E tinha conseguido o que queria. Ninguém iria me incomodar aqui, do lado de fora do Salão de baile, onde mais ninguém poderia ver a roupa que Rachel havia me obrigado a vestir. Ora... Eu odiava vestidos, mas este até que não era dos piores. Ao menos era confortável, e todas as garotas idiotas e mimadas dessa escola iriam embora amanhã, depois do almoço. Eu estaria em paz, não fossem as professoras, supervisoras e qualquer outra pessoa dessa escola enorme.

Em um dos cantos, perto do bosque que eu tanto gostava, um balanço preso a uma árvore era um indicio infantil, mas eu não me importava, se me achassem tola, criança ou infantil, que fosse. Eu ao menos estava bem, me divertindo, e aproveitando a noite, a lua e as estrelas. Mesmo o tempo estando nublado, não poderia querer um céu mais estrelado e bonito do que esse que via. Era simplesmente perfeito. E ninguém iria me incomodar aqui, já que ninguém dessa escola parecia saber da existência desse lugar. Mas um motivo para ser meu retiro. Nem mesmo Rachel sabia que eu estava aqui, e mesmo sabendo que ela ficaria chateada por não ter podido apresentar seus amigos para mim, sabia que ela iria sobreviver e estar muito bem, obrigada, pela manhã.

E não iria deixar de falar comigo, sua única amiga nesse lugar, apenas por que eu não queria estar perto de outras pessoas vestida assim, me sentindo uma tola e falsa. Era exatamente assim que essa escola queria que eu me sentisse, queriam que eu me parecesse assim, uma dama, e não eu mesma. Eu caçava com meu pai, não brincava de casinha com as coisas de minha... Bem, mãe. Eu não tive uma mãe para brincar com as coisas, e era feliz assim. Não queria me maquiar, me vestir melhor... Era tudo apenas uma farsa, como sempre. Minha vida parecia cada vez mais uma farsa.

Enquanto pensava sozinha em tudo o que acontecera de ruim nesse ano, pensei nas poucas coisas boas que também haviam acontecido a minha volta. Rachel, o bosque, o pequeno filhote de cachorro que haviam me prometido de presente... Nada mais interessante, mas os pequenos momentos de sorrisos eram mais do que felizes. Eram bons dias aqueles, mas nem sempre eles existiam. Devia estar mesmo muito distraída, já que quando olhei para o lado, ao escutar um galho se quebrando, um homem adulto, que eu nunca vira na vida estava parado.

Não sabia quem ele era, mas não me parecia uma boa noticia que ele estivesse aqui, ao meu lado, na escola, ainda mais eu estando sozinha assim. Era perigoso, e eu deveria voltar para a festa, mas teria de dar as costas para ele, e meus instintos gritavam para que não fizesse isso. Duvidas e mais duvidas...

-Você é Lunabel?

Conte para alguém que me chamo Lunabel e você vai descobrir se minha mira é boa ou não com um arco e flecha. Ou com um revolver.

-Sim. Quem quer saber?

-Meu mestre deseja algo mais do que saber. Talvez sua cabeça?

Não tive muito tempo para pensar no que ele falava, ou no que aquele ser queria dizer com palavras tão estranhas e sem sentido, já que ele logo me mostrou o que queria, se transformando em uma criatura estranha, mas que parecia pronta para me matar. Eu não queria morrer, obrigada, e a melhor coisa que pude fazer foi gritar, me levantar e correr.

Tente correr na grama, de salto alto e vestido longo. Não é nada fácil, mas eu estava me saindo até que bem. Pelo menos até alguma parede se materializar bem no meio do pátio gramado da escola. Parede? Olhei para cima e não havia nenhuma parede. Mas sim um garoto, que parecia se misturar muito bem com esse lugar todo. Estava vestido completamente de preto, mas não usava terno, ou smoking, como a ocasião pedia. Ele estava de calça jeans preta, camisa social preta com dois botões abertos e um casaco aviador.

Ok, de onde surgiu essa criatura sombria que esta parada na minha frente? E que me encarava como se eu fosse a louca, por esbarrar nele e cair sentada no chão. Mas o barulho da coisa que me seguia ainda estava alto de mais para que eu me importasse com os cabelos negros e olhos escuros que me encaravam. Eu tinha de correr.

-Você é Luna?

-Não!

O que? O ultimo estranho que me perguntou algo assim se transformou em um monstro que esta me perseguindo. Eu não ia mesmo confirmar que eu era Luna. E ia mesmo sair dali correndo, se ele não tivesse me levantado com uma mão e segurado meu braço para que eu não saísse correndo de novo. Ele era vidente? Bem, vai saber... Mas com toda a certeza ele não ia me segurar assim por muito tempo. Eu estava me sentindo uma anã de jardim...

-O que esta fazendo? Me solta!

Ele apenas me encarava nos olhos, mas logo mudou o local para o qual olhava, prestando mais atenção na criatura que chegava ainda mais perto, tornando discernível seus traços, do que em mim. E claro, muito normal o que ele disse...

-Por Hades... O que você fez pra mandarem uma manticora Luna?

-Eu disse para me soltar!

Enquanto falava, olhava para meu braço, com raiva já pelo atrevimento desse garoto. Quem ele pensava que era para me segurar desse jeito? Se ele não tirasse as mãos de mim, ia saber por que eu carregava um canivete buterfly escondido no corpete desse vestido.

Eu não queria realmente machucá-lo, mas ele me soltou ao olhar em meus olhos. Pareciam lembrar alguém para ele, mas não prestei mais atenção, voltando a andar para dentro do salão, com ele me seguindo de perto. Ignorei sua presença, pelo menos até que ele segurasse em meu braço de novo, quando entrava no salão. Ai sim eu me virei para ele, disposta a discutir, mas a expressão de... Medo?

Ele estava com medo de que? Pelos deuses! Ele teria medo de que, sendo que a única coisa que ele tinha feito era me seguir aqui para dentro? O monstro tinha sumido, mas eu ainda não tinha confirmado o que queria. Onde estava Rachel?

Minha mão estava no braço dele, segurando, como se fossemos algum casalzinho, como os poucos que via no salão. Já que ele não ia me soltar, ia arrasta-lo comigo atrás de Rachel. Eu tinha de encontrar a única pessoa que não me chamava de louca quando contava dos monstros que via quase diariamente, me seguindo. Ou se falava que um bando de garotas malucas parecendo que iam acampar tinham me cumprimentado com reverencias. Era algo comum para ela também.

Mas ela não estava longe. E meu companheiro desconhecido e silencioso também parecia ir em direção a ela. Estranho... Quem seria ele? Bem, não importa. Ele teria de me soltar, mais cedo ou mais tarde. E Rachel estava acompanhada por um casal de amigos, o que me deixava ainda mais constrangida de ter um garoto segurando em meu braço.

-Rachel?

-Luna! Que susto você me deu... Esses são Percy e Annabeth. São dois dos amigos de quem falei. E parece que já conheceu Nico.

-Nico?

Minha expressão deveria ter sido o bastante para ganhar uma explicação, mas por eliminação, Nico deveria ser o dito carinha que segurava meu braço como se fosse a coisa mais importante do mundo. O que ele queria comigo?

-Uma manticora esta lá fora, atrás dela. Parou de nos seguir quando sentiu meu cheiro, mas logo deve voltar. Acho que a festa acabou pessoal.

Esse era o desconhecido abusado. Ele ainda estava segurando em meu braço, olhando para os outros e falando com eles como se os conhecesse a tempos. Quem era esse carinha? E por que ele ainda não tinha me soltado? Bem, a resposta era curiosa, mas eu antes ia me livrar dele. Com um safanão, tirei meu braço de junto do dele, dando as costas para o... Nico.

-Agora alguém pode me explicar o motivo desse individuo ter me segurado?

Eles se olharam, como se perguntando de quem era a vez, ao menos até que o prédio todo tremeu, e o bicho apareceu de novo. Dessa vez, no meio do baile de confraternização.