Kira escrita por atalanta


Capítulo 10
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

Conheçam mais uma misteriosa personagem.



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Cada amanhecer é uma surpresa, um presente. Trás com ele todos os acontecimentos de um novo dia. Eu havia acordado antes de todos, logo cedo. Não havia muito que fazer até a hora de ir para o templo, eu já havia preparado o café e estava procurando algo para me ocupar. Na sala tudo parecia bem limpo e organizado, exceto pela imensa estante de papiros. Era uma desorganização surpreendente. Rolos e mais rolos, levaria dias para encontrar um papiro especifico.

 

 

Vi que ali havia uma atividade que me manteria ocupada, sem contar que era uma boa chance de verificar os arquivos de Derek, algo sobre mim poderia estar ali. Eu comecei retirando todos eles dos pequenos compartimentos e colocando-os na mesa de Derek.

 

 

Eu não podia simplesmente coloca-los de volta aleatoriamente, deveria haver uma organização funcional. Comecei lendo todos eles e tentando identificar o assunto, muitos dos textos estavam relacionados com as rotinas no templo. Eu separei cada um deles de acordo com o alfabeto egípcio. Eu identifiquei cada rolo com pequenas etiquetas e os distribui nas prateleiras novamente. Finalizando o trabalho, duas horas depois, eu fiquei satisfeita com o resultado, estava melhor do que eu esperava.

 

 

Quando terminei, eu distraidamente olhei pela janela da sala. O céu estava cinzento provavelmente iria chover. Mas era outra coisa que me interessava. A rua começava ficar movimentada. Fui atraída instantaneamente para a porta, Derek ainda não gostava que eu saísse sozinha, mas eu não pretendia sair. Mas eu queria estar lá fora. Sem pensar muito eu peguei na mesa de Sed, folhas de papiro em branco e o pote de tinta, eu iria escrever sobre o que eu via.

 

 

Sentei-me na escada com o papel sobre o colo e comecei a escrever sobre o que eu observava. As pessoas, os cheiros, os sons que me encantavam. Era tão novo como da primeira vez que eu vi. Eu já era conhecida como a sobrinha de Derek, algumas pessoas quando me viam cumprimentavam outras chegavam a fazer uma reverência.

 

 

De longe eu avistei uma figura que chamou minha atenção, não sei exatamente o que era, mas eu não conseguia deixar de admirá-la. Tudo nela parecia orgulhoso, seu andar era esplêndido. Com uma segurança e leveza impressionantes. Seu corpo parecia se mover em câmera lenta para que todas pudessem vê-la.

 

 

Era muito bonita, quase aristocrática. Ela usava uma túnica branca longa, que parecia esvoaçar com o vento. Os pulsos eram adornados por belas pulseiras de ouro. No pescoço ela exibia uma peça que eu gostava uma Ankh egípcia, uma cruz com uma volta sobre a barra horizontal. Era um símbolo que me encantava. E seu rosto era quase uma escultura, formas retas e sérias. Com um sorriso tímido que parecia brincar no rosto. Os olhos estavam cobertos com tinta escura, uma bela sombra nos olhos castanhos. Os cabelos eram perfeitamente penteados, presos com uma pequena tiara no topo da cabeça.

 

 

Ela passou por mim lentamente, não interrompeu seu andar quando olhou para mim, diretamente para mim. E apenas aquele olhar me pareceu cheio de significado.

 

 

— Eu tenho um aperto no peito toda vez que eu olho para ela. E quase impossível não sentir sua presença. — era Sed que saiu de casa e me encontrou sentada na entrada com o olhar perdido.

 

 

— Você também sente?

 

 

— Todos sentem. — ele se sentou a meu lado. — Talvez ela nem saiba que causa esses efeitos nas pessoas.

 

 

— Ela parece uma deusa, é tão bonita.

 

 

— Ela não vai acreditar se você contar a ela o quanto ela é bonita.

 

 

— Por que não? Qualquer um pode ver isso.

 

 

— Todos podem ver menos ela. — eu olhei para ele sem entender.

 

 

— O que quer dizer com isso, Sed?

 

 

— Quero dizer que ela é cega. Ela não vê absolutamente nada. — para mim isso não era possível, ela andava normalmente.

 

 

— Ela olhou para mim, eu tenho certeza, ela sabia que eu estava sentada na escada e me encarou.

 

 

— Talvez seja mais um delírio. — ele disse irônico e entrou.

 

 

Nunca mais eu duvidei dos meus olhos, desde que pus os pés no Egito. Eu tinha certeza, ela me encarou. E por mais estranho que parecesse, ela agia como se percebesse tudo a sua volta.

 

 

Talvez Derek tivesse uma explicação mais realista. Entrei em casa e o encontrei falando com Sed, eu não ouvi a conversa, mas entendi algo sobre Sed ser esperado para alguma coisa amanhã.

 

 

— Olá Kira. — Derek me cumprimentou quando me viu na sala.

 

 

— Derek, eu peguei um dos seus rolos de papiro, eu precisava fazer algumas anotações.

 

 

— Está bem, você pode usá-los à vontade. Você já está pronta, para sair?

 

 

— Sim, podemos ir.

 

 

Anath trazia nas mãos uma farto buquê de flores, rosas de várias cores, com certeza para oferendas. Ela nos recebeu delicadamente, com enorme doçura. Ela pediu que eu a acompanhasse enquanto ela levava as flores para a sala das oferendas, Sed partiu com Derek para a biblioteca. Ele pretendia relatar alguns cânticos para os escribas do templo. Eu ainda estava muito pensativa, lembrando-me da moça que encontrei esta manhã.

 

 

— Anath, eu vi uma pessoa hoje, — eu comecei. — que me deixou muito intrigada.

 

 

— Quem é essa pessoa? — ela me perguntou sorrindo.

 

 

— Eu não sei seu nome, Sed apenas me disse que ela era cega. — ela parou abruptamente. Passado um instante ela se recuperou do susto e me olhou.

 

 

— Ah sim. Eu a conheço. O que tem ela?

 

 

— Posso estar enganada, mas em minha opinião ela parecia se guiar muito bem para uma pessoa que não enxerga.

 

 

— Nem tudo é o que parece ser. — ela me disse simplesmente, enquanto depositava as flores no altar.

 

 

— Isso não explica muita coisa.

 

 

— Desculpe. — ela me disse. — Vamos começar?

 

 

Quando eu concordei Anath me guiou para o afresco de Bastet. Eu não havia percebido antes, mas a pintura continha outras representações, mas em geral todas as atenções eram voltadas para Bastet. Ela mostrou uma outra figura. Um homem que carregava um cetro e tinha a cabeça de cão. A figura me causou alguma estranheza.

 

 

— Este é Osíris. — ela apontou. — Pai de Hórus.

 

 

Anath pediu que eu me sentasse com ela na escada enquanto ela me narrava a história desse deus. Segundo a lenda Osíris era o deus dos mortos e do renascimento. Ele havia sido morto por seu irmão e suas irmãs Ísis e Neftis o reviveram utilizando uma poderosa magia.

 

 

Ela me contava a história com uma grande riqueza de detalhes, seus olhos brilhavam como se ela pudesse ver a história se desenrolar naquele momento diante dos seus olhos. Era evidente o respeito que ela tinha pela suas crenças, mas a história era realmente fascinante.

 

 

Cada palavra dela soava estranhamente familiar, como se eu já tivesse ouvido aquela voz. Eu sabia que era Anath ao meu lado, mas não era ela que contava. Eu tive certeza que havia algo misterioso ali quando ela me chamou de Akir, ela sabia sobre a lenda desse nome, mas sempre me chamava de Kira, como todos.

 

 

A única vez que me chamaram assim foi quando Bastet se manifestou para mim na iniciação. Quando ela terminou apenas sorriu para mim e pediu que eu a acompanhasse. Nós atravessamos a sala cheia de fiéis e voltamos para o florido pátio.

 

 

Havia uma ansiedade nela, quase pressa, para me mostrar alguma coisa. Eu vi de alguém sentado no pátio com uma posição ereta olhando para frente. Anath se posicionou na frente, então eu pude ver era a mulher que eu vi esta manhã. Ela estava no templo.

 

 

Eu respirei fundo e esperei que Anath dissesse algo.

 

 

— Eu a trouxe para que você a conheça. — Anath disse.

 

 

— Ela é bem mais jovem do que eu esperava.

 

 

— Ela é mais antiga do que eu. — Anath acrescentou o que fez a mulher suspirar longamente. Eu decidi não pensar no significado oculto dessa frase.

 

 

— Kira, esta é Dendara. — eu fiquei surpresa quando vi seu rosto de perto, ela era bonita. Com toda a certeza, mas agora que eu vi seus olhos eu percebi que eles tinham um tom de castanho opaco. Ela era cega.

 

 

— É uma honra finalmente conhece-la. Há muito tempo esperávamos por você. — ela declarou tocando minha mão. Eu olhei para Anath surpreendida, mais alguém sabia sobre mim.

 

 

— Está tudo bem, Kira. Ela sabe de tudo.

 

 

— É bom conhece-la também, Dendara. — eu sorri para ela.

 

 

— Eu vou deixar vocês a sós. — Anath se retirou me deixando com aquela misteriosa mulher. Ela se sentou novamente e eu fiquei a seu lado.

 

 

— Você tem uma participação importante na vida de muitas pessoas. — ela me disse.

 

 

— Sim, mas eu não sei se estou a altura da tarefa.

 

 

— Não se preocupe, nós logo vamos descobrir se você é capaz. — eu fiquei preocupada com essa declaração, não entendia o que ela queria me dizer. — nós nos encontramos essa manhã, estou correta?

 

 

— Sim, eu estava na entrada da casa de Derek, quando você passou.

 

 

— Eu pensei que era você. Você deve ter ficado muito surpresa comigo.

 

 

— Sim, é quase como estar hipnotizada. — ela riu.

 

 

— Eu ainda não me acostumei com isso. É muito estranho causar esse tipo de efeito nas pessoas.

 

 

— Você não faz de propósito?

 

 

— Não. Isso é apenas uma das conseqüências dos meus talentos. Um preço a se pagar.

 

 

— Como assim? — eu perguntei. Ela falava como se fosse um castigo.

 

 

— A vaidade é um dos defeitos que pode causar a ruína a uma pessoa. Pelos deuses eu fui agraciada com um dom e também com uma beleza incrível. Para criar um equilíbrio eu não posso me enxergar, para que eu não pudesse sucumbir à vaidade.

 

 

— É como um castigo?

 

 

— Não, é para minha preservação. Para as pessoas eu sou apenas bonita, para mim eu sou apenas mística. Assim dois segredos são ao mesmo tempo revelados e escondidos.

 

 

— Parece triste, mas de alguma forma inteligente.

 

 

— Alguns deuses têm senso de humor.

 

 

— Se você não pode ver como caminha pela cidade com tanta naturalidade?

 

 

— Eu não posso ver, mas posso sentir. Deixe-me explicar, eu sei que você está a meu lado, mas não posso ver seu rosto ou a cor das suas roupas. Eu sei exatamente onde pisar e sei onde estão as paredes do templo.

 

 

— Minha túnica branca. — eu disse. — Você consegue saber como é o branco?

 

 

— Sim, eu ainda sei. Obrigado.

 

 

— Quer que eu te conte mais?

 

 

— Por favor.

 

 

Ela parecia contente com isso. Eu contei a ela cada detalhe do meu rosto, no fim ela acabou dizendo que eu era bonita. Mas ambas sabíamos que ela era mais. Ela me falou que conseguia ouvir muito bem, de alguma forma os outros sentidos dela eram aguçados.

 

 

Algum tempo depois Anath apareceu e me disse que Derek tinha ido embora às pressas. Precisava resolver uma coisa urgente na cidade. Eu achei isso estranho, ele não me deixaria sozinha.

 

 

— Tudo bem, Anath eu posso voltar sozinha. — eu disse. Já estava me acostumando com o caminho.

 

 

— Tem certeza?

 

 

— Sim. — eu olhei para o céu as nuvens estavam escuras e tempestuosas. — Eu chegarei em casa antes que comece a chover, não se preocupe.

 

 

— Certo. Até amanhã. — eu me despedi dela e de Dendara.

 


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Notas finais do capítulo

Espero que estajam gostando de ler, pois eu realmente amei escrever.



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