Antes das Seis escrita por Moony


Capítulo 3
Como cão e lobo




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Capítulo 3 - Como cão e lobo

Ok, dessa vez estávamos realmente evitando um ao outro. Ao menos fiquei feliz em ver que ninguém mais além de James, Lily e a amiga nos olhavam com ares de 'se entendam'; isso significava que elas não tinham dito nada do que viram a ninguém. E James... Ele não precisava ver as coisas pra saber que havia algo errado.

“Vocês estão muito estranhos ultimamente, sabe.” - ele comentou, sério. Estávamos sozinhos na Sala Precisa, matando uma aula de História da Magia. Curiosamente, percebi que James não estava fingindo a seriedade, como costumava fazer. Isso significava que o assunto era grave mesmo. Vendo que eu não ia dizer nada, ele continuou. - “Você ainda não percebeu o que está acontecendo, Pad?”

Dei de ombros. James suspirou e procurou palavras pra explicar.

“Então não cabe a mim lhe dizer.”

“Ah, qual é, James... O que é que eu não percebi?”

“Eu acho que você já percebeu sim, só não quer admitir. E se demorar muito vai acabar sendo o último a saber, porque Hogwarts inteira já parece ter se tocado.”

“Do que você tá falando?” - ok, ele tinha me deixado realmente confuso.

“Preste mais atenção no que acontece ao seu redor, Pad.” - ele falou, enigmático, e foi-se embora.

O que seria tão difícil assim pra ele explicar? Saí também da sala quando a sineta tocou e o movimento nos corredores aumentou. A última frase de James servira para redobrar minha atenção nos alunos e suas conversinhas de canto de parede, mas até chegar ao Salão Principal não ouvi nada de estranho.

“Cadê o James?” - perguntei a Remus, me sentando ao seu lado na mesa.

“Atrás da Lily, eu acho. Ele quer que eu fale com ela, mas não deixa a coitada respirar...”

“Problemático.”

“É... Sirius, eu...” - ele começou, em um tom mais sério e um tanto hesitante. - “Queria conversar com você. Depois do jantar.”

“Tá bom.” - respondi, inseguro. Só então me dei conta de uma coisa... - “Ei!”

“Que foi?”

“Você tá falando comigo! Você não tava falando comigo desde aquele dia...”

“Já chega, já chega...” - ele me advertiu, meio divertido, meio zangado, notando que já tinha gente interessada demais no que eu ia falar. - “É mais ou menos sobre isso que eu quero falar com você.”

Era o dia das frases enigmáticas, com certeza. Terminei meu jantar apressado e fomos até o dormitório, vazio naquela hora. Remus se sentou na sua cama e eu sentei ao seu lado, curiosamente nervoso. O que ia ser dessa vez?

“É que... Eu acho que, em vista do que aconteceu naquele dia, a gente devia tomar mais cuidado em relação a certas coisas que fazemos...”

“Tipo o quê?”

“Bom, eu acho que não devíamos mais dar motivos pra que fiquem falando de nós pelos corredores.” - ele respondeu, com um sorriso amargurado.

“E o que falam de nós? Não tô entendendo nada, Remus.”

“Ai, Sirius, você nunca percebe nada... É realmente incrível.” - ele disse, numa voz sofrida e tentando sorrir.

“De novo essa história! O que é que eu não percebo, dá pra fazer o favor de me dizer?”

“É que você não percebe que as pessoas falam de nós sempre.” - ele falou depois de um pesado suspiro.

“E o que, exatamente, elas falam de nós?” - insisti, cauteloso. Remus parecia ter dificuldade em responder.

“Eles... Dizem que estamos juntos e tal... E que vivemos brigando porque você não deixa de sair com garotas pra ficar comigo de vez e... Que eu vivo amargurado por causa disso e etc. Isso pra não mencionar os detalhes mais pesados.” - ele concluiu, agora definitivamente triste.

“Eu não... Não sabia dessas coisas...” - falei, chocado.

“Claro que não sabia, você só vive pra você mesmo, acha que o mundo gira ao redor do seu umbigo!” - ele explodiu, quase às lágrimas, pra logo depois pôr as mãos na boca como uma criança se recriminando por dizer besteira. - “Desculpe, Sirius. Eu só estou nervoso, é só isso...”

Respirei fundo, tentei não ter raiva dele e nem remoer o que tinha sido dito, e continuei.

“Então... Basicamente, o que você quer é que não pensem mais isso? Que não discutamos mais e nem andemos mais sozinhos por aí?”

“Não precisamos parar de andar juntos... Mas vamos nos tratar como amigos se tratam. Apenas amigos, entende?”

“Não, não entendo.” - ao ouvir isso Remus rodou os olhos e suspirou mais uma vez, impaciente. - “Sempre nos tratamos como amigos.”

“Não é bem assim... Quero dizer, pra nós é, mas pro outros não... Você me trata com mais cuidado, Paddy, com mais... Carinho, eu acho.” - ele acrescentou baixinho, aparentemente tentando reprimir um sorriso.

“O que você quer que eu faça? Que saia por aí batendo nas suas costas e te xingando, como esses trogloditas fazem?”

“Ah, Sirius... Você fala como se eu fosse feito de porcelana. Acha que se fizer isso eu vou quebrar?”

“Ac... Não, não é isso, mas...” - gaguejei. Remus deu um sorrisinho meio infeliz.

“Eu não sou uma garota, Sirius.”

“Eu sei que não. Você é melhor que qualquer uma delas.”

Mais uma vez eu tinha falado demais... Olhei pra Remus com cuidado, com medo da sua reação às minhas novas palavras desenfreadas, e ele me olhava de um jeito estranho que eu não conseguia distinguir se era raiva, susto ou alegria. Por fim, ele se decidiu por um sorriso nervoso.

“Acho que isso isso foi um elogio, Sirius, mas mesmo assim... Apenas entenda que eu não sou uma garota, tá?”

Concordei e fui pra minha cama, me fechar entre as cortinas. Segundos depois ouvi Remus reclamar:

“Não fique agindo como uma criança, Sirius!” - ele disse, e vendo que eu não respondia, puxou as cortinas da minha cama, se sentou à minha frente e as fechou de novo. Só o que havia entre nós era a escuridão e a respiração pesada de Remus. - “Eu só quero que parem de me tratar sempre como o pobre coitado da história.”

“Eu sei, eu sei...”

“Então não faz isso!”

“Isso o quê?”

“Se fechar aqui dentro, como se eu tivesse te pedindo o impossível! Aliás, se você quiser, acho melhor esquecer isso tudo...”

“Você não disse que não quer mais ser o 'coitado'? Não precisa esquecer isso, é só que eu... Sei lá, preciso colocar minha cabeça no lugar por causa de umas coisas, só.”

“Posso ajudar?”

“Não, acho que não...”

“É alguma garota?” - Remus perguntou com um quê de amargura na voz.

“Não... Quero dizer, mais ou menos...” - o que custava inventar um pouco? - “Eu gostaria de saber o que estou sentindo.”

“Sirius Black se apaixonou?” - ele disse, agora decididamente zombando.

“Acho que sim. Pela garota mais incrível de toda a Hogwarts... Você não tem noção de como ela pode ser maravilhosa e nem ao menos se dar conta disso...”

“Não precisa continuar a lista das qualidades dela, obrigado.” - Remus reclamou, irritado, e saiu batendo a porta.

Minha primeira reação foi pensar 'o que foi isso, meu Deus?'. A segunda? Gargalhar. O doce prazer de atingir um alvo. Sim, eu estava me tornando sádico...

“Tudo bem?”

James entrou no quarto, me olhando como quem ainda está decidindo se me acha louco ou não.

“Achei que tinham brigado.” - ele continuou. - “Porque 'cê tá rindo?” - perguntou, agora começando a rir também.

“Eu não sei, mas... Bom, eu comecei a contar a ele que estava apaixonado e... - e me dei conta da besteira que dissera. Um sorriso demoníaco surgiu em Potter. - Ah, esqueça, esqueça, esqueça...”

“Admitiu, então?”

“Esqueça, James, esqueça...”

“Não, não agora que você percebeu!”

“Do que você tá falando? Eu só tava inventando, eu não... Percebi? Percebi o quê? Espera!”

Plim. Luz.

“Oh, não. Não, não, não...” - comecei a lamentar. Porque não percebi antes?

“Sim, infeliz!” - James exclamou, me jogando travesseiros. - “Três vivas ao mais novo casal canino de Hogwarts!” - ele concluiu, solene.

“Não, mas... Não pode ser. Porque isso agora? Porque isso está acontecendo?”

“Pergunte ao seu eu interior, Pad, e não a mim. Bom, agora que você acordou pra vida temos que começar, não é mesmo?”

“Começar o quê?”

“Como o quê? Você quer ele ou não quer?”

Uma pergunta muito simples. Até demais. Porque eu não sabia respondê-la? A verdade incontestável se descortinou diante dos meus olhos; eu estava apaixonado por Remus. Sim, era incontestável... Toda a Hogwarts já tinha percebido, até meu reflexo no espelho já tinha percebido e, no entanto... Eu não. Mas agora eu sabia, e um mundo de lembranças que me confirmavam tudo isso se passava na minha cabeça, e ainda assim James me bombardeava com uma pergunta dessas. Será que ele não via como eu estava confuso?

“Eu nunca gostei de garotos, Prongs... Porque isso agora?”

“Mas você não gosta de garotos, Sirius, gosta do Remus. É diferente. Eu acho.” - concluiu, pensativo.

“Faz sentido...”

“Você ainda não me respondeu. Quer ou não quer?”

“Quero, você sabe que eu quero.” - por uns instantes duvidei se aquela resposta era minha. Mal senti quando ela saiu, mas ainda assim eu sabia ser tão verdadeira... Estranho.

“Ótimo.” - James falou, juntando as mãos e se pondo a pensar em algo. - “Bom, então você tem que conquistá-lo, não é mesmo?” - pobre James, parecia achar as coisas tão simples...

“Fácil, né?” - zombei.

“Ah, vai... Você vive fazendo isso com dezenas de garotas por dia, não é mesmo? Não deve ser tão diferente.”

“Remus não é uma garotinha apaixonada, Prongs. É um lobo particularmente temperamental, isso sim.”

“Ora, então veja o lado bom... Ao menos você já sabe de tudo o que ele gosta, do que não gosta... Não é exatamente um terreno desconhecido.”

“Pois é...”

Remus e Peter entraram no dormitório. Meu lobinho estressado sequer me olhou, apenas se dignou a permanecer com uma expressão de intenso desagrado até fechar as cortinas de sua cama.

--

“Não, não é assim.” - Remus me corrigia, no meio de uma aula de História da Magia.

“Não importa... Não estou com a mínima vontade de copiar isso.”

“Como quiser.” - Remus suspirou, se resinando a me observar, entediado, enquanto o Binns rabiscava na lousa e, ainda assim, não parava de falar sobre os malditos duendes e sua revolução idiota. - “E sua garota?” - ele perguntou, parecendo depois se arrepender de ter aberto a boca.

“Que tem ela?” - respondi, procurando disfarçar um sorrisinho cínico.

“Não pode nem ao menos me dizer quem é?”

“Não acho que haja necessidade...” - respondi, e ele rodou os olhos, magoado.

“Antes você costumava me contar o que lhe acontecia.”

“Eu até contaria, se você não se inflamasse toda vez que tento falar da coitada.”

“Eu não me inflamo, Sirius.”- ele falou, mortal. - “Só acho que está exagerando...”

“Não, não estou.”

“Você nunca gostou realmente de alguém, porque gostaria agora?”

“Talvez eu tenha encontrado a pessoa certa, oras.”

Remus não disfarçou uma risada de descrença. Incrível como ele realmente parecia odiar a idéia de que eu estivesse apaixonado por alguém. Seria ciúmes?

“Sabe de uma coisa, Moony?” - sussurrei, chegando mais perto dele.

“O quê?”

“Se eu te disser que não é uma garota, o que você me diz?” - cochichei no ouvido dele.

A sineta tocou. Os alunos ao nosso redor davam tudo de si para conseguir sair o mais rápido possível daquela sala e Remus ainda me olhava, estupidificado.

“O que você está me dizendo?” - ele pergunto venenosamente baixo.

“Não fale assim, senão vou começar a creditar que você é ciumento.”

“Eu? Você enlouqueceu? Não é nada disso! Eu só... Você não pode estar falando sério, isso é uma brincadeira, não é?” - Remus perguntou, quase que desesperado.

“Não.” - respondi, firme.

“Mas... mas você nunca gostou de garotos, Sirius!”

“Bom, talvez eu goste de um apenas. O único.”

“O que ele tem de tão especial pra ter conseguido o coração de Sirius Black?” - Remus perguntou, meio zombando, meio curioso, colocando sua mochila nas costas.

“Ah, muitas coisas... Admiráveis olhos dourados por exemplo.”

Soltei, olhando diretamente nos olhos de Moony, e saí, sem olhar pra trás. Entrementes, algo me dizia que mais direto não poderia ser.


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