A tarde passava e eu continuava no quarto, apesar do meu pensamento de querer encontrar alguém, talvez para animar meu dia, tinha medo de esse alguém poder ser Tomas e uma estranha sensação que ele apareceria a qualquer momento se eu ficasse do lado de fora do quarto.

 Infelizmente, não havia nada além de roupas, sapatos, uma cama e um banheiro no quarto, e como eu não consegui ficar mais de meia hora parada, resolvi ir até a cozinha, tinha que conhecer meu local de trabalho, afinal.

 O caminho para a cozinha foi tranquilo, ignorando os guardas, que estavam lá o tempo todo, não havia nem moscas nos corredores.

 A porta do lugar era de madeira, e rangia. As paredes, assim como todo o resto do castelo eram feitas de pedras encaixadas, como em um quebra-cabeça gigante e indestrutível.

 O cômodo, que devia ter mais de dez metros por lado e dava a impressão de um quadrado perfeito, dava nojo do chão ao teto, não existia eletricidade no reino e consequentemente, nada de fogão a gás. Sendo assim, dois fogões a lenha grandes garantiam agilidade no serviço.

 Restos das refeições eram jogados no fogo, mas as que não eram totalmente destruídas foram deixadas à beira e ratos se amontoavam em volta.

 Além disso, manchas de gordura sujavam as paredes e eles não pareciam conhecer as palavras ‘’água, sabão e vassoura’’.

 Quatro pessoas estavam em volta de um balcão, que tinha quase o mesmo comprimento da cozinha, mas apesar de largo era estreito. Cheguei perto e eles não se incomodaram com minha presença, continuando o que faziam. O que eu não havia notado, ou talvez não estivesse tão ruim da primeira vez que eu estive aqui, era uma crosta de sujeira em cima desse balcão, e o pior é que eles faziam de tudo ali, de cortar frutas a limpar frangos.

 Eu nunca conseguiria trabalhar ali, precisava de ajuda para limpar aquele lugar, e não seria uma limpeza básica, eu teria de ‘’mandar ver com o balde’’.

 - Com licença? – cheguei a uma mulher que picava um tomate no balcão imundo – Eu preciso de produtos de limpeza. E que todos saiam daqui se não forem ajudar.

 - Ajudar em que, senhorita? – perguntou a mulher se dirigindo a mim apenas após terminar de cortar o tomate.

 - Olhe para esse lugar, está um lixo, eu tenho que lavar isso aqui, não posso trabalhar em um lugar assim. – falei curta e grossa.

 Ela me deu uma risadinha aguda e seca, sem humor algum.

 - Não pode trabalhar aqui de forma alguma. – falou pegando outro tomate.

 - Posso saber por quê? – perguntei arqueando a sobrancelha, mas notei que ela só iria me responder depois que acabasse o outro tomate então nada gentilmente eu o tomei dela e o pus atrás das costas – Perguntei o porquê.

 - Apenas cozinheiros com autorização mechem nos utensílios dessa cozinha. – falou estendendo a mão para que eu lhe devolvesse o tomate.

- Tenho autorização. – lhe devolvi e imediatamente ela voltou a pica-lo, me ignorando – da rainha Megan.

 - Oh sim, claro que tem querida, agora se não for incomodo, nos deixe trabalhar, sim? – falou com falsa empolgação.

 Desisti de argumentar, e já ia embora, mas para minha sorte, Rainha Megan, cruza a porta que range e um sorriso travesso aparece no meu rosto.

 - Luna? O que faz aqui? – perguntou a rainha vindo até mim.

 - Estava entediada, resolvi passar aqui, é aqui que vou fazer o bolo, certo? – perguntei.

 - Ah, não, não, Luna, essa cozinha é reservada para serviçais, ou um lanche rápido. Para eventos maiores, usamos a cozinha especial, é lá que você irá ficar.

 Pelo canto do olho pude ver uma carranca vinda da garota que poucos segundos antes havia me tratado como uma criança chata e senti uma imensa vontade de mostrar a língua, como uma típica criança chata faria, mas me limitei ao meu sorriso travesso.

 - Posso fazer uma pergunta, majestade? – perguntei enquanto ela seguia pelo corredor e me levava em direção à outra cozinha.

 - Pergunte Luna.

 - Sem querer ser rude, mas, por que aquela outra cozinha é tão suja, tudo bem que é para os serviçais, mas acho que devia ter um mínimo de higiene.

 - Bem, deixamos aquela cozinha na mão de Molly, uma mulher que se você já tiver ido lá antes provavelmente notou sua presença. Mas perceba, que hoje mesmo, Molly não estava lá, ela recebeu uma proposta, de uma posição melhor, se não me engano, secretária de alguém, e deixou a cozinha por conta dos cozinheiros. Infelizmente, eles não parecem se importar muito com a limpeza do lugar, então a menos que queira fazer faxina, recomendo que você venha até aqui, quando estiver com fome. – falou abrindo uma porta também de madeira, mas era lisa, lixada e pintada de branco, além de que essa não rangia.

 O lugar era muito mais apresentável com todas as paredes de pedra pintadas de branco, três fogões de lenha, com a lenha recém-posta e livre de ratos e restos de comida, o chão também era de pedra e um homem de avental o varria, na verdade, aquele lugar parecia mesmo ter o dobro do tamanho da outra cozinha, o balcão de mármore brilhava e em média dez pessoas trabalhavam ali. Eu esperava encontrar pessoas mas simpáticas ali, mas era o mesmo de antes, cada um com sua tarefa, ignorando todos ao seu redor.

 - Fique à vontade, Luna, apesar de a festa se apenas amanhã. Achei que você fosse esperar, mas tudo bem, ainda tenho coisas para decidir sobre o casamento. E procurar Molly, que foi o real motivo de eu ter aparecido na cozinha, mas pelo visto aquele é realmente o último lugar a que ela iria. Vejo-te depois. – e com uma risadinha, saiu pela porta antes que eu pudesse dizer alguma coisa.

 Eu pretendia fazer um bolo decorado, mas com eu decoraria? Eu não sabia nada sobre Tomas, e para falar a verdade, havia procurado a cozinha para fazer chantilly, que eu poderia guardar se aqui tivesse geladeira, mas como não, o chantilly também teria que esperar. Eu também sentia muita falta dos meus cupcakes, poderia me aquecer antes de fazer um bolo de vinte e três andares, afinal.

 O que eu precisava para os cupcakes era muito básico para não ter ali. Em um armário do outro lado da cozinha eu consegui achar tudo que precisava. Ovos, farinha, leite, fermento, açúcar e baunilha. Fiz o recheio de chocolate amargo e a cobertura com chantilly, parti oito morangos e pus metade em cada um dos quinzes cupcakes que a porção rendeu que não tinham afinal, o formato bonitinho, pois tecnicamente estávamos na era medieval e eram apenas bolinhos em formas redondas toscas.

 Saí da cozinha segurando um cupcake, e com o outro na mão, todo o resto havia sido devorado pelos cozinheiros, que davam sua opinião como ’’comida exótica deliciosa e estranha’’.

 Resolvi sair à procura de Tomas, eu precisava saber mais sobre sua vida para decorar o bolo, e tinha que arrumar um bom motivo para isso, na verdade, planejava chegar naturalmente como se nada tivesse acontecido e a palavra ‘’casamento’’ não fizesse parte do vocabulário. E esperava que ele fizesse o mesmo quando eu o encontrasse. Se encontrasse.  

 Bati três vezes na porta do quarto dele, não esperava o achar lá, mas não custava nada tentar. Por fim, um Tomas sonolento e de cabelo bagunçado abriu a porta.

 - Desculpe você estava dormindo? Eu volto depois. – falei me virando.

 - Tudo bem, eu na verdade deveria estar experimentando uma roupa, mas me escondi aqui, por sorte ninguém veio me buscar. Até agora. Quem te mandou aqui?

 - Ninguém. Eu vim por conta própria, mas já vi que não sou bem vinda aqui, então fique a vontade se escondendo.

 - Não, desculpe meus modos, apenas estou… cansado, por assim dizer. Quer entrar? – perguntou indicando o quarto com o braço.

 - Queria conversar com você, mas não tenho certeza se o seu quarto seria o lugar adequado. – falei destacando a palavra.

 - Tudo bem, acho que não há nada de mais em passear pelos corredores do castelo, certo? Acompanhe-me? – falou gentilmente após sair do quarto e fechar a porta.

 Eu o acompanhei pelo corredor e percebi que ele não havia se incomodado em arrumar o cabelo e ainda tinha cara de sono.