Perdida Em Seu Olhar - (Finalizada) escrita por Eu-Pamy


Capítulo 20
Capítulo dezenove - Um ano, em um capítulo.




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Capítulo dezenove. –  Um ano, em um capítulo.              

Subtítulo: Medo de avião.

(Fevereiro)

Quando as aulas do Lucas começaram, vi tudo voltar ao normal, e recebi com muito prazer, a minha rotina de volta. As coisas estavam indo bem na loja, e mais ou menos na segunda semana de fevereiro, com a aposentadoria de uma funcionaria antiga, fui promovida como a mais nova gerente do pedaço, com direito a festa e tudo, mas o que eu mais estava interessada mesmo, não era com a promoção e sim o aumento salarial que eu receberia no novo cargo. O mais impressionante foi que, quase ao mesmo tempo em que o Carnaval chegou na cidade, Fernando Henrique também nasceu, eximindo para todo mundo, seus valiosos três kilos e quinhentas gramas, deixando seus pais orgulhosos e os médicos apaixonados pelas suas bochechas gordinhas e pezinhos redondinhos. Quando mãe e filho chegaram em casa, se depararam com uma festa a altura, preparada pelos amigos e parentes que lotavam a casa. Fernando Henrique era o sinônimo de simpatia, sempre sorrindo para  qualquer um que estivesse disposto a brincar um pouco com ele, e encarando todos com seus grandes olhos castanhos com curiosidade e ás vezes, com certa estranheza, mas na maioria das vezes, nada era capaz de tirar o seu bom humor, que ao meu ver, fora herdado dos pais.         

 - Parece que ele gostou de você... – Disse Karol para Lucas, alguns dias depois. Lucas sorriu, olhando para o bebe adormecido em seus braços.

- Eu também gostei dele.

(...) Março (...)

Com a chegada do Outono, a cidade foi banhada por um clima gostoso, que me fazia sorrir. Alguns dias se passaram rápidos demais, enquanto outros pareciam nunca ter fim. E naquele dia em especial, eu olhava para o relógio e sentia a vontade de que as horas passassem mais rápido. 29/03/2000. O dia do meu vigésimo oitavo aniversário.

Á tarde, depois de receber presentes de todos os meus amigos e alguns telefonemas de parentes (alguns tios e primos), sai com o Lucas para passearmos. Sem muitas explicações, ele pediu para que eu comprasse um passarinho para ele. No inicio, eu não entendi, mas como ele disse que era importante e tinha a ver com a sua mãe, eu cedi. Quando chegamos em casa, foi que ele me explicou do que se tratava.

- É uma tradição entre a minha mãe e eu... – Começou. – Ela disse que no começo, fazia isso por causa de uma promessa, mas no fim, acabou se tornando uma brincadeira que só nós dois compartilhávamos. Sempre que fazemos aniversários, ela e eu comprávamos um passarinho e no final do dia, nós o soltávamos para serem livres.    

- E você quer que eu também participe? – Perguntei emocionada.

- Claro.

(...) Abril (...)

Com o passar dos meses, comecei a notar algumas mudanças sutis, mas existentes, acontecerem com o corpo do Lucas, e isso me assustava um pouco. Certo dia depois de acordar, desci as escadas e fui preparar o café, mas quando o chamei, tomei um susto ao reparar que suas sobrancelhas estavam mais grossas do que costumavam ser. Semanas depois, notei que suas mãos, que antes costumavam ser pequenas como á de uma criança de sete anos, estavam maiores e seus dedos mais grossos. Eu não via problema nenhum naquelas mudanças, apenas ficava assustada com a rapidez que elas aconteciam.

Como de costume, em Abril, marquei para ambos, uma bateria de exames, só por garantia. E fiquei surpresa com os elogios que o médico fez sobre a saúde dele e sobre a minha.       

  - Não fique assustada com as mudanças que estão acontecendo com ele, isso é devidamente normal nesta idade, além de ser apenas o começo. Lembre-se, ele não terá nove anos pelo resto da vida. – Disse o médico, vendo a minha preocupação.

O que me espantava mesmo, na verdade, era quando eu ia buscá-lo na escola e percebia a diferença obvia dele para as outras crianças. Lucas não era só maior do que as outras crianças, mas era também mais forte e mais encorpado, podendo facilmente ser confundido por uma criança de treze anos. As pessoas costumavam me dizer que no futuro ele deveria ser modelo e que provavelmente terá muito êxito em seus relacionamentos quando for mais adulto, mas só de imaginá-lo como modelo ou em um relacionamento, eu me arrepiava.

- Bonito desse jeito, ele certamente te dará muito trabalho, Susan. Anote as minhas palavras – Disse Tatiana, minha nova vizinha.       

   Olhei para ele sentado em uma cadeira no meio do quintal, enquanto lia um livro e aproveitava para tomar Sol.

- Eu espero que não... – Falei com sinceridade, sentindo aquela sensação estranha me tomar.

(...) Maio (...)

Maio chegou rápido como um suspiro. Ventava muito por toda a cidade, e por isso, resolvi ir as comprar, já que Lucas e eu precisávamos de casacos novos. Percebi então, que ele, como qualquer outro rapaz, não tinha paciência para esperar mulheres escolherem suas roupas.

- O que você acha dessa? – Perguntei. Estávamos em uma loja muito conhecida da cidade. Eu mostrava para ele um vestido vermelho, colocando-o na frente do corpo. – Muito chamativo? – Indaguei; esperançosa que ele dissesse que não. Ele deu de ombros.

- Não se você for uma árvore de Natal. – Disse emburrado, saindo da loja. Fiquei encarando-o com a boca aberta, enquanto escutava algumas vendedoras rirem pelas minhas costas.

Alguns dias depois, enquanto caminhava pela rua, vi um cartaz pendurado em uma loja de café, curiosa parei para ver do que se tratava. “Show de Rock para todas as idades. Próximo Sábado, inicio da apresentação: 19h00min e termino: 01h00min da madrugada. Galeria Saara. Apresentações especiais: Capital Inicial e Traje a Rigor. Ingressos Vinte reais. Venham todos presenciar o Show de suas vidas! Promoção para crianças menores de dose anos e idosos” li em voz alta no meio da rua, em seguida, peguei o meu telefone de dentro da bolsa e liguei para casa. Lucas atendeu no primeiro toque.

- Tenho novidades. – Falei alegremente.

No dia seguinte ao Show, Lucas e eu estávamos exaustos, mas mesmo assim, tivemos que sair bem cedo pela manhã de casa, porque havíamos sido convidados para uma festa de aniversários, a segunda daquele mês.

- Nossa, que menino adorável! – Disse meu tio Marcos, irmão do meu pai, abraçando o Lucas. O menino riu envergonhado, querendo ser educado.

Meu tio olhou para mim, e ergueu os braços para cima, depois me abraçou.

- Você está lindíssima! – Falou feliz.

- Obrigado... – Falei, quando ele me soltou. – Onde está o Charlie? Eu quero entregar o presente... – Charlie era o meu primo e o aniversariante do dia, ele estava fazendo vinte e quatro anos, pelo que sei. 

Marcos negou com a cabeça.

- Ele foi buscar a namorada, mas deve voltar logo. Entrem, por favor, e sintam-se a vontade, a casa é de vocês.        

(...) Junho (...)

15/06/2000

Era uma terça-feira, e eu havia pedido o dia de folga para a minha patroa sem ele saber e secretamente também havia ligado para a escola dele dizendo que ele não iria ir. Coloquei uma roupa que supus ser adequada, peguei a bolsa que eu havia arrumado na noite anterior, e segui para o quarto dele. Eram cinco horas da manhã, e ele ainda estava dormindo, sem suspeitar de nada e provavelmente achando que ele e eu só nos veríamos na hora do almoço. Sentei-me na beirada da cama e comecei a acordá-lo. Quando seus olhos se abriram, eu sorri.  

- Você tem dez minutos para se arrumar, se não vamos nos atrasar. – Falei, me levantando.

- O que? – Perguntou sem entender.

- Se arrume primeiro, depois eu te conto. Quando terminar, desça, eu estarei te esperando. – E sai do quarto, fazendo mistério.

Esperei-o na garagem. Quinze minutos depois, ele desceu. Estava vestindo uma calça jeans e uma jaqueta, seus cabelos um pouco desgrenhados.

- Aconteceu alguma coisa? Alguém sofreu um acidente? – Perguntou para mim. Eu ri.

- Entre no carro. – Ele obedeceu. – Coloque o cinto. – Ele colocou.

- Para onde vamos? – Perguntou confuso, querendo respostas.

- Você vai ver. – Dei partida.

- Porque você não pode me dizer?

- Você vai ver. – Repeti.

Dirigi por mais de três horas (ele dormiu mais da metade do caminho), até que finalmente chegamos onde eu queria. Acordei-o e depois saímos do carro, e quando ele olhou para cima do morro, se assustou.

- É o que eu estou pensando que é? – Perguntou, sem acreditar.

Respirei aquele ar gostoso.

- Exatamente, achei que já estava na hora de você conhecer o Cristo Redentor. – Uma pausa. – Ah, e... Feliz aniversário Lucas.

(...) Julho (...)

 Quando Julho chegou, recebi a visita de Karina (a minha prima, filha da minha tia Carmem) e do seu novo namorado, Ronaldo. Eles passaram duas semanas conosco, e eu aproveitei a sua estadia na minha casa, para fazer com que eles levassem o Lucas para a praia todos os dias. No final das duas semanas, eles estavam parecendo três camarões de tão vermelhos.

- Lucas, eu não falei para você usar protetor solar? – Falei nervosa, enquanto passava hidratante nas suas costas.

- Ai! – Disse, quando eu toquei em um ponto sensível – Desculpe-me.

Meses depois (...) Novembro (...).

Novembro foi um mês especial, porque foi o mês da tão aguardada Formatura do Lucas e a despedida daquela escola, logo, teríamos que procurar outro colégio para ele estudar. Com as melhores notas da sala e escolhido como o melhor aluno da quarta-série, ele subiu naquele palco para receber o seu diploma e todos os professores, eu percebi, ficaram de pé para aplaudi-lo, alguns pareciam até chorar. Ele estava vestindo uma bata e um chapeuzinho de formando, tudo da cor azul e muito tradicional; e eu estava vendo tudo ao fundo, com os outros pais. A cerimônia durou pouco mais de duas horas, alguns alunos fizeram apresentações, o coral cantou, e uma aluna baixinha fez um discurso. Ao fim, a diretora agradeceu a todos os alunos e desejou sorte, dizendo que estava agradecida por tê-los como alunos, e todos a aplaudiram de pé, assobiando e gritando o seu nome, fazendo-a chorar.

- E então, como você quer comemorar? Com pizza ou com um assalto à sorveteria? – Perguntei, enquanto saiamos. Ele me olhou pensativo.

- E porque não os dois?

Eu ri.

- Era exatamente o que eu queria escutar.

(...) Dezembro (...)

 Em dezembro, minha patroa finalmente me deu férias, e com isso, decidi que era o momento certo para uma viajem. Comprei as passagens um mês antes, mas o difícil mesmo, foi convencer certo alguém a viajar de avião.

- Eu não confio naquele negócio! – Ele falou irritado, quando eu insisti. – Não tem nada segurando ele lá no alto! E se ele cai? Vamos virar picadinho! Já imaginou isso? – Indagou.

Suspirei, cruzando os braços.

- Lucas, mas quem disse que vai cair?

- Você não assisti o jornal não? Cadê o seu bom-senso?

- Lucas...

- Esquece Susan. Eu não vou subir naquele troço de jeito nenhum, não mesmo! Pode tirar essa idéia maluca da sua cabeça! Não há nada que me faça mudar de idéia.

- Mas eu já comprei as passagens... – Tentei fazê-lo entender o meu ponto de vista.

Ele abriu a boca, mas depois fechou.

- Eu não quero morrer. – Ele falou depois de um longo tempo. Eu quase ria daquela cena.

- Mas você não vai morrer!

- É isso o que todo mundo diz antes de entrar em um avião, até que no meio da viagem, aquele troço despenca do céu e ai adeus vida. Todo mundo vira patê

- Lucas, você não quer que eu veja a minha irmã? Você não quer conhecer as minhas sobrinhas? – Esses eram os meus últimos argumentos. Ele se sentou no sofá.

- Não é isso... – Disse com a voz triste, olhando para o chão. – É que... é complicado. – Me encarou – E se você ir sem mim? Sabe, eu posso ficar com o Tio Marcos, ele é legal. Ou com a Karol... Sei que ela não vai se incomodar. Eu posso até ajudar ela a cuidar do Henrique... Eu gosto dele. Vai ser divertido. Ele e eu vamos brincar juntos e... E você vai poder ver a sua irmã...

Arrastei-me até o sofá, então me sentei ao seu lado e segurei as suas mãos, o fazendo encarar os meus olhos.

- Lucas... Não é por isso que eu quero que você vá. Sim, é claro que eu quero que você conheça a minha irmã e a família dela, mas é que para mim, essa viagem também é muito difícil. Eu e ela nunca nos demos bem... – Sorri tristonha – Temos uma péssima relação... Entende? – Ele assentiu – Mas o que eu mais quero nesse mundo, é que isso mude. Eu quero ser amiga dela, e não inimiga. E também tem as minhas sobrinhas... Eu as amo muito e elas ainda são muito jovens... Eu tenho que aproveitar agora, que elas são pequenas, porque logo elas serão crescidas e donas dos próprios narizes e não vão querer nada comigo. – Respirei fundo – Mas eu não consigo fazer isso sozinha. Eu não consigo... Eu preciso que você esteja lá para me ajudar. Eu preciso de você lá, se não vou me sentir sozinha... E eu não quero estragar tudo. Você entende Lucas? Entende como é importante você ir nessa viagem comigo? Eu sei que é difícil para você, mas também vai ser para mim. Mas do mesmo jeito que você vai estar do meu lado, me confortando, eu vou estar do seu. Não vou deixar que nada aconteça com aquele avião, eu prometo.

Ele me olhou por um longo tempo, perdido em conflitos internos e quando eu já estava quase perdendo as esperanças de receber uma resposta, ele diz:

- Na Bahia faz frio? – O encarei – É que eu quero saber se eu vou precisar levar muitas blusas de frio...

Sorri.

- Não, lá é bem quente.

O abracei, agradecida. 


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