Caspian.

Os dias foram correndo e a noite do baile estava cada vez mais próxima. Meu número de compromissos cresceram e pouco tempo tive para passar com minha noiva. Sempre que tentava vê-la surgia um imprevisto. Isso não me impediu de notar que ela passava cada vez mais tempo com Jacob, na sala de música. Juro que não queria admitir, mas sim, estou com ciúmes.

Queria não sentir isso, afinal, eles são amigos e eu querendo ou não vão continuar se falando. Mas a proximidade dos dois não deixava de me incomodar cada vez mais. Principalmente depois de Jacob deixar bem claro que talvez Susana devesse voltar para a Inglaterra, para “não sentir remorso”. Agora me diga, se ele não estivesse querendo se intrometer entre nós dois, por que sugeriria algo assim? Por que, se acontecesse como ele disse, quem iria para a Inglaterra com Susana? Eu? É claro que não. Não que eu não fosse capaz de deixar tudo para ir com ela, mas enfim.

Os convidados começaram a chegar dois dias antes do baile e o castelo estava numa correria só. O salão de baile estava todo decorado e isso é tudo o que pude reparar uma vez que não dispus de muito tempo para bisbilhotar o andamento de meu próprio noivado.

Na noite da véspera do baile, terminei mais cedo a última reunião do dia e corri para ver Susana. Ela me aguardava no jardim interno no qual planejei o “fracassado” café da manhã. Ela estava linda num vestido lavanda, admirando a paisagem, tendo os cabelos movimentados pelo vento da noite que, não pude deixar de reparar, fazia o tecido do vestido aderir às curvas de seu corpo. Senti meu coração acelerar com a visão e peguei-me admirando-a sem dar-me conta. Espantei os pensamentos inadequados e me aproximei dela.

–Um beijo por seus pensamentos. - falei. Só então ela percebeu minha presença, sorrindo abertamente para mim, ajeitando uma mexa do cabelo atrás da orelha. Não lhe dei tempo de responder, beijando-a intensamente. Susana retribuiu do mesmo modo, passando os braços ao redor de meu pescoço, mergulhando os dedos em meus cabelos. Abracei-a pela cintura, minhas mãos subiam e desciam por suas costas, apertando-a contra mim. Separamos os lábios quando o ar se fez necessário.

–Er... Não lembro mais no que estava pensando. - confessou, levemente ofegante. Sorri de lado, dando de ombros antes de beijá-la de novo, brevemente.

–Parece que faz uma eternidade que não lhe vejo. - falei.

–Mas, Caspian... Foi uma eternidade. - disse ela. Rimos e eu a abracei. Permanecemos um tempo em silêncio admirando o céu estrelado. - Dá para acreditar...? - Susana quebrou o silêncio. - Há alguns dias eu estava na Inglaterra com pouquíssimas esperanças de voltar, e agora estamos às vésperas de nosso baile de noivado.

–Não sei você, mas eu acredito muito mesmo. - falei divertido. Susana riu de leve, apertando um pouco mais os braços ao redor de minha cintura. O silêncio voltou e eu vi a oportunidade perfeita para tocar no assunto. - Su, posso lhe perguntar uma coisa?

–Claro.

–Quando nos casarmos, você vai pertencer definitivamente à Nárnia. - comecei, escolhendo as palavras. - Ficará aqui, mas, talvez, seus irmãos não possam ficar... Nem Jacob.

Ela respirou fundo.

–Já pensei nisso. - contou. - Vou sentir muita falta deles se isso acontecer, muita mesmo, e de meus pais também. Mas vivi em Nárnia sem meus pais durante a Era de Ouro e sobrevivi. Experimentei ficar sem você, Caspian, e foi insuportável.

Não pude evitar o sorriso.

–Quero me certificar de que não vai sofrer ficando aqui. - por que isso me preocupou, claro, mas também para esfregar na cara de Jacob. Susana afastou-se um pouco para olhar em meus olhos, ela sorriu de leve e eu a beijei na testa.

Naquele momento, ouvimos uma chamada do lado de fora seguida de batidas apressadas nas portas do jardim antes que ela abrisse. Era Jacob.

–Susana, graças à Aslam eu a encontrei! - disse ele aliviado.

–Jake, aconteceu alguma coisa?! - perguntou ela, preocupada. Comecei a ficar também, pela cara dele algo muito grave devia ter acontecido.

–Você precisa vir comigo! - ele parecia desesperado. - É uma emergência!

–Jake, respire e diga o que está acontecendo. - ela tentou tranquilizá-lo.

–Sumiu. - arfou ele. - Os papéis sumiram! O baile é amanhã e as partituras sumiram!

Isso... Deve ser uma piada.

–O que?! - perguntei indignado. Susana me lançou um olhar pedindo calma.

–Jake, se acalme, procure de novo, deve estar na sala de música. Não precisa se desesperar.

–Nem atrapalhar o encontro de ninguém. - murmurei, irritado, baixo demais para que ele ouvisse, mas Susana ouviu. Jacob também.

–Não seja egoísta. - suplicou ele desesperado. - Você já tem tudo nos eixos, mas eu posso estar prestes a perder minha grande chance! Su, você precisa me ajudar, só você e eu temos acesso à essas partituras.

–Pela Juba do Leão. - murmurei para mim mesmo, passando as mãos no rosto. - Isso não pode esperar até amanhã?!

–Mas isso é para amanhã! Demos um trabalho danado nisso para deixar sumir assim! - insistiu Jacob. Bufei.

–Se tivesse tido mais cuidado, não sumiria. - acusei.

–Caspian, por favor. - pediu Susana. - Jacob, onde você deixou pela última vez?

–Estava no piano, me ausentei um minuto para beber alguma coisa e quando voltei não estava mais lá!

–Você deve ter deixado em algum lugar. - falei, impaciente.

–É. Jake, você deve estar se desesperando à toa. Fique calmo. - tentou Susana.

–Su, eu estou... em pânico... - os olhos arregalados e apreensivos atestavam. - Não posso perder essa grande chance... Por Aslam, Su, você tem que me ajudar!

–Ora, tranquilize-se e pare de bancar o ridículo! - quando vi, já tinha falado.

Jacob me lançou olhos enfurecidos.

–Você quer parar?! - exigiu. - Susana e eu trabalhamos duro nisso nas últimas semanas para abrir mão assim!

–Não estou dizendo para abrir mão, só para esperar até amanhã!

–Amanhã po...!

–Parem vocês dois! - Susana interrompeu. Jacob e eu a olhamos. - Jake – ela virou-se para ele. - Calma! Recomponha-se!

Jacob franziu os lábios. Sua expressão continuava angustiada, só agora notei que seus cabelos estavam desalinhados e nos canos de seus olhos acumulavam-se pequeninas gotas de lágrimas. Bufei derrotado, compadecendo-me. Passei as mãos no rosto.

–Cas... - Susana voltou-se para mim.

–Pode ir, Su. - cortei-a.

–Mas...

–Está tudo bem, vá, nos vemos depois. - sorri fragilmente para ela. Susana sorriu de leve, pondo-se na ponta dos pés e beijando-me brevemente.

–Até mais. - sussurrou.

Tornou à Jacob, agarrou-lhe pelo pulso e arrastou-o para fora. Senti um suave aperto no peito em vê-la fechar a porta ao sair, decepcionado por ter meu encontro arruinado pelo Jacob. Ou, pelo menos, era o que eu achava.

Susana.

–O que deu em você, Jacob?!

–Ah, droga, me chamou de Jacob. - ele emburrou a cara.

–Faz muito tempo que Caspian e eu não temos um momento a sós e você vem atrapalhar! - briguei, ainda rebocando-o pelo pulso. - E você ainda fica discutindo com ele!

–Sabe, Susana, seu noivo podia ser mais compreensível! - resmungou, emburrado.

–Mais compreensível do que abdicar de nosso encontro por que você teve uma crise de nervos?!

–Ei! É uma emergência, Susana! Sem essas partituras posso acabar perdendo a única grande chance de me declarar à Lúcia! Trabalhamos muito nisso para simplesmente “deixar sumir” até amanhã, o grande dia! - insistiu. Parei e virei para encará-lo.

–A situação entre vocês dois é bastante instável, Jake, e você não está facilitando as coisas.

–Não estou facilitando nem complicando. Caspian, tem se mostrado bastante agressivo para comigo e eu tenho tentado reverter a situação, mas ele se mantem imutável! Eu estou tentando!

–Tentando como? Provocando-o? Jake, você sabe que agiu mal hoje. - falei paciente. Ele emburrou a cara. Rolei os olhos, bufando. - Vamos logo achar essas partituras!