Perdida Em Seu Olhar - (Finalizada) escrita por Eu-Pamy


Capítulo 32
Capítulo trinta e um - Seguindo em frente.


Notas iniciais do capítulo

Essas duas semanas foram semanas difíceis para mim, por isso a demora para postar. Comecei um tratamento que está tomando muito do meu tempo. Peço desculpa para quem está lendo e teve que esperar. Esse é o último capítulo. Eu não pretendo me superar neste final, porque a história não foi feita para surpreender ninguém. Eu só queria contar a vida de uma mulher.
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Desculpem os erros e boa leitura.



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Capítulo trinta e um. – Seguindo em frente.

            - A vida é maravilhosa se não se tem medo dela. (Charles Chaplin)

Menos de um mês depois, minha mãe estava morando comigo. Ela havia se separado do Matheus (por motivos que desconheço); dado entrada na aposentadoria e estava dedicando todo o seu tempo livre com a criação da minha filha. Entretanto nem por isso eu me deixava enganar, pois ela não havia mudado. Ela continuava a mesma Silvia implicante de sempre, mas a diferença era que eu não me importava mais, porque depois de cada comentário desagradável sempre vinha um sorriso e um olhar de ternura. Ela não precisava mais fingir que me odiava ou fingir antipatia por mim, ela só precisava fingir ser a minha mãe. Eu tinha consciência do esforço sobre-humano que ela estava fazendo. Ser legal não era algo natural para ela, pois a palavra “simpatia” não estava no seu dicionário. Ela precisava aprender como um bebê aprende a andar e a falar, a ser mais sociável e carinhosa. E quase sempre acontecia dela esquecer o nosso ‘acordo’ de convivência e ser um pouquinho irritante, mas eu sempre via isso com condescendência e não perdia o controle, porque ela estava tentando no fim das contas e eu respeitava isso. E com o passar do tempo, nós duas ficamos mais tolerantes. Até porque, com ela morando na minha casa, de um jeito ou de outro, ambas tiveram que aprender a tolerar as manias e grosserias da outra, se quiséssemos sobreviver pelo menos até a segunda semana.

Era estranho acordar e dar de cara com a minha mãe na cozinha lavando a louça, varrendo a sala ou preparando o café da manhã, porque isso tudo era muito inusitado para mim. Mesmo dividindo a mesma casa durante anos, na minha infância e adolescência, eu jamais tinha a visto agir como “dona de casa”, já que esse era o papel das empregadas. Admito que depois de algumas semanas, eu até comecei a gostar desta nova Silvia que nascia junto com o sol toda manhã. Passamos tanto tempo nos odiando, que acabamos esquecendo que éramos da mesma família. Eu esqueci que tinha mãe e ela que tinha filha. Tudo era muito novo, muito confuso... Mas não era ruim, na verdade, para ser sincera, era até... Bom. Eu gostava de pensar antes de dormir que quando eu acordasse não estaria sozinha naquela casa, só eu e a minha filha. De algum modo muito esquisito... A companhia da minha mãe estava me fortalecendo. E pela primeira vez desde o acidente do Lucas, eu não me sentia mais abandonada, ao contrário, eu me sentia forte... Pronta para recomeçar. Parecia até que o Lucas havia mandado um anjo (além da minha filha) para cuidar de mim. Se bem que chega a ser absurdo imaginar a minha mãe como um “anjo”.

- Eu sei que você não quer fazer isso. – Ela falou repentinamente, me tirando dos meus devaneios.

Estávamos sentadas no chão da sala, assistindo televisão. Era sábado e estava ventando muito lá fora. Yasmin estava no quarto, dormindo, enquanto minha mãe e eu arrumávamos à sala.          

- Pode ser mais direta? – Soltei, mal conseguindo respirar pelo cansaço. Não olhei para ela para perguntar.

Ela se levantou e se jogou no sofá.

- Você não quer deixar ele ir. – Continuou sendo indecifrável.

- Ele quem? – Perguntei com desinteresse.

- O Lucas. – Olhei para ela automaticamente ao escutar o nome, sentindo meu coração acelerar.

- Não. – Concordei.

- Mas então porque...

- O seguro não vai mais pagar o hospital. Esse é o último mês que eu tenho... Os médicos só estão esperando eu assinar alguns papeis... – Expliquei.

Ela assentiu, mostrando que avia entendido. Voltei a olhar para a TV. 

- Sabe, filha, eu estava pesquisando na internet-...

- Você pesquisando na internet? – A interrompi.

- É. Por quê? O que que tem eu pesquisar na internet?

- Nada... É que eu nunca te vi usar um computador. Nem sabia que você sabia mexer.

Ela pareceu irritada.

- Eu sou contadora, é claro que eu sei mexer em um computador, seria a pior contadora do mundo se não soubesse. Imagine só. Como você acha que eu calculo os impostos dos clientes e faço as Declarações? Com pena, tinta e um pergaminho? – Alfinetou – Eu sou obrigada a saber de cor todos os programas do Sistema, e você ainda me vem com essa de que eu não sei mexer? Poupe-me! – Cruzou os braços.

- Tá. Eu só quis dizer que eu nunca te vi usar um. Não estressa. – Falei rindo. Sua expressão se tornou irônica, mas ela ficou quieta. – Mas o que você ia dizer mesmo? – Tentei levar a conversa para um rumo mais saudável.

Sua expressão voltou a ficar séria.

- Eu ia dizer que estava pesquisando na internet e encontrei vários casos interessantíssimos em que pessoas ficaram em coma durante anos ou até décadas e depois acordaram. Teve um que ficou dezenove anos... Quando ele entrou no coma, a filha dele era uma criancinha entrando na puberdade e quando ele acordou ela era uma mulher formada e com filhos. Acredita?   

- Sim, mas...

- Teve outro caso muito inusitado de uma menina de três anos que ficou em coma por uma semana e quando acordou estava viciada em cigarros, da para acreditar? E outro menino, um adolescente, ficou internado por muito tempo e acordou xingando a mãe! Imagina o susto da mulher. – Ela sorriu brevemente. – Tem pessoas que acordam cantando músicas... Outras simplesmente acordam falando para a enfermeira parar de fazer barulho ou para não mexer nos lençóis da cama. Tudo é muito diferente do que vimos nas novelas... Muitas pessoas perdem a memória, mas é muito raro. Eu vi um caso em que uma menina croata chamada Sandra ficou em coma por um dia e quando acordou sabia falar alemão e tinha esquecido o próprio idioma completamente! Até hoje ela só se comunica em alemão! Dá para acreditar? – Ela tomou fôlego - E eu também encontrei um site em que uma mãe escreve para a filha em coma... O nome da menina é Flavia e ela entrou em coma depois de cair em uma piscina e ter os cabelos sugados pelo ralo... Quando isso aconteceu ela tinha dez anos. – Seus olhos brilharam e ela me olhou com apresso – Isso já faz quatorze anos e ela ainda está em coma. – Encarei o chão, sentindo meu coração apertar. – E mesmo assim, a mãe dela nunca deixou de acreditar. Ela tem o site desde que aconteceu e nunca parou de escrever, porque ela tem fé que um dia a filha dela vai voltar para ela. Ela é uma mulher muito corajosa, mas acima de tudo, ela é mãe. Até hoje ela tenta na justiça a aprovação de uma Lei Federal para a segurança nas piscinas... Porque ela é mãe, sabe o tamanho dessa dor e não quer que mais ninguém tenha que passar por isso.

Senti meus olhos ficarem úmidos.

- Porque você está me dizendo isso? Onde é que você quer chegar?

Ela se levantou do sofá e caminhou até onde eu estava, depois se agachou e segurou a minha mão.

- A filha dela está a quatorze anos presa em uma cama, ninguém acredita mais na recuperação dela, mas a mãe ainda tem fé. A mãe ainda tem esperanças. Se ela pode acreditar, porque nós não podemos Susan? Por quê? Eu sei o que os médicos disseram, mas algumas coisas nem os médicos podem prever.          

- Porque você está fazendo isso comigo? – Disse chorosa, meu rosto sendo molhado pelas lágrimas.  – Porque você está querendo me torturar?

Ela apertou minha mão com mais força.

- Porque eu sou mãe e sei o quanto é dolorido perder o homem da sua vida e saber pelo resto da sua vida que você podia ter feito algo para mudar isso. Eu convivo com essa dor todos os dias. Eu fico imaginando o que eu podia e deveria ter feito, mas que fui covarde demais para fazer. Fico dizendo todos os dias que eu fui fraca. Eu sinto como se eu tivesse abandona o seu pai. Ele se matou por minha causa, porque eu tornei a vida dele insustentável. Se eu tivesse deixado-o viver... Se eu não tivesse sido tão pegajosa e tivesse aceitado o divórcio... Tudo seria diferente. Você entende? Eu não quero que você passe pelo mesmo. Eu não quero que você fique se torturando, pensando em como seria a sua vida se você não tivesse desistido dele. Não quero que essa dúvida exista. Sei que é difícil viver vendo ele naquela cama, mas vai ser muito mais difícil ver ele dentro de um caixão. – Ela não estava chorando, mas sua voz estava marcada por uma tristeza desigual. Ela estava sendo sincera e isso só me fazia querer chorar ainda mais – Eu não quero que você o abandone.

- Mas ele me abandonou primeiro. Ele me deixou sozinha para enfrentar tudo isso! – Murmurei, engasgando por causa do choro.

Ela me lançou um olhar carinhoso.

- Seu pai também havia me abandonado... E eu devolvi na mesma moeda. – Sua mão acariciou os meus cabelos – Mas você não é igual a mim... Você é mais forte que eu. E você tem uma coisa que eu não tive... “Esperança”.

Suspirei.

- Mas o mundo não funciona só com esperança mãe, e o Lucas também não vai ficar vivo só com isso. O meu seguro não vai pagar...

- Eu pago.

- O quê?

Ela sorriu com ternura.

- Eu estou me separando do Matheus... Estamos vendendo a nossa casa e eu vou ficar com metade. Eu também tenho um dinheirinho no banco e outro investido na bolsa. Se eu juntar tudo, acho que dá para pagar tudo o que precisaremos para trazermos o Lucas para casa; assim você o terá por perto e não terá que ir toda semana até o hospital para vê-lo.

- Isso custará uma fortuna. Eu não posso aceitar, me desculpe. Além do mais, antes de morrer a Anabela deixou um dinheiro para a faculdade do Lucas, não é muita coisa, mas eu posso...    

- Eu faço questão. – Olhei surpresa para ela. – Essa é a única maneira de eu me redimir com vocês dois. Esse dinheiro que a Anabela deixou fica para a sua filha, entendeu? – Neguei com a cabeça, discordando – Eu não sei de quem você herdou essa teimosia, - ela sorriu - mas saiba que se formos competir eu vou ganhar, então é melhor você desistir.

- Você faria mesmo isso? Você faria mesmo isso “por mim”?

- Já está na hora de eu começar a agir como mãe. O que eu estou fazendo ainda é pouco. Eu acabei com a sua vida, agora eu quero consertar. Você é minha filha e eu vou cuidar de você. Mesmo que leve vinte anos, eu vou estar do seu lado. Nunca mais eu vou me afastar de você filha, nem de você e nem da minha neta. Não era esse o sonho do Lucas? Então assim será, do modo como ele quer.

Assenti, emocionada.

- Obrigado.

Foi a primeira vez em toda a minha vida que eu disse essa palavra com sinceridade para ela.

.

.

(...)

Faltava uma semana para que o Lucas fosse trazido para a casa. Eu estava em pé no corredor, encarando a porta fechada. Eu me lembrava exatamente da última vez que havia entrado naquele cômodo. Eu estava no meu escritório quando escutei o celular tocar e fui atender. Foi no dia em que tudo aconteceu, desde então nunca mais consegui entrar. Respirei fundo, criando coragem. Lentamente levei minha mão até a maçaneta, mas a retirei quando senti a frieza do metal, como se tivesse acabado de encostar em uma cobra.

- Vamos, você consegue. – Falei em voz alta.

Deixei meus ombros relaxarem, contei até três e levei a mão até a maçaneta, mas voltei a retirá-la.

- Anda idiota, é só um quarto, não precisa ter medo!

Eu já estava perdendo a sanidade quando finalmente consegui entrar. Ao contrário do que eu imaginava, a minha reação não foi tão ruim. Não era como se eu estivesse entrando em uma cena de crime, era só um quarto... Um quarto com muitas recordações. Percebi então, enquanto meus olhos vagavam pelo cômodo, que eu havia tido muito mais lembranças boas naquele quarto do que lembranças ruins. Caminhei até a cama de casal, um filminho passando na minha cabeça. Eu podia lembrar de tudo... De cada momento que eu vivi ali dentro. Lembrei das nossas risadas, das nossas brincadeiras, discussões bobas, lembrei de tudo.

Suspirei, passando a mão nos lençóis ainda bagunçados. Sentei-me na cama, sentindo a maciez do colchão. Depois estiquei a mão e peguei uma almofada. Fiquei encarando a almofada por alguns minutos, então a trouxe para mais perto do meu rosto. Ela ainda tinha o cheiro dele, eu podia sentir. Sorri, em seguida coloquei a almofada de lado e caminhei até o guarda-roupa. Não o meu guarda-roupa, eu caminhei até o dele. Abri a porta do móvel e encarei as suas roupas. O Lucas sempre foi um rapaz muito organizado... Ele sempre foi muito perfeito. Levei uma mão até uma de suas blusas, sentindo a textura do tecido. Eu podia lembrar de todas as vezes que ele usou aquela camisa... Fechei a porta do guarda-roupa e caminhei até a estante. Havia alguns porta-retratos ali, mas um em especial chamou a minha atenção. Fiquei encarando a foto do meu amado por um longo tempo. Eu nunca me enjoava de encará-lo. Fiquei prestando atenção na expressão que ele tinha quando a foto foi tirada. Ele parecia tão feliz, sorridente... Transmitia tanta juventude, tanta imortalidade... Eu mal me lembrava da última vez que o vi sorrir daquela maneira. Peguei a foto entre as mãos e caminhei até a cama, mas parei quando senti que pisei em algo desconhecido. Desviei o olhar da foto e olhei para o chão. Meu coração acelerou e meus olhos ficaram embaçados. Aquilo era... Sim, era.  Respirei fundo, me lembrando daquela noite. Bem ali, no chão, havia uma possa seca de sangue. Senti meu coração doer dentro do peito. Eu deveria ter imaginado que isso iria acontecer. Caminhei até a cama e me sentei, sem tirar os olhos da poça vermelha. Aquilo era perturbador, eu podia até sentia a dor daquele momento... Podia sentir o meu desesperado. Eu sentia tanto medo de perder a minha filha... Estava tão preocupada e assustada.

Sequei meus olhos. Eu não queria chorar.

Meus olhos voltaram a passear pelo quarto, observando cada detalhe, fosse a cor da parede ou o formato dos móveis. Alguns minutos depois, me levantei e caminhei até a janela, abrindo a mesma. Olhei para a rua, depois para o céu. O Lucas adorava ficar olhando para fora da janela. Ele adorava ver o mundo, adorava se perder no desconhecido.

Eu não sei quanto tempo fiquei ali, provavelmente muitas horas, porque o cômodo já estava escurecendo quando minha mãe apareceu no corredor. Ela estava segurando a minha filha.

- Você não está com fome?  - Perguntou sem entrar no quarto, como se aquele fosse um santuário proibido para ela.

- Eu já vou descer. – Ela tentou sorrir.

- Você tem certeza que quer que ele fique aqui?

- Tenho. Esse é o nosso quarto, ele tem que ficar aqui. Além do mais, o cômodo é espaçoso, não é abafado e nem muito frio. É perfeito para ele.  

Ela assentiu.

- Ta bom, eu vou descer, preciso terminar o arroz.

- Mãe! – Chamei antes que ela saísse.

- Oi?

- Me entrega a Yasmin, eu vou cuidar dela agora. – Ela olhou para a porta do quarto assustada. – Você pode entrar mãe. – Sussurrei. Sua expressão se acalmou. Ela caminhou até onde eu estava.

- Eu tenho muito orgulho do que você está fazendo. – Eu não sabia bem a que ela estava se referindo, mas sorri assim mesmo.

- Eu também. – Peguei minha filha, ela me encarou com seus grandes olhos azuis e neste momento tive a impressão de que ela também queria dizer alguma coisa, provavelmente que estava na hora da sua mamadeira. Sorri para a minha linda anãzinha. – Eu vou ter muito trabalho com você, não vou? – Ela suspirou igual gente grande. Olhei assustada para a minha mãe.

- Para você ver, se ela já faz isso agora, imagina quando ela aprender a falar! – Riu.

Gargalhei, nem querendo imaginar.

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(...) Três dias depois (...).

Eu havia terminado de arrumar o meu antigo quarto para receber o Lucas quando decidi que iria pendurar alguns dos seus quadros na parede. Então entrei no seu “refúgio” do mundo e comecei a escolher algumas pinturas. A sensação de estar naquele lugar não foi tão diferente da de estar no nosso quarto, a diferença era que as pinturas eram quase como pequenos pedacinhos espalhados do Lucas. Eu ficava imaginando o que ele estava sentindo quando pintou cada obra. Estar ali era como se eu estivesse dentro da alma dele, dentro da mente dele. Cada quadro representava um momento, um sentimento e um pensamento.

De repente minha mente viajou no tempo e eu lembrei de uma conversa que tivemos há muito tempo atrás. Quase em outra vida.

Estávamos dentro do carro, voltando para casa, quando ele me surpreendeu com uma pergunta nada comum.

– Susan, quando eu for pintor profissional, eu... Eu posso pintar um quadro seu?

Eu quase perdi o controle da direção.

– O que?

– Quando eu for pintor profissional eu posso-...

– Eu escutei o que você falou, mas... Porque você quer pintar um quadro meu?

– Porque quando uma pessoa o ver, saberá exatamente o que está na minha mente... Você.

Sorri com a lembrança. Ele sempre foi um encanto de menino. Balancei a cabeça como um cachorro molhado, tentando afastar esses pensamentos de mim. Andei até uma caixa com quadros e comecei a olhar as pinturas, retirando uma a uma de dentro da caixa, mas me surpreendi quando encontrei no fundo da mesma, um  grande embrulhe. Franzi o cenho, confusa. Porque será que o Lucas mantinha algo assim escondido? Refleti por dois minutos se deveria ou não abrir. Acabei decidindo que sim. Com cuidado retirei o papel e descobri o que era.

- Lucas... – Sussurrei, chorando.

Um quadro. Mas não um quadro comum. Era lindo... A sua obra mais bem feita. Nela ele e eu estávamos abraçados, a pintura só focava da nossa cintura para cima, mas pude perceber que estávamos completamente molhados por causa da chuva... Eu estava usando um vestido branco e cabelos soltos, e ele estava lindo de blusa de mangas compridas também da cor branca. Eu podia ver o mar ao fundo e podia ver também algum tipo de ciclone agitar a água, ele parecia vir na nossa direção... Estava ventando muito, muitas folhas e areia no ar, o céu estava escuro e eu podia ver que nós dois estávamos de olhos fechados... Porém, sorrindo.

Não parecia um quadro, parecia uma foto de tão bem detalhada. Era impressionante, tudo muito real. Por um momento, eu realmente acreditei que aquilo havia acontecido e que alguém havia tirado uma foto de nós dois.    

Então me lembrei que no dia do acidente, ele disse que havia feito um presente para mim...

Comecei a chorar compulsivamente, quase não conseguindo respirar de tão intenso que era o choro.

Eu não podia viver sem ele. Eu não conseguia. Não era forte o bastante. Eu precisava dele, precisava que ele voltasse para mim!

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(...) Dois meses depois (...).

Eu estava arrastando o carrinho da minha filha pelo shopping, passeando distraída enquanto olhava para as vitrines das lojas, quando vi se aproximando de mim um velho conhecido.

- Felipe? – Disse surpresa, quando nos encontramos.

- Oi, Susan. – Ele parecia desconfortável, mas sorriu para mim. Seus olhos se voltaram para o carrinho.

- Faz tempo. – Afirmei, avaliando-o.

- Eu sinto muito Susan. – Falou rápido. – Eu... Eu vi no jornal o que aconteceu e eu sinto muito mesmo. O Lucas... Eu ainda não consigo acreditar.

Tentei me manter calma.

- Não precisa dizer nada, Felipe.

- Ele ainda está no hospital? - Neguei com a cabeça. Ele pareceu ficar muito triste. – Então você desligou...

- Não. – Expliquei, acalmando-o. – Ele está em casa, ele ainda não acordou, mas eu achei melhor ele ficar comigo, assim eu posso cuidar dele.

Ele assentiu compreensivo.

- Ele vai melhorar, você vai ver.

- Tomara. – Concordei. – Mas e então, como vai a vida? – Tentei mudar o assunto.

- Nós estamos levando.

- E como está a Karol?

- Ela... – Suspirou – Ela está arrasada, é claro. Não tem um dia que ela não fale de vocês...

- E os meninos?

Seu rosto ficou sereno.

- Estão grandes e saudáveis.

- Eu imagino.

Ele olhou novamente para o carrinho.

- Essa é a-...? – Não terminou.

- Sim, é ela mesma.

- Está grande. – Sorriu. – Muito bonita a sua filha.

- Obrigado.

- Qual o nome dela?

- Yasmin.

- Ah. Bonito também.

Sorri.  

- Você está passeando sozinho?

- Não, eu vim encontrar um cliente.

- Ah, entendi. Vida de empresário não é fácil, não é mesmo?

- Não mesmo. Mas me diga, como anda a sua carreira? Imagino que você esteja dando um tempo.

- Estou, mas logo vou voltar a escrever. A vida não pode parar.

- É verdade. Susan, eu realmente sinto muitíssimo. Eu sei como deve ter sido difícil para você passar por tudo isso sozinha, ainda mais com uma criança... Eu realmente sinto muito. Sei que devo te pedir desculpas por não ter ido te ver, mas...

- Você não precisa se explicar Felipe. Deve ter sido um choque para vocês também.

- Mas  nada justifica termos te abandonado. Você é nossa amiga, deveríamos-...

  - Não precisa se explicar. – Repeti. – O importante é seguir em frente, nada vai mudar o que aconteceu. Precisamos pensar no futuro e não no passado. Além disso, eu não estou sozinha, tenho a minha filha e a minha mãe.

- Sua mãe?

- É. – Dei de ombros – A vida é uma caixinha de surpresar, não é mesmo? Se existe algo bom nisso tudo... – Não terminei.

- A Karol irá gostar de saber que você está conseguindo seguir em frente. Mesmo ela não admitindo, ela está muito preocupada com você. Vocês fazem parte da nossa família, você sabe. E os meninos... Eles estão com muitas saudades... Chega a dar dó. Mas você conhece a Karol, quando ela coloca uma coisa na cabeça... É difícil fazê-la mudar de idéia.

- Ela tem os motivos dela. – Encarei o chão.

- Susan, eu só quero dizer que... Eu estou torcendo muito para que ele melhore. O Lucas é um bom garoto, não merece passar por isso.

- Ele vai melhorar Felipe, não se preocupe. Ele prometeu para mim que voltaria.

Ele pareceu confuso, mas não perguntou nada.

- Foi bom te reencontrar.

- Também foi bom te rever. Manda um beijo para os meninos e um abraço para a Karol. E diz para ela que se um dia ela quiser conversar comigo... Eu não mudei o número do telefone.

- Eu direi. – Ele sorriu. – A sua filha é linda. – Eu também sorri - Tchau Susan.

- Tchau Felipe.

Fiquei olhando ele se afastar, até que ele sumisse do meu campo de visão. Era triste perder um amigo, mas eu não podia parar de viver por causa disso.

Aquela foi a última vez que eu o vi.

.

.

(...) 

Quase ao mesmo tempo em que minha filha dava seus primeiros passos no mundo, eu voltei a escrever mais inspirada do que nunca. Eu costumava brincar dizendo que a tristeza era a minha inspiração. Meus produtores aviam me dado um tempo para me recompor e o canal estava reprisando os desenhos, mas contradizendo todas as expectativas, eu não voltei a escrever episódios de desenhos infantis, ao contrário, eu comecei a escrever livros para adultos. Contudo, eram romances dramáticos, onde quase sempre o amor era visto como uma força indestrutível. E para a minha alegria e espanto, todos os exemplares publicados do livro foram vendidos em menos de dois meses. Mas o que eu não sabia era que esse era só o começo. Os anos que se seguiram foram marcados por grandes sucessos da minha autoria, que aos poucos começaram a ser exportados para outros paises, até que meu nome se tornou conhecido globalmente. Era bom ser uma inspiração para novos escritores e poder representar o meu país.

Contudo, eu escrevia livros e esses livros viravam filmes. Eu escrevia poesias e essas poesias viravam músicas. Eu escrevia roteiros e esses roteiros ganhavam prêmios. Mas eu mal tinha consciência disso, apenas escrevia por escrever, me refugiando na beleza das palavras, criando mundos e enredos. Eu apenas escrevia para me distrair, não por ganância... O sucesso era apenas conseqüência, uma benção de Deus.

Tudo era como um sonho, uma fantasia de criança. Eu sentia medo, euforia... Estava vivendo um conto de fadas. Mas como toda boa fantasia, essa também tinha seus momentos ruins... E enquanto eu amadurecia e crescia profissionalmente, eu via o meu lindo anjo dormir em sono profundo, sem previsão para acordar.  Eu estava ganhando o mundo, enquanto ele apenas vegetava, sem viver a própria vida, sem aproveitar a juventude que nunca mais voltará... Ele apenas dormia o tempo todo, e mesmo que eu implorasse para ele acordar, ele continuava dormindo. Ás vezes eu me sentia sem esperança, vazia; queria trocar de lugar com ele, eu perguntava: “Por que Deus? Por quê? Por que ele e não eu?” Eu não achava justo, existem tantas pessoas ruins no mundo... Porque logo o Lucas? Logo o meu Lucas?

Nossa filha estava crescendo, criando lindos cachos loiros, seus dentes estavam nascendo e ela estava aprendendo a andar... Aprendendo a falar “mamãe”... E ele perdia tudo. Isso não era justo. Não. Não. Ele não merecia isso. Então porque logo ele?  

Não sei quando ao certo, mas um dia, olhando para ele impotente naquela cama, eu decidi que iria viver a vida por nós dois. Se ele não podia, então eu faria por ele.

Eu sempre fui uma mulher guerreira, sempre lutando minhas próprias batalhas, enfrentando de cabeça erguida qualquer obstáculo que o Destino coloque no meu caminho. Eu sou assim, está no meu sangue. Eu vim para esse mundo para viver. Digo e afirmo, eu morri quando o Lucas foi baleado, mas eu renasci quando a minha filha nasceu. Foi quase ao mesmo tempo, com diferença de minutos, mas aconteceu, como mágica. Hoje sinto como se tivessem levado parte do meu espírito, mas nem por isso eu vou desistir. Afinal, eu sou assim. Se eu for dar um exemplo para a minha filha, vai ser esse: De nunca desistir de viver.

Coragem eu não sei se tenho, mas eu tenho fé, e isso que me impulsiona, é por isso que eu luto, que eu sigo em frente. Eu quero conhecer o meu futuro, quero beijar a minha felicidade e agarrar cada amanhecer, sabendo sempre que nada é eterno.  

Eu não vou mentir, eu choro sim todos os dias, mas não vejo isso como fraqueza. Se eu choro é porque tenho sentimentos, é porque ainda estou viva. Sinto-me como galhos secos de uma fogueira sendo queimados, mas o importante é que apesar da minha dor, eu ainda consigo aquecer quem esta ao meu redor.

Eu enfrento um Leão todos os dias. Algumas batalhas eu perco, outras eu ganho, não faz diferença. A diferença de mim para as outras pessoas, é que mesmo perdendo você não me vê desistindo. Sou como um escravo, que mesmo sendo açoitado, pede aos santos que protejam a alma do demônio branco com os chicotes nas mãos. Porque a força não está em resistir, mas em saber enfrentar.   

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(...) UM ANO DEPOIS (...).

            - A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos. (Charles Chaplin)

Aprendizados.

Com a minha mãe eu aprendi a sofrer, mas com a dor que ela me fez sentir, eu aprendi a sorrir. Porque aprendemos muito mais com a dor do que com a felicidade. Com a felicidade ficamos acomodados, mas com a tristeza não, ela nos ensina a reagir, a correr atrás, a dor nos ensina a dar valor para os momentos felizes. Não quero dizer que é bom uma vida cheia de tristezas, mas a dor é inevitável e muitas vezes só serve para nos fazer amadurecer. Eu amadureci muito cada vez que chorei. Amadureci tanto, que hoje nem mesmo a pior das facadas me dói. Eu não fiquei imune à dor, mas eu me acostumei com ela. Estar triste não é vergonha, a vergonha mesmo é não reagir contra essa tristeza, é virar amante dela.

Minha mãe não é a melhor mãe do mundo, mas ela tentou. E mesmo sem querer, ela me ensinou muitas coisas. Ensinou-me que ás vezes as palavras machucam, que nem todo mundo concorda ou precisa concordar comigo; ela me ensinou o significado de “solidão”, mas me ensinou também o de “perdão”. Ela me ensinou que eu não posso depender dos outros e que eu também não posso ter medo da vida.

Minha mãe é minha amiga, minha inimiga e o meu anjo da guarda. Com a minha mãe eu aprendi que a diferente entre o ódio e o amor é muito pequena, quase invisível. 

Por toda a minha vida ela me detestou, mas quando eu mais precisei dela... Ela estava do meu lado. Quando minha vida desmoronou, ela com toda a sua coragem e perseverança, reconstruiu cada tijolo outra vez.

Mas a lição mais importe que ela pôde ter me ensinado, é que ninguém é imortal. Qualquer pessoa pode morrer a qualquer momento.

Minha mãe morreu quando minha filha tinha um ano e dez meses de idade, em dezembro daquele ano. Ela estava tirando o pó da estante quando teve um ataque cardíaco e morreu a caminho do hospital. E eu estava lá, ao lado dela na ambulância, a vendo partir. Eu segurei sua mão até o último minuto.

Hoje penso que Deus é bom, porque ele me deu a oportunidade de conhecer mais afundo aquela pessoa. Porque ele me deu a oportunidade de ser amiga dela. Se ela tivesse falecido dois anos antes, eu jamais saberia o quanto ela é parecida comigo.

No enterro da minha mãe, eu abracei a minha irmã e disse que a amava, não precisávamos mais do que isso. No enterro da minha mãe eu chorei como sempre fiz, mas desta vez chorei porque sabia que sentiria a sua falta.

Minha mãe me ensinou muitas coisas e eu a agradeço por isso. Ela era chata e temperamental, mas ela era entre tudo, a minha mãe.

             - O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela. (Fernando Pessoa)

            .

            .

***

Durante toda a minha vida, eu vivi perdendo pessoas que eu amava. Primeiro foi meu pai, depois minha amiga Anabela, o Lucas, a Karol... - Mesmo ela estando viva, acho que posso dizer que eu a perdi. - E agora... Perdi também a minha mãe. Eu não sei o que fiz para merecer tais punições, mas eu não posso reclamar, porque ainda tenho a pessoa mais importe: Minha filha.

Quando ela nasceu eu pensei que eu não iria conseguir continuar a viver, mas o tempo provou que eu estava enganada. Eu sou muito mais forte do que imaginei. E mesmo quando minha mãe se foi e mais uma vez eu tive que conviver com a perda, eu não desisti.   

Com o passar dos meses, eu via as árvores mudaram, perderam e ganharem folhas, e via o céu azul celeste no verão e enfezado no inverno. Eu via os feriados passarem, os aniversários... Conhecia pessoas, fazia amizades... Eu era convidada para festas, para casamentos, e às vezes eu até ia. Porque acima de tudo, eu continuava seguindo em frente.

Meu nome é Susan Cllaus, sou uma mulher loira, de olhos claros, com quase um metro e setenta, e mais de quarentas anos. Eu sou teimosa, prepotente, implicante, e até – dizem – engraçada. Sou verdadeira e otimista, e defensora convicta dos animais. Sou velha, mas tenho pensamentos de gente jovem. Sou chorona... Mas AMO dar gargalhadas. Tenho sérios problemas em ser discreta, e não costumo voltar atrás nas minhas decisões. Sou decidida. Mas também sou amiga, conselheira... Sou mãe (Acho que essa é a melhor definição). Sou mulher... Gosto de falar alto, de dançar enquanto faço faxina no sábado de manhã (devo ser a única). Gosto de panquecas. Ás vezes eu sou preguiçosa e durmo a maior parte dos finais de semana, mas por outro lado, sofro muito de insônia, o que não faz sentido. Eu sou paranóica, superprotetora, controladora, ciumenta e tagarela. Sou escritora. Gosto de cozinhar, apesar de não gostar da minha comida. Eu sou louca, descente, católica. Sou boba? Acho que sim, talvez. Odeio muitas coisas, mas gosto de muitas outras. Eu sou eu. Eu sou eu. Eu simplesmente sou... EU. Tenho manias, idéias, chiliques... Porque sou igual a todo mundo. Tenho tantos defeitos... Tantas excentricidades... Gosto de pensar que do meu jeito torto, eu sou única e que faço a diferença.

Meu nome é Susan. Susan Cllaus.  

Sou brasileira. Sou guerreira. Sou forte.

Posso não ser a pessoa mais inteligente do mundo, mas sei o meu valor.

Os anos passam, e eu cresço com eles. Eu aprendo a andar, correr, aprendo a gritar. Vivo em um mundo de perdas, ganhos, e farsas, mas vivo cada dia como se fosse o último. A vida não foi boazinha comigo, mas ela não é com ninguém.

Eu nasci em uma família sem amor, perdi meu pai muito sedo e tive que aprender a sobreviver sozinha. Eu sou como um passarinho, uma águia, um falcão. Vôo livre, sem correntes. Eu quero conhecer o mundo, quero desvendar os oceanos, quero conquistas povos, aprender línguas. Eu quero ser feliz.

 Porque não importa quão devasta seja a tempestade, eu sempre vou correr para a luz.

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 .    

(...) DOIS ANOS DEPOIS (...).

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Eu estava tendo um sonho branco, onde não via nada, apenas ouvia. Não me lembrava bem quando eu havia caído no sono, mas o sonho era bom e eu gostava de estar nele.

No sonho, eu era pequena... Estava quente e cansada. Sempre gostei de ter sonhos sobre a minha infância. Sempre gostei de sonhar com a voz do meu pai, apesar de ser nostálgico eu adorava relembrar como ele era. E desta vez, eu e ele estávamos conversando.   

- (...) E a mamãe nem sempre gosta de fazer mingau para mim... Ela diz que se eu comer muito, vou passar mal, mas eu não como tanto... Mas a mamãe fica preocupada. Ela fica dizendo para mim’ comer jiló, mas eu não como porque tem gosto ruim... Eu gosto mesmo é de comer mingau.

Escutei uma risada abafada.   

- Você é uma garotinha adorável, sabia? – Ele perguntou tão baixo que eu mal entendi, parecia exausto e muito fraco.  

- ‘Brigado, é o que o Tio Marcos diz... Mas ele já não enxerga tão bem. O Charlie disse que é porque ele está ficando velho...  – Sussurrei.  

Eu queria ver onde ele estava, queria ver o rosto do meu pai, mas eu só era capaz de escutar a sua voz, o resto era escuridão.

- Qual o seu nome? - Seu tom era rouco, pouco normal, parecia doente.

- Yasmin, mas todo mundo só me chama de Mine, menos a mamãe... – Respondi de uma só vez.

Três - talvez quatro - minutos de silêncio. Escutei um barulho abafado e depois a resposta.

- Yasmin é um nome muito bonito.

- Obrigado. Você sabe o que sig’fica?

- Não, o que significa?

- Fôr – (flor) - branca.

- É... Encantador. Acho que combina mesmo com você.

Uma risada. 

- Eu posso te contar um segledo’? 

- Estou escutando.

- O livo’ que a mamãe ‘ta fazendo tem esse nome por minha causa, sabia? Ela não me disse, mas eu sei.

- Ela deve gostar muito de você.

- Gosta mesmo... Você quer que eu chame ela?  

Escutei passos contra o chão, e então alguém balançou o meu braço, me chacoalhando. Abri os olhos calmamente, vislumbrando a imagem da minha filha. Eu estava sentada na poltrona do quarto, tirando um cochilo, ou pelo menos achava que estava. Yasmin sorriu para mim, me mostrando suas duas janelinhas.

- Mamãe... – Chamou impaciente, querendo atenção – Acorda! Acorda! Acorda!

Olhei cansada para ela.

- O que foi dessa vez, meu anjo?

Um arrepio subiu pela minha espinha. Havia algo de diferente pairando no ar. Meu corpo reagiu de imediato, ficando tão quente e sensível que quase me assustei.

- O papai acordou! – Gritou eufórica, pulando e jogando as mãos para o alto, como em uma coreografia.  

- O que você disse querida? – Indaguei sem muito interesse.

O que ela estava inventando dessa vez?

Minha filha não era uma garota comum. Aos quatro anos (quase cinco) ela costumava viver suas fantasias como se fossem reais. Ela era muito criativa, gostava de inventar histórias, inventar cenários... Ela tinha a mente do pai, o que sempre me fascinou. Yasmin havia herdado a melhor parte de ambos, havia herdado a melhor parte dos dois mundos. Ela era determinada, curiosa e nunca se contentava com um: “Eu não sei Yasmin”, porque ela sempre queria respostas e quando não as conseguia ficava furiosa.   

- O papai... Ele acordou mamãe!

Mas de vez em quando ela passava dos limites. Tudo bem criar histórias, mas agora contar mentiras era inaceitável.  

 - Claro Yasmin. – Respondi sem paciência, me espreguiçando na poltrona.

Ela revirou os olhos, parecendo tão desaprovadora quanto a minha mãe costumava ser.   

- É sério mamãe - Ela cruzou os braços fortemente sobre o peito e fez beicinho -, eu não estou inventando dessa vez. Olha só. – Com isso, ela saiu da minha frente, me mostrando a cama de casal no centro do quarto.  

Foi então que eu vi.

Sentado sob a cama, ele me encarava com curiosidade, seu rosto inconscientemente declinando levemente para o lado, como sempre fazia quando algo o intrigava. Seus cabelos estavam um pouco grandes e desarrumados, caindo sobre o rosto, e ele usava uma roupa confortável.  

- Tempo demais. – começou - Acho que eu perdi tempo demais. – Disse contrariado; a boca formando uma linha reta no rosto e seu olhar fixo nos meus.

Ele parecia tão vivo... Como se esse tempo todo estivesse fingindo que estava dormindo, como se ao invés de quatro anos ele tivesse dormido apenas uma única noite. Por um bom tempo eu ponderei se aquilo era ou não verdade.

Levantei da poltrona, meu corpo tremendo. Levei a minha mão à boca. Eu queria gritar, queria chorar, mas não era capaz, por algum motivo, cada célula do meu corpo estava paralisada.

Talvez eu estivesse sonhando. Isso seria muito comum, pois cansei de acordar suada a noite depois de sonhar com ele voltando à vida. Mas dessa vez era diferente, muito mais real, e eu não tinha certeza se possuía imaginação suficiente para inventar tudo isso.

*

*

*


            Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
            Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar autor da própria história.
            É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.
            É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
            Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um “não”. É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.


            Augusto Cury


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Notas finais do capítulo

Bom, deixa eu explicar esse final. Neste último capítulo eu não quis focar na recuperação do Lucas, e sim na superação da Susan, porque a determinação dela sempre foi o foco da fic. Essa fic não precisa ser uma fic de amor, o meu desejo mesmo é que ela se torne uma inspiração para quem a ler. Todos os dias pessoas choram e dizem que suas vidas não tem mais sentido, dizem que querem morrer, e na maioria das vezes esse sentimento acaba tomando conta da pessoa. A personagem que eu criei é o contrário disso. Ela nunca desiste, nunca deixa que sentimentos ruins a dominem. A Susan não é uma mulher especial, diferente das outras, ela só é mais corajosa, mas determinada. Nenhum problema é grande demais para apagar o brilho do seu olhar. Eu realmente espero que quem leia essa história se inspire. Todos nós passaremos por momentos complicados no futuro, é inevitável; mas precisamos ser fortes para superar.
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O epílogo será o ponto final desta aventura.



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