Sentada na beirada da poltrona azul-clara, eu chorava. Ter ali na minha frente a visão de meu amado pegando um trem de portas douradas que prometia chegar à terra mais bela de todas era a coisa mais dolorosa que uma mulher poderia suportar. Ele estava me deixando...

Meus olhos, confundindo-se com as lágrimas que deles caíam, enxergavam mulheres de vestidos brancos passando óleos afrodisíacos em seu corpo pálido coberto apenas com um pedaço de pano cor de gelo enquanto ele entrava vagarosamente – e certamente relutante - no vagão florido de cravos alvos. Ele gritava – talvez de alegria, talvez de tristeza.

Infelizmente ambos, o amor de minha vida e eu, sabíamos que aquela viagem era sem volta. Uma vez que se toma o trem divino, não há mais retorno a essa terra cheia de pecados em que meu coração permanece, atônito, conflitado entre resignar-se com sua partida e a luta por sua permanência, mesmo que curta, junto a mim, essa reles menina apaixonada.

Ele olhava meu rosto, ruborizado e marejado de lágrimas insistentes, e sorria em uma paz que apenas quem estivesse indo embora teria na face. Minha tentativa de retribuir-lhe o sorriso belo e iluminado era apenas um esboço de um puxão forçado nos lábios. Eu gostaria de sorrir e fazê-lo feliz, mas era egoísta demais para aceitar, ele não podia estar partindo tão cedo! Mas sua estadia na estação da vida estava ao término, e ele necessitava partir para outro lugar, um lugar melhor, não podia ficar aqui... Sei que ele não queria permanecer. A doença não lhe permitia.

De um transe ocasional, retornei à poltrona azul daquele quarto claustrofóbico de hospital. Paredes brancas, leito branco, sua roupa também. Mas a pele bronzeada contrastava de uma maneira melancólica com tudo aquilo; ele sempre fora alguém tão alegre...

Suas palavras de amor foram murmuradas com muita calma, ele sabia para onde estava indo e confiava em mim, pedia para que eu ficasse em paz– assim como ele estava. Prometi que estaria bem, ao menos me esforçaria para ficar feliz mesmo sem sua presença.

Havia chegado a hora. A última vez que o vi sorrir foi a mais bela de todas.  Ouvi um barulho irritante e contínuo: sem batimentos cardíacos. Ele finalmente ingressou ao vagão daquele trem brilhante e olhou para trás uma última vez.  Beijou-me as duas faces, eu estava em pé a sua frente, depois meus lábios uniram-se aos dele. Entrou no trem e o vagão estava partindo, minha maior vontade era de agarrar-me às laterais do vagão e suplicar que me levassem ao seu lado...

Partiu.