegado atrasada. Billy e Vivian conversavam animadamente sobre alguma atividade. Comi o meu pão em silêncio observando a mesa do chalé de Apolo. Felipe estava em pé no banco, para ficar na mesma altura de um outro garoto de Apolo, os dois conversavam e faziam gestos. Felipe parecia bem feliz. Na mesa de Hefesto, James estava em pé ao lado do banco, conversando com Marie. Percy parecia até um famoso, estava sentado na mesa 3, com vários pequenos campistas tentando falar com ele, pois todos sabiam que grande herói ele era.

Quando terminei meu lanche, me levantei e fui em silêncio até o alto da colina mais próxima, essa tinha vista para o pavilão do refeitório, vários campistas ainda estavam lá. Eu gostava dessa colina, bem no alto dela havia um pequeno pinheiro, Jimmy e eu sempre nos sentávamos ali quando não tínhamos nada pra fazer.

Fiquei pouco tempo no acampamento, é um ótimo lugar, mas parece que eu não pertenço a ele. Eu não participava das atividades, e ninguém se importava se eu apenas observasse. As pessoas não ficavam muito felizes em me ter por perto. Ninguém gosta dos filhos de Hades. Ainda mais daqueles que já viveram 70 anos em uma outra vida e voltou depois de 12 anos. Parece que é mais estranho voltar à mesma vida do que ser um filho de um deus Grego ou Romano.

Acho que fiquei um bom tempo sentada à sombra do pequeno pinheiro, pois quando me dei por mim, o sol já estava baixo no céu. Preciso ir, pensei, as caçadoras já vão em bora e agora faço parte delas.

Me levantei e fui em direção ao meu chalé. Ele estava vazio, duas camas bagunçadas (a do Bill e a da Vivian), uma cama impecável (a do Nico) e a minha, que estava um pouco desarrumada. Eu não tinha muitas coisas, apenas algumas mudas de roupa em um baú. Estava prestes a ir em bora, mas uma coisa me chamou a atenção. Uma pequena estátua velha. Cheguei perto, era uma estátua de mitomagia de Hades. Nico amava esse jogo, e Bianca di Angelo, ou eu, morreu por pegá-la do ferro velho dos deuses.

Seria isso? - Pensei. Mas logo descartei a ideia, algo tão simples não seria capaz de tudo isso. - Mas mesmo assim... Bianca não teve a chance de dar essa estátua ao Nico.
Guardei a pequena estátua de Hades no bolço. - Vou dar isso ao Nico, - pensei.

Peguei meu pequeno baú e saí do chalé 13. As caçadoras estavam em frente ao chalé de Ártemis, 7 garotas ao todo. Uma carruagem com dois pégasos estava esperando.

– Vamos? - Thalia perguntou. - Subam.

Subi, me sentei ao lado de uma filha de Apolo e uma filha de Atena. E quando a carruagem decolava, vi o Acampamento meio-sangue diminuindo dentre as nuvens, até sumir.

E deixei Angelica pra trás, daqui em diante, até minha morte chegar, serei Bianca di Angelo.

Mesmo querendo continuar negando, mesmo querendo repetir: "Não, eu não sou essa sua Bianca di Angelo".