Mutação Oculta escrita por Athenaie


Capítulo 11
Capítulo 11




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Quando era miúda adorava o carnaval. Todos os anos escolhia antecipadamente do que me queria mascarar e fazia a minha mãe fazer-me a vestimenta a condizer. Princesa, fada ou sevilhana. Já na adolescência era eu que as fazia, de sereia, de odalisca e bailarina de can-can.

Só no estado adulto deixei de me mascarar e não porque não gostasse mas sim porque deixei de ter companhia para ir aos bailes de mascaras. Os meus namorados nunca foram homens que gostassem disso e não tem lógica ir a um baile de mascara com o companheiro vestido normalmente. Seja como for tinha pena.

Tinha passado uma semana sobre a noite que fiz sexo com o Eric e andei nas nuvens durante esse tempo. Agora no entanto pensava como era estranho ele nunca mais ter aparecido. É verdade que o podia ir ver ao Fangtasia mas não chegamos a falar sobre isso e tinha duvidas se devia aparecer sem ser convidada. Afinal é o local de trabalho dele, um deles pelo menos e ele tem uma imagem de indisponível que gosta de manter. Estava de telemóvel na mão a ensaiar um SMS, à 10 minutos, quando recebi uma mensagem dele. Sorri! Seria possível que ele soubesse que eu estava a tentar-lhe mandar uma e não sabia o que escrever?

Li a mensagem e dizia:

 - Noite de mascaras no Fantagsia. A Pam vai buscar-te às 23 horas. Vem mascarada. Eric

Oh diabo! A Pam vem buscar-me?

A Pam era uma vampira que ele tinha criado e era assim por dizer o seu braço direito. Sabia que ela não nutria um especial sentimento por mim, como aliás por nenhum humano. Isto não me parece promissor.

Pensei no que podia mascarar-me. O que tinha eu em casa que desse para fazer uma mascara?

Respondi-lhe à SMS. ‘’mascaro-me de quê? J ‘’

E ele respondeu de seguida: De vampira claro!

Desatei às gargalhadas sozinha no meio da sala. Não é nada básico, mascarar-me de vampira para ir a um bar de vampiros. No entanto essa é uma mascara fácil. Roupa preta, uma base meio esbranquiçada na cara para ficar mais pálida e um fiozinho de sangue ao canto da boca.

No meu caso nem preciso de base esbranquiçada, basta não por nenhuma que pálida como sou, passo por morta há 50 anos na boa.

Procurei um espartilho preto que tinha lá por casa e umas calças pretas justas. Vampira mas sexy, ora bolas. Empecei o cabelo para dar-lhe um ar volumoso e maquilhei os olhos de um tom bem escuro. Montes de rímel e eye-liner. O toque final o risquinho vermelho a imitar um fio de sangue que escorre da boca. Eis o mítico vampiro que todos imaginavam antes de saberemos que na realidade existiam mesmo.

À hora marcada um carro desportivo vermelho parou à porta do prédio. Desci e a Pam disse-me para entrar.

Mantivemo-nos em silencio durante boa parte do caminho, até que já não suportando o silencio comecei:

 - Então Pam, o Eric disse-me que é o teu criador.

 - Sim - disse ela

 - E como é isso? Que espécie de relação tem vocês?

A Pam sorriu para a estrada

 - Estás com ciúmes?

 - Não, claro que não. Queria apenas entender… - Disse o mais sinceramente que consegui

Ela pareceu pensar e disse:

 - Estava a provocar-te. Não há motivo para teres ciúmes. Eu e o Eric não temos esse tipo de relação há muitos anos já.

 - Mas tiveram? – Claro que tiveram, pensei. Têm os dois, uma óptima aparência, andam por aí há séculos e os vampiros parecem gostar tanto de sexo como de sangue.

 - Sim, no princípio tivemos sexo, muitas e muitas vezes antes de eu perceber que prefiro outro género.

 - Outro género?

 - Sim, o feminino.

Isso era uma novidade. Não podia dizer que estava chocada. Nunca me fez confusão os gostos sexuais. Apenas tinha imaginado a Pam como heterossexual e não homossexual.

Desta vez foi ela que recomeçou a conversa

 - Então tu e o Eric?

 - Não concordas pois não?

 - Não tenho que concordar nem discordar. O que vocês fazem só a vocês diz respeito. Não tenho absolutamente nada contra ti. És-me completamente indiferente apenas acho que a tua presença pode ser um perigo para o Eric

 - Eu posso ser perigosa para o Eric?? Estava completamente a zero agora

 - Não tu! – Riu-se – Os sentimentos dele por ti podem torna-lo mais fraco.

 - Desculpa Pam, mas continuo a não perceber.

 - Alexandra, o Eric não é apenas o dono do Fangtasia. Ele gere um pequeno império. Várias participações em empresas, negócios variados na nossa própria hierarquia e, ele é o responsável por manter a lei e ordem do território dele. Alguém na posição dele tem muitos inimigos, inimigos esses que não terão problemas em faze-lo cair para ficar com o seu poder. O Eric não se pode dar ao luxo de ter um calcanhar de Aquiles e os sentimentos dele por ti são um prato cheio para quem quiser derruba-lo.

 - Estás a dizer realmente o quê?

 - Que um dos inimigos dele pode pensar que se te raptar ou matar pode comprometer a sua racionalidade e conseguir mata-lo ou desacredita-lo. Um vampiro não se deve pôr em perigo por um humano. Somos superiores a vocês.

Uau! Não sei se estava ofendida ou espantada com o à-vontade como ela disse tudo o que pensava

 - No entanto – continuou ela – o Eric sabe o que faz, ou pelo menos sabia e nunca irei contra aquilo que ele quer. È o meu criador e devo-lhe lealdade.

 - Isso é sempre assim? Essa aparente incapacidade de ir contra as ordens do criador?

 - Estás a perguntar-me se ele te transformar se lhe deverás respeito e lealdade, sem nunca te revoltares contra o que ele quer? – Perguntou ela

 - Não exactamente, mas no fundo até gostaria de saber a resposta a essa pergunta.

 - Bom, nem sempre. Depende da relação entre o criador e a cria. Há casos em que o criador mantém o seu poder sobre a cria, há outros, mais raros em que a cria tem voz activa.

 - Ora então – continuei eu – Há mais casos de vampiros que gostam de humanos. Não sou um caso único.

 - Não, claro que não. Mas o Eric não é um vampiro normal. Tem uma posição a defender e manter a situação assim muito tempo é que pode ser um risco. Se ele gosta de ti, devia transformar-te.

 - Eu não quero ser imortal! – Quase que gritei

- Pois, assim ele tem um problema. Pensa nisso!

Não quis pensar nisso. Que raio, conheço o Eric à meia dúzia de meses. Andámos num jogo de esconde-esconde até há uma semana atrás, quando finalmente cedi aos meus desejos. Toda esta conversa sobre a minha mortalidade provocava-me vómitos e estive quase para desistir e ir para casa. Resolvi ignorar as ideias da Pam. O Eric tinha dado a sua palavra que não me transformaria e eu não tinha motivos para duvidar dele. Já o poderia ter feito se quisesse e ele não iria contra a minha vontade. Acho!

Chegamos finalmente ao Fangtasia. Quando ia a sair do carro a Pam agarrou-me o braço com a sua mão gelada

 - Alexandra, não tenho nada contra ti mas entende que ele é o meu criador e entre ti e ele, escolho ele.

 - Preferias que eu o deixasse de ver?

 - Não, isso não, pois ele não gostaria disso mas sei que eventualmente vocês terão problemas e temo por ele.

 - Ok, Pam. Na boa. Deixemos isso por agora. Sejamos realistas. Eu e o Eric demos apenas umas cambalhotas. Vai na volta e ele farta-se dentro de dias e não tens nada com que te preocupar.

 - Não conheces bem o Eric. Ele não é nenhum humano inconstante. È um vampiro poderoso e antigo e alguém como ele não quer uma coisa hoje e outra amanhã!

 - Obrigado pela parte do ‘’coisa’’ – Disse-lhe sarcasticamente

Ela riu-se e disse:

 - Tens garra! Acho que começo a perceber o que ele viu em ti!

E com isto saímos do carro e entramos no bar.

O Fangtasia estava ao rubro! Era difícil perceber no meio de tanto vampiro quem eram os humanos mascarados ou os vampiros verdadeiros. Após analisar a multidão comecei a identificar os verdadeiros dos falsos e pareceu-me estar casa cheia de humanos. Talvez os vampiros não apreciem o carnaval.

Segui a Pam até ao bar onde pedi um vodka.

O barman olhou-me com aparente desagrado. Literalmente não ando a fazer fans entre os súbditos de Eric.

Tentei relaxar e apreciar o ambiente. As pessoas estavam muito divertidas e o bar estava à pinha e continuava a entrar clientes. A música não era propriamente carnavalesca mas as pessoas dançavam à mesma e atiravam papelinhos uns aos outros. Os vampiros presentes pareciam ignorar tanta animação. Senti a presença dele mesmo antes dele me tocar e pouco depois a mão dele abraçou-me pela cintura. Fiquei encostada de costas para ele e disse ao meu ouvido:

 - Estás tão sexy, coração! Esse espartilho é uma tentação!

Sorri sem dizer nada. Ele podia sentir que eu tinha gostado.

 - Achas que posso rasgar-te a roupa e foder-te já aqui? – Assoprou ele no meu ouvido

 Respondi:

 - É melhor não, pois senão todas as mulheres presentes pensarão que isso está incluído no consumo e vais ter uma noite muito atarefada.

Ele riu alto

 - Ficas bem? Preciso de uma hora para resolver uns assuntos e depois podemos ficar juntos.

 - Sim, vai lá.

Ele foi e eu tentei perceber se alguém estava a olhar para mim. Havia um ou outro cliente que tinha reparado no meio da folia, que o Eric me estava a agarrar e estavam com um ar curioso. Imagino que os clientes habituados à casa, não costumem ver o Eric a aproximar-se de uma humana com aparente simpatia.

Bebi o meu vodka, procurei um sofá para me sentar. A Pam apareceu e sentou-se ao meu lado. Acabamos por ter uma conversa normal sobre assuntos mundanos, como por exemplo as mulheres estarem a ficar cada vez mais gordas e os homens mais carecas. A Pam quando não está a defender o Eric com unhas e dentes até pode ser uma boa companhia e algo divertida duma forma muito própria e muito caustica!

Precisava ir à casa de banho. Perguntei onde era. A Pam indicou-me o corredor de acesso. Ao percorre-lo, senti a presença do Eric na cave. Aproximei-me das escadas. No fundo havia uma porta que estava entreaberta. Desci uns degraus para ouvir melhor mas, não arrisquei desce-los todos. Os vampiros ouvem muito bem e podia ser facilmente descoberta além de que se eu sinto a presença do Eric ele também sabe que eu estou ali.

Fiquei a ouvi-lo. Ele acusava alguém de não ter cumprido as regras e enquanto uma outra voz implorava por clemência, ouvi-o dizer:

 - Não há clemência para quem mete em perigo a nossa existência!

E com isto, ouviu-se um barulho de luta, gritos desesperados e depois silêncio.

A voz do Eric ouviu-se outra vez:

 - Limpem a cave e tu informa a autoridade que o castigo foi aplicado.

Fugi rapidamente dali e refugiei-me na casa de banho. Estava sem reacção. O Eric acabou de matar um vampiro?

Tentei recompor-me e decidir se havia de fugir dali o mais rápido que podia, fazer as malas e sair do pais, ou ficava e encarava a situação.

Quando abri a porta da casa de banho ele estava encostado à ombreira da porta. Dei um salto. Devia ter sentido que ele estava ali mas estava demasiado assustada.

 - Já me viste matar antes – disse ele

É verdade. Ele mandou matar o João e companhia naquela estranha explosão em Setembro e despedaçou os dois homens que me atacaram mas de alguma forma parece que senti que havia um motivo para o fazer e agora via nele uma outra capacidade. A de matar a sangue frio!

 - Sim mas…..

Fiquei sem saber o que lhe dizer.

 - Anda - disse ele, sem expressão definida no rosto - Vamos embora

Fui com ele em silêncio. Saímos pelas traseiras do bar e entramos num BMW Z5 preto que estava estacionado perto.

Ele ligou o carro e conduziu a uma velocidade estonteante pelas ruas da cidade até uma zona de moradias nos subúrbios da cidade. Virou o carro para uma das propriedades e um portão alto e impenetrável à vista abriu-se ao toque de um comando no interior do carro. Assim que o carro avançou pela propriedade os portões fecharam-se silenciosamente atrás de nós.

O carro avançou subindo uma estrada de pedra até à porta de uma garagem que ficava na lateral de uma moradia de dois pisos de cor clara. Uma vez lá dentro, saímos do carro e entramos em casa por uma porta de acesso.

A casa dele era ampla, de cor bege claro. A sala tinha sofás brancos, um enorme tapete de cor preta. Na parede um LCD gigantesco. Os cortinados eram pretos e pareciam pesados, como de veludo. Não consegui reparar em mais nada, sentei-me num sofá e meti a cabeça entre as pernas.

Ele foi buscar um copo de vodka e deu-mo. Bebi metade de uma vez só.

Ficou à espera que eu falasse mas eu não tinha nada que dizer. Não sabia o que pensar. Ia acusa-lo do quê? De ser aquilo que é?

 - Eric, disse finalmente, sei que estás à espera que eu diga qualquer coisa mas eu não tenho nada para te dizer sobre o assunto. Não posso julgar-te ou condenar-te por algo que faz parte de ti. Há imensas coisas que eu não sei sobre ti, sobre o que fazes, há quanto tempo ou porquê mas eu sempre soube o que tu eras.

 - Podes perguntar-me o que quiseres.

 - Não quero perguntar-te nada. Não esta noite. As coisas são como são e eu só quero estar contigo, sem pensar em mais nada.

 - Acho que posso fazer isso.

E fez, várias vezes!


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