Pra não Dizer que não Falei de Flores escrita por Moony


Capítulo 16
Tudo sob controle




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Capítulo 15 – Tudo sob controle

 

 

Estávamos quase no recesso de Natal e eu ensaiava diversas maneiras de dizer aos meus pais que o Walter não era apenas um amigo. Tinha resolvido que não dava pra fugir disso a vida toda e, na pior das hipóteses, me mudaria pra casa dele até a poeira baixar.

 

Foi com esses planos na cabeça que cheguei em casa, completamente distraído, até ouvir minha dizer que tinham ligado pra mim de um jornal. Não dei muita importância porque, afinal de contas, alguns lugares já tinham telefonado para dizer que eu não seria empregado. Fiquei até surpreso com a eficiência do Walter de mandar meu currículo pra tantos lugares. Se duvidar, até a banca de revistas da esquina sabia qual a minha formação.

 

No dia seguinte ligaram de novo, dessa vez de manhã e eu atendi. Tinha sido empregado. Ou melhor, seria um estagiário. No mesmo jornal em que o Walter já fazia o mesmo. Era uma notícia ao mesmo tempo boa e aterrorizante. Eu sempre tinha sido um nerd entocado em casa, e de repente teria que estagiar no mesmo lugar que o meu namorado, pra que ele visse todos os meus erros (que eu certamente cometeria), e tudo isso em pleno segundo semestre na faculdade.

 

Assustador. Pensei até em não contar a ele, mas seria impossível. Minha mãe ficou saltitante de felicidade, afinal, aos olhos dela eu estava quase me tornando um adolescente “normal”.

 

- x -

 

- Isso é sério? – Walter perguntou, quase tão saltitante quanto minha mãe quando lhe contei.

 

- É.

 

- E por que você tá assim?

 

- Assim como?

 

- Assim, oras. Com essa cara de quem tá achando tudo horrível e doloroso.

 

- Você é um chato, sabia? Eu só não estava esperando por isso agora.

 

- Mas você se acostuma. Podemos almoçar juntos todo dia e ir pra faculdade de lá. Sem falar nas pausas no almoxarifado...

 

- Walter!

 

- Enfim... Vai, fica feliz. Seja um bom menino. Quando você começa?

 

- Semana que vem.

 

- Quer que eu vá te buscar? Tenho um carro agora.

 

- É, você faz questão de me lembrar o tempo todo... Mas não precisa.

 - Qual é, Rô... Você não quer porque tá com vergonha de que eu te veja trabalhando, pensa que eu não sei?

 

Às vezes ter alguém que nos conheça tão bem não é tão bom quanto pensamos. Mas tudo bem. Eu supero.

 

- Walter... Eu nunca trabalhei na vida. Eu sou um zero à esquerda, uma criatura sem experiência nenhuma em lugar algum, e tenho certeza de que vou ter um colapso nervoso quando chegar lá.

 

- E começar a rir desesperadamente?

 

- É, e começar a rir desesperadamente.

 

- Isso não é bom.

 

- Não é nada bom. E o risco de realmente ter esse colapso cresce enormemente com a perspectiva de que você vai estar lá vendo tudo, então deixa eu me acostumar com a situação e depois eu penso em aceitar a carona.

 

- Tá bom. Você manda, eu obedeço.

 

Nada mal.

 

- x -

 

Tudo bem. Dentro de uma semana minhas manhãs seriam preenchidas pelo estágio, as tardes pela faculdade e a noite para viver um pouco. Talvez não fosse tão ruim.

 

Mas, pra completar o rumo estranho que a minha vida estava levando, minha carteira de estudante simplesmente foi bloqueada. E não é muito animador descobrir isso em um ônibus. E pior ainda seria o fato de que o problema teria que ser resolvido no grêmio.

 

Fui até lá quase que completamente esquecido de que o Lucas provavelmente me atenderia ou me veria, nem que fosse de relance, mas lembrei disso no meio do caminho e estanquei. Bom, eu pensei, se a gente já quase não se vê estudando no mesmo corredor, não faz sentido temer encontrá-lo aqui. E, se encontrar, não tem problema. Está tudo bem. Tudo sob controle.

 

Talvez eu não devesse exercitar tanto o meu otimismo em um mesmo dia. Ele estava lá sim, sentado no fundo da sala e com toda a atenção voltada para o computador. Se houvesse alguém pra falar comigo não haveria nem perigo de ele me ver, mas, como não havia, o único jeito era chamá-lo. Vamos lá, Rodrigo. Enfrente seus medos.

 

Chamei uma vez e ele já ouviu. Um tanto surpreso, foi até a janelinha onde eu estava debruçado e perguntou o que eu queria.

 

- Minha carteira foi bloqueada. – expliquei. Mostrei a bendita carteira de estudante ele deu uma olhada.

 

- Ela já venceu. Tem que fazer outra. Você preenche isso aqui, paga a taxa e daqui a um tempinho tá pronta. – ele falou, me entregando um formulário pequeno.

 

- Ok.

 

Simples, prático e quase indolor. Eu evitava olhar diretamente para ele, mas dava perceber que nós dois estávamos evitando ao máximo qualquer tipo de conversa mais profunda. Eu por não estar nem um pouco afim de me envolver com ele nem que fosse amigavelmente , e ele talvez por estar tomando alguma consciência e ter percebido que não vai adiantar nada ficar me abordando com o mesmo assunto o tempo todo.

 

Tudo tinha terminado bem. Claro que eu teria que voltar lá quando terminasse o formulário e pagasse a taxa, mas provavelmente não seria tão terrível quanto eu imaginava. Mas não terminou assim. Incrédulo, ouvi ele me chamar quando eu estava a uns cinco passos do grêmio.

Eu poderia simplesmente fingir que não ouvi e continuar meu caminho, mas também poderia ver no que aquilo ia dar. Talvez fosse melhor resolver tudo de uma vez.

 

- Você não acha que eu mereço uma chance de me explicar? – ele falou, ou melhor, quase sussurrou. – Não que tenha feito algo muito errado, mas... Talvez você esteja com uma imagem ruim de mim.

 

- Não, não precisa explicar nada. Já aconteceu, eu já entendi e está tudo bem.

 

- Está tudo bem pra você, não pra mim. – ele continuou, ainda calmo. Eu tinha que admitir que sua voz era bonita. Tranqüilizante. Mas não era hora de reparar nesses detalhes.

 

- Nós poderíamos sair depois da aula e conversar...

 

- Não, não poderíamos. – interrompi, com um certo desespero.

 

- Tá bom, então o que você quer que aconteça?

 

- Quero que a gente esqueça tudo isso. Simples.

 

- Pra você. – ele arrematou, voltando para o computador. Ainda passei alguns segundo atordoado, até conseguir me mover dali.

 

Aquele cara era muito atrevido! Eu não achava que ele tinha cometido um crime ou algo assim em me mandar aquelas pétalas ao mesmo tempo em que Walter o fazia, mas não queria conversar sobre isso. O que iria dizer? Que estava namorando outro cara e que ele deveria se conformar com isso? Não, obrigado.

 

Encontrei Walter a poucos passos da nossa sala, e por um momento ou dois tive medo de que o encontro com o Lucas estivesse estampado na minha cara. Depois percebi que isso era bobagem e tive uma vontade quase que incontrolável de beijá-lo ali mesmo, no meio do corredor.

 

- Que cara é essa? – Walter me perguntou com um sorriso meio hesitante quando cheguei até ele.

 

- Nada não... Tava aqui pensando besteira.

 

- Hum, sei... Escuta, você lembra daquela festa na casa da dita cuja que você cismou que tava dando em cima de mim?

 

- Lembro... Ei! Eu nunca te disse isso que tinha cismado com isso.

 

- Como se não desse pra perceber você fuzilando a coitada com os olhos! Mas isso não vem ao caso... Vai ter outra, sabe.

 

- Outra o quê?

 

- Festa.

 

- Ah, Walter...

 

- Não começa. Aproveita enquanto o estágio não começa, considere como sua despedida de... Sei lá, de estudante-sem-emprego.

 

- Não sei, não.

 

- Sabe, sim. Ficamos naquele esquema de ir embora se você não gostar.

 

- Jura?

 

- Claro.

 

- E quando vai ser isso?

 

- Sexta-feira à noite.

 

- Tá, mas quero voltar cedo.

 

- Pra quê?

 

- Pra nada, oras. Só não quero passar muito tempo lá. E também não quero saber daquela garota te secando.

 

- Você fica tão bonitinho com ciúmes... Tá bom, a gente sai de lá cedo e passa na minha, só minha e completamente minha, casa.

 

- Parece que você tá gostando desse negócio de ter uma casa só pra si.

 

- Não deixa de ter lá as suas vantagens. Não acha?

 

- Claro.

 

- x -


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Notas finais do capítulo

N.A.: Olá :D
É, dessa vez o capítulo demorou mesmo... Mas vocês entendem, né? Tá difícil arranjar um tempinho extra pra escrever, infelizmente.
De qualquer forma, aqui estamos... Mais uma festa para desafiar os instintos anti-sociais do Rodrigo! xD O que será que vai acontecer dessa vez?
Ah, eu realmente tentei achar um título melhorzinho para o capítulo, mas não rolou... >
Certo, essa falação toda é pra dizer que postei uma "coletânea" desses pequenos contos aqui no Nyah. Se chama Cogito Ergo Doleo, se alguém estiver interessado :D
É isso. Até mais e continuem lendo ;D

(02/04/2009)